Acórdão nº 50385407220208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 14-06-2022

Data de Julgamento14 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50385407220208210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002141540
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5038540-72.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano moral

RELATORA: Desembargadora DENISE OLIVEIRA CEZAR

APELANTE: PERCIO DIAS RODRIGUES (AUTOR)

APELANTE: CARLOS HENRIQUE PETERSEN (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação interpostos por PERCIO DIAS RODRIGUES e CARLOS HENRIQUE PETERSEN em face da sentença que, nos autos da ação de indenização por danos morais ajuizada pelo primeiro recorrente, julgou parcialmente procedentes os pedidos nos seguintes termos:

III – FACE AO EXPOSTO, julgo parcialmente procedente exclusivamente o pedido cumulado indenizatório e condeno o réu ao pagamento de R$10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por dano moral, importância a ser corrigida monetariamente, pelo IGP-M, desde a data de hoje, e acrescida de juros moratórios de 1% ao mês, contados de 29/05/2020 (súmula n.54/STJ).

Ocorrente sucumbência recíproca de que trata o artigo 86 do CPC, arcará o autor com o pagamento de 70% das custas processuais e verba honorária arbitrada em R$1.200,00 (mil reais) – com suspensão da exigibilidade dos encargos de sucumbência por litigar com o benefício da gratuidade judiciária (Evento 10) – enquanto que o réu, por sua vez, pagará o restante das custas do processo e honorários advocatícios fixados em 15% do valor corrigido da condenação, verba honorária aquela que deverá ser atualizada monetariamente desde esta data, pelo IGP-M, e acrescida de juros de 1% ao mês, contados do trânsito em julgado da sentença (artigo 85, § 16, do CPC). É inadmitida a compensação das verbas honorárias, por haver expressa vedação legal (artigo 85, § 14, do CPC).

Na fixação das verbas honorárias considerei o grau de zelo na elaboração das peças processuais, o local da prestação do serviço - coincidente com aquele de localização dos escritórios dos procuradores das partes, circunstância que facilita o desempenho doss mandato outorgados - o trabalho realizado pelos advogados e o tempo necessário para sua realização, decorrente do necessário acompanhamento processual e participação em audiência.

Em suas razões (evento 119), o réu afirma que as alegadas ofensas proferidas contra o autor decorreram de conduta inapropriada com alunas da academia de que era proprietário. Assevera que o autor omitiu informações em seu depoimento pessoal. Argumenta que a testemunha ouvida em juízo tinha relação próxima com o autor. Defende que não houve comprovação dos danos extrapatrimoniais supostamente experimentados pelo autor. Subsidiariamente, requer a redução do quantum indenizatório. Colaciona julgados e, ao final, requer o provimento do recurso.

Por sua vez, em suas razões (evento 121), o autor sustenta que lhe foram direcionadas, através de aplicativo de mensagens eletrônicas, diversas ofensas advindas do réu. Entende que houve excesso na conduta do réu. Afirma que o valor arbitrado a título de danos morais deve ser majorado para valor não inferior a R$ 50.000,00. Pugna pela condenação do réu à retratação pública em rede social diante das ofensas proferidas. Ao final, requer o provimento do recurso.

Foram apresentadas contrarrazões (eventos 126 e 127).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Trata-se de ação de indenização por danos morais na qual o autor afirma que foi ofendido pelo réu em grupos de mensagens eletrônicas, tendo contra si direcionadas acusações indevidas e ameaças. Segundo seu relato, tais fatos ocorreram depois do ajuizamento de ação trabalhista em face da empresa de que o réu é proprietário, com o término de seu contrato de trabalho que perdurava por 8 (oito) anos.

O juízo a quo julgou parcialmente procedente a demanda, condenando o réu ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de indenização por danos morais e afastando a necessidade de desagravo público.

Inicialmente, cabe destacar que à relação do feito incide a responsabilidade de natureza subjetiva, regulada pelo Código Civil, insculpida no art. 927, que dispõe que Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.

O art. 186 do CC traz a definição de ato ilícito, dispondo:

Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Assim, sendo a responsabilidade civil aqui de ordem subjetiva, deve ser analisada a conduta, o dano e o nexo de causalidade para a configuração do dever de indenizar.

Sobre a matéria, cito a doutrina de Rui Stoco:

Importante observar que o art. 927, caput, tem estreita e umbilical relação com o art. 186, constituindo consectário lógico deste. Primeiro o art. 186 definiu o que seja ato ilícito. Em seguida, estabeleceu-se o nascimento da obrigação de indenizar, que ocorrerá quando o agente praticar um ato ilícito definido no referido art. 186 e dessa prática resultar dano a outrem.

É que, segundo a doutrina e jurisprudência pacíficas, não basta o ato ilícito. Dele deve decorrer um dano, seja de ordem material, como moral.

Mas nessa obrigação deve ter como antecedente os pressupostos fundamentais da responsabilidade civil, ou seja, os elementos formadores daquela obrigação: um comportamento (ação ou omissão) do agente, o elemento subjetivo (dolo ou culpa), o nexo de causalidade entre a conduta e o resultado e a ocorrência de um dano efetivo, seja de ordem patrimonial ou extrapatrimonial (moral).1

Soma-se a isso a previsão na Constituição da República, em seu art. 5º, inciso X, quanto à proteção à honra e à imagem das pessoas, assegurando inclusive o direito à reparação na hipótese de dano moral decorrente da violação de tais direitos.

No caso dos autos, verifica-se dos documentos constantes de Evento 1, OUT3-OUT10 que o réu ofendeu o autor por meio de grupos em comum no aplicativo Whatsapp. Em que pese o autor sustente que tais ofensas se deram em decorrência do ajuizamento de reclamatória trabalhista, os elementos apontam para o fato de que o agir do réu se deu em virtude de suposta conduta inadequada do autor em relação à aluna de academia em que era professor.

Depreende-se da leitura das mensagens eletrônicas que o réu ameaçou agredir fisicamente o autor com uma corda, assim como proferiu ofensas como "molestador", "covarde" e "arrombado". Ainda, questionou o autor publicamente a respeito de suposto incidente havido com a aluna, sem embasar suas alegações em qualquer prova.

Da mesma forma, em sede de defesa o réu limitou-se a alegar que as afirmações do autor eram inverídicas e que esse apresentava conduta duvidosa, entretanto não há qualquer documento ou prova produzida a esse respeito, ônus que lhe incumbia, a teor do disposto no art. 373, inciso II, do Código de Processo Civil.

Nesse tocante, valho-me das considerações tecidas pelo Magistrado na origem:

Na causa em exame, restou comprovado o agir culposo do demandando porque não há nenhuma controvérsia entre os litigantes quanto ao fato de o demandado ter atribuído ao autor termos ofensivos e atitudes injuriosas em meios digitais, especificamente através de redes sociais, sendo que o afirmado pelo réu extrapola o direito de crítica e livre manifestação do pensamento, assegurados pelo artigo 5º, inciso IV, da Constituição Federal, eis o nítido propósito de atingir a honra do demandante na condição de professor e instrutor de artes marciais.

Não obstante o réu possuir o dever de zelar pela boa imagem comercial da empresa e dos profissionais com exercício de atividade laboral nas academias, a atividade comportamental que levou a efeito foi excessiva na defesa de seus interesses profissionais culminou por atingir a honra do autor, especificamente no momento em que foram veiculadas nas redes sociais ofensas caluniosas e injuriosas à pessoa do demandante .

E releva destacar que o demandado admitiu, em seu depoimento pessoal, ter havido excesso na sua conduta em relação ao demandante, quando afirma:

J. "O que o senhor falou, o senhor acha que é correto?"

R. "Não, acho que errei. Estou arrependido, mas o que foi falado era verídico na minha cabeça."

Assim sendo, da análise dos documentos acostados aos autos entendo que restou comprovada a ofensa à honra e à imagem do autor por parte do réu, razão pela qual a sentença não merece reparo no ponto.

No que tange ao valor da indenização por danos morais, tem-se que o seu arbitramento deverá levar em conta os problemas causados à vítima, bem como a capacidade econômica da parte ré, não podendo a indenização caracterizar nem enriquecimento sem causa ao autor da ação, nem se mostrar irrisório em virtude da capacidade econômica do autor do ato danoso.

Desse modo, levando em consideração as particularidades do caso concreto, bem como os parâmetros utilizados por este Tribunal em casos análogos, entendo que o valor fixado na origem - R$ 10.000,00 (dez mil reais) - comporta minoração, considerados os parâmetros adotados por esta Câmara em casos análogos:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER. PUBLICAÇÃO EM REDE SOCIAL - FACEBOOK. OFENSA À HONRA. DIFAMAÇÃO E INJÚRIA. AFRONTA AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. DANO MORAL IN RE IPSA. 1.A inconformidade recursal refere-se ao cabimento de indenização por danos morais, referente alegado ato ilícito envolvendo ofensa à honra da parte autora por publicação realizada em rede social. 2.Mostram-se aplicáveis as disposições contidas nos artigos 186 e 927, do Código Civil, no sentido de que, para se configurar o dever de indenizar, devem ser observados os pressupostos legais, quais sejam: a ação do agente, o resultado lesivo e o nexo causal entre o ato danoso e o resultado. 3.Caso dos...

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