Acórdão nº 50784010220198210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Criminal, 31-03-2022

Data de Julgamento31 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50784010220198210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSétima Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001528574
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5078401-02.2019.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Roubo majorado (art. 157, § 2º)

RELATOR: Desembargador JOSE CONRADO KURTZ DE SOUZA

APELANTE: ANDRE DOS SANTOS DREYER (RÉU)

APELANTE: LUCAS CAVALHEIRO CARDOZO (RÉU)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de denúncia oferecida pelo Ministério Público contra ANDRÉ DOS SANTOS DREYER, nascido em 01/05/1997, com 22 anos de idade à época dos fatos; e LUCAS CAVALHEIRO CARDOZO, nascido em 08/05/1999, com 20 anos de idade à época dos fatos como incursos nas sanções do Art. 157, § 2º, II e § 2º-A, I e do Art. 311, ambos do Código Penal.

A denúncia ficou assim lavrada:

Fato 01

No dia 03 de dezembro de 2019, por volta das 13h30min, na Avenida Palmeira, em frente ao n.° 330, em via pública, nesta capital, os denunciados, em comunhão de esforços e conjugação de vontades, mediante grave ameaça exercida pela utilização de arma de fogo (não apreendida), subtraíram, para si, da vítima Paula Chiattone Corvello Vidal, um veículo MMC/Pajero, placas JAP-2060, avaliada em R$ 80.941,00 (oitenta mil novecentos e quarenta e um reais), uma maleta contendo materiais odontológicos, avaliada aproximadamente em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), um motor de cirurgia, um telefone celular de marca e modelo iPhone Xe uma bolsa de marca Colcci contendo diversos documentos e cartões, bens estes ainda não avaliados, e da vítima Débora Souza Pinto uma bolsa Contendo diversos documentos pessoais, tudo conforme boletim de ocorrência (fl. 50) e auto de prisão em flagrante.

Na ocasião, os denunciados, previamente associados, abordaram as vítimas quando estas permaneciam no interior do veículo descrito. Enquanto Lucas abriu a porta frontal de passageiro, André chegou pelo lado da motorista e, apontando uma arma, determinou às vítimas que desembarcassem do automotor. Paula ainda tentou retirar alguns objetos seus do banco traseiro, sendo impedida pelos denunciados, que embarcaram no carro e empreenderam fuga, levando consigo a res furtivae.

Fato 02

Em data não precisada nos autos, mas certamente entre os dias 03 e 05 de dezembro de 2019, em Porto Alegre, os denunciados, em comunhão de esforços e conjugação de vontades, adulteraram sinal identificador de veículo automotor, consistente em identificarem o veículo MMC/Pajero, placas JAP-2060, roubado das vítimas Paula Chiattone Corvello Vidal e Débora Souza Pinto conforme descrito no Fato 01, com as placas ITY-4197, pertencente a automotor idêntico.

Ao agirem, os acusados contrafizeram as placas ITY4197 e apuseramnas no veículo de placas JAP-2060, perpetrando, no intuito de ocultar a origem espúria do bem, que se convencionou chamar de “clonagem”.

Posteriormente, no dia 05 de dezembro de 2019, policiais civis, depois de receberem comunicado anônimo acerca da adulteração do veículo, deslocaram-se em diligências e visualizaram a MMC/Pajero, conduzida pelos denunciados na Avenida Ipiranga, nesta capital, ingressar no estacionamento do Hospital da PUCRS, onde ficou estacionada depois que os acusados entraram em um Ford/Feita e deixaram o local. Nesse momento, os policias realizaram a abordagem, ocasião em que André e Lucas apontaram a exata localizado da MMC/Pajero, a qual foi apreendida porque em situação de roubo e com as placas adulteradas.”

Homologado o auto de prisão em flagrante dos réus em 05/12/2019, oportunidade em que foi convertida a prisão em flagrante em prisão preventiva (evento 2, DESP3).

Recebida a denúncia em 07/01/2020 (evento 2, DESP6).

Procedida à citação dos réus (evento 2, OUT8). O réu André ofereceu resposta à acusação por intermédio de defensor constituído evento 2, DEFESA PRÉVIA7) enquanto o réu Lucas foi assistido pela Defensoria Pública (evento 2, OUT11, p. 05-06).

Em audiência de instrução e julgamento, foram ouvidas as vítimas, as testemunhas arroladas pela acusação, as testemunhas arroladas pelas defesas, homologada a desistência da oitiva da testemunha Ederson, e efetuado o interrogatório dos réus (evento 2, TERMOAUD13).

Concedida a liberdade ao réu André em 25/09/2020 (evento 2, TERMOAUD13).

As partes apresentaram memoriais (evento 2, OUT14, pág. 23-27 e evento 2, MEMORIAIS15).

Sobreveio sentença (evento 2, SENT16), publicada em 26/01/2021, julgando parcialmente procedente a denúncia para condenar ANDRÉ DOS SANTOS DREYER e LUCAS CAVALHEIRO CARDOZO como incurso nas sanções do Art. 157, § 2º, II, e § 2º-A, I, do Código Penal, e absolvê-los da imputação referente ao crime previsto no Art. 311 do Código Penal, com fulcro no Art. 386, VII, do Código de Processo Penal, nos seguintes termos:

Passo, pois, à dosimetria da pena, não sem antes tecer considerações comuns ao crime de roubo descrito na denúncia e pelos quais condenados os réus.

Como visto, incidem à espécie duas majorantes. No ponto, atento-me à faculdade conferida ao Juiz de, na hipótese de concurso de causas de aumento, aplicá-las em cascata ou limitar-se ao uso daquela que emprestar maior fração de exasperação. É a inteligência do artigo 68, parágrafo único, do Código Penal.

Todavia, à luz da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a opção pela cumulação de majorantes deve ser devidamente fundamentada nas peculiaridades do caso concreto, sob pena de violação ao princípio da proporcionalidade e da proibição do excesso, consoante se depreende do seguinte precedente:

PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. VIA INADEQUADA. ROUBO CIRCUNSTANCIADO PELO CONCURSO DE AGENTES E PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO. LEI N.º 13.654/2018. DOSIMETRIA. INSURGÊNCIA DEFENSIVA NO SENTIDO DE SER VEDADO O CÚMULO DE CAUSAS DE AUMENTO DA PARTE ESPECIAL DO CÓDIGO PENAL. PLEITO DE QUE SEJA APLICADA APENAS A MAJORANTE DE MAIOR VALOR. IMPROCEDÊNCIA. INTERPRETAÇÃO CORRETA DO ART. 68, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DAS DUAS CAUSAS DE AUMENTO, HAVENDO FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO IDÔNEA, NA HIPÓTESE. PROPORCIONALIDADE. MANUTENÇÃO SOMENTE DA CAUSA DE AUMENTO DO ART. 157, § 2.º-A, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA, DE OFÍCIO (…). - A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça e a do Supremo Tribunal Federal são no sentido de que o art. 68, Parágrafo Único, do Código Penal, não exige que o juiz aplique uma única causa de aumento da parte especial do Código Penal quando estiver diante de concurso de majorantes, mas que sempre justifique a escolha da fração imposta. - Assim, não há ilegalidade flagrante, em tese, na cumulação de causas de aumento da parte especial do Código Penal, sendo razoável a interpretação da lei no sentido de que eventual afastamento da dupla cumulação deverá ser feito apenas no caso de sobreposição do campo de aplicação ou excessividade do resultado (ARE 896.843/MT, Rel. Min. GILMAR MENDES, SEGUNDA TURMA, DJe 23/09/2015). - Contudo, na hipótese ora analisada, as instâncias ordinárias não fundamentaram, concretamente, o cúmulo de causas de aumento, com remissão a peculiaridades do caso em comento, pois o modus operandi do delito, como narrado, confunde-se com a mera descrição típica das majorantes reconhecidas, não refletindo especial gravidade. - Assim, respeitada a proporcionalidade da pena no caso concreto, e a intenção da Lei n. 13.654/2018, afasta-se a majorante do art. 157, § 2.º, inciso II ('A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade se há o concurso de duas ou mais pessoas'), aplicando-se apenas a do art. 157, § 2.º-A, inciso I ('A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços)' se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo'), ambas do Código Penal. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para reduzir a reprimenda do paciente ao novo patamar de 9 anos e 26 dias de reclusão, e 21 dias-multa, mantidos os demais termos da condenação (HC 472.771/SC, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 04/12/2018, DJe 13/12/2018) (grifamos)

Por conseguinte, com vistas a afastar o incremento da pena em cascata, mas considerando ainda que a majorante de menor intensidade, qual seja, o concurso de agentes, deve também repercutir no apenamento, desloco sua valoração para a 1ª etapa do processo dosimétrico, a fim de não simplesmente desprezá-la.

Ilustro a solução sobredita com o julgado que segue:

APELAÇÃO-CRIME. ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO. CONCURSO DE AGENTES. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. CONCURSO MATERIAL. 1. ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO (1º FATO). ÉDITO CONDENATÓRIO. MANUTENÇÃO. (…) 5. ÍNDICE DE AUMENTO PELA INCIDÊNCIA DA DUPLA MAJORANTE. O índice de aumento da pena pela incidência de duas ou mais majorantes é questão que se insere na órbita de convencimento do magistrado, no exercício de seu poder discricionário de decidir a quantidade de aumento que julga conveniente na hipótese concreta, desde que observados os limites estabelecidos pela norma penal. Hipótese na qual o decisor singular aumentou as corporais em 2/3 para o emprego de arma e 1/3 para a adjetivadora do concurso de agentes, sucessivamente. Inviável a aplicação das majorantes do mesmo tipo penal de modo sucessivo, na 3ª etapa, o que implicaria séria deformação do sistema trifásico, consagrado no art. 68 e seu § único do CP, já que o incremento dar-se-ia em cascata. Concurso de agentes que também deve repercutir no apenamento, em atendimento aos princípios da isonomia, individualização e proporcionalidade. Circunstâncias do delito mais gravosas. Deslocamento da valoração da majorante para a 1ª fase de aplicação da pena, promovendo-se o aumento da pena-base nesta sede recursal, sem que isso...

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