Acórdão nº 50475043820228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Primeira Câmara Cível, 01-06-2022

Data de Julgamento01 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50475043820228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002191049
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5047504-38.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Pensão por Morte (Art. 74/9)

RELATOR: Desembargador MARCELO BANDEIRA PEREIRA

AGRAVANTE: LILIA DA COSTA DE MEDEIROS

AGRAVADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RELATÓRIO

LILIA DA COSTA DE MEDEIROS interpõe agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, da decisão que, nos autos da ação declaratória de inexigibilidade de débito, cumulada com repetição de indébito e danos morais, movida em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, indeferiu a tutela provisória de urgência postulada, em que visada a cessação dos descontos, na pensão por morte, a título de ressarcimento de valores pagos a maior e redução do valor correspondente à sua quota-parte, que foi calculada erroneamente (ev. 14, DESPADEC1, originário).

Aduz que é pessoa idosa, 86 anos, e beneficiária da pensão por morte de seu marido, ex-servidor, que exercia a função de Delegado de Polícia Civil. Explica que sempre recebeu a pensão, observada sempre a mesma proporção, e isso faz já 34 anos, e que nunca teve conhecimento de que sua quota-parte estava incorreta. Conta que recebeu notificação do Estado, em 23 de junho de 2021, com a informação do erro no percentual da divisão das quotas-partes, acarretando a diminuição do valor que percebe como pensionista, além da devolução dos valores recebidos a maior indevidamente. Aponta que recebia o valor de R$ 6.349,24 e, com a nova forma de cálculo, passou a receber R$ 3.126,69. Ainda, com mais o desconto (restituição) do valor supostamente recebido a maior, acaba por perceber R$ 2.389,31. Explica que pagou o imposto sobre a renda auferida, querendo o Estado, agroa, a restituição do que entende ter pago indevidamente. Afirma que, embora tenha havido equívoco no pagamento dos percentuais das quotas-partes da pensão, mostra-se abusiva sua penalização com a restituição de qualquer valor, até porque se trata de verba alimentar. Colaciona julgados e afirma ser evidente a sua boa-fé, pois o erro somente pode ser imputado à Administração Pública. Requer a concessão de efeito suspensivo para que, de imediato, seja suspenso o desconto da restituição do valor descontado na sua folha de pagamento.

Recebido o recurso e concedido o efeito suspensivo (ev. 6).

Foram apresentadas contrarrazões (ev. 11).

A Procuradora de Justiça opina pelo conhecimento e provimento do agravo de instrumento (ev. 14).

É o relatório.

VOTO

A esses efeitos, porque atuais e suficientes para sustentar o agora decidido, e tendo em vista que após o processamento do recurso não advieram elementos novos aos autos capazes de infirmar as conclusões da decisão, reproduzo os fundamentos que lancei quando do deferimento da antecipação de tutela recursal, in verbis:

"2. Recebo o agravo, porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade recursal. A agravante litiga sob o pálio da AJG.

O provimento em que apreciada a atribuição de efeito ativo a agravo caracteriza-se, estruturalmente, pelo seu caráter provisório, no sentido de perdurar até que sobrevenha o julgamento do recurso.

O que importa, neste plano, é o se saber se é possível manter-se o “status quo” durante a tramitação do recurso, a esses efeitos se exigindo, por certo, a ponderação acerca dos interesses em xeque, identificando onde maior o risco ou o dano, se na manutenção desse estado, com o qual a parte convivia ao tempo da interposição da irresignação, ou se na pronta interferência na situação prática vivenciada.

Disso resulta que, para o deferimento da tutela em liminar, não basta o mero risco de lesão. Esse já é pressuposto sopesado pelo legislador para definição das hipóteses de cabimento do agravo de instrumento no novo CPC. Deve haver, ainda, um plus; um risco de lesão qualificada, que transcende a mera interposição do agravo, e que autoriza a concessão do efeito ativo, alcançando, desde logo, a tutela indeferida na origem. Isso, sob pena de se estabelecer um efeito ativo automático, sempre que interposto o recurso.

Por isso é que o art. 995, Parágrafo único, condiciona a concessão do efeito ativo/suspensivo, às hipóteses em que “houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso”.

Trata-se de demanda na qual a autora, pensionista de quota-parte da pensão por morte do seu marido, ex-servidor público estadual, Luiz Carlos Barreto de Medeiros, postula a devolução e a repetição em dobro dos valores que foram suprimidos de sua folha de pagamento, alegando erro da Administração quanto à divisão dos percentuais das pensões.

Como relatado, o que se apreende da peça inicial eé que a pretensão deduzida não vai ao ponto de se opor ao ajustamento do percentual alusivo à quota-parte pensão da agravante ao efetivamente devidos, senão que ao desconto de parcela destinada ao ressarcimento ao erário do que lhe teria pago a mais no curso dos últimos cinco anos (o cálculo da dívida pelo agravado ignorou pagamentos anteriores a maior por reconhecer a prescrição administrativa daquelas parcelas.

A propósito, como destacado na r. decisão agravada, tem-se a fixação pelo STJ da tese do Tema 979, referente à questão da "Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social", "verbis":

"Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido."

Como se vê da tese fixada pela Corte Superior, conquanto repetíveis, em princípio, as quantias pagas a maior, é indispensável para que tal ocorra a comprovação da boa-fé objetiva de quem percebeu o benefício.

Quanto a esse ponto específico, tenho que é possível, e recomendável no caso, identificar indícios conducentes à presença da boa-fé.

E não apenas porque, de regra, a boa-fé se presume, e a má-fé se prova, mas também porque, percebendo 33,33%, como seria o devido, ou 50% da pensão deixada pelo seu marido - o teria sido o caso -, o certo é que auferia a agravante fração daquela pensão, e não sua integralidade, elementos não havendo no sentido de evidenciar que a revisão do cálculo que teria acontecido em novembro de 2007 deveria tê-la despertado para probabilidade de algum erro na ocasião, mormente quando esse erro seguiu se repetindo por quase quatorze anos, até o ano próximo passado, quando identificado pelo agravado.

Nem se tem nestes autos, outrossim, qualquer informação sobre o grau de instrução da agravante, profissão que tenha desempenhado, etc., que pudesse sugerir preparo e informação suficiente para a positivação de que não lhe poderia ter escapado a circunstância de que estaria sendo beneficiada por erro da administração.

Trata-se de questão que, como outras, haverá de ser trabalhada no curso da instrução, sendo razoável, pela redução significativa do poder aquisitivo produzido pela abrupta adequação do valor da quota-parte da agravante, a conclusão de que os descontos adicionais, respeitantes ao ressarcimento parcelado do que alcançado a mais,...

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