Acórdão nº 50785737020218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50785737020218210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003143361
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5078573-70.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador JORGE ALBERTO VESCIA CORSSAC

APELANTE: PORTOCRED SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

APELADO: LETICIA DE MEDEIROS ANDREAZZA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por PORTOCRED SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO em face da sentença proferida nos autos da ação pelo rito ordinário ajuizada por LETICIA DE MEDEIROS ANDREAZZA, nos seguintes termos (evento 27, SENT1):

Pelo exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora para o fim de limitar os juros remuneratórios dos contratos de empréstimos nº 3801654400, 3801490193, 3801461588, 3801859740 e 3801549383 estabelecida pelo Banco Central do Brasil na série 254671, bem como descaracterizar a mora da parte autora, condenando o réu à devolução dos valores cobrados em excesso, subtraindo-os, se for o caso, das parcelas vincendas, com a repetição simples do indébito caso exista crédito em favor da parte autora após a compensação dos valores. O valor deverá ser corrigido monetariamente pelo IGP-M a partir de cada desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da data da citação.

Condeno o réu, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$1000,00 (um mil reais) para o procurador do requerente.

Em suas razões, a instituição financeira alega, preliminarmente, que os contratos objetos da lide não podem ser revisados, considerando o fato de estarem liquidados, em razão do adimplemento das parcelas contratadas, e portanto, requer a extinção do feito sem julgamento de mérito, nos termos dos artigos 267, VI e 301, X do CPC. Ainda em preliminar, impugna o cálculo realizado pela consumidora, a taxa de juros utilizada e defende a ocorrência de prescrição trienal do pedido de repetição do indébito. No mérito, defende a validade da contratação e as taxas de juros utilizadas nos contratos, a existência da mora e a impossibilidade de compensação e repetição de indébito. Pugna pelo provimento do recurso, com a inversão da sucumbência.

Intimada, a autora apresentou contrarrazões (evento 36, CONTRAZ1).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL

O presente norteia-se pelas disposições processuais estabelecidas pelo Novo Código de Processo Civil.

Com fundamento no art. 1010, §3º, in fine, presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos (cabimento e adequação, tempestividade, regularidade procedimental e formal, preparo pela ré, ausência de fato extintivo ou modificativo do direito de recorrer, legitimidade e interesse) recebo o apelo em ambos os efeitos.

Ausentes quaisquer das hipóteses previstas no art. 933 do CPC, passo a examinar o apelo.

PRELIMINARMENTE.

REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PRESCRIÇÃO.

Consoante a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é de dez anos o prazo para o ajuizamento da ação revisional de contrato de empréstimo, o qual flui a contar da data da sua celebração.

Logo, à pretensão de repetição de indébito deduzida em sede revisional, aplica-se, também, o prazo de dez anos, forte no artigo 205 do Código Civil.

Aliás, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do AgInt no REsp 1.820.408/PR, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, julgado em 28 de outubro de 2019, assentou que (...) "A discussão acerca da cobrança indevida de valores constantes de relação contratual e eventual repetição de indébito não se enquadra no conceito de enriquecimento ilícito, seja porque a causa jurídica, em princípio, existe (relação contratual prévia em que se debate a legitimidade da cobrança), seja porque a ação de repetição de indébito é ação específica; por essa razão, aplica-se a prescrição decenal e não a trienal".

Nesse mesmo sentido, a jurisprudência desta Corte:

"CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. FUNCORSAN. PREVIDÊNCIA PRIVADA FECHADA. REVISÃO. PRESCRIÇÃO DECENAL. INTERESSE PROCESSUAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO. CAPITALIZAÇÃO. MENSAL. JUROS. TAXA DE ADMINISTRAÇÃO. COMPENSAÇÃO. REPETIÇÃO. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. DESEQUILÍBRIO ATUARIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. A ausência de cláusula contratual relativa à capitalização dos juros não obsta a impugnação da sua cobrança se a parte alega ter sido exigida, havendo, portanto, interesse processual para o pedido de exclusão. 2. O prazo prescricional da ação revisional de contrato de empréstimo é de 10 anos e flui a contar da sua celebração, ainda que tenha havido sucessivas repactuações, à luz do princípio da actio nata. Tal prazo se aplica à pretensão de repetição de indébito. Jurisprudência do STJ e deste Tribunal. 3. Os contratos de empréstimos firmados com entidades fechadas de previdência privada não se regem pelas normas relativas às instituições financeiras. Assim, não estão autorizadas a estipular juros livremente, limitando-se à taxa de 12% ao ano. Jurisprudência do STJ. Inteligência dos arts. 1º da Lei de Usura, 406 do CC e 161, § 1º, do CTN. 4. A capitalização anual dos juros remuneratórios pelas entidades de previdência privada depende de expressa pactuação. Art. 591 do CC. Tema 953 do STJ. “A cobrança de juros capitalizados nos contratos de mútuo é permitida quando houver expressa pactuação”. 5. Não é ilegal a cobrança de taxa de administração pelo mutuante, a qual consiste em contraprestação pelos serviços disponibilizados ao mutuário. Contudo, a sua cobrança está adstrita à taxa prevista no contrato. Jurisprudência deste Tribunal. 6. Nos contratos de empréstimo pessoal, a compensação ou a repetição do indébito são admitidas sempre que for constatado o pagamento indevido, independentemente da comprovação de erro no pagamento, porquanto visam a obstar o enriquecimento ilícito. Jurisprudência do STJ e deste Tribunal. Em se tratando de repetição de indébito, os juros de mora fluem a contar da citação. Precedente do STJ. 7. Em caso de revisão contratual de contrato de empréstimo, a readequação das cláusulas pactuadas não implica o inadimplemento do contratante nem desequilíbrio atuarial. Jurisprudência deste Tribunal. 8. O arbitramento dos honorários advocatícios por equidade afigura-se regra excepcional, de aplicação subsidiária, cabível somente nas hipóteses em que (I) o proveito econômico obtido for inestimável ou irrisório ou (II) o valor da causa for muito baixo. Jurisprudência do STJ. Hipótese em que, por se tratar de ação de revisão contratual, revela-se possível mensurar o proveito econômico obtido. Recurso do Autor provido em parte. Recurso da Ré desprovido. Honorários majorados. Art. 85, § 11, do CPC.(Apelação Cível, Nº 70083989384, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Isabel de Azevedo Souza, Julgado em: 08-10-2020)".

De conseguinte, desacolho a alegação.

CARÊNCIA DE AÇÃO. CONTRATOS QUITADOS. POSSIBILIDADE DE REVISÃO.

A possibilidade jurídica de revisão de contrato bancário extinto, quer pela novação, quer pela quitação propriamente dita, é matéria pacífica na jurisprudência, estando, inclusive, sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Veja-se:

Súmula 286 do STJ:"A renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores".

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PEDIDO DE SUSPENSÃO DO PROCESSO. IMPOSSIBILIDADE. CONTRATO BANCÁRIO.
1. A presente controvérsia não se enquadra naquelas hipóteses em que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral das matérias de fundo (RE 591.797/SP e 626.307/SP) referentes aos índices dos expurgos inflacionários dos depósitos em cadernetas de poupança afetados pelos Planos Econômicos Collor I e II (valores não bloqueados), Bresser e Verão, mas de correção monetária de cédula de crédito rural.
2. É possível a revisão dos contratos firmados com instituições financeiras, desde a origem, para afastar eventuais ilegalidades, mesmo encontrando-se extintos pela quitação.
3. Aplica-se o BTN de 41,28% no mês de março de 1990, nas cédulas rurais cujo débito esteja vinculado aos índices da caderneta de poupança.
4. Agravo não provido.”
(AgRg nos EDcl no REsp 1428280/RS, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/03/2014, DJe 03/04/2014). g.n.

Desacolho a alegação.

IMPUGNAÇÃO DO CÁLCULO.

Sustenta o apelante que o cálculo apresentado é ineficaz porquanto desconsiderado o prazo de carência.

Sem razão, contudo.

Veja-se os contratos:

Contrato nº 3801654400, firmado em 27.05.2014, sendo que o cálculo anexado (evento 1, CALC21) utiliza como data inicial 27.05.2014 e, a primeira parcela amortizada em 20.08.2014.

Contrato nº 3801490193, firmado em 26.09.2013, sendo que o cálculo anexado (evento 1, CALC21) utiliza como data inicial 26.09.2013 e, a primeira parcela amortizada em 20.12.2013.

Contrato nº 3801461588, firmado em 08.08.2013, sendo que o cálculo anexado (evento 1, CALC21) utiliza como data inicial 08.08.2013 e, a primeira parcela amortizada em 20.10.2013.

Contrato nº 3801859740 firmado em 09.01.2015, sendo que o cálculo anexado (evento 1, CALC21) utiliza como data inicial 09.01.2015 e, a primeira parcela amortizada em 20.03.2015.

Contrato nº 3801549383 firmado em 26.12.2013, sendo que o cálculo anexado (evento 1, CALC21) utiliza como data inicial 26.12.2013 e, a primeira parcela amortizada em 20.03.2014.

Logo, ainda que não considerado exatamente o período de carência, a pretensão versa acerca da taxa de juros incidente em cada pactuação, sendo suficiente para fins do art. 330, §2º, CPC as memórias anexadas porquanto estimam o valor incontroverso, não...

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