Acórdão nº 50411742520228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 20-06-2022

Data de Julgamento20 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo50411742520228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002222651
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5041174-25.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATORA: Desembargadora ROSAURA MARQUES BORBA

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo em execução interposto pelo Ministério Público, em face de decisão proferida pelo 1º Juizado da 1ª Vara de Execução Criminal da Comarca de Porto Alegre, que afastou a hediondez da condenação pela prática do delito de tráfico de drogas, do apenado ANDERSON RENATO CARVALHO MARTINS, determinando a consequente retificação do RSPE (evento 3, AGRAVO1, fls. 73-80).

Em suas razões (evento 3, AGRAVO1, fls. 123-140), requer a cassação da decisão hostilizada, sendo novamente reconhecido o caráter hediondo do delito de tráfico de entorpecentes, operando-se as devidas correções no RSPE do reeducando.

A defesa ofereceu contrarrazões (evento 3, AGRAVO1, fls. 161-164).

Nesta instância, em parecer, a Dr.ª Luciana Maria Ribeiro Alice, Procuradora de Justiça, opinou pelo conhecimento e provimento do agravo em execução (evento 8, PARECER1).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Cuida-se de agravo em execução interposto pelo Ministério Público, inconformado com decisão proferida pelo 1º Juizado da 1ª Vara de Execução Criminal da Comarca de Porto Alegre, que afastou a hediondez da condenação pela prática do delito de tráfico de drogas, do apenado ANDERSON RENATO CARVALHO MARTINS, determinando a consequente retificação do RSPE.

Ausentes questões preliminares, passo à análise do mérito.

O agravante requer a reforma da decisão hostilizada, para que seja restabelecido o reconhecimento da hediondez do delito do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06.

Pois bem.

Anteriormente à vigência da Lei n. 13.964/19, o art. 2º, §2º, da Lei n. 8.072/90, vigorava com a seguinte redação:

Art. 2º Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de:

I - anistia, graça e indulto;

II - fiança.

§ 2º: A progressão de regime, no caso dos condenados pelos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente, observado o disposto nos §§ 3º e 4º do art. 112 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal).

Consequentemente, era atribuída equiparação a hediondez o delito de tráfico ilícito de drogas.

Com a vigência do chamado "Pacote Anticrime", revogou-se o § 2º do art. 2º da Lei nº 8.072, suprimindo a menção a delitos dessa espécie. Entretanto, as alterações instituídas pela nova lei de modo algum tem como consequência o afastamento da hediondez do delito.

A Constituição Federal claramente determina em seu art. 5º, inciso XLIII, que delitos de tráfico de drogas deverão receber tratamento diferenciado, tendo em vista a alta reprovabilidade da conduta do agente:

A lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.

Se a reforma da lei tivesse realmente afastado tal interpretação, o legislador não incluiria o parágrafo 5º, no art. 112 que ressalva especificamente a figura do tráfico privilegiado, in verbis:

Art. 112. (...)

§ 5º Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006. – grifei.

Nessa senda, precedentes desta e. Corte:

HABEAS COUS. LIVRAMENTO CONDICIONAL. EXCESSO DE PRAZO NA APRECIAÇÃO DE PEDIDO DEFENSIVO. INOCORRÊNCIA. TRÁFICO DE DROGAS PRIVILEGIADO. HEDIONDEZ AFASTADA. GUIA DE EXECUÇÃO. RETIFICAÇÃO. EXCESSO DE PRAZO NA APRECIAÇÃO DE PEDIDO DE LIVRAMENTO CONDICIONAL. AUSÊNCIA DE DESÍDIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO. Os prazos previstos na legislação processual penal são de natureza imprópria, devendo ser utilizados unicamente como parâmetros para auxiliar no adequado andamento do feito. Não verificada mora do Juízo da Execução na apreciação do pedido de livramento condicional formulado em favor do paciente, a ensejar o alegado constrangimento ilegal, conforme se depreende dos atos praticados e da distância temporal entre eles. Eventual elastecimento do trâmite processual se deu em razão da instabilidade do sistema eletrônico, demandando que a Guia de Execução fosse alterada manualmente. CONDENAÇÃO COMO INCURSO NAS SANÇÕES DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/2006. DELITO NÃO EQUIPARADO A HEDIONDO. A partir do julgamento do Habeas Corpus nº 118.533/MS, pelo Supremo Tribunal Federal, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça readequou seu posicionamento e cancelou o enunciado da Súmula nº 512, passando a adotar a tese de que “o tráfico ilícito de drogas na sua forma privilegiada (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006) não é crime equiparado a hediondo” (Tema nº 600). Em concreto, a Guia de Execução do paciente foi alterada erroneamente, constando como delito hediondo a condenação pelo crime de tráfico de drogas privilegiado. Assim, vai concedida, de ofício, a ordem de habeas corpus, para afastar a hediondez do tráfico de drogas privilegiado, pelo qual condenado o paciente, e para determinar a retificação da Guia de Execução, devendo a autoridade coatora reapreciar o pedido de livramento condicional. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.(Habeas Corpus Criminal, Nº 70085404200, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Viviane de Faria Miranda, Julgado em: 26-11-2021) - grifei.

AGRAVO EM EXECUÇÃO. PROGRESSÃO DE REGIME. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PACOTE ANTICRIME QUE AFASTOU A HEDIONDEZ DO TRÁFICO PRIVILEGIADO DO §4º DO ART. 33 DA LEI DE DROGAS, MAS MANTEVE HEDIONDEZ DO TRÁFICO DO CAPUT DO ART. 33, DELITO PELO QUAL CUMPRE PENA O APENADO. MANUTENÇÃO DECISÃO RECORRIDA. AGRAVO DESPROVIDO. UNÂNIME.(Agravo de Execução Penal, Nº 51979465020218217000, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Mello Guimarães, Julgado em: 22-11-2021) - grifei.

APELAÇÃO CRIME. TRÁFICO DE DROGAS. SENTENÇA CONDENATÓRIA. IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. 1. TRÁFICO DE DROGAS. SOLUÇÃO CONDENATÓRIA. MANUTENÇÃO. (...) 5. AFASTAMENTO DA NATUREZA HEDIONDA DO CRIME DE TRÁFICO PRIVILEGIADO. As cortes superiores, já firmaram entendimento no sentindo de que somente a modalidade do tráfico previsto no artigo 33, caput e parágrafo 1º da Lei 11.343/06, possuem caráter hediondo. Afastada, portanto, a hediondez do crime de tráfico privilegiado. 6. PREQUESTIONAMENTO. O julgador não está obrigado à análise de cada um dos dispositivos de lei federal e da Constituição Federal destacados pelas partes, bastando que fundamente a sua decisão acerca dos questionamentos postos a julgamento na legislação que entende pertinente ao caso. RECURSO DEFENSIVO PARCIALMENTE PROVIDO, POR MAIORIA.(Apelação Criminal, Nº 70085124337, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Viviane de Faria Miranda, Julgado em: 29-10-2021) - grifei.

Ademais, o posicionamento se coaduna ao entendimento exarado em julgados recentes do e. Superior Tribunal de Justiça, no sentido de manter a equiparação à hediondez do delito do art. 33, caput, da Lei de Drogas:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS COUS. EXECUÇÃO PENAL. NATUREZA DO DELITO DE TRÁFICO DE DROGAS. LEI N. 13.964/2019. EQUIPARAÇÃO A DELITOS HEDIONDOS. MAIOR GRAVIDADE APONTADA PELA PRÓPRIA...

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