Acórdão nº 50473692620228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 28-04-2022

Data de Julgamento28 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo50473692620228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002019571
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5047369-26.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATOR: Desembargador JAYME WEINGARTNER NETO

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo em Execução interposto por ATILA VEGA DA SILVA JUNIOR contra decisão do Juiz de Direito da Vara Adjunta de Execuções Criminais da Comarca de Santiago, que indeferiu o pedido de retificação do RESPE do apenado, quanto à fração para prorrogação de regime tocante ao delito de tráfico de droga.

Foram apresentadas contrarrazões. Em juízo de retratação, a decisão foi mantida.

Nesta instância, a Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo desprovimento do recurso.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

O apenado Atila Vega da Silva Junior, PEC nº 8000052-65.2021.8.21.0064, cumpre pena privativa de liberdade fixada em 17 anos e 13 dias de reclusão pela prática dos crimes de tráfico de drogas e roubo majorado.

A defesa, na origem, em razão da nova redação do art. 112 da LEP, aduziu que ante a ausência de previsão legal expressa acerca do conteúdo dos crimes equiparados a hediondo, bem como diante da impossibilidade de criação de figura mais gravosa por interpretação extensiva ou analogia (princípio/regra da reserva legal penal), o tráfico ilícito de entorpecentes deve ser considerado, para efeitos de progressão de regime, como crime comum.

O Magistrado a quo, em 20 de dezembro de 2021, indeferiu o pedido, salientando ser inviável o acolhimento da pretensão da defesa de ver reconhecido o percentual de 16% para a progressão de regime, pois implicaria o afastamento da hediondez do delito de tráfico de drogas, equiparado ao hediondo, reconhecido pela Lei n° 8.072/90 e cuja maior reprovabilidade decorre da norma constitucional (artigo 5°, inciso XLIII, da CF).

Pese a substancial fundamentação da defesa, o agravo deve ser desprovido, como resultado da melhor interpretação sistemática para o problema posto.

Em consulta à certidão de antecedentes criminais, o agravante ostenta condenação por tráfico de entorpecentes e roubo majorado.

Já firmei posição, diante da premissa de que o tráfico é crime equiparado a hediondo, em relação à progressão. Tratando-se, substancialmente do mesmo fundamento transcrevo a argumentação:

A Constituição Federal elencou o tráfico de drogas como inafiançável e insuscetível de graça ou anistia, ao lado dos crimes de tortura, do terrorismo e dos "definidos como crimes hediondos". O mandado de criminalização específico indica o tratamento mais gravoso conferido a tais delitos pelo constituinte originário. Em certa medida, pode-se afirmar que, num primeiro plano, a Constituição demarcou os três delitos que "merecem" maior repressão [tortura, tráfico e terrorismo], de modo que, a rigor, estão fora da esfera primordial de disponibilidade do legislador infraconstitucional, diferente dos "hediondos", cujo rol, esse sim, pode ser ampliado ou restringido de acordo com a política criminal escolhida. Em outras palavras, a equiparação, no fundo, é dos crimes hediondos, de livre escolha legislativa, à tortura, ao tráfico e ao terrorismo, já selecionados singularmente pelo constituinte, como está literalmente escrito no inciso XLIII do artigo da Constituição. Trata-se de mera constatação. Pessoalmente, tenho sérias reservas, empíricas e axiológicas, ao que se convencionou chamar de "war on drugs" - e que talvez estivesse no auge quando dos trabalhos constituintes. E não desconheço que expressivo contingente da população carcerária brasileira, especialmente a feminina, venha do endurecimento adotado pela Lei nº 11.343/2006. Mas não há como, em termos lógico-normativos, negar que o texto é claro e implica tratamento mais gravoso a tais crimes do que aos crimes ditos comuns. Por outro lado, se vingasse a tese defensiva, seria forçoso concluir que as frações para progressão em casos de tortura e terrorismo, em situações notoriamente graves e desvaliosas, também estariam no espectro de 25% a 30% da pena (na metade inferior do espectro previsto no artigo 112 da Lei de Execuções Penais), a delibar-se a proteção insuficiente de bens jurídicos tão fundamentais.

Em sentido similar, precedente deste Tribunal de Justiça:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. PROGRESSÃO DE REGIME. CONCESSÃO DE REDUÇÃO DE 60% PARA 20% DO CUMPRIMENTO DA PENA PARA FINS DE PROGRESSÃO DE REGIME. MAGISTRADO SINGULAR QUE AFASTOU A HEDIONDEZ DO DELITO DE TRÁFICO DE ENTOECENTES. IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL. O DELITO DE TRÁFICO DE ENTOECENTES, AINDA QUE COMETIDO SEM VIOLÊNCIA À PESSOA OU GRAVE AMEAÇA EQUIPARA-SE A HEDIONDO POR FORÇA DE PREVISÃO LEGAL CONTIDA NO ARTIGO 5, INCISO XLIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NOVA REDAÇÃO DADA AO ARTIGO 112 DA LEP COM O ADVENTO DA LEI 13.964/2019 QUE PREVÊ PERCENTUAL ESPECIFICO PARA O CASO POSTO SUB JUDICE. RÉU CONDENADO PELA PRÁTICA DOS DELITOS DE TRÁFICO DE ENTOECENTES, LAVAGEM DE DINHEIRO, RECEPTAÇÃO, TRÁFICO DE ENTOECENTES (SEGUNDA INCIDÊNCIA) E ROUBO, SENDO REINCIDENTE EM CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. REINCIDÊNCIA ESPECÍFICA. PERCENTUAL DE CUMPRIMENTO DE PENA APLICÁVEL DE 60%. RÉU QUE CONTA APENAS COM 24% DA PENA CUMPRIDA. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA PROGRESSÃO DE REGIME. DECISÃO CASSADA. AGRAVO PROVIDO.(Agravo de Execução Penal, Nº 50060212820228217000, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto Carvalho Fraga, Julgado em: 18-02-2022).

E o STJ tem ecoado a mesma conclusão, em diversos provimentos monocráticos. A título de ilustração: Decisão Monocrática no HC 726166/SC, Min. Olindo Menezes, em 03 de março de 2022; Decisão Monocrática no HC 723462/SC, Min. Antonio Saldanha Palheiro, em 17 de fevereiro de 2022.

Por outro lado, reconhecida a reincidência em crime hediondo em um dos processos pelo qual cumpre pena, a circunstância agravante incide na totalidade da execução.

Há argumento adicional. A Lei nº 13.964/2019, o chamado “Pacote Anticrime”, publicada em 24 de dezembro de 2019, derrogou a Lei dos Crimes Hediondos; efetivamente, revogou expressamente o disposto no artigo 2º, § 2 da Lei nº 8.072/90. Mas não se criou, ipso facto, um vácuo ou uma lacuna. A novel legislação, dispondo sobre a progressão de regime, passou a exigir diferentes percentuais e nos seguintes termos:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:

I - 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa...

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