Acórdão nº 50644969020208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Terceira Câmara Cível, 30-08-2022

Data de Julgamento30 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50644969020208210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Terceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002539500
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

23ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5064496-90.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador JORGE LUIS DALL AGNOL

APELANTE: COOPERATIVA DE ECONOMIA E CREDITO MUTUO DOS PROFESSORES ESTADUAIS DA REGIAO METROPOLITANA DE PORTO ALEGRE (RÉU)

APELANTE: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

APELADO: DANIEL RAMOS DA SILVA (AUTOR)

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação interposta por COOPERATIVA DE ECONOMIA E CREDITO MUTUO DOS PROFESSORES ESTADUAIS DA REGIAO METROPOLITANA DE PORTO ALEGRE - EDUCREDI e FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO da sentença que, nos autos da ação de obrigação de fazer proposta por DANIEL RAMOS DA SILVA julgou procedentes os pedidos para o fim de: a) limitar os descontos em folha de pagamento relativos ao empréstimo consignado em folha de pagamento da parte autora no patamar de 30% de seus rendimentos brutos, observada a dedução dos descontos obrigatórios e a proporcionalidade do empréstimo, nos termos da fundamentação supra, confirmando a decisão liminar proferida pelo Tribunal de Justiça; b) determinar que a financeira ré não efetue qualquer bloqueio na conta corrente da parte autora que não seja correspondente ao empréstimo consignado, retificando a decisão liminar quanto ao ponto. Condenou os réus, solidariamente, ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios ao procurador da parte autora, que arbitro em 15% sobre o valor da causa atualizado, considerando o trabalho do profissional, a natureza da causa, o tempo de tramitação e a não realização de instrução, com base no art. 85, § 2º, do CPC (evento 39 do processo originário).

Em suas razões, a apelante aduz que, em relação ao pedido de limitação de desconto em 30%, é necessária a participação do ente pagador e de todas as consignatárias ou instituições financeiras concedentes dos créditos consignados no polo passivo da ação, referindo que há litisconsórcio necessário obrigatório e requerendo a extinção do feito sem resolução do mérito. Assevera que há necessidade de participação do Estado no polo passivo, devendo ser reconhecida a competência da vara da Fazenda Pública. Diz que, aos servidores públicos estaduais do Rio Grande do Sul, aplica-se a limitação de descontos em folha no percentual de 70% sobre sua remuneração mensal bruta, consoante, Decreto Estadual nº 43.574/2005. Refere sobre a impossibilidade de aplicação analógica da Lei Federal n. 10.820/2003. Requer, alternativamente ao reconhecimento da inaplicabilidade de qualquer limitação em 30% relacionada ao autor, que se reconheça o limite de descontos de 70% para todos os descontos (obrigatórios, mensalidades, empréstimos) e de 30% exclusivamente para empréstimos bancários, ou que os descontos sejam efetuados de forma proporcional entre os demandados, não se afigurando medida justa a limitação em ordem cronológica. Postula o provimento do recurso, para que seja reformada a sentença (Evento 44 do processo originário).

Apresentadas as contrarrazões (evento 48 do processo originário).

É o relatório.

VOTO

A recorrente insurge-se da sentença cujo dispositivo foi redigido nos seguintes termos:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados DANIEL RAMOS DA SILVA em face da FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO e EDUCRED ( COOPERATIVA DE ECONOMIA E CREDITO MUTUO DOS PROFESSORES ESTADUAIS DA REGIAO METROPOLITANA DE PORTO ALEGRE ) , o que faço com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC, para o fim de:

a) LIMITAR os descontos em folha de pagamento relativos ao empréstimo consignado em folha de pagamento da parte autora no patamar de 30% de seus rendimentos brutos, observada a dedução dos descontos obrigatórios e a proporcionalidade do empréstimo, nos termos da fundamentação supra, confirmando a decisão liminar proferida pelo Tribunal de Justiça;

b) DETERMINAR que a financeira ré não efetue qualquer bloqueio na conta corrente da parte autora que não seja correspondente ao empréstimo consignado, retificando a decisão liminar quanto ao ponto.

CONDENO os réus, solidariamente, ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios ao procurador da autora, que arbitro em 15% sobre o valor da causa atualizado, considerando o trabalho do profissional, a natureza da causa, o tempo de tramitação e a não realização de instrução, com base no art. 85, § 2º, do CPC.

Face à inexistência de juízo de admissibilidade, em caso de interposição de recurso, sistemática do Código de Processo Civil, proceda-se à intimação da parte contrária para que apresente contrarrazões, querendo, no prazo legal. Transcorrido o prazo, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça/RS.

Registre-se. Intimem-se.

Inicialmente, não conheço do pedido de participação do ente pagador e de todas as consignatárias ou instituições financeiras concedentes dos créditos consignados no polo passivo da presente demanda, porquanto se trata de inovação recursal. Tal alegação não foi objeto de contestação e não houve manifestação do juízo do origem, logo inviável a apreciação por esta Corte. Ademais, os empréstimos consignados em nome do apelado foram realizados com a apelante.

Afasto a alegação de incompetência da justiça comum, porquanto não há ente público no polo passivo da demanda.

Passo ao exame do mérito do presente recurso.

No tocante ao desconto em folha de pagamento das prestações referentes à contratação firmada entre as partes (contrato de mútuo), o Egrégio Superior Tribunal de Justiça tem posição uniforme, qual seja, limitar, tais descontos, em 30% dos vencimentos, em observância aos princípios da função social do contrato e da dignidade da pessoa humana. Nesse sentido:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATO. EMPRÉSTIMO BANCÁRIO. DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA-CORRENTE. HIPÓTESES DISTINTAS. LIMITAÇÃO AO PERCENTUAL DE 30%. VIOLAÇÃO À DIGNIDADE. COMPROMETIMENTO DO SUSTENTO DO DEVEDOR. INEXISTÊNCIA. REVISÃO. REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

1. Segundo orientação jurisprudencial vigente no Superior Tribunal de Justiça, em observância aos princípios da função social do contrato e da dignidade da pessoa humana, o adimplemento de obrigação assumida em contrato de mútuo bancário na modalidade de consignação em pagamento está limitada ao percentual de 30%.

2. Todavia, segundo jurisprudência firmada pela Segunda Seção deste Tribunal Superior, a limitação dos descontos aplicados à remuneração não pode ser estendida às constrições efetuadas em conta-corrente, que, pela natureza do contrato firmado com a instituição financeira, não podem sofrer restrição quanto aos lançamentos de créditos e débitos nela inseridos. (...) 4. Agravo interno desprovido (AgInt no REsp 1812927/DF, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, julgado em 14/10/2019, DJe 22/10/2019).

Esta Câmara possui igual entendimento, conforme se verifica nos seguintes julgados:

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. DECLARATÓRIA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO. Exegese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de limitação dos descontos voluntários em 30% e, concomitantemente, limitação em 70% de todos os descontos. Caráter supletivo da legislação estadual frente à normatividade federal. No caso é hipótese de limitação dos descontos em folha de pagamento em 30% da remuneração, uma vez que há provas nos autos a respeito de descontos em folha de pagamento superior à limitação legal, restando valor ínfimo para a sobrevivência da consumidora e de...

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