Acórdão nº 50511279220218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 27-06-2022

Data de Julgamento27 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50511279220218210001
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002270719
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5051127-92.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Práticas Abusivas

RELATOR: Desembargador JOAO MORENO POMAR

APELANTE: JOSE CARLOS DE AZEVEDO MOREIRA (AUTOR)

APELADO: OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

RELATÓRIO

JOSE CARLOS DE AZEVEDO MOREIRA (AUTOR) apela da sentença proferida nos autos da ação declaratória c/c indenizatória que move em face de OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU), assim lavrada:

Vistos.
JOSE CARLOS DE AZEVEDO MOREIRA ajuizou ação declaratória, cominatória e indenizatória por danos morais em face de OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, alegando ter a requerida inscrito seu nome junto ao Sistema de Informações de Créditos do Banco Central do Brasil (SISBACEN - SCR BACEN), sem realizar a notificação prévia exigida pela Resolução nº 4.571/2017 do Banco Central do Brasil.
Discorreu sobre o direito aplicável. Requereu o reconhecimento de seu direito em ser notificado e, na hipótese de ausência de notificação, pugnou o cancelamento do registro. Ainda, postulou indenização por danos morais e a concessão da gratuidade de justiça. Juntou documentos.
A gratuidade da justiça foi deferida.

Regularmente citada, a empresa ré ofereceu contestação.
Preliminarmente, impugnou a concessão da gratuidade judiciária conferida ao autor. No mérito, sustentou ter o autor realizado contrato de financimento de veículo com a Caixa Econômica Federal, a qual cedeu seu crédito à requerida. Discorreu sobre a desnecessidade de informar a cessão de crédito ao devedor, bem como acerca da legalidade da inscrição negativa em nome do autor. Afirmou ser indevida a indenização por danos morais e a existência de apontamento negativos anteriores. Requereu a improcedência dos pedidos. Juntou documentos.
Houve réplica.
A impugnação a gratuidade judiciária foi afastada e, instadas as partes acerca da produção aditiva de provas, quedaram-se inertes.


É o Relatório. Passo a decidir.

O feito comporta julgamento no estado em que se encontra, na forma do artigo 355, inciso I, do CPC, até porque as partes não manifestaram interesse na produção de novas provas.
Trata-se de demanda na qual a parte autora afirma não ter sido notificada previamente pela empresa ré que seu nome seria inserido no Sistema de Informações de Crédito - SCR a teor do disposto no artigo 11 da Resolução nº 4.571/2017 do Banco Central do Brasil.

Inicialmente, registro a aplicabilidade, ao presente caso, das normas do Código de Defesa do Consumidor.

Contudo, não é caso de inversão do ônus da prova, pois o autor tinha ao seu alcance todos os meios de prova aptos a comprovar os fatos constitutivos do seu direito, não se caracterizando como hipossuficiente.

O artigo 42, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor dispõe acerca da necessidade do consumidor em ser comunicado quando aberto qualquer tipo de cadastro em seu nome, in verbis:

Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.
[...]
§ 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.

[...]

E, a Resolução nº 4.571/2017 do Banco Central do Brasil, no artigo 11, corrobora essa questão, afirmando ser preciso as instituições financeiras comunicarem seus clientes sobre a inserção de dados das operações do SCR, conforme se demonstra:

Art. 11. As instituições originadoras das operações de créditodevem comunicar previamente ao cliente que os dados de suas respectivasoperações serão registrados no SCR.
§ 1º Na comunicação referida no caput devem constar asorientações e os esclarecimentos relacionados no art. 14.

§ 2º As instituições referidas no caput devem manter a guardada comunicação de que trata este artigo, em meio físico ou eletrônicoque permita comprovar a sua autenticidade, por um períodode cinco anos, contado da data de emissão do documento, sem prejuízode outras disposições que fixem prazo maior para a sua guarda.

Assim, incubia a parte requerida acostar algum demonstrativo comprovando a ciência do autor acerca da inclusão de seus dados em referido cadastro, o que não o fez.
Inclusive, na contestação ofertada, não há impugnação específica sobre o alegado pelo autor, limitando-se a requerida a aduzir questões atinentes a origem do débito.

Portanto, o pedido de reconhecimento do direito do demandante em ser notificado pela empresa ré referente ao cadastro no SCR e o pedido de exclusão dos dados do autor desse registro são medidas impositivas.

De outra banda, em relação a indenização por danos morais, adianto, razão não assiste ao autor.

Isso, pois, não há falar em abalo de crédito por parte do registro no SCR em função da natureza desse banco de dados.

O Sistema de Informações de Crédito - SCR, regulamentado pela Circular nº 3.098/02 e pela Resolução nº 2.390, ambas do Banco Central do Brasil, obriga as instituições financeiras a enviarem informações acerca do montante e das garantias relativas aos débitos contraídos por seus clientes, nas mais diversas modalidades de operação de crédito, independentemente do adimplemento de tais operações.

Eventual inadimplência, que pode ser temporária, não impede a contratação de novas operações de crédito, inclusive, no referido relatório consta que as informações nele constantes possuem defasagem mínima de 20 dias e não representam o valor atualizado de eventuais dívidas junto às instituições financeiras.

Como se percebe, não se trata de um registro desabonador, e sim do registro objetivo de operações de crédito contratadas, não possuindo qualquer equivalência aos órgãos de proteção ao crédito como SPC e SERASA.

Ademais, o acesso externo ao sistema é limitado.
Apenas as instituições financeiras que o alimentam podem consultá-lo, mediante autorização expressa do cliente interessado.
Em outras palavras, os dados contidos nesse banco de dados englobam informações de consumidores adimplentes e inadimplentes e eventual inadimplência, que pode ser temporária, não impede a contratação de novas operações de crédito.

Por isso, eventual registro errôneo ou sua manutenção não terá os mesmos reflexos negativos sobre o crédito de uma pessoa que tenha uma inscrição nos cadastros restritivos de consumidores, estes sim, destinados à proteção ao crédito.

Portanto, o cadastro das operações financeiras efetuados ao Banco Central do Brasil não caracteriza danos morais indenizáveis.

Nessa linha já decidiu o ETJRS:

RECURSO INOMINADO. BANCO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INCLUSÃO NO SISTEMA DE INFORMAÇÕES DE CRÉDITO DO BANCO CENTRAL SISBACEN/SCR. VINCULAÇÃO OBRIGATÓRIA. RESOLUÇÃO Nº 2.390 DO BANCO CENTRAL. SISTEMA QUE INFORMA EVENTUAL SALDO DEVEDOR DE CLIENTES E PAGAMENTOS, CABENDO AO AGENTE FINANCEIRO CONCEDER OU NÃO CRÉDITO. REGISTRO SEM CARÁTER DESABONADOR. AUSÊNCIA DE OFENSA AOS ATRIBUTOS DA PERSONALIDADE DA PARTE AUTORA. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO MANTIDA. SENTENÇA CONFIRMADA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO DESPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71007517568, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Roberto Carvalho Fraga, Julgado em 27/03/2018). Grifei.

RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. INSCRIÇÃO NO SCR/BACEN. DANOS MORAIS INOCORRENTES. Cadastro informativo no SCR/SISBACEN que reflete as operações realizadas pelo tomador junto às instituições que integram o sistema financeiro nacional. Natureza diversa dos órgãos de proteção ao crédito, como o SPC e a SERASA. Inexistência de prova de negativa de crédito ao autor por conta do registro objetado. Dano moral não evidenciado. NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70073492076, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 25/05/2017). Grifei.

Destarte, as características do banco de dados SCR, desautorizam a presunção de dano moral decorrente de cadastramento indevido. Nessas hipóteses, cabe ao reclamante demonstrar que o registro causou-lhe algum tipo de dano imaterial, algum abalo de crédito, em suma, algum prejuízo, ônus do qual o autor não se desincumbiu.
ISSO POSTO, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, havendo resolução de mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por JOSE CARLOS DE AZEVEDO MOREIRA em face de OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO para:
a)
reconhecer o direito do autor de ser notificado pela empresa ré acerca dos registros efetuados no banco SCR e,
b) determinar a exclusão das incrições relativas ao cadastramento objeto da presente demanda.

Diante do decaimento parcial de cada parte, arcarão a parte autora e ré, respectivamente, com 50% das custas processuais.
Sendo parcial e na mesma proporção o decaimento, cada parte arcará com os honorários do procurador da parte contrária, no percentual de 10% sobre o valor da condenação, em observância ao artigo 85, §2º do CPC/2015, corrigidos monetariamente pela variação do IGP-M a contar da data da fixação da verba e acrescidos de juros de mora de 1% a.m a contar do trânsito em julgado. Suspensa a exigibilidade do pagamento com relação ao autor em razão da gratuidade judiciária concedida.
Registre-se. Publique-se. Intime-se.
Com o trânsito em julgado, arquive-se com baixa.

A decisão foi alvo de embargos de declaração:

Vistos.
A empresa ré interpôs embargos de declaração da sentença exarada ao Evento 35, afirmando a existência de contradição na decisão, pois sendo o dispositivo sentencial relacionado a obrigação de fazer, não caberia a incidência dos
...

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