Acórdão nº 50733188620218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Câmara da Função Delegada dos Tribunais Superiores, 01-06-2022

Data de Julgamento01 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50733188620218217000
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001983664
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

Departamento de Recursos aos Tribunais Superiores

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

AGRAVO INTERNO EM Agravo de Instrumento Nº 5073318-86.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Padronizado

RELATOR: Desembargador ALBERTO DELGADO NETO

AGRAVANTE: JURACI MARIA CANAL RIEDI

AGRAVADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RELATÓRIO

Trata-se de agravo interno interposto por JURACI MARIA CANAL RIEDI contra a decisão que negou seguimento ao recurso extraordinário, tendo em vista o RE 855.178/SE (TEMA 793), interposto contra o julgamento do agravo de instrumento, em acórdão de seguinte ementa:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO A SAÚDE. HISTOPLASMOSE PULMONAR CRÔNICA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. VORICONAZOL. FÁRMACO QUE NÃO PERTENCENTE À RELAÇÃO NACIONAL DE MEDICAMENTOS ESSENCIAIS. TEMA 106 DO STJ. TEMAS 793 E 500 DO STF. ARTIGO 19-Q, DA LEI 8.080/90. REMESSA À JUSTIÇA FEDERAL.

O direito à saúde é direito fundamental do ser humano, corolário do direito à vida. As disposições constitucionais neste sentido são autoaplicáveis, dada a importância dos referidos direitos.

O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar na Primeira Seção o REsp 1657156, recurso repetitivo (Tema 106), assentou as premissas válidas para fornecimento de remédios fora da lista do Sistema Único de Sáude, quais sejam: a) comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; b) incapacidade financeira do paciente de arcar com o custo do medicamento prescrito; c) existência de registro do medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e d) a não configuração de tratamento experimental.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal retomou a discussão a respeito dos limites da atuação do Poder Judiciário na concretização do direito fundamental à saúde quando do julgamento do Recurso Extraordinário 657.718 (Tema 793), com repercussão geral conhecida, fixando as seguintes teses: 1) O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais; 2) A ausência de registro na Anvisa impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial. 3) É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da Anvisa em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos: I – a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil, salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras; II – a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; III – a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil. 4) As ações que demandem o fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa deverão ser necessariamente propostas em face da União.

Em sede de embargos de declaração, o mesmo sodalício expressou compreensão no sentido de que: v) Se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, material ou medicamento não incluído nas políticas públicas (em todas suas hipóteses), a União necessariamente comporá o pólo passivo, considerando que o Ministério da Saúde detém competência para a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica (art. 19-Q, Lei 8.080/90) de modo que recai sobre ela o dever de indicar o motivo da não padronização e eventualmente iniciar o procedimento de análise de inclusão, nos termos da fundamentação; vi) A dispensa judicial de medicamentos, materiais, procedimentos e tratamentos pressupõe ausência ou ineficácia da prestação administrativa e comprovada necessidade, observado, para tanto, os parâmetros definidos no art. 28 do Decreto Federal n. 7.508/11.

Na espécie, o medicamento postulado na petição inicial (VORICONAZOL) não consta elencado na RENAME 2020 ou REMUME, e sequer foi incorporado ao Sistema Único de Saúde, conforme se infere das informações disponibilizadas no sítio eletrônico da CONITEC.

Desta forma, em observância do Tema 793 do Supremo Tribunal Federal, aplico a orientação dos Tribunais Superiores em relação aos medicamentos não constantes da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais – RENAME, declinando dos autos para análise e julgamento perante a Justiça Federal por competência da União, haja vista se tratar de medicamento não padronizado no Sistema Único de Saúde.

Agravo provido.

Remessa à Justiça Federal.

A Agravante alega que “ao contrário do asseverado na decisão agravada, o acórdão expedido pela Colenda Câmara Cível desta Egrégia Corte Estadual está em contradição com o entendimento do Egrégio STF (...) o que se estabelece no Tema nº. 793, do STF, é o direito de regresso contra o ente administrativamente responsável pelo fornecimento do medicamento, porém, o tratamento médico adequado ainda segue no rol dos deveres dos entes públicos demandados, porquanto a responsabilidade é solidária entre entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente". Apresentadas as contrarrazões, vêm os autos conclusos. É o relatório.

VOTO

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 855.178/SE (TEMA 793), em sede de repercussão geral, assentou que “O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente”, em acórdão de seguinte ementa:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente.”

(RE 855178 RG / PE, Relator Min. LUIZ FUX, j. em 05/03/2015, DJe-050 DIVULG 13-03-2015 PUBLIC 16-03-2015)

Todavia, no julgamento dos embargos de declaração opostos contra o aludido acórdão, decidiram os Ministros por "ressignificar o precedente" e explicitar os desdobramentos da responsabilidade solidária dos entes federativos. Assim, foi fixada a tese de que "Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro" (grifou-se). O acórdão dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário 855.178/SE foi assim ementado:

"CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. DESENVOLVIMENTO DO PROCEDENTE. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE DE SOLIDÁRIA NAS DEMANDAS PRESTACIONAIS NA ÁREA DA SAÚDE. DESPROVIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. 1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. 2. A fim de otimizar a compensação entre os entes federados, compete à autoridade judicial, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, direcionar, caso a caso, o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. 3. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União. Precedente específico: RE 657.718, Rel. Min. Alexandre de Moraes. 4. Embargos de declaração desprovidos.
(RE 855178 ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 23/05/2019, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-090 DIVULG 15-04-2020 PUBLIC 16-04-2020)

Do voto do Ministro Edson Fachin, redator do acórdão dos embargos de declaração, extrai-se a seguinte conclusão:

"VI) DIANTE DE TODO O EXPOSTO:

(...)

3) Quanto ao desenvolvimento da tese da solidariedade enuncia-se o seguinte:

(...)

v) Se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, material ou medicamento não incluído nas políticas públicas (em todas as suas hipóteses), a União necessariamente comporá o polo passivo, considerando que o Ministério da Saúde detém competência para a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica (art. 19-Q, Lei 8.080/90), de modo que recai sobre ela o dever de indicar o motivo da não padronização e eventualmente iniciar o procedimento de análise de inclusão, nos termos da fundamentação" (Grifou-se)

No acórdão da Vigésima Primeira Câmara Cível, constou:

"Com efeito, o direito à saúde é direito fundamental do ser humano, corolário do direito à vida. As disposições constitucionais neste sentido são autoaplicáveis, dada a importância dos referidos direitos.

Compete à União, aos Estados e aos Municípios o resguardo dos direitos fundamentais relativos à saúde e à vida dos cidadãos, conforme regra expressa do art. 196 da Constituição Federal. Da mesma forma, dispõe claramente a Constituição Estadual, em seu art. 241, que a saúde é...

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