Acórdão nº 50736454720198210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50736454720198210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003194394
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Cível Nº 5073645-47.2019.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: De Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas

RELATOR: Desembargador SERGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES

RELATÓRIO

Trata-se de embargos de declaração opostos por SILVIO D. B. S. contra o acórdão que, à unanimidade, deu provimento ao recurso de apelação interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, contra a r. sentença que julgou extinta a representação movida, pela prática do ato infracional tipificado no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, reconhecendo a prescrição da pretensão socioeducativa do Estado.

Sustenta a defesa que o fato reflete a realidade de milhares de trabalhadores infantis, visto que adolescentes servem como fundamental força de trabalho para grandes organizações criminosas. Alega que devem ser considerados os aspectos jurídicos, sociais e humanos, nos termos dos tratados e convenções internacionais firmados pelo Brasil, priorizando a proteção dos trabalhadores infantis. Pede sejam acolhidos os embargos de declaração com pronunciamento expresso acerca da não aplicação dos tratados internacionais firmados pelo Brasil relacionados diretamente ao caso em epígrafe, especialmente as Convenções nº 182 e nº 183 e a Recomendação nº 190, ambas da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da violação dos art. 5º, §§ 1°, 2° e 3°, e art. 227, da Constituição Federal, da Emenda Constitucional nº 45/2004, e dos art. , , 98, 101 e 103, do ECA.

É o relatório.

VOTO

Estou desacolhendo os embargos de declaração opostos, pois não vislumbro qualquer vício formal no aresto.

No corpo do acórdão foram deduzidas de forma suficientemente clara as razões pelas quais foi, unanimemente, provido o recurso de apelação, não pendendo qualquer dúvida sobre o conteúdo do aresto, nem existe nele qualquer contradição, erro ou omissão, nem houve ofensa à legislação federal, sendo oportuno transcrever o voto lançado na íntegra:

Estou acolhendo o pleito recursal.

Com efeito, tem inteira razão o órgão do Ministério Público, pois, equivocadamente, foi lançada sentença reconhecendo a prescrição da pretensão punitiva estatal, extinguindo a punibilidade do adolescente.

De fato, é admissível a prescrição em matéria infracional, nos termos da Súmula nº 388 do Superior Tribunal de Justiça, mas é inadmissível o reconhecimento da prescrição in abstracto sem que tenha transcorrido o lapso temporal correspondente ao prazo prescricional estabelecido para o máximo da pena prevista no tipo penal considerado na prática infracional.

Este é, aliás de longa data, o critério para o reconhecimento da prescrição segundo orientação do Supremo Tribunal Federal, como se vê do seguinte aresto, in verbis:

HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA. INTERNAÇÃO-SANÇÃO. LEGITIMIDADE. INSTITUTO DA PRESCRIÇÃO. APLICABILIDADE. PARÂMETRO. PENA MÁXIMA COMINADA AO TIPO LEGAL. REDUÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL À METADE COM BASE NO ART. 115 DO CÓDIGO PENAL. HIPÓTESE DE CRIME DE ROUBO. PRESCRIÇÃO NÃO CONSUMADA, NA ESPÉCIE. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA. (HC 88788/SP – Min. Joaquim Barbosa – Julgamento: 22/04/2008 – STF – 2ª Turma)

E é pertinente destacar parte do aresto, que melhor explicita o critério ainda dominante naquela Corte e que baliza a orientação seguida por esta 7ª Câmara Cível:

“(...) 2. O instituto da prescrição não é incompatível com a natureza não-penal das medidas sócio-educativas. Jurisprudência pacífica no sentido da prescritibilidade das medidas de segurança, que também não têm natureza de pena, na estrita acepção do termo.

“3. Os casos de imprescritibilidade devem ser, apenas, aqueles expressamente previstos em lei. Se o Estatuto da Criança e do Adolescente não estabelece a imprescritibilidade das medidas sócio-educativas, devem elas se submeter à regra geral, como determina o art. 12 do Código Penal.

“4. O transcurso do tempo, para um adolescente que está formando sua personalidade, produz efeitos muito mais profundos do que para pessoa já biologicamente madura, o que milita em favor da aplicabilidade do instituto da prescrição.

“5. O parâmetro adotado pelo Superior Tribunal de Justiça para o cálculo da prescrição foi o da pena máxima cominada em abstrato ao tipo penal correspondente ao ato infracional praticado pelo adolescente, combinado com a regra do art. 115 do Código Penal, que reduz à metade o prazo prescricional quando o agente é menor de vinte e um anos à época dos fatos.

“6. Referida solução é a que se mostra mais adequada, por respeitar os princípios da separação de poderes e da reserva legal.

“ 7. A adoção de outros critérios, como a idade limite de dezoito ou vinte e um anos e/ou os prazos não cabais previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente para duração inicial das medidas, além de criar um tertium genus, conduz a diferenças de tratamento entre pessoas em situações idênticas (no caso da idade máxima) e a distorções incompatíveis com nosso ordenamento jurídico (no caso dos prazos iniciais das medidas), deixando de considerar a gravidade em si do fato praticado, tal como considerada pelo legislador.(...)”

Por oportuno, trago à colação alguns arestos das Câmaras do 4º Grupo Cível e que mostram o entendimento uníssono da jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado, in verbis:

AGRAVO INTERNO. ATO INFRACIONAL. RECEPTAÇÃO E TRÁFICO DE DROGAS. INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. Como ainda não foi aplicada medida socioeducativa, o prazo para o cômputo da prescrição em abstrato deve levar em consideração a pena máxima cominada ao tipo penal correspondente ao ato infracional praticado (art. 180, caput, do CP, e art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/06), que no caso é de 4 e 10 anos, respectivamente (art. 109, I e IV, na forma do art. 115, ambos do CP), lapso temporal não transcorrido. Impossibilidade de reconhecimento de prescrição projetada, e ainda se considerado o limite máximo à medida mais gravosa (internação, três anos, prazo prescricional de 4 anos). AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.(Agravo Interno, Nº 70081992414, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em: 22-08-2019)

APELAÇÃO CÍVEL. ATO INFRACIONAL. TRÁFICO E PRODUÇÃO DE DROGAS. INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. Não existe previsão legal para aplicação da prescrição in abstrato. Portanto, não aplicada medida socioeducativa, o prazo para o cálculo da prescrição deve considerar a pena máxima cominada ao tipo penal equiparado ao ato infracional praticado (artigo 33 da Lei 11.343/06), que no caso é de 10 anos, nos termos do artigo 109, inciso I, combinado com artigo 115, ambos do Código Penal, lapso temporal que ainda não transcorreu. Guardando isonomia de tratamento entre adultos e adolescente, a medida extrema de privação de liberdade, caso fosse aplicada, observa prescrição em 04 (quatro) anos, tempo ainda não decorrido. Impossibilidade de reconhecimento de prescrição projetada. Sentença desconstituída. Apelação provida.(Apelação Cível, Nº 70078681210, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Antônio Daltoe Cezar, Julgado em: 25-04-2019)

APELAÇÃO CÍVEL. ECA. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO FURTO QUALIFICADO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELO RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO EM ABSTRATO. IMPOSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. Para o reconhecimento da prescrição em abstrato o critério a ser utilizado é a pena máxima cominada ao...

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