Acórdão nº 50450766520218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 26-04-2022

Data de Julgamento26 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50450766520218210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001970830
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5045076-65.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Práticas Abusivas

RELATOR: Desembargador HELENO TREGNAGO SARAIVA

APELANTE: NADIR DE FATIMA MELLO MORAES (AUTOR)

APELANTE: BANCO PAN S.A. (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

BANCO PAN S/A e NADIR DE FATIMA MELLO MORAES interpuseram recursos de apelação em face da sentença proferida na ação movida pela segunda contra o primeiro, nos seguintes termos:

Ante o exposto, nos moldes do art. 487, I, do Código de Processo Civil, resolvendo o mérito da lide, JULGO PROCEDENTE a presente Ação Declaratória ajuizada por NADIR DE FATIMA MELLO MORAES contra BANCO PANAMERICANO S/A, para:

(a) converter o Contrato de Reserva de Margem Consignável para Empréstimo Consignado Comum, devendo ser observada a taxa de juros remuneratórios, à época da contratação, para esta modalidade, com a exclusão do nome da parte demandante dos cadastros negativos de crédito;

(b) autorizar eventual repetição de indébito, na forma simples, caso verificado saldo em prol do Autor após a revisão do débito, o que deverá ser acrescido de correção monetária pelo IGP-M desde cada pagamento a maior, assim como de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação.

(c) condenar o Réu ao pagamento de indenização por danos morais de R$ 3.000,00, a ser corrigido monetariamente desde a presente data e acrescido de juros de mora de 1 % ao mês desde a citação.

Condeno o Réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em favor do procurador do Autor, os quais fixo em 10 % sobre o valor atualizado da causa, conforme determina o art. 85, § 2°, do CPC.

O réu apelante sustenta que comprovou a contratação de cartão de crédito consignado realizada pela parte autora junto ao banco, em conformidade com a legislação vigente ao tempo da contratação. Ressalta que a juntada do contrato assinado nos autos é prova cabal de que a parte autora tinha prévia ciência de todas as obrigações assumidas, o que afasta qualquer vício de consentimento ou abusividade. Aponta prescrição da pretensão de repetição do indébito e de indenização pelos danos morais. Alega a legalidade do contrato firmado entre as partes. Diz que não é possível que se considere irregular toda e qualquer contratação na modalidade de cartão de crédito consignado, ainda que contratado exclusivamente para realização de saque, quando tal modalidade está devidamente regulada por lei e atos normativos. Destaca que a parte autora tinha consciência que estava pactuando contrato de cartão de crédito consignado. Aduz a inexistência de danos morais. Requer o provimento do recurso.

A autora apelante afirma que o "quantum" indenizatório deve ser majorado para que a condenação sirva de desestímulo para novos atos ilícitos contra consumidores de boa-fé. Postula a majoração da verba honorária. Requer o provimento da apelação.

Foram apresentadas contrarrazões.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

VOTO

Atendidos os pressupostos de admissibilidade, recebo os recursos.

A parte autora busca o reconhecimento da nulidade ou descaracterização da contratação de cartão de crédito consignado, com a condenação do réu à devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente e indenização por danos morais, com a conversão do empréstimo de cartão de crédito consignado (RMC) em empréstimo pessoal consignado, com a devida conversão dos encargos.

Na inicial, afirma que não recebeu maiores informações de seu contrato (nº 0229020032829), sendo depositado em sua conta o valor do empréstimo (R$ 2.815,00); que pensou estar assinando um empréstimo consignado; que houve evidente prática abusiva e desleal da demandada.

O banco réu, na contestação (Evento 22 dos autos originários), sustenta que a autora recebe benefício previdenciário e contratou com o requerido contrato de cartão consignado nº 717410807 e 716023542; que o nº 0229020032829 se refere ao controle de reserva de margem INSS; que houve saque no valor de R$ 1.216,00 em 22/06/2017 e telessaque complementar no valor de R$ 2.669,00 em 09/10/2017; que a contratação firmada é legítima, com o contrato tendo sido devidamente assinado pela autora; que não há vício de consentimento; que há possibilidade do pagamento mínimo, mas é obrigação do cliente efetuar o pagamento integral da fatura; que deve ser mantida a operação pactuada.

A sentença julgou procedentes os pedidos. Ambas as partes recorreram e analiso os recursos conjuntamente.

Cabe destacar que o objeto da presente ação é o contrato vinculado ao benefício de aposentadoria da autora, o qual foi acostado no Evento 22 - CONTR3 dos autos originários e de nº 717410807, firmado em 02/10/2017, e não aquele vinculado ao benefício de pensão por morte e de nº 716023542 (Evento 22 - CONTR2 dos autos originários). Assim, o exame passará a ser feito apenas sobre o pacto objeto da controvérsia, delimitado na peça inicial.

No caso, não está configurada a prescrição pois se trata de contrato com de parcelas mensais de trato sucessivo, com descontos regulares no benefício previdenciário da parte autora.

Neste sentido, precedentes desta 18ª Câmara Cível:

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DECLARATÓRIA COM PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C DANO MORAL. CONTRATAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). PRESCRIÇÃO. AFASTAMENTO. TRATANDO-SE DE UMA OBRIGAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO, COM DESCONTO REGULAR DA PARCELA EM 12/2019, NÃO HÁ FALAR EM PRESCRIÇÃO, CONSIDERANDO O AFORAMENTO DA AÇÃO EM 02/2020.INOBSTANTE DEMONSTRADA A CELEBRAÇÃO DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC), COM AUTORIZAÇÃO EXPRESSA PARA DESCONTO DO PAGAMENTO MÍNIMO EM SEU BENEFÍCIO, INEXISTENTE PROVA QUE DEMONSTRE A ENTREGA DO CARTÃO RESPECTIVO À REQUERENTE E NEM O SEU USO COMO TAL, O QUE DESCARACTERIZA A CONTRATAÇÃO COMO FORMALIZADA E SE RECONHECE A SUA NULIDADE.FRENTE À INTENÇÃO DE CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO E RECEBIDO VALORES, A CONTRATAÇÃO DEVE SUBSISTIR COMO SE EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO FOSSE (ART. 170, DO CÓDIGO CIVIL).SENTENÇA MANTIDA.FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS RECURSAIS. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME. (TJRS, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000274-33.2020.8.21.0060, 18ª Câmara Cível, Desembargador NELSON JOSE GONZAGA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 01/04/2021)

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. PRESTAÇÕES DE TRATO SUCESSIVO. ALEGAÇÃO DE NÃO CONTRATAÇÃO DA RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). CONTEXTO PROBATÓRIO QUE INFIRMA A TESE INICIAL. DEMONSTRAÇÃO, PELA PARTE RÉ, DA EXISTÊNCIA DA CONTRATAÇÃO E DO EFETIVO USO DO CARTÃO DE CRÉDITO. SENTENÇA REFORMADA. MALGRADO SUSTENTE A AUTORA A INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC), A PROVA DOCUMENTAL CARREADA AOS AUTOS DEMONSTRA A EXISTÊNCIA DA CONTRATAÇÃO E, POR DECORRÊNCIA, A LEGITIMIDADE DOS DESCONTOS EFETIVADOS PELO RÉU. DEMONSTRADA A EXISTÊNCIA DA CONTRATAÇÃO E NÃO HAVENDO COMPROVAÇÃO DE QUALQUER ILÍCITO, NÃO HÁ LASTRO PARA O CANCELAMENTO DOS DESCONTOS, REPETIÇÃO DE INDÉBITO OU INDENIZAÇÃO A TÍTULO DE DANO MORAL. RECURSO PROVIDO. UNÂNIME. (TJRS, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5059438-09.2020.8.21.0001, 18ª Câmara Cível, Desembargador PEDRO CELSO DAL PRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 01/03/2021)

Da mesma forma, quanto à indenização pelos danos morais, não se configura a prescrição.

Isso porque, embora a pretensão de reparação civil esteja sujeita ao prazo prescricional de três anos, conforme dispõe o art. 206, §3º, V, do Código Civil, o seu termo inicial, no caso dos autos, os descontos continuaram a ser realizados, não havendo, portanto, o que se falar em prescrição da pretensão da autora no que se refere à reparação pelos danos morais alegados.

A propósito:

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C PEDIDO RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. - Preliminar arguida em contrarrazões: PRESCRIÇÃO. PEDIDO DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO. Quanto à prescrição do pedido de repetição do indébito, esta Câmara entendia que era aplicável o prazo trienal, nos termos do 206, §3º, inc. IV, do Código Civil. Contudo, o tema foi posto em pauta para votação, restando definindo que, diante nulidade da contração por vício do negócio jurídico, aplica-se o disposto no art. 169 do Código Civil, o qual dispõe que: "O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo", entendimento do qual passo a adotar. Ademais, tratando-se de contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), o qual prevê descontos mensais em benefício previdenciário para pagamento de prestações sucessivas, sem sequer mencionar o número de parcelas do contrato ou limite de saques, não se pode falar em ocorrência de prescrição. Assim, tratando-se de contrato nulo, bem como de prestações de trato sucessivo, não há o que falar em incidência de prescrição. Preliminar afastada. PRESCRIÇÃO DO PEDIDO DE DANO MORAL. Em relação ao pedido de danos morais, fundado na pretensão de reparação civil, aplicável o prazo prescricional trienal, previsto no art. 206, §3º, inc. V, do Código Civil. Contudo, os descontos também continuaram a ser realizados, não havendo, portanto, o que se falar em prescrição da pretensão do autor no que se refere à reparação pelos danos morais alegados. Preliminar afastada. - Mérito recursal: RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. Trata-se, in casu, de responsabilidade contratual objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, respondendo a instituição financeira independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados a seus...

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