Acórdão nº 50439464020218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 08-02-2023

Data de Julgamento08 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50439464020218210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003234165
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5043946-40.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Concurso

RELATORA: Desembargadora LAURA LOUZADA JACCOTTET

APELANTE: COMPANHIA RIOGRANDENSE DE SANEAMENTO CORSAN (AUTOR)

APELADO: AVANEX INDUSTRIA E COMERCIO LTDA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto pela COMPANHIA RIOGRANDENSE DE SANEAMENTO CORSAN, nos autos da ação que move contra AVANEX INDUSTRIA E COMERCIO LTDA, em face da sentença (evento 29, SENT1) que julgou extinto o processo, pela prescrição, conforme o seguinte dispositivo:

III. Isto posto, JULGO EXTINTO o processo, pela prescrição, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso II, do Código de Processo Civil.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono da autora, que fixo em 10% sobre o valor da causa, levando em conta a natureza da causa e o trabalho realizado, nos termos do art. 85, §2º do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Em caso de interposição de recurso por qualquer dos litigantes, intime-se a parte adversa para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal. Após, proceda-se à remessa dos autos ao Tribunal competente para apreciação.

Na hipótese, se a Serventia observar eventual alegação de preliminar em contrarrazões, deverá ser intimada a parte apelante para, querendo, se manifestar no prazo de 15 (quinze) dias, observado o disposto pelo art. 1.009, §2º, do CPC.

Com o trânsito em julgado, e nada sendo requerido, arquivem-se os autos com baixa na distribuição.

Em sua razões (evento 34, APELAÇÃO1), defende a aplicação do prazo prescricional de dez anos, na medida em que a relação estabelecida entre as partes está fundada em contrato administrativo, precedido da devida licitação. Assim, entende cuidar-se de instrumento público firmado entre as partes, o que atrai a incidência do art. 205 do Código Civil. No mais, aduz que ao deixar de incluir o diferencial de alíquota no seu preço, a parte recorrida o fez por mera liberalidade. A sua omissão, nesse passo, não representa o afastamento daquela regra do edital, nem a assunção da responsabilidade do pagamento do diferencial de alíquota pela CORSAN. Sustenta que sofreu prejuízo, pois arcou com um custo da contratada que, além de não estar contabilizado na proposta, era de sua responsabilidade por expressa disposição do edital, o qual restou demonstrado através das notas fiscais juntadas, razão pela qual a sentença merece reforma também quanto ao tópico. Pede o provimento do recurso para julgar procedente o pedido.

Apresentadas contrarrazões (evento 38, CONTRAZAP1), subiram os autos a esta Instância, oportunidade em que o Ministério Público declinou da intervenção (evento 9, PARECER1).

Após, voltaram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade, e passo ao seu exame.

A CORSAN ajuizou a presente ação contra AVANEX INDUSTRIA E COMERCIO LTDA, aduzindo que as partes firmaram contratos administrativos que tinham como objeto o fornecimento de bens para infraestrutura da prestação dos serviços de abastecimento de água e/ou esgoto sanitário. Alega que os licitantes, quando da formulação de suas propostas, deveriam considerar todos os custos existentes. Ademais, quando domiciliados em outro Estado da Federação (como a parte ré), tinham o dever de computar o diferencial de alíquotas de ICMS incidente da operação. Assim, restou estabelecido que, na hipótese de operações interestaduais, nenhum pagamento seria realizado ao fornecedor, a título de diferencial de alíquotas de ICMS, se essa rubrica não estivesse incluída na formação do seu preço. Afirma que a ré não atentou para essa regra do edital quando da formulação de suas propostas nas licitações em que se sagrou vencedora. E, disso, decorreram prejuízos à CORSAN, que efetuou os pagamentos diretamente ao Fisco, deixando de efetuar a glosa proporcional quando do pagamento das notas fiscais apresentadas pela parte ré. Assim, postulou a procedência dos pedidos, a fim de condenar a ré ao pagamento dos valores que lhe foram vertidos indevidamente, equivalente ao diferencial de alíquota de ICMS incidente nas operações de fornecimento de bens à parte autora.

Após regular trâmite do feito, sobreveio a sentença em axame, que julgou extinta a ação pela prescrição.

Irresignada, a Companhia interpôs o presente recurso, defendendo a aplicação da prescrição decenal disposta no art. 205, caput, do Código Civil.

Pois bem.

Do compulsar do caderno processual, verifica-se que a CORSAN busca o ressarcimento dos valores pagos a título de diferencial de alíquota de ICMS incidente sobre operações de fornecimento de bens.

Conforme restou estabelecido no Edital de Pregão Eletrônico nº 288/2013, na cláusula 5.3.1 "A CORSAN não efetuará o pagamento de qualquer valor referente à diferença entre as alíquotas interna e interestaduais que não sejam incluídas nos lances ofertados pelos licitantes" (evento 18, EDITAL3).

Logo, a questão tratada nos autos não envolve prestação do serviço de água, razão pela qual não se há falar em prescrição decenal.

Ainda, por ser a CORSAN uma sociedade de economia mista, não se submete ao prazo prescricional quinquenal, previsto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32, aplicável à Fazenda Pública, mas sim, às normas previstas no Código Civil.

A propósito, precedentes do Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ORDINÁRIA PROPOSTA EM DESFAVOR DE SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL. ART. 206, § 3º, IV, DO CÓDIGO CIVIL. ALEGADA APLICAÇÃO, AO CASO, DO PRAZO DECENAL, PREVISTO NO ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL. TESE RECURSAL NÃO PREQUESTIONADA. SÚMULA 211 DO STJ. AGRAVO IMPROVIDO.
I. Agravo interno aviado contra decisão que julgara recurso interposto contra decisum publicado na vigência do CPC/2015.

II. Trata-se, na origem, Ação Ordinária, proposta por Paez de Lima Construções Comércio e Empreendimentos Ltda contra a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo - CDHU, objetivando a condenação da ré ao pagamento de indenização pelos prejuízos decorrentes do descumprimento e da modificação das condições previstas no contrato administrativo celebrado entre as partes. Julgado improcedente o pedido, foi interposta Apelação, pela parte autora. O Tribunal de origem, contudo, acolheu a preliminar de prescrição arguida pela apelada, porquanto o prazo prescricional contra sociedade de economia mista é de 3 anos, previsto no art.
206, § 3º, V do Código Civil.

III. Por simples cotejo das razões recursais e dos fundamentos do acórdão recorrido, percebe-se que a tese recursal de que o prazo decenal, previsto no art. 205 do Código Civil, seria aplicável à espécie, por se tratar de responsabilidade civil contratual, não foi apreciada, no voto condutor, não tendo servido de fundamento à conclusão adotada pelo Tribunal de origem, incidindo o óbice da Súmula 211/STJ.
IV. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, "a admissão de prequestionamento ficto (art. 1.025 do CPC/15), em recurso especial, exige que no mesmo recurso seja indicada violação ao art. 1.022 do CPC/15, para que se possibilite ao Órgão julgador verificar a existência do vício inquinado ao acórdão, que uma vez constatado, poderá dar ensejo à supressão de grau facultada pelo dispositivo de lei" (STJ, REsp 1.639.314/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe de 10/04/2017). Hipótese em julgamento na qual a parte recorrente não indicou, nas razões do apelo nobre, contrariedade ao art. 1.022 do CPC/2015.
V. Ainda que se reconhecesse o prequestionamento implícito, como defende a parte agravante, o acórdão recorrido encontra-se em conformidade com o entendimento do STJ, que, em caso análogo, assentou que
"as ações movidas contra as sociedades de economia mista não se sujeitam ao prazo prescricional previsto no Decreto-Lei 20.910/1932, porquanto possuem personalidade jurídica de direito privado, estando submetidas às normas do Código Civil. Assim, aplica-se o art. 206, § 3º, IV, do Código Civil de 2002, que estipula o prazo prescricional de três anos para as ações de ressarcimento por enriquecimento sem causa" (STJ, REsp 1.814.089/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 01/07/2019).
VI. Agravo interno improvido.
(AgInt no AREsp 1795172/SP, Rel.
Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/05/2021, DJe 27/05/2021) (grifei)

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. VALORAÇÃO JURÍDICA DOS FATOS. NÃO INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO STJ. PRAZO PRESCRICIONAL. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. APLICAÇÃO DAS NORMAS DE DIREITO CIVIL. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.
I - Na origem, trata-se de agravo de instrumento contra decisão que, em ação indenizatória, reconheceu a prescrição trienal de parte dos valores cobrados.
No Tribunal a quo, foi dado provimento ao agravo para que fosse aplicada a prescrição quinquenal. Esta Corte deu provimento ao recurso especial.
II - A revaloração jurídica dos fatos não implica a incidência do óbice da Súmula n. 7 do STJ, quando a análise do recurso especial é baseada nas premissas estabelecidas pelas instâncias ordinárias.

Assim, não se verifica a incidência da referida súmula no presente caso.

III - No que trata da alegação de violação do 206, § 3º, IV, do Código Civil, com razão o Metrô, uma vez que a orientação desta Corte Superior encontra-se sedimentada no sentido de que as sociedades de economia mista possuem personalidade jurídica de direito privado, de modo que as ações movidas contra elas se sujeitam às regras constantes do Código Civil, e não às previstas no Decreto n.
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