Acórdão nº 50549327120228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 22-06-2022

Data de Julgamento22 Junho 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50549327120228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002236102
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5054932-71.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: IPTU/ Imposto Predial e Territorial Urbano

RELATOR: Desembargador JOAO BARCELOS DE SOUZA JUNIOR

AGRAVANTE: MUNICIPIO DE MACAMBARA

AGRAVADO: ANTONIO CARLOS GUTIERRES ASSUMPCAO

AGRAVADO: FILIPO RANGEL ASSUMPCAO

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo MUNICÍPIO DE MAÇAMBARÁ, em face da decisão que, nos autos da execução fiscal ajuizada em desfavor de ANTONIO CARLOS GUTIERRES ASSUMPCAO, restou assim definida (evento 71 dos autos de origem):

Penhore-se, por Termo nos autos, o imóvel dado em hipoteca conforme consta na Cédula de crédito bancária, constante da matrícula 2.333 do Registro de Imóveis de Itaqui, na forma do art. 845, § 1º, do CPC.

Feita a penhora e a avaliação, intime-se o devedor.

Na sequência, fica o credor intimado para dizer sobre o interesse na adjudicação.

Em caso negativo, deverá o credor diligenciar acerca de interessados para alienação por iniciativa particular, atendendo as seguintes condições: a) divulgação em jornal local e na internet, com pelo menos cinco dias de antecedência para realização do negócio; b) observar o valor de avaliação; c) pagamento integral do preço por meio de depósito judicial.

Outrossim, intime-se a parte exequente para, em entendendo necessário, promover a respectiva averbação no ofício imobiliário, a fim de dar conhecimento a terceiros, conforme art. 844 do CPC.

Por fim, para avaliação do bem penhorado, nomeio o leiloeiro Clademir dos Santos Flores.

Intimem-se.

Em razões, o agravante alega que não cabe a alienação de seus bens por meio de iniciativa particular. Aponta que a administração pública deve observar o princípio da impessoalidade, somente podendo realizar a venda de bens mediante licitação. Ressalta que deve ser observada a Lei de Execução Fiscal para venda de bens de terceiros. Argumenta o cabimento da avaliação do bem pelo ente público, devendo ser mantido o valor informado pela municipalidade, especialmente ante a ausência de impugnação. Requer o provimento do agravo de instrumento, fins de que a alienação do imóvel penhorado siga os termos da Lei de Execução Fiscal, adotando a avaliação realizada pelo Município.

O recurso foi recebido e determinado ser processamento (evento 4).

Sem contrarrazões, retornaram os autos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Contextualizando a demanda, verifico que se cuida de execução fiscal ajuizada em 12/12/2019 pelo Município de Maçambará em face de Antônio Carlos Gutierres Assumpção e de Filipo Rangel Assumpção, para cobrança de créditos de IPTU do exercício de 2017.

O despacho citatório foi exarado em 18/12/2019 (evento 3 dos autos de origem) e o executado Filipo Rangel Assumpção citado em 09/09/2020, conforme certidão lançada no evento 11 dos autos de origem.

Apresentada exceção de pré-executividade (evento 12 dos autos originários), foi julgada improcedente em decisão do evento 30 dos autos originários.

Em 01/03/2021, o Município requereu o bloqueio de valores via SISBAJUD (evento 36 dos autos originários).

O Juízo de Primeiro Grau deferiu a penhora (evento 39 dos autos de origem), restando bloqueada a quantia de R$ 1.513,74 (evento 42 dos autos de origem).

Posteriormente, foi reconhecida a impenhorabilidade da verba e determinado o levantamento da quantia (evento 46 dos autos de origem).

O Município, em 23/07/2021, postulou a penhora do imóvel que ensejou a cobrança do IPTU, bem como seu leilão (evento 68).

Posteriormente, foi exarada a decisão hostilizada, e desta decisão recorre a parte agravante.

Assiste razão em parte ao agravante.

Explico.

Sobre a alienação por iniciativa particular (venda direta) tratam os artigos 879 e 880 do Código de Processo Civil:

Art. 879. A alienação far-se-á:

I - por iniciativa particular;

II - em leilão judicial eletrônico ou presencial.

Art. 880. Não efetivada a adjudicação, o exequente poderá requerer a alienação por sua própria iniciativa ou por intermédio de corretor ou leiloeiro público credenciado perante o órgão judiciário.

§ 1º O juiz fixará o prazo em que a alienação deve ser efetivada, a forma de publicidade, o preço mínimo, as condições de pagamento, as garantias e, se for o caso, a comissão de corretagem.

Pois bem.

A alienação por iniciativa particular é modalidade de expropriação cabível tão logo se verifique o desinteresse do credor na adjudicação dos bens penhorados, não havendo necessidade de prévia realização de hastas públicas.

Na doutrina, Araken de Assis1 tece os seguintes comentários acerca do que vem a ser a alienação por iniciativa particular:

O art. 880 consagra a possibilidade da alienação por iniciativa particular.

Essa figura já existia no CPC de 1939 e não empolgava seus contemporâneos. Seu desaparecimento no procedimento da expropriação, na versão originária do CPC de 1973, recebeu aplausos. É preciso situar a ojeriza no contexto legislativo do primeiro estatuto unitário. Segundo o entendimento da época, com efeito, essa forma de alienação forçada representaria negócio jurídico privado, em que o procedimento in executivis ficava sobrestado até a alienação voluntária do bem penhorado pelo devedor. A locução “venda por iniciativa particular” era empregada no direito português, que hoje utiliza a expressão “negociação particular” (art. 811, d , do CPC de 2013), também se afigura criticável: a “alienação se integra num processo executivo, é ordenada por despacho e fiscalizada pelo tribunal”. Nesse sistema, todas as modalidades de alienação dos bens penhorados são judiciais, pretendendo a lei, por vezes, “diferenciar os casos em que esse ato tem lugar no próprio tribunal daqueles em que têm lugar fora do tribunal”.

(...)

A alienação por iniciativa particular tem caráter negocial e público ( retro , 339). Não parece exata sua equiparação a uma “venda voluntária”. Eventual convergência das partes, quanto ao conteúdo da proposta, nas condições estipuladas pelo órgão judiciário (art. 880, § 1.º), absolutamente confere caráter privado ao negócio. O procedimento se transformou, realmente, no “sucedâneo” da alienação em leilão. Mas, a alienação é forçada, realizada sob as condições fixadas pelo órgão judiciário e sob sua superintendência. Não há, pois, convenção processual, não equivalendo ao “convenio de realización” existente no direto espanhol. Nada impede a convenção processual das partes, fixando as condições do negócio. Em tal hipótese, não se cuidará da figura do art. 880. A assinatura do termo (art. 880, § 2.º) forma negócio entre o Estado, de um lado, sub-rogando o poder de disposição do executado, e o adquirente, de outro, o que não haveria na convenção processual cogitada, idôneo a propiciar a aquisição do domínio pelo registro ou pela tradição.

Incumbe ao órgão judiciário, na alienação por iniciativa particular do art. 880, examinar os elementos de existência, os requisitos de validade e os fatores de eficácia do negócio, avaliando a admissibilidade da oferta e o preenchimento dos demais pressupostos do remate ( v.g ., a proibição de preço vil, a teor do art. 891), de acordo com as condições traçadas no ato previsto no art. 880, § 1.º. Existe, portanto, alienação forçada própria e autêntica.

Ainda, importa sinalar que plenamente cabível a utilização da...

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