Acórdão nº 50704933820228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo50704933820228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002282342
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5070493-38.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes do Sistema Nacional de Armas (Lei 9.437/97 e Lei 10.826/03)

RELATOR: Desembargador ROGERIO GESTA LEAL

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo em execução interposto por Fernando dos Santos dos Santos contra a decisão do MM. Juízo da Vara de Execuções Criminais da Comarca de Ijuí/RS, que, após o cometimento de novo delito no curso do livramento condicional, reconheceu a falta grave, determinando a regressão cautelar do regime carcerário e a alteração da data base para novos benefícios.

Nas razões, alegou nulidade da decisão, em face do não enfrentamento das teses defensivas apresentadas em memoriais, configurando ausência de fundamentação. No mérito, sustentou que o cometimento de novo delito, no curso do benefício não caracteriza falta grave, visto que a violação da regra do livramento condicional de não cometer novo delito corresponde a sanção específica prevista no art. 88, do CP, qual seja, revogação do benefício e a perda do período de prova. Acrescentou que não há sentença condenatória transitada em julgado sobre o novo delito imputado ao apenado, não permitindo o reconhecimento da falta grave. Requereu o acolhimento da preliminar de nulidade da decisão para que outra seja proferida. No mérito, postulou o provimento do recurso, afastando o reconhecimento da falta grave no curso do livramento condicional para o qual há consequências distintas. Subsidiariamente, requereu o não reconhecimento da falta grave cometida no curso do cumprimento do livramento condicional por ausência de prova da prática de novo delito pelo apenado (evento 3 - agravo 1).

Nas contrarrazões, o Ministério Público postulou o afastamento da preliminar, e, no mérito, o improvimento do recurso (evento 3 - fls. 317/322 ).

O juízo manteve a decisão agravada, referindo o envio à VEC da condenação do apenado no processo nº5005995-64.2021.8.21.0016, da 1ª Vara Criminal de Ijuí (evento 3 - fl. 343).

VOTO

Na data de 11.08.2020, foi concedido o livramento condicional para o agravante Fernando dos Santos dos Santos, eis que preenchidos os requisitos contidos no art. 83, do CP.

Durante o seu cumprimento, restou noticiado que o apenado cometeu novo delito e foi preso preventivamente. Diante disso, em 25.08.2021, o magistrado determinou a suspensão do livramento condicional, informando a manutenção da suspensão enquanto não transitada em julgado a decisão final do processo pelo qual o agravante estava recolhido.

Em 05.10.2021, o juízo reconheceu a falta grave e determinou o seu recolhimento junto ao regime semiaberto, fixando a data da prisão (11.08.2021) como data-base "para a concessão de novos benefícios, exclusivamente para fins de progressão de regime".

Não é nula a decisão que deixa de enfrentar todas as teses defensivas. O magistrado não está obrigado a abordar todas as propostas apresentadas pelas partes, devendo, entretanto, apresentar explicitamente os fundamentos do seu decidir. No caso, ainda que a decisão não tenha enfrentado todos os argumentos apresentados pela defesa do apenado, está devidamente motivada, não existindo nulidade a ser declarada.

Por outro lado, o cometimento de novo delito no curso da execução penal, embora possa ser configurado como falta grave, não se aplica ao livramento condicional, nos termos do art. 86, inc. I, c/c o art. 88, ambos do CP, e art. 145, da LEP, e tem como consequência a incidência das regras próprias do referido benefício (arts. 83 a 90, do CP, e arts. 131 a 146, da LEP).

Assim, conforme a orientação do Superior Tribunal de Justiça, entende-se que cometimento de fato definido como crime doloso no curso do livramento condicional acarreta a suspensão do benefício e não falta grave:

HABEAS COUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. EXECUÇÃO PENAL. NOVA INFRAÇÃO NO CURSO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL. AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. EFEITOS DA PRÁTICA DE NOVA INFRAÇÃO NÃO SE CONFUNDEM COM OS CONSECTÁRIOS LEGAIS DA FALTA GRAVE. HABEAS COUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.

I – [...] II - A controvérsia, na hipótese vertente, circunscreve-se a definir se o cometimento de novo crime no curso do livramento condicional configura a prática de falta grave, nos termos do art. 52 da Lei de Execuções Penais, ou, se, com incidência das regras próprias do referido benefício, na forma dos arts. 83 a 90 do Código Penal e arts. 131 a 146 da LEP, tem por efeito apenas a sua suspensão e posterior revogação, com a desconsideração do tempo que o apenado esteve liberado.

III - Os efeitos da prática de outra infração penal no curso do livramento condicional, de fato, submetem-se às regras próprias deste benefício e, portanto, não se confundem com os consectários legais da falta grave. Precedentes.

IV - Revela-se, assim, manifestamente ilegal determinar a realização de audiência de justificação para apuração de infração disciplinar, que, fosse o caso, deveria ser apurada mediante instauração de Procedimento Administrativo Disciplinar, como é o entendimento desta Corte Superior.

Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para cassar o v. acórdão impugnado e afastar a apuração de falta grave em vista do cometimento de nova infração penal no curso do livramento condicional (HC 479.923/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 26/02/2019, DJe 07/03/2019)

No mesmo sentido:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. PRÁTICA DE FATOS DEFINIDOS COMO CRIME NO CURSO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL. REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO. INEXISTÊNCIA DE FALTA GRAVE. ART. 52 DA LEP. ENTENDIMENTO DO STJ. 1. A prática de crimes no curso do livramento condicional tem consequência próprias, que afastam o reconhecimento de falta grave, em que pese o teor do art. 52 da LEP. Precedentes. 2. No caso dos autos, logo após ser posto em livramento condicional, o recorrente praticou crimes que determinaram, inicialmente, a suspensão do benefício e, posteriormente, com o trânsito em julgado, a revogação do livramento condicional. Não se aplica à hipótese o reconhecimento da falta grave e tampouco as suas consequências, mantendo-se, somente, aquelas já estabelecidas por conta da revogação da benesse do art. 83 do CP. AGRAVO PROVIDO. (Agravo Nº 70080559867, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Julio Cesar Finger, Julgado em 11/04/2019)

AGRAVO EM EXECUÇÃO. CRIMES DO SISTEMA NACIONAL DE ARMAS. LIVRAMENTO CONDICIONAL. PRÁTICA DE CRIME DOLOSO DURANTE O PERÍODO DE PROVA DO ALUDIDO BENEFÍCIO. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE FALTA GRAVE. ALTERAÇÃO DE ENTENDIMENTO. POSIÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. A prática de fato classificado como crime doloso durante o período de prova do livramento condicional não configura falta grave, havendo consequências próprias previstas para tal agir. De acordo com o art. 86, inc. I, c/c o art. 88, ambos do CP, bem como o art. 145, da LEP, praticado novo crime, o livramento condicional deverá ser revogado e o tempo em que o apenado esteve solto não será descontado da pena. Em consequência, não há que se falar na designação de audiência de justificação. Entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça. Alteração de entendimento. Precedentes colacionados do STJ, TJRS e desta 4ª Câmara. AGRAVO MINISTERIAL DESPROVIDO.(Agravo, Nº 70080935844, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em: 25-04-2019)

AGRAVO EM EXECUÇÃO. LIVRAMENTO CONDICIONAL. PRÁTICA DE FATO DEFINIDO COMO CRIME DOLOSO. SUSPENSÃO DO BENEFÍCIO. O colendo Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que o cometimento de fato definido como crime doloso no curso do livramento condicional acarreta a suspensão do benefício, não ensejando falta grave a ser apurada. Agravo improvido. Unânime.(Agravo de Execução Penal, Nº 70084681493, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Julgado em: 17-12-2020)

Desse modo, apesar do cometimento, em tese, de novo delito durante o período em que estava sob livramento condicional, inviável a aplicação dos consectários legais inerentes à falta disciplinar de natureza grave, conforme determinado pelo juízo de execução.

Pelo exposto, voto por DAR PARCIAL provimento ao recurso, para afastar o reconhecimento da falta grave e suas sanções, mantendo-se apenas as consequências relativas à suspensão do livramento condicional.



Documento assinado eletronicamente por ROGERIO GESTA LEAL, Desembargador Relator, em 30/6/2022, às 16:21:48, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. A autenticidade do documento pode ser conferida no site https://eproc2g.tjrs.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=consulta_autenticidade_documentos, informando o código verificador 20002282342v43 e o código CRC 0c9bec71.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGERIO GESTA LEAL
Data e Hora: 30/6/2022, às 16:21:48



Documento:20002342066
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

Agravo de Execução Penal Nº 5070493-38.2022.8.21.7000/RS

RELATOR: Desembargador ROGERIO GESTA LEAL

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

VOTO DIVERGENTE

Rogando vênia ao preclaro Relator, tenho por bem divergir da solução proposta, a fim de negar provimento ao Agravo defensivo.

Na hipótese em julgamento, em que pese a divergência quanto à natureza jurídica do livramento condicional que, para muitos, se trataria de fase última do sistema progressivo da execução, o fato é que tal benefício está circunscrito no...

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