Acórdão nº 50380724520198210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Cível, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoQuarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50380724520198210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002209383
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5038072-45.2019.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Exame de Saúde e/ou Aptidão Física

RELATOR: Desembargador ALEXANDRE MUSSOI MOREIRA

APELANTE: EDUARDO BORGES BANDA (IMPETRANTE)

APELADO: CHEFE DA DIVISÃO DE RECRUTAMENTO, SELEÇÃO E COMPANHAMENTO DA BRIGADA MILITAR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL ¿ DRESA (IMPETRADO)

APELADO: DIRETOR ADMINISTRATIVO DA BRIGADA MILITAR (IMPETRADO)

APELADO: DIRETOR ADMINISTRATIVO INTERINO DA BRIGADA MILITAR (IMPETRADO)

APELADO: FUNDAÇÃO LA SALLE (IMPETRADO)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (IMPETRADO)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por EDUARDO BORGES BANDA, nos autos do mandado de segurança impetrado contra ato praticado pelo DIRETOR ADMINISTRATIVO DA BRIGADA MILITAR; DIRETOR ADMINISTRATIVO INTERINO DA BRIGADA MILITAR, e pelo CHEFE DA DIVISÃO DE RECRUTAMENTO, SELEÇÃO E COMPANHAMENTO DA BRIGADA MILITAR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – DRESA, em face da sentença (Evento 57 da origem) em que denegada a segurança e condenada a parte impetrante ao pagamento das custas processuais, cuja exigibilidade restou suspensa, em face da AJG deferida.

A impetrante, em suas razões de apelo (Evento 65), aduz que participou do Concurso Público destinado a Capitão QOEM da Bombeiro Militar, Edital DA/DRESA nº CSBM 01/2018, tendo alcançado aprovação na 1ª fase do certame (provas objetiva e teórica) e na 2º fase (Exame de Saúde), tendo sido convocado para participar da 3º fase (Exame de Capacitação Física) aprazada para 15/08/2019 (Edital DA/DRESA nº CSBM 47 – 2018), na qual restou considerado inapto (Edital DA/DRESA nº CSBM 48 – 2018), resultado contra o qual interpôs recurso administrativo, no qual foi mantida sua inaptidão, resultando em sua eliminação eliminado do certame (EDITAL DA/DRESA nº CSBM 53 – 2018). Refere ter sido considerado inapto na fase de exame físico em razão de estar acometido por doença transitória (hérnia de disco) que ensejou no afastamento de suas atividades por 14 dias, conforme atestado médico juntado. Alega que a oportunização de novo Exame de Capacitação Física não ensejará em ofensa a isonomia entre os candidatos, por se tratar de fase eliminatória e não classificatória, na qual poderá ser considerado apto ou inapto. Refere que a ilegalidade da previsão constante no item item 8.3.11 do Edital DA/DRESA nº CSBM 01/2018 Edital, porquanto discriminatória, uma vez que foi eliminado do certame em razão de doença que não deu causa, tampouco podia prever quando de sua inscrição no certame, caracterizando-se como caso fortuito ou de forma maior, na forma do art. 393 do CPC. Refere que no dia 04/10/2019 realizou cirurgia de hérnia discal e descompressão, apresentando melhora da ciática, estando apto a realizar atividades e esforços físicas vigorosas. Pugna pelo provimento do apelo, a fim de que seja reforma a sentença, para que lhe seja oportunizada a submissão a novo Exame de Capacitação Física.

Apresentadas as contrarrazões (Evento 72, da origem), os autos foram remetidos para a superior instância.

Com parecer lançado pela Procuradoria de justiça (Evento 39), os autos vieram, conclusos, para julgamento.

VOTO

O recurso merece ser conhecido, pois preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

Pois bem. optando o impetrante pela estreita via do mandado de segurança, deve estar ciente da necessidade de demonstrar a existência de direito líquido e certo e a sua ameaça, a teor do art. 1º da Lei nº 12.016/09.

O mandado de segurança exige prova pré-constituída como condição essencial para o exame da suposta ilegalidade; ou seja, o direito ameaçado ou lesado deve ser líquido e certo, demonstrado prima facie pela documentação juntada com a inicial, visto se se permitir a dilação probatória.

Sabidamente a Administração Pública está vinculada ao princípio da legalidade, adstrita, portanto, à observância da lei, nos termos do art. 37, caput, da CF, não podendo se afastar dessa regra, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade civil ou criminal, conforme o caso.

Nesse sentido leciona Hely Lopes Meirelles, in Direito Administrativo Brasileiro, 37ª edição atualizada até a EC nº 67, de 22/12/2010, São Paulo: Malheiros Editores, 2011, p. 89, verbis:

A legalidade, como princípio de administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.
(...)
Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal.
Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei significa “deve fazer assim”.
As leis administrativas são, normalmente, de ordem pública e seus preceitos não podem ser descumpridos, nem mesmo por acordo ou vontade conjunta de seus aplicadores e destinatários, uma vez que contêm verdadeiros poderes-deveres, irrelegáveis pelos agentes públicos.
Por outras palavras, a natureza da função pública e a finalidade do Estado impedem que seus agentes deixem de exercitar os poderes e de cumprir os deveres que a lei lhes impõe. Tais poderes, conferidos à Administração Pública para serem utilizados em benefício da coletividade, não podem ser renunciados ou descumpridos pelo administrador sem ofensa ao bem comum, que é o supremo e único objetivo de toda ação administrativa.

O edital é a lei do concurso público e suas regras vinculam tanto a Administração Pública quanto os candidatos.

No que diz com o Exame de Capacitação Física, em que o impetrante restou considerado inapto, o Edital DA/DRESA nº CSBM 01 - 2018 prevê nos itens 8.3.11 e 8.3.13:

8.3.11 Os casos de alterações psicológicas ou fisiológicas que impossibilitem o candidato de se submeter aos exames ou de neles prosseguir, ou que lhe diminuam a capacidade físico-orgânica, não serão considerados para fins de tratamento diferenciado, ou novo exame pelos examinadores ou pela Comissão de Concurso.

(...).

8.3.13 Em nenhuma hipótese haverá segunda chamada, seja qual for o motivo alegado.
O candidato não poderá alegar qualquer desconhecimento sobre a realização da prova como justificativa de sua ausência ou atraso. O não comparecimento à prova, no horário determinado em Edital, por qualquer que seja o motivo, caracterizará desistência e resultará na eliminação do Concurso. Não será aplicada prova fora do dia, horário e local designados em Edital.

Os concursos públicos regem-se pelos princípios que norteiam a administração pública, em especial, o princípio da igualdade e da impessoalidade.

Leciona Helly Lopes Meirelles (in Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Malheiros, 25ª edição, pag. 397/398) que a "administração é livre para estabelecer as bases do concurso e os critérios de julgamento, desde que o faça com igualdade para todos os candidatos, tendo, ainda, o poder de, a todo tempo, alterar as condições e requisitos de admissão dos concorrentes, para melhor atendimento do interesse público”.

Assim, permitir que o impetrante seja submetido a novo Exame de Capacitação Física, sob o argumento de que o resultado de inaptidão, obtido em anterior Exame de Capacitação Física, teria decorrido do fato de que, à época, o candidato estava acometido por doença transitória (hérnia de disco) que lhe impedia de fazer atividades que demandassem esforços físico, implicaria, a toda evidência, em tratamento não isonômico, igualitário, com relação aos demais candidatos, o que deve estar resguardado em qualquer certame público.

Isso porque, a luz do princípio da isonomia, é vedado que um candidato tenha tratamento diferenciado dos demais, justamente para que os critérios de classificação sejam correta e igualitariamente aplicados, devendo todos se submeter às mesmas regras.

Aliado a isso, tendo em vista o princípio da vinculação ao edital, é imperioso a atenção às regras convocatórias, as quais se destinam a todos os concorrentes às vagas. Nessa linha, circunstâncias personalíssimas, por mais pontuais e delicadas que sejam, não têm o condão de alterar a generalidade isonômica do concurso.

Assim compreendido, tendo agido a Administração Pública nos moldes estabelecidos pelo edital – fato incontroverso – não estará cometendo qualquer ilegalidade. Ou seja, não há se falar em violação ao direito líquido e certo.

No caso concreto, fica evidente que o apelante não logrou êxito em comprovar que a autoridade coatora, ao indeferir sua submissão a novo Exame de Capacitação Física agiu com abuso, de forma a violar direito líquido e certo.

Nesse sentido, precedentes:

APELAÇÃO CÍVEL. CONCURSO PÚBLICO. MANDADO DE SEGURANÇA. CAPITÃO DA BRIGADA MILITAR. NÃO COMPARECIMENTO NO EXAME DE SAÚDE. MARCAÇÃO DE NOVA PROVA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. 1. O direito líquido e certo é aquele que se mostra inequívoco, sem necessidade de dilação probatória, exigindo-se para sua configuração a comprovação dos pressupostos fáticos adequados à regra jurídica. 2. O regime jurídico dos concursos públicos caracteriza-se pelo conjunto de regras e princípios sobre acesso aos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT