Acórdão nº 50657359520218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Segunda Câmara Cível, 24-02-2022

Data de Julgamento24 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50657359520218210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Segunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001523425
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

12ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5065735-95.2021.8.21.0001/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5065735-95.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Cancelamento de vôo

RELATOR: Desembargador UMBERTO GUASPARI SUDBRACK

APELANTE: TRANSPORTES AEREOS PORTUGUESES SA (RÉU)

ADVOGADO: JOÃO JOAQUIM MARTINELLI (OAB RS045071)

APELADO: ADRIANO RODRIGUES SARAIVA (AUTOR)

ADVOGADO: MARCELA CAMARGO SAVONITTI JAHN (OAB RS079813)

APELADO: FABIANA SEELIG ROSARIO (AUTOR)

ADVOGADO: MARCELA CAMARGO SAVONITTI JAHN (OAB RS079813)

RELATÓRIO

De início, transcrevo o relatório da sentença:

Vistos.

I – Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS ajuizada por FABIANA SEELIG ROSARIO e ADRIANO RODRIGUES SARAIVA contra TRANSPORTES AEREOS PORTUGUESES S.A., narrando, em suma, estarem passando um período de férias em Lisboa/Portugal no mês de março/2020 e, em função surto do Coronavírus, acabaram alterando os seus planos e adquirindo junto à empresa ré, em 16/03/2020, duas passagens para retornarem para Porto Alegre, no valor unitário de R$4.035,95 (totalizando o pagamento de R$8.071,90). Informam que o voo TP117 sairia de Lisboa no dia 19/03/2020 às 11 horas e chegaria em Porto Alegre às 19h30min, no entanto, com menos de 24 horas de antecedência do embarque, a companhia ré encaminhou comunicado informando que, em razão do surto de Coronavírus, o voo tinha sido cancelado. Alegam não ter a demandada fornecido nenhuma alternativa, simplesmente comunicou não haver possibilidade de retorno ao Brasil naquele momento, devendo os autores remarcarem as passagens pelo site da companhia, quando então os valores pagos seriam devolvidos por meio de um voucher com validade de um ano. Relatam terem se dirigido ao aeroporto no dia e horário inicialmente contratado (19/03/2020 às 11h), objetivando solucionarem o problema, mas houve total descaso da companhia requerida, mesma oportunidade na qual souberam por outros passageiros - e não pela companhia ré - que existiam voos disponíveis para o dia 20/03/2020 para a cidade de São Paulo e de lá pegariam um voo doméstico para Porto Alegre. Aduzem terem despendido gastos de Lisboa para São Paulo de R$25.909,16, além do valor de R$1.804,98 gasto com as passagens internas no Brasil. Discorrem, outrossim, acerca da falha na prestação de serviço e requerem uma reparação pecuniária de ordem material de R$27.714,14 e na esfera moral de R$16.000,00 (R$8.000,00 para cada autor). Postulam pela inversão do ônus da prova e, por fim, pela procedência da ação.

Contestando (Evento 8), a demandada alega não ter cancelado os voos por mera liberalidade, mas sim em razão da decretação da pandemia mundial e ter informado devidamente os autores, em 18/03/2020, quanto ao cancelamento do voo, ou seja, com um dia de antecedência, motivos pelos quais não há o que se falar em falha na prestação do serviço, tendo em vista que comunicou os autores com a devida antecedência sobre os cancelamentos, bem como não possuía qualquer obrigação de prestar assistência material, conforme artigos 2° e 3° da Resolução 556 da ANAC. Discorre acerca da inexistência de danos materiais e morais, bem como de impossibilidade de aplicação do Código de Defesa do Consumidor e da inversão do ônus probatório. Pede, ao final, a improcedência da ação.

Réplica no Evento 14.

É o relatório. Decido.

Sobreveio julgamento, nos seguintes termos:

III - FACE AO EXPOSTO, julgo procedente a ação para condenar a demandada ao pagamento de

a) R$27.714,14 relativo às passagens aéreas adquiridas em 19/03/2020, acrescido de correção monetária pelo IGP-M desde a data do respectivo desembolso (Súmula 43, STJ) e juros de mora desde a citação (artigo 405 do Código Civil);

b) R$16.000,00 a título de danos morais, acrescidos de correção, pela variação do IGP-M, a partir da data de hoje, e de juros de 12% ao ano, calculados da dta da citação (artigo 405 do Código Civil).

Sucumbente, arcará a ré com o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios `fixados em 10% do valor corrigido da condenação, nos termos do disposto no artigo 85, § 2º, do Código de Código Civil).

Na fixação dos honorários advocatícios considerei o grau de zelo na elaboração das peças processuais, o local da prestação do serviço – coincidente com aquele de localização do escritório da procuradora dos autores, circunstância a informar a existência de maior facilidade no cumprimento do mandato outorgado -, o trabalho realizado pela advogada e o tempo necessário para sua realização, inclusive decorrente do necessário acompanhamento processual, eis que ajuizada a ação em 24/06/2021.

Inconformada, recorre a transportadora demandada.

Em suas razões, afirma não ter agido de modo antijurídico, ou mesmo causado lesão de qualquer espécie aos requerentes. Afirma, nesse sentido, ter a pandemia ocasionado efeitos deletérios junto ao setor aéreo, afetando sua malha aérea. Assevera ter cumprido com o disposto no artigo 2º da Resolução nº 556 da ANAC, porquanto comunicado os passageiros a respeito da mudança de seu voo com mais de vinte e quatro horas de antecedência. Aduz, ainda, que a mesma Resolução não a obrigaria a prestar assistência material na hipótese de fechamento de fronteiras ou espaço aéreo em decorrência dos efeitos da pandemia. Defende inexistir dano moral indenizável e que, ainda que assim fosse, seria necessário proceder ao redimensionamento da verba fixada na origem. Aponta igualmente descaber qualquer indenização por danos materiais, visto que ausente responsabilidade por eventuais trechos percorridos em território brasileiro. Alega que, quando muito, seria possível determinar o reembolso, exclusivamente, dos valores correspondentes às passagens não usufruídas. Assim, pede o provimento do recurso.

Com contrarrazões, vieram os autos conclusos para julgamento.

VOTO

É impositiva a manutenção do decidido na origem, pois, na esteira do disposto no artigo 373, inciso I, do CPC/2015, lograram os demandantes comprovaram a conduta ilícita da requerida.

Com efeito, a conduta da ré causa, inclusive, perplexidade.Veja-se, afinal, que o cancelamento do voo aprazado para o dia 19/03/2020 teria se dado em virtude de supostas dificuldades operacionais decorrentes do coronavírus, daí porque incompreensível que os autores, ao fim e ao cabo, tenham se vistos obrigados a comprar novas passagens na mesma empresa requerida, para viajar de Portugal ao Brasil, no dia 20/03/2020 (EVENTO 1 OUTROS 8).

Nesse passo, é evidente não ter a requerida cumprido com suas obrigações contratuais, tampouco prestado assistência adequada. De fato, não houve mera comunicação sobre alteração do horário do voo, mas efetivo cancelamento da viagem aprazada para 19/03/2020 e ausência de realocação dos passageiros em outra aeronave, o que somente foi possível, aliás, em virtude da ação dos próprios demandantes.

No mesmo sentido, consequentemente, é cabível a reparação fixada a título de danos morais, a qual atende às diretrizes do artigo 944 do CC/2002. Deveras, a negligência da requerida, na presente hipótese, revelou-se considerável, na medida em que comunicado o cancelamento do voo dos demandantes em 18/03/2020 sem que a eles fosse ofertada alternativa (EVENTO 1 EMAIL 5), situação essa que os obrigou a adquirir novas passagens para o dia 20/03/2020, e a remanejar seu planejamento inicial.

Da mesma forma, viável o reembolso das quantias despendidas pelos autores, tanto no que tange ao trecho Lisboa-São Paulo, quanto às demais viagens realizadas em território nacional (EVENTO 1 OUTROS 8 E 9). Afinal, essas despesas somente se fizeram necessárias em virtude da conduta desidiosa da demandada, a qual não assegurou aos demandantes que chegassem a seu destino - Porto Alegre - na forma contratada, ou por outros meios, embora estivesse a seu alcance assim proceder - inclusive, no que tange ao trecho internacional, por meio de seuas próprias aeronaves.

No mais, porquanto bem dirimida a questão na origem, transcrevo os fundamentos da sentença da lavra do Juiz de Direito Walter José Girotto, a fim de que também integrem a presente decisão:

II - A lide comporta julgamento no...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT