Acórdão nº 50401003320228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quinta Câmara Cível, 31-05-2022

Data de Julgamento31 Maio 2022
ÓrgãoVigésima Quinta Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50401003320228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002063500
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

25ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5040100-33.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Educação Básica

RELATOR: Desembargador LEO ROMI PILAU JUNIOR

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto pela parte demandante contra a decisão do julgador a quo que deferiu parcialmente a tutela de urgência.

Em suas razões a parte agravante defende, em suma, que comporta reforma a decisão recorrida, para o fim de conceder à infante a vaga em turno integral. Tece considerações a respeito do núcleo familiar e da legislação aplicável à matéria e, ao fim, pleiteia o deferimento de liminar. No mérito pede o provimento.

Foi concedida a medida liminar (evento 4, DESPADEC1).

Intimada, a parte agravada apresentou contrarrazões (evento 13, CONTRAZ1).

Sobreveio parecer do Ministério Público no sentido do desprovimento do recurso (evento 16, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e passo a analisá-lo, observando que a fundamentação se dirige a este momento processual de cognição sumária, ressalvada, portanto, eventual reanálise da matéria em face do surgimento de novos elementos.

No que tange à concessão da tutela de urgência, giza-se que a discricionariedade do juiz em antecipar a tutela jurisdicional deve preceder de análise criteriosa do pedido, conforme dispõe a regra do art. 300 do CPC:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§ 1° Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

§ 2° A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.

§ 3° A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

Da leitura do dispositivo, extrai-se que a tutela poderá ser concedida mediante os seguintes requisitos: a probabilidade do direito – em analogia ao fumus boni iuris, de forma a convencer o juiz das alegações e o fundado perigo de dano (periculum in mora) ou de resultado útil ao processo.

No entendimento de Cássio Scarpinella Bueno1:

"A concessão da “tutela de urgência” pressupõe: (a) probabilidade do direito; e (b) perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (art. 300, caput). São expressões redacionais do que é amplamente consagrado nas expressões latinas fumus boni iuris e periculum in mora, respectivamente."

Ainda, na visão de Fredie Didier Júnior2:

A tutela provisória de urgência pode ser cautelar ou satisfativa (antecipada).

"Em ambos os casos, a sua concessão pressupõe, genericamente, a demonstração da probabilidade do direito (tradicionalmente conhecida como ‘’fumus boni iuris’’)e , junto a isso, a demonstração do perigo de dano ou de ilícito , ou ainda do comprometimento da utilidade do resultado final que a demora do processo representa(tradicionalmente conhecido como ‘’periculum in mora’’)(art. 300, CPC)

Percebe-se, assim, que a ‘’redação do art. 300, caput, superou a distinção entre os requisitos da concessão para a tutela cautelar e para a tutela satisfativa de urgência, erigindo a probabilidade e o perigo na demora a requisitos comuns para a prestação de ambas as tutelas de forma antecipada’’ (enunciado n.143 do Fórum Permanente de Processualistas Civis)

A lei exige a conjugação desses dois pressupostos. A prática, porém, revela que a concessão para a tutela provisória não costuma obedecer rigorosamente essa exigência. Há situações em que juízes concedem a tutela provisória em razão da extrema urgência, relegando um tanto a probabilidade; e vice-versa. ‘’No dia a dia do foro, quanto mais ‘denso’ é o fumus boni iuris, com menor rigor se exige o periculum in mora; por outro lado, quanto mais ‘denso’ é o periculum in mora exige-se com menor rigor o fumus boni iuris’’. Eduardo José da Fonseca Costa, em trabalho importantíssimo de pragmática processual demonstra que o ‘’Direito vivo’’ aceita várias combinações entre probabilidade e perigo, para fim de concessão da tutela provisória. O autor demonstra que, na prática, os juízes se valem de um raciocínio tipológico, ‘’o fumus boni iuris e o periculum in mora são vistos como pautas ‘moveis’, que podem se apresentar em graus ou níveis distintos e que, por isso, não são suscetíveis de fixação em termos genéricos(...)Conseguintemente, para conceder-se a liminar, não há necessidade da presença simultânea dos dois pressupostos. Entre eles há uma espécie de permutabilidade livre. Se o caso concreto desviar-se do ‘tipo normal’ e somente um dos pressupostos estiver presente em ‘peso decisivo’ mesmo assim será possível conceder-se a medida, embora por força de uma ‘configuração atípica’ ou ‘menos típica’, que se afasta do modelo descrito na lei. Tudo se passa como se, nos processos concretos de concessão de tutelas liminares, o fumus boni iuris e o periculum in mora fossem ‘elementos’ ou ‘forças que se articulam de forma variável, sem absolutismo e fixidez dimensional’’

A tese é muito interessante e de difícil refutação. A análise pormenorizada dela desborda dos limites deste Curso. O registro dela é, no entanto, indispensável.

A tutela provisória de urgência satisfativa (ou antecipada) exige também o preenchimento de pressuposto específico, consistente na reversibilidade dos efeitos da decisão antecipatória (art 300, §3, CPC), como adiante se abordará

A tutela provisória de urgência pode ser requerida e concedida em caráter incidental ou antecedente.

A tutela provisória de urgência incidental se processa de acordo com as regras gerais vistas no item anterior. Já a tutela provisória de urgência antecedente segue regras especificas, que exigem análise própria e apartada a ser realizada em itens seguintes."

Como cediço, a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional somente se justifica quando as alegações acerca do direito reclamado estejam efetivamente comprovadas e revestidas da verossimilhança inequívoca.

Em um juízo de cognição sumária, ressalvo, ilustrativamente, neste primeiro momento, que, em diversas leis federais, o Legislador impôs ao Ente Público demandado o dever de fomentar a educação. Nesse passo, acosto inicialmente o que nos diz a Carta Magna de 1988 no tocante à temática ora abordada:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

(...)

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria;

II - progressiva universalização do ensino médio gratuito;

III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade;

V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;

VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;

VII - atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didáticoescolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.

§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.

§ 2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.

§ 3º Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela freqüência à escola.

Adentrando na matéria, mais precisamente no que diz respeito às Crianças e aos Adolescentes, considerando sua natureza vulnerável (nos moldes do que diz ao artigo 227 da CF/88), há grande leque de leis garantindo direitos e impondo deveres ao ente público no que diz respeito à educação. Sobre esse tópico3:

“Fundamento constitucional: preceitua o art. 227 da Constituição Federal: “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. ” Neste dispositivo faz-se a concentração dos principais e essenciais direitos da pessoa humana, embora voltados, especificamente, à criança e ao adolescente. Evidencia-se o comando da absoluta prioridade, que alguns preferem denominar como princípio. Parece-nos, entretanto, um determinismo constitucional, priorizando, em qualquer cenário, a criança e o adolescente. Sob outro prisma, cria-se a imunidade do infante acerca de atos prejudiciais ao ideal desenvolvimento do ser humano em tenra idade. É a proteção integral voltada à negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

Dando prosseguimento, como antes referido, em face da natureza peculiar das Crianças e dos Adolescentes, houve grande preocupação em resguardar os seus direitos....

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