Acórdão nº 50755581420228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 20-06-2022

Data de Julgamento20 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo50755581420228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002271461
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5075558-14.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATORA: Juiza de Direito VIVIANE DE FARIA MIRANDA

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Ab initio, rogo vênia para adotar o relatório do parecer ministerial, exarado pela ilustre Dra. Ieda Husek Wolff, Procurador de Justiça, in verbis (evento 10, PARECER1):

JOSIAS DANIEL DA SILVA foi condenado à pena privativa de liberdade de 11 (onze) anos e 11 (onze) meses de reclusão, atualmente em regime semiaberto.

Iniciou o cumprimento da pena em 09/03/2014, com final previsto para 24/12/2030, conforme relatório da situação processual executória disponível no Sistema Eletrônico de Execução Unificado (PEC n. 0010039-33.2019.8.21.0001).

Em 09/12/2021, o Juízo da Execução afastou a equiparação de hediondez do delito do artigo 33, caput, da Lei de Drogas, pelo qual o apenado cumpre pena, sob o fundamento de que a equiparação decorria do § 2º do artigo 2º da Lei n. 8.072/1990 (Lei dos Crimes Hediondos), o qual foi revogado pela Lei n. 13.964/2019 (Pacote Anticrime), determinando a retificação do RSPE referente ao percentual para progressão de regime (seq. 57.1 do PEC).

Inconformado, o Ministério Público interpôs, tempestivamente, AGRAVO EM EXECUÇÃO. Em suas razões, requereu a reforma da decisão, para o fim de ser mantido o caráter hediondo decorrente da condenação pelo delito de tráfico de drogas, retificando-se os percentuais referentes à progressão de regime e livramento condicional (seq. 66.1 do PEC).

O agravado apresentou contrarrazões (seq. 87.1 do PEC).

Em juízo de retratação, a decisão agravada foi mantida (seq. 89.1 do PEC).

Acresço.

Subiram os autos a este Sodalício, sendo distribuídos à minha Relatoria (evento 5, INF1).

A Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo provimento do recurso (evento 10, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Eminentes Desembargadores:

O agravado JOSIAS DANIEL DA SILVA foi condenado à pena total de 11 anos e 11 meses, pela prática dos crimes previstos no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, e artigo 16, caput, da Lei nº 10.826/2003.

Deu início ao cumprimento da aflitiva em 9/3/20214, com término previsto para 23/12/2030.

No curso da expiação da reprimenda, a ilustre Juíza de Direito, Dr.ª Sonáli da Cruz Zluhan, determinou retificação do Relatório da Situação Processual Executória e, na sequência, de aplicação da fração de 1/6 para fins de progressão de regime, porquanto alterada a natureza do crime disposto na Lei de Drogas, após a entrada em vigor da Lei nº 13.964/2019.

A decisão foi proferida nos seguintes termos (evento 10, PARECER1, fls. 33/11):

Vistos.

Pelos motivos que passo a expor, considerando que se trata de apenado reincidente, há que ser retificado o RSPE no tocante ao delito de tráfico de drogas para 1/6 (crimes cometidos antes de 23/01/ 2020) para fins de progressão de regime (retificado o RSPE nesse ponto via assessoria deste juízo).

A Constituição Federal – artigo 5º não dispõe quais cri mes são considerados hediondos, limitando-se a expôr que o tráfico de drogas é crime inafiançável, insuscetível de graça e anistia:

“XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;”

Coube, portanto, a Lei Nº 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, o rol taxativo:

Art. 1º São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados:
I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII e VIII);
-A – lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art. 129, § 2o) e lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3o), quando praticadas contra autoridade ou agente descrito nos artigos 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição;
II – roubo:
a) circunstanciado pela restrição de liberdade da vítima (art. 157, § 2º, inciso V);
b) circunstanciado pelo emprego de arma de fogo (art. 157, § 2º-A, inciso I) ou pelo emprego de arma de fogo de uso proibido ou restrito (art. 157, § 2º-B);
c) qualificado pelo resultado lesão corporal grave ou morte (art. 157, § 3º);
III – extorsão qualificada pela restrição da liberdade da vítima, ocorrência de lesão corporal ou morte (art. 158, § 3º);
IV – extorsão mediante sequestro e na forma qualificada (art. 159,caput, e §§ lo, 2o e 3o);
V – estupro (art. 213, caput e §§ 1º e 2º)
VI – estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1º, 2º, 3º e 4º); VII – epidemia com resultado morte (art. 267, § 1º).

VII-A – (VETADO)
VII-B – falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273,caput e § 1º, § 1º-A e § 1º-B, com a redação dada pela Lei no 9.677, de 2 de julho de 1998).
VIII – favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável (art. 218-B, caput, e §§ 1º e 2º). IX – furto qualificado pelo emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum ( art. 155, § 4º-A)
Parágrafo único.
Consideram-se também hediondos, tentados ou consumados:
I – o crime de genocídio, previsto nos arts.
, e da Lei nº 2.889, de 1º de outubro de 1956;
II – o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso proibido, previsto no art. 16 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
III – o crime de comércio ilegal de armas de fogo, previsto no art. 17 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
IV – o crime de tráfico internacional de arma de fogo, acessório ou munição, previsto no art. 18 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003
V – o crime de organização criminosa, quando direcionado à prática de crime hediondo ou equiparado”
.

Nota-se que na redação da referida lei, o tráfico de drogas (artigo 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006) não está elencado, mesmo depois da alteração legislativa de 2019, que incluiu como hediondo o roubo com emprego de arma de fogo entre outros. A antiga redação dada pela Lei nº 13.769, de 2018 - revogada pela Lei nº 13.964, de 2019 – fazia a equiparação do tráfico com a hediondez para fins de progressão de regime nos seguintes termos:

Artigo 2º Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de: I – anistia, graça e indulto;
II – fiança
§ 2º: A progressão de regime, no caso dos condenados pelos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente, observado o disposto nos §§ 3º e 4º do art. 112 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal)

Com a revogação do referido dispositivo (parágrafo 2º do artigo ), não remanesce nenhum comando legal para equiparação do tráfico ao delito hediondo, salvo a vedação contida no artigo 2º da Lei dos Crimes Hediondos que reproduziu a Constituição Federal para impedir a fiança e ser insuscetível de graça e anistia.

A nova redação da Lei nº 13.964, de 2019 – repito – revogou o § 2º do art. 2º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei dos Crimes Hediondos) assim dispõe:

“Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:
I - 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
II - 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
III - 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
IV - 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;
VI - 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for:
a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional;
b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou
c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada;
VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;
VIII - 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional.

A Lei 13.964/2019 (“Pacote Anticrime”) ao revogar expressamente o dispositivo que equiparava a hediondez do tráfico de drogas como delito hediondo para fins de progressão de regime, expôs os critérios de progressão no artigo 112 da Lei n. 7.210/ 1984 (Lei de Execução Penal), diferenciando frações para os delitos hediondos ou “equiparados”, sem mencionar quais seriam os...

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