Acórdão nº 50777072820228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 06-02-2023

Data de Julgamento06 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50777072820228210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003016189
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5077707-28.2022.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador JORGE ALBERTO VESCIA CORSSAC

APELANTE: PORTOCRED SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

APELADO: MARIA OCEANIA ESTEVES RODRIGUES (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por PORTOCRED SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO em face da sentença que, nos autos da ação revisional ajuizada por MARIA OCEANIA ESTEVES RODRIGUES, assim julgou os pedidos (evento 30, SENT1):

"Pelo exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora para o fim de limitar os juros remuneratórios do contrato de empréstimo nº 3801792195 à taxa média de mercado à época da contratação (1,77% a.m.), bem como descaracterizar a mora da parte autora, condenando o réu à devolução dos valores cobrados em excesso, subtraindo-os, se for o caso, das parcelas vincendas, com a repetição simples do indébito caso exista crédito em favor da parte autora após a compensação dos valores. O valor deverá ser corrigido monetariamente pelo IGP-M a partir de cada desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da data da citação.

Condeno o réu, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$1000,00 (um mil reais) para o procurador do requerente.

Transitada em julgado e nada requerido, arquive-se com baixa.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se".

A apelante opôs embargos declaratórios (evento 36, EMBDECL1), os quais restaram desacolhidos (evento 38, DESPADEC1).

Em suas razões recursais (evento 44, APELAÇÃO1), a instituição financeira sustenta, preliminarmente, a nulidade da sentença ante a ausência de enfrentamento dos argumentos invocados, em evidente afronta ao disposto nos art. 489, IV, § 1º do CPC. Alega a apelante que o relatório da sentença não contém uma adequada suma da contestação apresentada, e que a sentença recorrida deixou de seguir jurisprudência e precedentes invocados pela ré. Salienta que o cálculo apresentado é inválido porquanto desconsiderado o período de carência para o início do pagamento das parcelas. Defende, ainda em sede preliminar, seja reconhecida a nulidade da decisão de primeiro grau ante à inexistência de despacho saneador, e abertura da fase instrutória para produção de provas. Argui, também, as preliminares de carência de ação, ante a impossibilidade de revisão de contrato quitado, e a prescrição trienal da repetição do indébito. Aduz que a série temporal referente à taxa média de juros do BACEN, para a modalidade da contratação utilizada na sentença está equivocada, já que a autora é pensionista do IPERGS. No mérito, defende a legalidade da contratação, ao referir que os ajustes entre os contratantes se deram de forma ciente e voluntária, inexistindo cobrança indevida ou imprevista. Sustenta em suas razões a validade da contratação estabelecida e a manutenção da taxa dos juros pactuada entre as partes, ante à inexistência de abusividade no caso concreto. Refere que a a sentença deve ser reformada no que tange o pedido de descaracterização da mora, porquanto o contrato encontra-se quitado. Requer a improcedência do pedido de repetição do indébito e compensação dos valores, assim como que os valores pagos a maior pela instituição financeira sejam atualizados exclusivamente pela taxa SELIC. Postula, ao final, pelo acolhimento das preliminares e pelo provimento do apelo, com a consequente inversão da sucumbência, a ser suportada integralmente pela autora, e, no caso da manutenção da sentença, a minoração da verba arbitrada.

Intimada, a apelada apresentou contrarrazões (evento 48, CONTRAZ1).

Após, subiram os autos a esta Corte.

Por distribuição, vieram-me os autos conclusos para julgamento.

Cumpridas as formalidades legais.

É o relatório.

VOTO

DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL.

O presente norteia-se pelas disposições processuais estabelecidas pelo Novo Código de Processo Civil.

Com fundamento no art. 1010, §3º, in fine, presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos (cabimento e adequação, tempestividade, regularidade procedimental e formal, preparo, ausência de fato extintivo ou modificativo do direito de recorrer, legitimidade e interesse) recebo o apelo em ambos os efeitos.

Ausentes quaisquer das hipóteses previstas no art. 933 do CPC, passo ao exame do recurso.

DA RELAÇÃO CONTRATUAL.

A presente ação tem por objeto o contrato de mútuo nº 3801792195, firmado em 24/10/2014, prevendo juros remuneratórios no percentual de 6,00% ao mês e de 101,22% ao ano (evento 1, CONTR4).

PRELIMINARES.

DA NULIDADE DA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO.

Aduz a apelante a nulidade da sentença ante a ausência de enfrentamento dos argumentos invocados, em evidente afronta ao disposto no art. 489, IV, § 1º do CPC.

Sem razão, contudo.

A necessidade de fundamentação é prevista no inc. IX do art. 93 da CF e no art. 489 do CPC. O princípio que orienta a formação do convencimento se deduz do art. 371 do CPC:

"Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento."

"Art. 489. São elementos essenciais da sentença:

(...)

II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;

(...)"

Referidos preceitos não impõem que o julgador deva discorrer sobre todos os argumentos lançados pelas partes, mas que apresente, ainda que sucintos, os fundamentos de fato e de direito que formam sua convicção ao enfrentar o pedido.

Na hipótese dos autos, a causa de pedir fundamenta-se no excesso da cobrança dos juros remuneratórios. Os argumentos deduzidos são justificativas para a cobrança dos juros acima da taxa média de mercado, critério esse adotado pela jurisprudência, inclusive das Cortes Superiores. Logo, fundamentada a sentença no critério jurisprudencial pacífico e prevalente, desnecessário o enfrentamento explícito como apregoado o que, inclusive, encontra respaldo nos dispositivos acima elencados.

Com efeito, não é nula por ausência de fundamentação, julgamento em tese ou negativa da prestação jurisdicional, a decisão que atendendo ao princípio da persuasão racional enfrenta e decide com razões lógico-jurídicas a questão posta em juízo.

Em suma, a sentença é silogismo lógico e que não prescinde de interpretação. No caso concreto, não verifico qualquer afronta aos artigos mencionados, impondo o desacolhimento da preliminar suscitada.

Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. VIOLAÇÃO DE PATENTE DE INVENÇÃO. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. PROCESSUAL CIVIL. NULIDADE DA DECISÃO POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA. OBSERVÂNCIA DO ART. 489, CAPUT, CPC. MULTA POR DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. ART. 536, CPC. POSSIBILIDADE DE MODIFICAÇÃO DO VALOR NOMINAL DAS ASTREINTES. ART. 537, §1º, CPC. PARCELAS VINCENDAS OU VENCIDAS. JUROS SOBRE A MULTA. NÃO INCIDÊNCIA SOB PENA DE BIS IN IDEM. 1. Preliminar de nulidade da decisão rejeitada, pois não se encontram presentes quaisquer das hipóteses previstas no art. 489, §1º, do CPC. O juízo de valor emitido na decisão agravada não conduz à conclusão de que a decisão carece de fundamentação. Em verdade, verifica-se que as questões de fato e o direito aplicado foram devidamente analisados, restando a conclusão motivada na interpretação do art. 537, §1º, do CPC, e na impossibilidade de enriquecimento sem justa causa, o que denota, ao fim, insatisfação da recorrente com a tese, o que não pode ser confundido com vício processual. 2. (...) À UNANIMIDADE, REJEITADA A PRELIMINAR PROCESSUAL, NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO". (Agravo de Instrumento, Nº 70083577460, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luís Augusto Coelho Braga, Julgado em: 28-05-2020)

"APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. RESCISÃO DE CONTRATO. Não há falar em nulidade da sentença por ausência de fundamentação, pois o magistrado expôs as questões de fato e de direito que embasaram o seu juízo, nos termos do art. 489, II, do Código de Processo Civil. (...) AFASTARAM A PRELIMINAR E NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME.(Apelação Cível, Nº 70083600833, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Walda Maria Melo Pierro, Julgado em: 27-05-2020)".

Desacolho, portanto, a prefacial.

DA IMPUGNAÇÃO DO CÁLCULO.

Sustenta a apelante que o cálculo apresentado é ineficaz porquanto desconsiderado o prazo de carência.

Sem razão, contudo.

Veja-se que o contrato em questão foi firmado em outubro de 2020 sendo que o cálculo anexado (evento 1, CALC5) utiliza como data inicial 20/11/2014, e a primeira parcela amortizada em 20/12/2014.

Logo, ainda que não considerado exatamente o período de carência, a pretensão discute o percentual de juros aplicado ao débito, sendo suficiente para fins do art. 330, §2º, CPC, a memória anexada porquanto representa o valor incontroverso, entendido pela parte como devido. Eventual alteração desafia decisão judicial, de sorte que, para fins de instrumentalização do pedido, não se cogita de ineficácia daquele.

Desacolho a preliminar suscitada.

DO CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CARACTERIZAÇÃO.

Consoante art. 370, CPC, incumbe ao magistrado analisar e determinar as provas necessárias ao julgamento do feito.

Assim referido dispositivo legal

"Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.

Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias."

No caso concreto, pretende a parte autora a revisão...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT