Acórdão nº 50388821520228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Cível, 01-02-2023

Data de Julgamento01 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50388821520228210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003226586
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5038882-15.2022.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias

RELATOR: Desembargador IRINEU MARIANI

APELANTE: DELL COMPUTADORES DO BRASIL LTDA. (IMPETRANTE)

APELANTE: DELL COMPUTADORES DO BRASIL LTDA (IMPETRANTE)

APELANTE: DELL COMPUTADORES DO BRASIL LTDA (IMPETRANTE)

APELANTE: DELL COMPUTADORES DO BRASIL LTDA (IMPETRANTE)

APELANTE: DELL COMPUTADORES DO BRASIL LTDA (IMPETRANTE)

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (INTERESSADO)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação e de recurso adesivo em face da sentença do Juízo da 6ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre que julgou extinto, sem julgamento do mérito, em relação à filial sediada no Estado do Rio Grande do Sul, por ilegitimidade ativa e ausência de interesse processual, mandado de segurança impetrado por DELL - COMPUTADORES DO BRASIL LTDA, matriz e filiais, contra o SUBSECRETÁRIO DA RECEITA ESTADUAL, objetivando o reconhecimento da inexigibilidade da cobrança do diferencial de alíquota - DIFAL, instituído pela LC 190/2022, durante o exercício financeiro de 2022, em razão do dever de observância da anterioridade tributária (art. 150, III, da Constituição Federal), denegando a segurança em relação às demais impetrantes. Custas pelas impetrantes. Sem honorários. Os depósitos judiciais estão autorizados até o trãnsito em julgado (Evento 86, origem).

Nas razões (Evento 102, origem), as impetrantes alegam que o STF, ao modular os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, decidiu que: o Convênio nº 93/2015 e as leis estaduais e distrital com base nele editadas, em que pese inconstitucionais e nulas (logo, inválidas), produziram efeitos para permitir a cobrança de ICMS até 2021, para aqueles que não ingressaram em juízo para discutir o DIFAL da EC 87/2015 até o dia 24-2-21. A partir de 2022, tanto o Convênio nº 93/2015 quanto as leis estaduais e distrital, além de inconstitucionais, deixaram de produzir efeitos. A Lei 14.804/2015 nunca mais poderá servir para viabilizar a exigência do DIFAL, uma vez que, a partir de 2022, o STF já a considerou não só uma lei inválida, por inconstitucional, como também absolutamente ineficaz. O julgamento do STF no Tema 1093 da repercussão geral fixou o entendimento de que é inconstitucional lei estadual ou distrital editada anteriormente à Lei Complementar trazendo as normas gerais sobre o DIFAL da EC 87/2015. O DIFAL não pode ser exigido sem que a LC 190/22 obedeça à anteriordade nonagesilmal e de exercício.

O Estado, por sua vez, em recurso adesivo, alega que não pode, com a denegação da segurança, ser mantida a autorização para realização dos depósitos judiciais, por força do art. 309, caput e inciso III do CPC, e art. 7º, § 3º, da Lei 12.016/09. O direito ao depósito judicial não é absoluto. Autorizar a feitura de sucessivos depósitos (sem a previsão a curto ou a médio prazo de termo final para a autorização) acaba por trazer diversos transtornos para a Administração tributária. Tais embaraços decorrem, em especial, da dificuldade do Fisco em controlar se os valores depositados judicialmente estão corretos tanto no que diz respeito ao quantum, bem como no que concerne à pontualidade (Evento 110, origem).

Recursos respondidos (Eventos 108 e 123).

O MP opina pelo desprovimento da apelação da impetrante e provimento do recurso adesivo do Estado (Evento 7).

É o relatório.

VOTO

Há dois recursos: apelação da impetrante, e recurso adesivo do Estado, os quais analiso individualmente, conforme segue.

1. APELAÇÃO. Embora amiúde seja utilizada a expressão “princípio nonagesimal”, com a devida vênia, melhor é dizer princípio da noventena, isto é, dos noventa dias (CF, art. 150, III, alínea c), pois antes dele não existem oitenta e nove.

No mais, sabidamente, a EC 87/2015 decorreu da proliferação do comércio eletrônico, tornando necessário modificar a redação do inciso VII do § 2º do art. 155 da CF, que passou a dizer: nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual.

O STF deliberou no RE 1287019, em repercussão geral – TEMA 1093 – e ADI 5469, restando firmada a tese de que A cobrança do diferencial de alíquota alusiva ao ICMS, conforme introduzido pela Emenda EC 87/2015, pressupõe a edição de lei complementar veiculando normas gerais.

Observe-se: lei complementar veiculando normas gerais, portanto lei federal.

Na modulação dos efeitos, postergou-os para o exercício financeiro seguinte ao do julgamento – isto é, para 1º-1-2022 –, "ressalvadas as ações judiciais em curso", vale dizer, 24-2-2021.

À sua vez, a lei complementar federal veiculando normas gerais a respeito do Diferencial de Alíquota – DIFAL veio com a LC 190, de 4-1-2022, e aí as dúvidas: se (a) incide apenas o princípio da noventena, como previsto no art. 3º, pelo qual é vedado cobrar tributos antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o dispositivo na alínea ‘b’ (CF, art. 150, III, alínea c); ou se (b) incide também o princípio da anterioridade ou da anualidade, qual seja de que é vedado cobrar tributo no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou (CF, art. 150, III, alínea b).

Dito isso, evidencio três capítulos.

1.1 - PERÍODO ANTERIOR E POSTERIOR À EC 87/2015. Antes, todo o ICMS sobre as operações interestaduais a compradores/consumidores finais não contribuintes ficava no Estado de origem; depois, passou a vigorar partilha, assim como em relação às operações a compradores contribuintes: parte ao Estado de origem (= maior, alíquota interestadual) e parte ao de destino (= menor, alíquota estadual, isto é, diferença entre uma e outra).

A EC 87/2015 também instituiu período de transição, a fim de os Estados adaptarem seus orçamentos, dizendo no art. 99 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT.

Portanto, a EC 87 não modificou o fato gerador, nem a base de cálculo, nem adentrou em matéria típica de lei complementar (CF, art. 146), mas apenas instituiu a partilha do imposto, como chegou a dizer o art. 99 do ADCT, relativamente às operações interestaduais a compradores não contribuintes, dispensando-lhes o mesmo tratamento que até então vigorava aos compradores contribuintes.

Noutras palavras: os compradores não contribuintes com a instituição da partilha não passaram a pagar mais. Pagavam “X” ao Estado de origem, e com a partilha continuaram a pagar “X”, com a diferença de que esse “X” passou a ser dividido entre os Estados de origem de destino, assim como – repito – vigorava aos compradores contribuintes.

Vista assim a questão, não houve aumento de ICMS, e muito menos se pode falar em instituição de novo tributo; logo, também não incide o princípio da anterioridade ou da anualidade; e, a rigor, também não o da noventena, mas este foi estabelecido pelo art. 3º da LC 190, de 4-1-2022.

1.2 - ADVENTO DA LC 190/2022 E OS PRINCÍPIOS DA ANTERIORIDADE E DA NOVENTENA. A esse respeito, ingressaram no STF quatro ADIs, sendo a primeira a de nº 7066, da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos – ABIMAQ, na qual o Relator, Min. Alexandre de Moraes, em 17-5-2022, proferiu decisão indeferindo a medida liminar em todas as ações.

Peço vênia para, no quanto interessa, reproduzi-la:

Na presente hipótese, ainda em sede de cognição sumária, fundada em mero juízo de probabilidade, entendo AUSENTES os requisitos necessários para a concessão da medida liminar pleiteada por todos os Requerentes.

A CORTE apreciou matéria relacionada à instituição do diferencial de alíquota de ICMS no julgamento do RE 1.287.019-RG, Relator para acórdão o Ministro DIAS TOFFOLI, julgado sob o rito da repercussão geral (Tema 1093), fixou tese no sentido de que: ‘A cobrança do diferencial de alíquota alusivo ao ICMS, conforme introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/2015, pressupõe edição de lei complementar veiculando normas gerais.’

(...).

A Requerente ABIMAQ invoca esse precedente para defender que a mesma premissa – de que a “novidade” operada pela EC 87/2015 caracterizaria relação nova, a ser regulada por lei complementar – imporia a aplicação da regra constitucional que limita a eficácia de toda instituição ou majoração de tributos ao exercício financeiro seguinte.

O efeito pretendido pela Requerente é diverso daquele apreciado pelo Plenário no mencionado julgamento, considerando, sobretudo, a singularidade da sucessão normativa que tratou das alterações do ICMS em operações interestaduais.

Naquela oportunidade, observei que a situação atinente ao diferencial de alíquotas sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, na previsão do art. 155, II, e também do § 2º, VII e VIII, da CF, com a redação da EC 87/2015, reclamava uma rigorosa comparação com o regime anterior a essa Emenda Constitucional, no qual, para as hipóteses em que o consumidor destinatário final fosse contribuinte do ICMS, já era adotada a alíquota interestadual, cabendo ao Estado de localização do destinatário o montante referente ao diferencial de alíquotas (diferença entre a alíquota interna e a interestadual).

Ou seja, já existia essa destinação de receita, recolhido mediante a cobrança do diferencial, em razão do que não se pode afirmar ter surgido uma inovação com a Emenda Constitucional.

Antes da EC 87/2015, a Constituição...

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