Acórdão nº 50691152920218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 27-04-2022

Data de Julgamento27 Abril 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50691152920218210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002019984
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5069115-29.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias

RELATORA: Desembargadora LUCIA DE FATIMA CERVEIRA

APELANTE: GUIMARAES BRASIL INDUSTRIA E ALIMENTOS LTDA (AUTOR)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

GUIMARAES BRASIL INDUSTRIA E ALIMENTOS LTDA apela da sentença proferida nos autos da ação ordinária, movida contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, que assim dispôs:

Vistos.

(...)

Em face do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a presente ação, forte no art. 487, inc. I, do CPC.

Diante do resultado do julgamento, condeno a parte autora ao pagamento das custas e de honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, em conformidade com o disposto no art. 85, §§ 3º e 4º, inc. III, do CPC. O valor será atualizado monetariamente pelo IPCAE a contar da data do ajuizamento da ação (Súmula nº 14 STJ), e acrescido de juros de mora pela cardeneta de poupança, a partir do trânsito em julgado da presente decisão.

P. R. I.

Havendo apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões e, após, remeta-se o feito ao egrégio Tribunal de Justiça, com as homenagens deste juízo.

Diligências legais.

Em razões recursais, defende a parte apelante, em síntese que as mercadorias entregues em bonificação não integram a base de cálculo do ICMS, não podendo ser inseridas no mesmo. Sustenta ser contraditória a alegação na decisão da juíza de primeiro grau, visto que, em decisão proferida em ação de matéria idêntica (Processo 9026280-94.2017.8.21.0001), desta mesma Vara, ela própria referiu que a vinculação da nota de venda e da nota de bonificação pode ser demonstrada pela data e hora da emissão, não havendo necessidade de constar as bonificações na mesma nota fiscal de venda. Postula pela falta de coerência entre uma decisão e outra, mesmo sendo referida pela mesma Juíza, prejudicando o direito de a autora realizar a compensação dos valores pagos indevidamente, visto que é consolidada a decisão de não recolhimento de ICMS sobre mercadoria dada em bonificação. Requer a reforma da sentença. Pede provimento.

Com as contrarrazões, o Ministério Público opina pelo conhecimento e desprovimento do apelo.

Vêm os autos conclusos para julgamento.

Observado o disposto nos artigos 931 e 934 do Código de Processo Civil.

É o relatório.

VOTO

A base de cálculo do ICMS, por força do que estabelece o art. 155, §2º, inc. XII, “i”, da Constituição Federal, é definida pelo art. 13 da Lei Complementar n. 87/96, que dispõe, in verbis:

Art. 13. A base de cálculo do imposto é:

I - na saída de mercadoria prevista nos incisos I, III e IV do art. 12, o valor da operação

.......................................................................................

§ 1o Integra a base de cálculo do imposto, inclusive na hipótese do inciso V do caput deste artigo:

I - o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle;

II - o valor correspondente a:

a) seguros, juros e demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas, bem como descontos concedidos sob condição; [grifado]

Da redação legal extrai-se, contrario sensu, que os descontos incondicionais ou bonificações não integram a base de cálculo do ICMS.

Este, inclusive, é o entendimento adotado pelo E. STJ no julgamento do REsp n. 1.111.156/SP, submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, que deu origem ao verbete n. 4571 da sua Súmula.

Para que a remessa de mercadorias seja considerada bonificação, entretanto, faz-se necessária sua vinculação direta a uma transação de compra e venda. Uma operação isolada a que se dá o nome de “bonificação” não pode ser excluída da tributação, notadamente porque, nessa hipótese, não há desconto em razão da venda de um lote maior.

A bonificação e o desconto incondicional pressupõem a existência de um negócio de compra e venda subjacente, havendo uma correlação entre a doação e a venda, pois sem esta última não ocorreria aquela. Desta relação, decorre uma operação específica e bem determinada, qual seja, a venda com bonificação.

Dentro desta dinâmica, o desconto ou bonificação sempre equivalerão a uma parcela do todo maior constante na nota fiscal, num percentual aceitável, como por exemplo 20% ou 30% do valor da nota fiscal. Todavia, se o desconto ou bonificação equivalem a 100% do valor da nota, não há desconto, mas se presume a burla tributária com o claro intuito de evitar-se a tributação sobre a remessa da mercadoria.

Aplicável à espécie, o art. 10, §2º, alínea ‘b’, da Lei Estadual n. 8.820/89, que prevê que “não integra a base de cálculo do imposto o valor dos descontos concedidos no ato da emissão do documento fiscal, desde que constem deste.

Desse modo, para que não haja incidência do ICMS sobre o valor das mercadorias dadas em bonificações ou em descontos incondicionais, é necessário que tais rubricas venham destacadas no próprio documento fiscal de compra e venda. Portanto, somente os descontos que constam no próprio documento fiscal podem ser excluídos da base de cálculo, assim caso a empresa autora emita notas fiscais separadas para as mercadorias dadas em bonificação, ela estaria obrigada a pagar o imposto.

Na hipótese, a parte autora busca o reconhecimento do direito à não incidência de ICMS sobre as bonificações, todavia, através das notas fiscais acostadas aos autos, observa-se que a bonificação não se encontra vinculada a qualquer operação mercantil. A empresa não menciona na nota fiscal de bonificação o número da nota fiscal de venda a qual essa está atrelada.

Como bem referiu a sentença, o fato de as notas fiscais de bonificação terem sido emitidas na mesma data e com horário e numeração próximos aos das notas fiscais de venda, por si só, não é suficiente para comprovar a vinculação entre ambas operações.

Ora, nesses casos em que ausente vinculação da bonificação com a operação mercantil, 100% dos produtos remetidos receberam o tratamento da bonificação, sem que tenha sido demonstrado, sequer minimamente, sua vinculação a uma operação de compra e venda de lote maior.

Ainda que estivesse demonstrada tal vinculação, a pretensão inicial encontra óbice no fato de que as mercadorias constantes das notas fiscais não foram remetidas ao consumidor final, mas sim aos supermercados, para posterior venda.

A vedação da incidência do ICMS incidiria tão somente se a bonificação em questão beneficiasse consumidor final. Ausente, contudo, prova nesse sentido, inviável a exclusão dos valores correspondentes às mercadorias enviadas em bonificação da base de cálculo do ICMS.

Sobre a matéria, seguem precedentes deste E. Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. REMESSA EM BONIFICAÇÃO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. INOCORRÊNCIA DE CONTRADIÇÃO ENTRE A FUNDAMENTAÇÃO E O DISPOSITIVO. OPERAÇÕES SUJEITAS AO REGIME DE SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA (ICMS-ST): RECOLHIMENTO DO ICMS SOBRE O VALOR CHEIO. OPERAÇÕES PRÓPRIAS: NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO NO MESMO DOCUMENTO FISCAL PARA NÃO INCIDÊNCIA DO ICMS.

1. Sem lastro a arguição de nulidade da sentença calcada que está em suposta contradição entre a fundamentação e o dispositivo. Mera leitura corrida da sentença é o bastante para se verificar que julgou improcedente a pretensão porque, quanto às operações próprias, entendeu não observado o disposto na legislação estadual; e, quanto às operações em regime de substituição tributária, entendeu incabível a exclusão do valor das mercadorias dadas em bonificação. Portanto, a sentença nada tem de contraditória, além de atender, com suficiência necessária, ao disposto no art. 93, inc. IX, da Constituição Federal e ao contido no art. 489 do CPC.

2. No que tange às operações sujeitas ao regime de substituição tributária (ICMS-ST), os valores correspondentes às mercadorias dadas em bonificação, assim como os descontos incondicionais, integram a base de cálculo do ICMS. Precedente do STJ.

3. Por ocasião do julgamento do REsp nº 1111156/SP, submetido ao rito dos recursos repetitivos, o qual deu ensejo à edição da Súmula nº 457 do STJ, restou definido que, na operação de venda com bonificação, as mercadorias doadas não integram a base de cálculo do ICMS. Portanto, nas operações próprias, inexiste dúvida quanto ao fato de que, em se tratando de mercadoria remetida sob a forma de bonificação, de regra, não há incidência do ICMS. Isso porque se constituem em descontos incondicionais, razão pela qual não possuem preço sobre o qual se possa fazer incidir a exação. Todavia, incide o art. 10, § 2º, alínea b, da Lei Estadual nº 8.820/89 (Instituiu o ICMS no Estado do Rio Grande do Sul), o qual exige que os descontos incondicionais estejam destacados no mesmo documento fiscal de compra e venda. Como a legislação estadual, no âmbito de sua competência legislativa, disciplinou a necessidade de indicação da bonificação na própria nota fiscal de compra e venda que materializa o negócio jurídico, não há como passar por cima dessa exigência.

4. Honorários de sucumbência majorados em razão do disposto no art. 85, §§ 1º e 11, do CPC, além do Enunciado Administrativo nº 07 do STJ. APELAÇÃO DESPROVIDA.

(Apelação Cível Nº 70079238317, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em 14/11/2018)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA REJEITADA. AÇÃO DECLARATÓRIA. ICMS. BASE DE CÁLCULO. MERCADORIAS DADAS EM BONIFICAÇÃO.

I. Rejeitada a preliminar de nulidade da sentença, por contradição entre o dispositivo e a fundamentação, tendo em vista a sua inocorrência. Congruência entre os fundamentos e a parte dispositiva.

II. Na operação de venda de mercadorias com...

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