Acórdão nº 50545681820208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 21-01-2021

Data de Julgamento21 Janeiro 2021
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Número do processo50545681820208210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20000450853
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação/Remessa Necessária Nº 5054568-18.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: ITCD - Imposto de Transmissão Causa Mortis

RELATOR: Desembargador MIGUEL ANGELO DA SILVA

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (INTERESSADO)

APELADO: NELSON DO CANTO OLMEDO (Sucessor) (IMPETRANTE)

APELADO: NEWTON DO CANTO OLMEDO (Sucessor) (IMPETRANTE)

APELADO: WALDMARINA DO CANTO OLMEDO (Espólio) (IMPETRANTE)

APELADO: SUBSECRETÁRIO DA RECEITA ESTADUAL - ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - PORTO ALEGRE (IMPETRADO)

RELATÓRIO

Trata-se de reexame necessário e apelação interposta pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL em face da sentença proferida no mandado de segurança impetrado por NELSON DO CANTO OLMEDO e OUTRO contra ato do SUBSECRETÁRIO DA FAZENDA ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL, cujo dispositivo enuncia, “in verbis”:

“Diante do exposto, confirmo a liminar anteriormente deferida e CONCEDO A SEGURANÇA pleiteada por ESPÓLIO DE WALDMARINA DO CANTO OLMEDO para afastar a inclusão dos valores referentes ao seguro VGBL na Declaração do ITCD (DIT) n. 1202866

Oficie-se à SEFAZ/RS.

Custas pelo Impetrado. Sem condenação em honorários, conforme Súmulas n° 105 do STJ e n° 512 do STF."

Nas razões recursais (Evento nº 37 dos autos de origem), o Estado apelante sustenta incidir o ITCD sobre os valores percebidos pelos beneficiários do plano denominado Vida Gerador de Benefício Livre – VGBL. Afirma que o aludido imposto alcança a totalidade do patrimônio do “de cujus”, na forma do art. 2º da Lei nº 8.821/89; logo, “se existe bem incorporado ao patrimônio do de cujos, passível de transferência a herdeiros ou legatários, sobre esse bem recairá a exigência fiscal” (sic). Alega que, diferentemente do que ocorre com o seguro de vida, em que o segurado não possui, em vida, a disponibilidade financeira sobre o capital, no VGBL o montante capitalizado compõe, desde o início, o patrimônio do contratante, que pode dele dispor a qualquer tempo e por qualquer razão, tal como um plano de aposentadoria privada. Sublinha se tratar, na realidade, de uma aplicação financeira, de modo que, se o segurado vier a falecer, o numerário aplicado será transferido aos herdeiros, mediante pagamento do ITCD respectivo. Requer o provimento do recurso, a fim de que seja denegada a ordem.

Foram apresentadas contrarrazões (Evento n º 44 dos autos de origem).

Nesta instância, o Ministério Público exarou parecer opinando pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Reexame Necessário.

A sujeição da sentença ao duplo grau de jurisdição obrigatório encontra previsão no art. 14, § 1º, da Lei nº 12.016/09, “in litteris”:

Art. 14. Da sentença, denegando ou concedendo o mandado, cabe apelação.

§ 1º Concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição.

Portanto, conheço da remessa necessária.

Mérito.

Conheço do recurso, porquanto presentes seus pressupostos de admissibilidade.

Estou em negar-lhe provimento, pelos motivos adiante explicitados.

Cuida-se de mandado de segurança impetrado por NELSON DO CANTO OLMEDO e OUTROS contra ato do SUBSECRETÁRIO DA FAZENDA ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL, em cuja inicial aqueles postulam seja concedida a ordem, para que “reste declarado o direito líquido e certo à não incidência do ITCD sobre os valores referentes ao Plano de Previdência VGBL que são objeto da DIT nº 1202866 (sic).

Insurge-se o Estado do Rio Grande do Sul contra a sentença que concedeu a segurança, nos termos do dispositivo transcrito no relatório supra.

Pois bem.

Quanto ao ponto fulcral da questão trazida ao crivo desta instância revisora, estimo não comportar reparos a douta sentença invectivada, cujos escorreitos fundamentos adoto e transcrevo adiante, a fim de evitar desnecessária tautologia, “in litteris”:

"Nos termos do art. 5º, LXIX, da CF:

Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por 'habeas-corpus' ou 'habeas-data', quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou proveniente de agente de pessoa jurídica no exercício de atribuição do Poder Público.

Como se vê, a ação mandamental busca a correção do ato apontado como ilegal, o que constitui seu objeto.

Cuida-se de writ em que o Impetrante busca afastar a incidência do ITCD sobre os valores aplicados em VGBL.

Assiste razão ao Impetrante.

A Lei Estadual n° 8.821/89, ao instituir o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos - ITCD estabeleceu, no art. 2º que o imposto tem como fato gerador a transmissão causa mortis sobre os seguintes bens:

Art. 2.º O imposto tem como fato gerador a transmissão "causa mortis" e a doação a qualquer título, de:

I - propriedade ou domínio útil de bens imóveis e de direitos a eles relativos;

II - bens móveis, títulos, créditos, ações, quotas e valores, de qualquer natureza, bem como dos direitos a eles relativos. (Redação dada pela Lei n.°14.741/15)

Com efeito, o plano de previdência VGBL caracteriza-se como:

seguro de vida individual que tem por objetivo pagar uma indenização, ao segurado, sob a forma de renda ou pagamento único, em função de sua sobrevivência ao período de diferimento contratado.1

Nesse sentido, o art. 794 do Código Civil determina o seguinte:

Art. 794. No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito. [grifei]

Apesar dos argumentos sustentados pela Autoridade Coatora, a jurisprudência é pacífica no sentido de reconhecer a natureza jurídica de contrato de seguro de vida do plano de previdência privada, ainda que possua a peculiaridade de ser pago em razão da sobrevida do contratante.

Nesse sentido, é o posicionamento firmado pelo e. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:

APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO TRIBUTÁRIO. ITCD. INCLUSÃO DE O VGBL - VIDA GERADOR DE BENEFÍCIO LIVRE NA HERANÇA. IMPOSSIBILIDADE. 1. Embora o VGBL possua a peculiaridade de ser pago em razão da sobrevida do contratante ao tento pactuado, tal peculiaridade não tira a natureza deste de contrato de seguro de vida individual privado, conforme informações da SUSEP, sendo indevida a incidência de ITCD. Aplicação do disposto no art. 794 do CC e art. 1o do Decreto Estadual no 33.156/1989. Precedentes jurisprudenciais. Por consequência, não há falar em inclusão do VGBL na herança, sendo correta a sentença hostilizada ao conceder a segurança pleiteada pela parte impetrante. 2. O recurso de apelação esgotou a análise do mérito, restando prejudicada a remessa necessária. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO. REMESSA NECESSÁRIA JULGADA PREJUDICADA. UNÂNIME." (Apelação e Reexame Necessário No 70080821564, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Barcelos de Souza Junior, Julgado em 29/05/2019)

APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ORDEM CONCEDIDA. ITCDIMPOSTO DE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE OS VALORES DE APLICAÇÃO EM VGBL. O VGBL individual Vida Gerador de Benefício Livre é um seguro de vida individual que tem por objetivo pagar uma indenização ao segurado, sob a forma de renda ou pagamento único. Ou seja, possui natureza de seguro de vida, de forma que não pode ser classificado como herança. Inteligência do artigo 794 do Código de Processo Civil. Considerando que os valores do VGBL possuem natureza jurídica de contrato de seguro de vida, descabe a incidência do ITCD Imposto de Transmissão Causa Mortis. Precedentes jurisprudenciais. Remessa necessária. A decisão singular que concede a ordem em mandado de segurança está sujeita ao duplo grau de jurisdição, nos termos do § 1o do artigo 14 da Lei no 12.016/2009. APELAÇÃO CÍVEL DESPROVIDA. SENTENÇA CONFIRMADA EM REMESSA NECESSÁRIA. UNÂNIME." (Apelação e Reexame Necessário No 70080901531, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 24/04/2019) [grifei]

REMESSA NECESSÁRIA. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INVENTÁRIO. PLANO DE SEGURO DE PESSOAS. VGBL (VIDA GERADOR DE BENEFÍCIOS LIVRE). NÃO INCIDÊNCIA DE ITCD. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça considera que, diante dos termos do art. 794 do Código Civil, no seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, sequer se considera herança para todos os efeitos de direito. Nesse caso, o beneficiário, titular da indenização securitária, é o terceiro designado pelo falecido, sendo descabido que tal direito componha o acervo hereditário composto pelos bens da pessoa segurada. Dessa forma, tratando-se o VGBL de um plano de seguro de pessoas com cobertura por sobrevivência, não integra o acervo hereditário da pessoa falecida e não responde por suas eventuais dívidas, em razão do que não há fato gerador de ITCD. Julgados do Tribunal da Cidadania e desta Corte Gaúcha. Por fim, merece ser confirmada, em parte, a sentença, pois o Estado restou condenado ao pagamento das custas em desatendimento ao art. 5° da Lei n. 14.634/14. O ente público estadual responde apenas pelo reembolso das despesas judiciais adiantadas pela parte impetrante. NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO E CONFIRMARAM, EM PARTE, A SENTENÇA EM REMESSA NECESSÁRIA. UNÂNIME." (Apelação e Reexame Necessário No 70080765068, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Laura Louzada Jaccottet, Julgado em 24/04/2019) [grifei]

Logo, por força do art. 794 do Código Civil, o seguro VGBL não deve ser considerado como...

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