Acórdão nº 50587388520208217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 21-01-2021

Data de Julgamento21 Janeiro 2021
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50587388520208217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20000508165
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5058738-85.2020.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Edital

RELATOR: Desembargador FRANCISCO JOSE MOESCH

AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE ARARICÁ

AGRAVADO: GLOBAL MED SERVIÇOS EM SAÚDE LTDA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo MUNICÍPIO DE ARARICÁ, porquanto inconformado com a sentença proferida nos autos do mandado de segurança impetrado por GLOBAL MED SERVIÇOS EM SAÚDE LTDA., que concedeu liminar para suspender o procedimento licitatório.

Narra o agravante que a impetrante pretende o reconhecimento de nulidade no critério quantitativo de solvência geral, fixado no percentual de 1,5%, no Registro de Preços, sob a alegação de que o mesmo está em desacordo com o comumente exigido em outros certames, de acordo com a doutrina e jurisprudência, importando tal diferença, em impedimento de sua participação na licitação, bem como de outros licitantes. Postula a concessão do efeito suspensivo, uma vez que o procedimento licitatório suspenso, é na área da saúde, tendo como objeto a prestação de serviços técnicos especializados de operacionalização, gerenciamento e execução das ações e serviços de saúde nas unidades básicas de saúde do Município. Assevera ter fixado o critério para solvência geral em conformidade com a análise do caso concreto, como possibilita a Lei de Licitações. Ressalta que existe motivação para a fixação do critério, sendo assim possível, dentro da discricionariedade do gestor, estipular índice que melhor atenda à qualificação econômico-financeira, considerando a dimensão do objeto da licitação. Argumenta que de acordo com a Secretaria Municipal da Fazenda, a solvência geral é obtida através da divisão do ativo total pela soma do passivo circulante com o exigível a longo prazo, significando que quanto maior o índice, maior a probabilidade de cumprimento da prestação. Refere que a Lei nº 8.666/93, não fixa percentual do índice em nenhum de seus dispositivos, apenas autorizando que a Administração Pública estipule critérios para verificação da habilitação econômico e financeira dos licitantes. Cita o art. 31 da Lei de Licitações e a Súmula 289 do Tribunal de Contas da União. Destaca que o valor médio de contratação para o período e que serve de base para o certame, é de R$ 2.729.855,50 (dois milhões, setecentos e vinte e nove mil, oitocentos e cinquenta e cinco reais e cinquenta centavos). Requer a atribuição de efeito suspensivo e, ao final, o provimento do recurso, com o prosseguimento do certame.

O recurso foi recebido, sendo concedido o efeito suspensivo pleiteado.

Não foram apresentadas contrarrazões.

O Ministério Público manifesta-se pelo conhecimento e provimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas.

Para a concessão de liminar nos autos de mandado de segurança é essencial a ocorrência dos dois requisitos previstos no inciso III do art. 7º da Lei nº 12.016/2009, quais sejam, o fumus boni juris e o periculum in mora.

Na valiosa lição de Márcio Louzada Carpena “o fumus boni juris significa fumaça de bom direito, ou seja, a probabilidade de exercício presente ou futuro do direito de ação, pela ocorrência da plausividade, verossimilhança, do direito material posto em jogo. A fumaça do bom direito tem que ser apenas verossímil, provável, não há a necessidade de demonstrar que o direito existe, nem o julgador deve se entreter, a princípio, em buscá-lo, bastando uma mera probabilidade. No entanto, a parte tem que apresentar, no mínimo, indícios daquilo que afirma para bem merecer a tutela pretendida; vale dizer, simples alegações de direito e fatos não comprovados nos autos não demonstram o fumus boni juris nem tampouco comportam o julgamento procedente da demanda. (...) Já o periculum in mora significa o fundado temor de que, enquanto se aguarda a tutela definitiva, venham a ocorrer fatos que prejudiquem a apreciação da ação principal ou frustrem sua execução.”

Caso concreto, entendo que ausente o fumus boni juris.

Na hipótese, mantenho o entendimento exarado quando do recebimento do recurso, cujos fundamentos seguem transcritos, a fim de evitar desnecessária tautologia:

"GLOBAL MED SERVIÇOS EM SAÚDE LTDA. impetrou mandado de segurança contra ato praticado pela COMISSÃO PERMANENTE DE LICITAÇÃO E A PREGOEIRA DO MUNICÍPIO DE ARARICÁ, alegando que diante de seu interesse em participar da licitação modalidade Concorrência Pública - Edital nº 003/2020, cujo objeto é a “contratação de prestação de serviços técnicos especializados de operacionalização, gerenciamento e execução das ações e serviços de saúde nas unidades básicas de saúde do Município de Araricá, conforme Anexo VIII – Termo de Referência, com a descrição dos cargos", ao analisar o ato convocatório, verificou irregularidade quanto ao item 6.3.1., relativo à qualificação econômica-financeira, no que tange ao índice exigido para "Solvência Geral", de 1,5%. Assinalou ter ingressado com recurso administrativo, o qual, foi desacolhido. Disse ter realizado pesquisa junto ao site portal de licitação, em que obteve a informação que nos procedimentos licitatórios se utilizam índices contábeis mais baixos, considerando que empresas que apresentam o índice de 1% estão em situação deficitária; de 1,00 a 1,35% situação equilibrada e maior que 1,35%, situação satisfatória. Defendeu que é usualmente utilizado pela doutrina e jurisprudência o ISG igual ou superior a 1%. Citou precedente do TCU. Ressalvou que caso fosse indeferida a liminar, ela não poderia participar do certame, uma vez que possui índice de solvência geral de 1,42%, sendo empresa renomada no mercado de trabalho e que possui anos de experiência em licitações de serviços médicos. Requereu:

"a) O deferimento de liminar inaudita altera pars, para que seja suspensa a licitação até que o ato ilegal praticado seja revisto, o que deve ser comunicado com urgência à autoridade impetrada, sem prejuízo da intimação posterior via Oficial;

b) A notificação das autoridades coatoras e do Município de Porto Alegre para apresentar informações, na forma legal;

c) A intimação do Ministério Público para que apresente parecer, caso deseje;

d) Ao final, seja concedida em definitivo a segurança para confirmar a liminar concedida e cassar o ato coator, a fim de determinar que as autoridades coatoras se abstenham de retificar o edital, no que se refere ao Índice de Solvência Geral – ISG, e oportunizem a participação de licitantes no certame que disponham de ISG IGUAL ou SUPERIOR a 1,0%, conforme estabelece a doutrina e jurisprudência."

A magistrada a quo, deferiu o pedido liminar, nos seguintes termos:

"Trata-se de mandado de segurança, objetivando a suspensão do procedimento licitatório vinculado ao EDITAL Nº 018/2020, sob o argumento de que estaria exigindo índices muito superiores à média de mercado para análise da solvência geral, postulando urgência na análise do pedido, em face da sessão de abertura do certame se dar no dia 04 de Setembro de 2020.

Como prova, acosta aos autos o EDITAL Nº 018/2020, a impugnação e a decisão correlata indeferindo a impugnação intentada.

Sendo assim, analisando o procedimento licitatório embargado (item 6.3.1), verifico que realmente a autoridade coatora impôs o índice de solvência de 50% acima do mínimo exigido para as demais grandezas econômicas, sem ao menos justificar a razão deste distanciamento, conforme determina art. 31, §5°1, da Lei n° 8666/93.

Ademais, é da própria orientação do TCU, nos moldes da súmula 289, que haja prévia justificativa do ente público, com base em parâmetros de mercado, a adoção do índice, fato esse não consignado no edital.

E outro não é o entendimento da superior instância:

MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. QUALIFICAÇÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA. ORDEM DE SERVIÇO. EDITAL. CRITÉRIOS. NULIDADE. ANULAÇÃO. 1. O edital de licitação deve obedecer às normas legais e aos atos normativos administrativos. 2. A qualificação econômico-financeira dos licitantes é avaliada por meio de índices contábeis previstos no edital. Art. 31 da Lei n 8.666/93. Hipótese em que o Prefeito por meio de ordem de serviço padronizou os indicadores a serem utilizados para verificar a situação econômico-financeiras das empresas, determinando a adoção, na Administração Pública Direta, nas obras de engenharia, dos índices de liquidez corrente (LC) e liquidez geral (LG) igual ou superior a 1 e solvência geral (SG) igual ou superior a 1,5. 3. É nulo o edital de licitação que discrepa de ordem de serviço expedida pelo Chefe do Poder Executivo que fixou os indicadores de avaliação da situação econômico-financeira dos interessados em valor significativamente superior. Recurso provido.(Agravo de Instrumento, Nº 70030261333, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Isabel de Azevedo Souza, Julgado em: 13-08-2009)

Assim, tendo o edital afastado dos princípios da legalidade e isonomia, já que a previsão contida ali contida, além de afrontar o §5°, do art. 31, da Lei de Regência, afasta a possibilidade de novos licitantes concorrerem, DEFIRO a liminar postulada para suspender o processo de licitação.

Requisitem-se as informações, no prazo de 10 dias, devendo constar necessariamente a justificativa dos critérios adotados para fixação do índice de 1,5% de solvência geral.

Após, ao Ministério Público.

Por fim, voltem conclusos os autos.

Cumpra-se. Diligências legais." (grifei)

Pois bem.

O art. 31 da Lei nº. 8.666/33 estabelece:

"Art. 31. A documentação relativa à qualificação econômico-financeira limitar-se-á a:

I - balanço patrimonial e demonstrações contábeis do último exercício social, já exigíveis e apresentados na forma da lei, que comprovem a boa situação financeira da empresa,...

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