Acórdão nº 50544667720228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quinta Câmara Cível, 31-05-2022

Data de Julgamento31 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50544667720228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002153332
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

25ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5054466-77.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Educação Básica

RELATORA: Desembargadora HELENA MARTA SUAREZ MACIEL

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por G. D. S. K. D. O., representada por L. D. F. D. S., contra decisão proferida na ação ajuizada em desfavor do MUNICIPIO DE CANOAS.

A decisão recorrida foi proferida nos seguintes termos:

"Vistos. Trata-se de ação pelo rito ordinário visando à obtenção de vaga em creche ou pré-escola municipal em favor de criança, ante omissão do Município no cumprimento do dever constitucional de disponibilizar ensino infantil aos munícipes.

É o breve relato. Decido.

Considerando que vige a gratuidade do acesso à justiça nas ações em tramitação no Juizado da Infância e Juventude, postergo o exame da AJG para sentença.

Nos termos do art. 205, CRFB/88: “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”, norma esta repetida no art. 2º, da Lei 9.394/96.

Estatui o art. 227, CRFB/88: “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los à salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

Ainda, consoante o art. 208, I, CRFB/88, a educação básica é obrigatória e gratuita dos 04 aos 17 anos e, segundo dispõe o art. 211, §2º, CRFB/88, é atribuição dos Municípios a disponibilização do ensino infantil e fundamental.

Segundo o art. 30, da Lei 9.394/96, a educação infantil é oferecida em creches ou entidades equivalentes para crianças de até três anos de idade e em pré-escolas para crianças de quatro a cinco anos de idade.

Ainda, para fins de deferimento da tutela de urgência, deve a parte demonstrar, com fulcro no art. 300, CPC/15, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

Dentre os requisitos para concessão da tutela postulada, inclusive para exame do pressuposto da urgência, está a formulação de prévio pedido administrativo, circunstância que, embora não impeça a propositura da ação, impede verificar a omissão do Município no implemento da política pública aqui examinada, sendo possível, portanto, a obtenção da vaga pela via extrajudicial.

Por evidente, além do prévio pedido administrativo, há necessidade de transcurso de prazo razoável para que o Município atenda a pretensão, somente restando caracterizada sua omissão, se (i) houver negativa expressa ou se (ii) transcorrido prazo considerável sem qualquer resposta.

No mesmo sentido, o entendimento do TJ/RS:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À EDUCAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. VAGA EM CRECHE. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PRÉVIA SOLICITAÇÃO DA MATRÍCULA NA VIA ADMINISTRATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA. Antecipação de tutela – Nos termos do artigo 300 do Código de Processo Civil, o juiz poderá conceder a tutela de urgência quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. No caso concreto, os elementos de prova coligidos estão a apontar pela inocorrência do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Ausência de Prévia Inscrição Administrativa - A ausência de comprovação da prévia inscrição administrativa, perante o órgão competente, para concessão de matrícula em creche da rede municipal de ensino inviabiliza a concessão da tutela de urgência buscada pela parte. A referida exigência não representa óbice ao acesso do Judiciário, apenas se afigura necessária à demonstração da efetiva existência de pretensão resistida por parte do ente público, requisito esse que se relaciona com o próprio interesse de agir. Cumpre consignar que se está a exigir apenas a demonstração de que houve prévia inscrição administrativa para a concessão de vaga em creche, não o esgotamento da via administrativa. Destarte, a parte que necessite de vaga em creche deve formular prévio pedido junto ao órgão competente e aguardar prazo razoável para resposta. Não sendo fornecido retorno por parte da municipalidade ou, ainda, em caso de indeferimento da vaga pleiteada, se afigura crível a busca pela interferência do Poder Judiciário, ante a concreta pretensão resistida. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. UNÂNIME.(Agravo de Instrumento, Nº 70084306935, Vigésima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Helena Marta Suarez Maciel, Julgado em: 25-08-2020).

Cediço que o Município de Canoas, pelo menos desde o ano de 2021, retomou a publicação de editais periódicos, por meio dos quais convoca os interessados em obter vaga na educação infantil para que realizem a inscrição administrativa acima citada.

Na hipótese dos autos, a parte autora comprovou, seja no ajuizamento, ou após determinação de emenda à inicial, sua inscrição em edital aberto para o ano de 2022 (Edital 376-2021).

Contudo, conforme informação obtida no site https://www.canoas.rs.gov.br/servicos/inscricoeseducacaoinfantil2022/, os sorteios períodos estão aprazados para as seguintes datas:

Primeiro Sorteio: de 27/01/2022 a 28/01/2022

Segundo Sorteio: de e 16/05/2022 a 17/05/2022

Terceiro Sorteio: de 15/08/2022 a 16/08/2022

Quarto Sorteio: de 21/11/2022 a 22/11/2022

Assim, considerando a data do ajuizamento da ação e da prévia inscrição, é manifesta a ausência de tempo hábil para que o Município divulgasse a lista dos contemplados com as vagas disponibilizadas após sorteio.

É possível, inclusive, que, restando concedida a vaga extrajudicialmente pelo ora réu, seja a parte autora carecedora de ação, daí porque, como decorrência lógica, tal circunstância é impeditiva da concessão da tutela de urgência postulada, o que poderá ser reanalisado após a formação do contraditório.

Ante o exposto, por ora, INDEFIRO a tutela de urgência postulada.

Diante do desinteresse da parte autora, deixo de designar audiência para tentativa de conciliação.

Cite-se a parte demandada para contestar, querendo, no prazo legal.

Em seguida, intime-se a parte autora para réplica.

Após, intimem-se as partes a fim de que especifiquem, fundamentadamente, em 15 dias, as provas que pretendem produzir, justificando sua necessidade, devendo vir expressamente a pretensão de depoimentos pessoais e, em caso de pretensão de prova testemunhal, o respectivo rol (com endereço completo e ponto de referência, caso residentes no interior), para melhor adequação da pauta. Outrossim, caso pretenda a intimação da testemunha, deverá constar requerimento expresso, presumindo-se o comparecimento independentemente de intimação.

Com pedidos, voltem para exame. Não havendo requerimento de provas, ao Ministério Público para parecer final. Por fim, registrem-se os autos conclusos para sentença. Intimem-se. Diligências Legais."

Em suas razões, a parte agravante afirmou que o menor realizou inscrição, não sendo sorteado para vaga, conforme negativa de vaga juntada. Alegou que já foi suprido o esgotamento da via administrativa, inclusive, com o comprovante de que não vai ganhar a vaga. Refere estar presente o interesse de agir e a pretensão resistida. Alegou estar configurado o perigo de dano, vulnerabilidade e desamparo a que está exposto o menor, diante da omissão pública para atender ao pleito e a falta de condições financeiras dos genitores para pagamento de creche. Requereu o provimento do recurso para que seja deferida a tutela de urgência postulada, com a concessão da vaga municipal em turno integral ao menor ou a compra de vaga particular às expensas do Município (evento 1).

Foi deferida parcialmente a antecipação de tutela recursal, concedendo vaga em turno único (Evento 6).

Em sede de contrarrazões, a parte agravada intentou rechaçar as testes ventiladas no recurso, e pediu o seu desprovimento (Evento 15).

O Ministério Público, neste grau de jurisdição, opinou pelo parcial provimento do recurso (Evento 18).

Os autos vieram conclusos.

É o relatório.

VOTO

A interposição dos recursos está adstrita aos pressupostos de admissibilidade, os quais se dividem em extrínsecos e intrínsecos. Por conseguinte, devidamente preenchidos os referidos requisitos, conheço do recurso e passo à análise do mérito.

Nos termos do artigo 300 do Código de Processo Civil, o juiz poderá conceder a tutela de urgência quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

De início, impõe-se reconhecer que o direito ora pleiteado – direito à educação - se trata de direito fundamental social, disposto tanto na Constituição Federal quanto na legislação infraconstitucional. Assim se extrai da redação da Lei Maior (artigo 6°) e da Lei de Diretrizes e Bases - Lei nº 9.394/96 (artigos 4°, II e 11, V):

“Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015)”

“Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:

II - educação infantil gratuita às crianças de até 5 (cinco)...

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