Acórdão nº 50609631020228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 24-11-2022

Data de Julgamento24 Novembro 2022
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50609631020228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002993599
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5060963-10.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Administração judicial

RELATOR: Desembargador NIWTON CAES DA SILVA

AGRAVANTE: RIO GRANDE FERTILIZANTES LTDA.

AGRAVADO: MERCOTAINER TERMINAL DE CONTAINER LTDA

RELATÓRIO

RIO GRANDE FERTILIZANTES LTDA interpôs agravo de instrumento, nos autos da ação de recuperação judicial, em que figura como devedora MERCOTAINER TERMINAL DE CONTAINER LTDA, em face da decisão que determinou à recorrente que desocupe o imóvel de matrícula n. 57.534, no prazo de 90 (noventa) dias, para que seja devolvido à recuperanda, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Em suas razões recursais a agravante relatou que em 29.08.2018 celebrou contrato de promessa de compra e venda com a agravada, envolvendo o imóvel matrícula nº 57.534, tendo pago no ato da assinatura da avença a quantia de R$ 2.000.000,00 (...), restando um saldo de R$ 1.000.000,00 (...). Preliminarmente, invocou violação ao princípio da não surpresa, uma vez que não lhe foi oportunizado manifestar-se nos autos da Recuperação Judicial, em que não figura como credor, acerca da determinação de desocupação do imóvel. Requereu a desconstituição da decisão por violação aos artigos e 10º do CPC. No mérito, discorreu sobre os negócios da agravante e a indispensabilidade do imóvel para o regular desempenho de sua atividade econômica. Suscitou má-fé da recuperanda pois poucos meses após ter ajustado a compra e venda, a agravada ingressou com pedido de Recuperação Judicial, sem informar ao juízo acerca da negociação anteriormente entabulada, bem como sobre o valor recebido. Discorreu sobre a boa fé nos contratos e que a agravante tem legítima expectativa sobre a Compra e Venda, pois ao tempo do negócio não havia processo de recuperação judicial, bem como porque o contrato previa cláusula de baixa de restrições no bem, o que perfectibilizaria a alienação com a quitação dos débitos fiscais frente a União. Ressaltou que tanto a agravante quanto a União foram prejudicadas com a transformação do bem em UPI no plano de recuperação, uma vez que o imóvel serve de garantia à dívidas fiscais contraídas pela recuperanda frente a União. Referiu que inexistindo o arrependimento eficaz por parte da vendedora, a posse da agravante no imóvel é justa e legítima, ressaltando, ainda, que o pacto não se submete aos efeitos da recuperação, posto que firmado em data pretérita, anterior à concessão do favor judicial. Requereu a concessão de efeito suspensivo a fim de ser mantido na posse do bem, e, no mérito, postula a revogação da ordem para que o agravante se mantenha na posse de forma definitiva, até que o contrato seja perfectibilizado ou exercido o direito de arrependimento pelo agravado.

Foi concedido efeito suspensivo ativo para manter a agravante na posse do bem, até solução de mérito. (evento 7).

Contrarrazões pela recuperanda no evento 6.

O Administrador Judicial se manifestou no evento 20.

O MP opinou pelo não conhecimento das preliminares recursais e contrarrecursais, e desprovimento do agravo no mérito (evento 36).

Os autos vieram-me conclusos para julgamento.

É o relatório

VOTO

Trata-se, consoante sumário relatório, de agravo de instrumento interposto em face da decisão judicial que, nos autos da ação de recuperação judicial, determinou à recorrente que desocupe o imóvel de matrícula n. 57.534, no prazo de 90 (noventa) dias para que seja devolvido à recuperanda, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

A decisão agravada, da lavra da Dra. CAROLINA GRANZOTTO, é do seguinte teor, sic:

Vistos.

No Evento 153 o Município informou os débitos judiciais e administrativos da recuperanda.

A Administração judicial anexou relatórios de atividades (Evento 157).

A recuperanda apresentou manifestação (Evento 162), noticiando que para garantir efetividade ao plano de recuperação judicial, iniciou estratégia para garantir a alienação do imóvel constituído unidade produtiva isolada. Esclareceu que a questão relativa à posse do imóvel é discutida em ação da manutenção de posse promovida pela Rio Grande Fertilizantes. Defendeu que as decisões proferidas nos presentes autos inviabilizam os pedidos da promitente compradora. Ressaltou que a alienação do imóvel é indispensável para o cumprimento do plano. Requereu, após a oitiva do Síndico e do MP, a devolução da posse, com o arbitramento de multa diária de cinco mil reais até a afetiva desocupação do imóvel.

No Evento 168 foram anexados balancetes de agosto de 2021.

A Administração Judicial apresentou parecer (Evento 170), apontoando, inicialmente, a necessidade de intimação da recuperanda para que se manifeste sobre as providências tendentes à regularização dos débitos tributários municipais. Sobre a questão envolvendo o imóvel objeto da promessa de compra e venda celebrada com a Rio Grande Fertilizantes, recordou que a discussão não é nova nos autos e já foi objeto de apreciação pelo TJRS, em sede de agravo de instrumento. Fez considerações sobre o contrato celebrado e as decisões judiciais proferidas a respeito da questão. Mencionou que a definição quanto à posse do imóvel deve ser dirimida na ação possessória. Registrou que a procedência do pedido de manutenção de posse não resolverá o impasse, face a impossibilidade de transferência da propriedade à Rio Grande Fertilizantes. Aduziu que a implementação do plano depende da resolução do imbróglio envolvendo o imóvel, opinando, entretanto, pelo indeferimento do pedido formulado no Evento 162. Manifestou ciência do ofício enviado na ação de nº. 5007177-98.2020.8.21.0023, bem como dos balancetes apresentados pela recuperanda. Informou que o agravo de instrumento relativo aos pedidos formulados pela Rio Grande Fertilizantes transitou em julgado, e que ao recurso interposto pela recuperanda contra ressalvas do plano de recuperação não foi atribuído efeito suspensivo, estando o mesmo pendente de julgamento.

No Evento 172 foi anexado novo relatório de atividades da Administração Judicial.

Sobreveio notícia de julgamento de improvimento do agravo de instrumento interposto contra a sentença que homologou o plano com ressalvas (AI 5063178-90.2021.8.21.7000).

A recuperanda anexou balancetes de setembro de 2021 (Evento 181).

O Ministério Público manifestou concordância com o parecer da Administração Judicial (Evento 185).

No Evento 187 a recuperanda apresentou nova manifestação, reiterando a necessidade de desocupação do imóvel para implementação do plano. Fez impugnações ao parecer do Administrador Judicial. Sobre o passivo tributário, registrou que sua regularização depende da destinação dos recursos oriundos da alienação da UPI. Renovou o pedido de desocupação do imóvel.

Os balancetes de outubro de 2021 foram juntados (Evento 189).

Pois bem.

Conforme relatado, resta pendente a questão relativa à posse do imóvel constituído unidade produtiva isolada.

De fato, a negociação envolvendo a recuperanda e a Rio Grande Fertilizantes não é nova, tendo em vista que já foi reconhecida, neste feito, a impossibilidade de transferência da propriedade do imóvel, o que foi confirmado em sede de agravo de instrumento, transitado em julgado em março de 2021.

Após a sentença de homologação do plano, e ausente recurso a respeito da constituição da UPI e previsão de alienação, a recuperanda notificou a RG Fertilizantes, solicitando a devolução do imóvel, o qual será alienado, nos termos do artigo 60 da LRF.

O pedido de restituição não foi atendido e a RG Fertilizantes ingressou com ação de manutenção de posse (5005841-25.2021.8.21.0023), julgada improcedente.

A fim de evitar desnecessária tautologia, oportuno transcrever os fundamentos da sentença proferida na ação possessória:

" (...)

As partes celebraram, em 29 de agosto de 2018, promessa de compra e venda, comprometendo-se a ré a vender à autora o imóvel registrado na matrícula n. 57.534 do Livro 2 do Registro de Imóveis de Rio Grande/RS.

O parágrafo primeiro da cláusula terceira do negócio celebrado (Evento 1, CONTR5) assim estabeleceu:

Dessa forma, as partes ajustaram o pagamento de R$ 2.000.000,00 na assinatura do contrato e o adimplemento do saldo após a outorga da escritura definitiva de compra e venda.

Para a perfectibilização da compra e venda seria necessário, ainda, o levantamento das penhoras do imóvel, circunstância que era de pleno conhecimento da compradora, estando expressamente prevista no contrato, conforme cláusulas segunda e quarta:

(...)

Além da necessidade de levantamento dos gravames, o contrato celebrado contém cláusula de arrependimento, o que se depreende do parágrafo segundo da cláusula terceira:

Incontroverso que não houve o levantamento das penhoras, inexistindo notícia de interpelação da autora quando ao inadimplemento do réu. Em sequência, a parte ré ingressou com ação de recuperação judicial, arrolando o imóvel objeto da discussão dentre seus bens, bem como indicando o recebimento dos valores relativos a parte do negócio.

Nos autos da recuperação judicial, a parte autora noticiou o negócio celebrado com a recuperanda, pugnando a transferência da propriedade, pleito que foi indeferido, pois inviável o cumprimento da promessa em virtude da existência de penhoras.

Diante de tal cenário, a recuperação teve andamento, com a homologação do plano de recuperação, sendo o imóvel constituído unidade produtiva isolada, nos termos do artigo 60 da Lei 11.101/05. A ré, em razão da autorização de alienação do bem, notificou a autora para desocupar o imóvel (Evento 1, NOT13).

Para embasar o pedido de manutenção de posse, em suma, a autora destaca que as decisões da recuperação não interferem no seu...

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