Acórdão nº 50467516320218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Primeira Câmara Cível, 09-02-2022

Data de Julgamento09 Fevereiro 2022
ÓrgãoVigésima Primeira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50467516320218210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001657819
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5046751-63.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Dívida Ativa

RELATOR: Desembargador ARMINIO JOSE ABREU LIMA DA ROSA

APELANTE: BANCO ITAU VEICULOS S.A. (BANCO FIAT) (EMBARGANTE)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (EMBARGADO)

RELATÓRIO

BANCO ITAÚ VEÍCULOS S/A apela da sentença de improcedência dos embargos à execução fiscal ajuizados contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.

Nas razões recursais, argui a ilegitimidade passiva tributária relativamente ao IPVA em cobrança, conforme art. 5º, Lei 8.115/85, alegando que com o término dos contratos, e consequente baixa dos gravames, os veículos foram alienados em nome dos arrendatários, não mais detendo apelante a propriedade, nem mesmo indireta, consolidada a propriedade para todos os fins aos arrendatários, nos termos do art. 1.228, CC.

Salienta decorrer a obrigação tributária relacionada ao imposto sobre propriedade de veículo automotor da relação de propriedade do bem, e não do registro da alienação junto ao órgão de trânsito respectivo, lembrando que a transferência da propriedade dos bens móveis se dá com a tradição, art. 1.267, CC.

Reafirma ter efetuado a baixa do gravame dos veículos após o término dos contratos, em cumprimento ao disposto na Resolução CONTRAN nº 689/2017, com o que resta afastada a responsabilidade solidária imposta pelo art. 134, CTB.

Requer o provimento do recurso.

Contrarrazões acenam com o acerto decisório, enfatizando constar a empresa executada como proprietária dos veículos, respondendo, assim, pelo IPVA, de acordo com artigos 2º e 5º, Lei Estadual nº 8.115/85,

No tocante à responsabilidade tributária no caso do arrendamento mercantil, sustenta responder o credor arrendante pelo pagamento do IPVA, ao menos até que quitado o VRG e exercida a opção de compra, devidamente registrado, quanto ao que destaca inexistir prova.

No mais, salienta que eventual compra e venda celebrada a partir de 1º de janeiro de 2014 não exime o ex-proprietário alienante de responsabilidade solidária pelo pagamento do IPVA devido, até a data do registro da compra e venda no órgão de trânsito, conforme previsto no art. 6º, II, Lei Estadual 8.115/85, na redação dada pela Lei 14.381/13, hipótese de responsabilidade tributária expressamente prevista em lei específica, conforme previsto no art. 124, II, CTN.

É o relatório.

VOTO

Não merece acolhida a pretensão recursal.

Como se infere das telas de cadeia dominial dos veículos constantes no DETRAN/RS (Evento 16, PET1, autos eletrônicos de primeiro grau), os veículos geradores do tributo constam em nome de Fiat Leasing S/A Arrendamento Mercantil, empresa da qual é a embargante Banco Itaú Veículos S/A sucessora legal, fato este incontroverso.

Além disso, a par de nada demonstrar embargante em relação à transmissão dominial em prol dos arrendatários, ausente algum esclarecimento quanto ao momento em que tal teria ocorrido (se antes ou depois dos lançamentos), resta desautorizado qualquer raciocínio neste sentido.

Prova cuja produção sempre esteve ao alcance da embargante, de modo a se desincumbir do seu ônus, como previsto no artigo 373, I, CPC/15, descabido falar em termos de prova negativa.

Se não foi produzida pela interessada, é justamente porque vai de encontro aos seus interesses.

Definida a propriedade registral quanto aos veículos, da arrendante, obviamente responde ela como devedora do IPVA, nada mais cabendo, em termos de prova quanto à relação jurídica de que decorre a responsabilidade tributária da apelante.

Ou seja, o exequente desincumbiu-se do ônus probatório que lhe cabia, qual seja, o domínio do veículo e sujeição passiva da arrendante.

A condição de proprietário está enquadrada no fato gerador do tributo, artigo 2º, Lei Estadual nº 8.115/85.

Condição de proprietário essa destacada na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e a responsabilidade quanto ao IPVA.

Assim, o REsp nº 744.308/DF, CASTRO MEIRA:

TRIBUTÁRIO. IPVA. ARRENDAMENTO MERCANTIL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. ARRENDANTE.
1. O arrendante, por ser possuidor indireto do bem e conservar a propriedade até o final do contrato de arredamento mercantil, é responsável solidário para o adimplemento da obrigação tributária relativa ao IPVA, nos termos do art. 1º, § 7º, da Lei Federal nº 7.431/85. Precedentes: (REsp 897.205/DF, Rel. Min. Humberto Martins, DJU de DJU de 29.03.07; REsp 868.246/DF; Rel. Min. Francisco Falcão, DJU de 18.12.06).
2. Recurso especial provido.

Não é outra a orientação deste Tribunal de Justiça, como se vê da AC nº 70037231990, LUIZ FELIPE SILVEIRA DIFINI:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. IPVA. ARRENDAMENTO MERCANTIL. RESPONSABILIDADE DO ARRENDANTE. INOPONIBLIDADE DE CONVENÇÕES E CONTRATOS PARTICULARES. INTELIGÊNCIA DO ART. 123 DO CTN.
I. O fato gerador do IPVA é a propriedade do veículo automotor.
No caso de automóvel objeto de contrato de arrendamento mercantil, a responsabilidade pelo pagamento do IPVA é do arrendante, porque ele permanece titularizando a propriedade do bem em questão.
II. De acordo com o disposto no art. 123 do CTN, são inoponíveis à Fazenda Pública as convenções e contratos particulares relativos à responsabilidade pelos pagamentos de tributos.

De cujo voto, por exaustivo, permito-me transcrever a seguinte passagem:

“A questão em tela diz respeito à responsabilidade do arrendante pelo pagamento, ou não, do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), incidente sobre veículos automotores objeto de contrato de arrendamento mercantil (leasing).

Primeiramente, insta definir o fato gerador do imposto em discussão. Nesse sentido, a Lei Estadual nº 8.115/85, ao instituir referido tributo, reza em seu artigo 2º: “O imposto, devido anualmente ao Estado, tem como fato gerador a propriedade de veículo automotor”.

Já o seu 5º dispõe que “São contribuintes do imposto os proprietários de veículos automotores sujeitos a registro e/ou licenciamento em órgão federal, estadual ou municipal, neste Estado”.

Por outro lado, há que se fazer breve digressão acerca da natureza jurídica do contrato de arrendamento mercantil, no intuito, notadamente, de verificar se há a transferência a propriedade do bem objeto da contratação.

A Lei n. 6099/74, que dispõe do tratamento jurídico das operações de arrendamento mercantil (leasing), conceitua, em seu artigo 1º, parágrafo único, arrendamento mercantil como “o negócio jurídico realizado entre pessoas jurídicas, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta”.

Na doutrina, Arnold Wald define a figura do arrendamento mercantil (leasing) como um contrato misto, pelo qual um financiador adquire e aluga a uma empresa bens de equipamento ou de uso profissional, móveis ou imóveis, a prazo longo ou médio, facultando-se ao locatário a aquisição dos mesmos pelo preço residual.

Como se vê, o leasing é espécie de negócio jurídico complexo (estruturalmente), porque “realiza uma fusão de diversos figurinos ou moldes num só contrato”, com um sentido econômico peculiar e características que o diferenciam da pura e simples locação, atividade com a qual costuma ser confundida.

Com efeito, não se trata de uma simples locação com promessa de venda, como à primeira vista pode parecer. Mas cuida-se de uma locação com uma consignação de promessa de compra e venda, trazendo, porém, um elemento novo, que é o financiamento, numa operação específica que consiste na simbiose da locação, do financiamento e da venda.

A Lei n. 6099/74, que dispõe do tratamento jurídico das operações de arrendamento mercantil (leasing), conceitua, em seu artigo 1º, parágrafo único, arrendamento mercantil como “o negócio jurídico realizado entre pessoas jurídicas, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta”.

A propósito, explica Arnold Wald a distinção entre os dois contratos – locação e leasing –, a despeito da existência de direitos e deveres semelhantes:

O leasing não se confunde com a locação, que, como vimos, é o contrato em que uma das partes se obriga a ceder à outra o uso e gozo temporário de coisa infungível, mediante retribuição. Findo o prazo, salvo acordo ou leis especiais, a coisa deve ser devolvida, ficando extinto o contrato. No leasing, há, no fim do prazo contratual, uma tríplice opção para o usuário: a) renovar a locação; b) adquirir o material; c) restituí-lo. Por outro lado: a) na locação, o risco da coisa é do locador (art. 1.190 do Código Civil); no leasing, é do arrendatário; b) na locação, o aluguel corresponde (ou deve corresponder) ao uso e gozo da coisa; no leasing, as prestações são mais altas, porque garantem também a amortização e os custos do financiamento; c) na locação finda, a coisa deve ser restituída; no leasing, o arrendatário tem opção: renova, restitui ou compra a coisa pelo preço residual; d) na locação, o locador deve garantir o uso pacífico da coisa; no leasing, fica por conta do usuário as medidas para defesa; e) na locação pode haver denúncia vazia; no leasing, não; f) na locação, há apenas um contrato entre o locador e o locatário e, raramente apenas, o locador não é dono da coisa locada; no leasing, a empresa de arrendamento mercantil adquire a coisa especialmente pra o usuário.

No mesmo sentido, Waldirio Bulgarelli, em sua obra Contratos Mercantis:

O leasing, assim, afasta-se da concepção de uma simples locação com opção de compra, não só pela triangularidade, ou...

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