Acórdão nº 50798138320208217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 29-01-2021

Data de Julgamento29 Janeiro 2021
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo50798138320208217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20000506824
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5079813-83.2020.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Furto (art. 155)

RELATORA: Desembargadora ISABEL DE BORBA LUCAS

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

E.D.S.S. interpôs agravo em execução contra decisão que reconheceu a prática de faltas graves, de sua parte, consistentes no cometimento de novo crime, no curso da execução de sua pena, assim como fuga.

Em suas razões, o agravante alegou, em síntese, que os fatos não constituíram faltas graves. Quanto ao novo crime, conduta apurada nos autos do PAD nº 017/2020, alegou inexistirem provas suficientes acerca da suposta ameaça perpetrada contra sua então companheira, em especial no tocante à presença de dolo em seu agir, também destacando que o casal restabeleceu os laços afetivos e que a Sra. M.C. perdoou o apenado, inclusive, retirando as medidas protetivas que possuía contra ele. Já no tocante à conduta apurada no bojo do PAD nº 036/2020 argumentou que o fato jamais pode ser considerado como situação análoga de fuga, ou sequer tentativa de fuga, eis que o apenado nunca teve a intenção de fugir do sistema prisional, tendo apenas saído de sua residência, momentaneamente, no curso da prisão domiciliar, a fim de prestar cuidados a um familiar doente. Ressaltou, nesse sentido, que somente restará caracterizada a fuga a que alude o artigo 50, II, da LEP quando o preso obtiver a liberdade por suas próprias forças, subtraindo-se do estabelecimento prisional de que é refém, elidindo, por seu engenho e arte, os obstáculos que lhe são impostos pelo sistema de segurança. Ainda comparou a situação em análise aos casos de violação de perímetro da zona de inclusão do monitoramento eletrônico, hipóteses em que, conforme entendimento pacificado pelo STJ, não haveria falta grave, mas mero ato de indisciplina. Subsidiariamente, sustentou a impossibilidade de alteração da data base, por ausência de previsão legal e violação ao princípio da proporcionalidade, assim como da regressão de regime, tratando-se de consectários desnecessários, diante da imposição das sanções administrativas de isolamento e regressão cautelar. Pugnou pelo afastamento da perda dos dias remidos, porquanto direito adquirido do apenado, ou, a seguir, que seja limitada à fração de 1/10 dos dias já remidos, excluídos aqueles a remir.

Com base nessas considerações, requereu o provimento do agravo, para afastar o reconhecimento das faltas graves ou, subsidiariamente, para que não haja alteração da data base, regressão de regime e perda dos dias remidos ou que esta seja declarada em apenas 1/10 dos dias já remidos, excluído o tempo ainda a remir, à época das condutas faltosas.

Contrarrazões pelo desprovimento do recurso (doc. 4, evento 3).

A decisão foi mantida (fl. 309, doc. 5, evento 3).

Em parecer, opinou o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Airton Aloisio Michels, pelo desprovimento do recurso (doc. 7, evento 8).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

De início, o recurso, adianto, deve ser parcialmente provido.

Com efeito, a E.D.S.S. são imputadas duas faltas graves consistentes em prática de novo crime, suposta ameaça contra sua companheira, praticada em 25/03/202, e fuga, pois não teria sido encontrado no endereço informado, nos dias 03/06/2020 e 15/06/2020, quando em prisão domiciliar, por tal motivo sendo revogada a benesse, passando à condição de foragido, com recaptura em 05/07/2020. As condutas foram apuradas no bojo dos procedimentos administrativos disciplinares de números 017/2020 (fls. 189/202, doc. 5, evento 3) e 036/2020 (fls. 204/217, doc. 5, evento 3).

Quanto ao PAD nº 017/2020, em que apurado o novo crime, assim constou do respectivo termo de ocorrência (fl. 190, doc. 5, evento 3):

(...) relata a comunicante que compareceu na Delegacia de Polícia trazida pela BM, que vive em união estável com E. a nove meses. Não possui filhos com o mesmo. Que E. cumpre pena no regime aberto e que no dia 18/03/2020, foi concedido ao mesmo prisão domiciliar por 30 dias. Que hoje E. saiu de sua casa por volta de 16h e retornou por volta de 20h, totalmente embriagado. De chegada, de forma gratuita, E. disse à comunicante que iria colocar fogo na casa com a família da comunicante dentro. Que falou outras sandices e continuou fazendo ameaças dizento que iria matar a comunicante e que não iria sair da casa. Que a comunicante acionou a BM que compareceu no local e trouxe as partes a esta DPPA. Que é a primeira vez que registra BO contra E. e que pede Medidas Protetivas. Deseja representar criminalmente contra E. Requer as medidas protetivas de urgência. (...)

O agravante, ouvido em âmbito administrativo, afirmou que a sua esposa retirou o registro, bem como que estão bem e que ficou em domiciliar na casa com a sua esposa (fl. 196, doc. 5, evento 3). Já em juízo, ouvido na forma do §2º do artigo 118 da LEP, E.D.S.S. disse que estaria bêbado e não lembro por causa que eu bati a cabeça em um acidente e daí eu não lembro, mas depois nós se acertemo, ficamo tudo bem (seq. 208.3 execução nº 0008542-62.2014.8.21.0064).

Ainda foi ouvida, também na fase judicial, a vítima M.C.D.S.S. (seq. 208.3 execução nº 0008542-62.2014.8.21.0064), companheira do agravante, que confirmou a ocorrência do fato, em especial que E.D.S.S., alcoolizado, ameaçou atear fogo em sua residência. Esclareceu, ademais, que, após os fatos e por ter o agravante sofrido um acidente, no interior da casa prisional, inclusive passando por cirurgia no pescoço, ele voltou a residir com ela, que o auxiliou, acabando por se reconciliarem, ao final.

Nesse contexto, é entendimento pacificado desta Câmara que o cometimento, por parte do apenado, de fato definido como crime, no curso da execução da sua pena, além de configurar falta grave, dá ensejo à regressão de seu regime carcerário, modificação da data base para concessão de novos benefícios e a perda de até 1/3 dos seus dias remidos, independentemente do trânsito em julgado de posterior sentença condenatória.

É o que se depreende do artigo 118, I, da Lei de Execuções Penais. Eis o teor:

Art. 118. A execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com a transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos, quando o condenado:
I - praticar fato definido como crime doloso ou falta grave;
(...)

Destarte, a simples prática de fato definido como crime doloso, de parte do apenado, nos termos do artigo 52 da LEP, constitui falta grave, independentemente de sentença condenatória transitada em julgado, referente a este novo delito, conforme o acima exposto, devendo esta ser apurada pelo Juízo da Execução. Assim, aliás, o E. STJ editou a Súmula nº 526, sedimentando seu já reiterado entendimento acerca da desnecessidade do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, para o reconhecimento da falta grave, em casos como o ora analisado, conforme segue:

O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal instaurado para apuração do fato.
(Súmula 526, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/05/2015, DJe 18/05/2015)

Na espécie, contudo, a consulta à certidão de registros criminais atualizada do agravante, disponível em sistema informatizado desta Corte, permite verificar que o processo originado a partir da suposta prática de crime de ameaça, no ambiente doméstico, ação penal nº 064/2.20.0000984-8, teve determinado o seu arquivamento, em decisão transitada em julgado em 19/11/2020, o que impede, então, o reflexo negativo na execução da pena do agravante.

Portanto, ainda que sedimentada neste órgão fracionário a desnecessidade de trânsito em julgado da decisão relativa ao fato criminoso perpetrado pelo apenado, no curso da execução, in casu, em debate a conduta faltosa e sobrevindo decisão definitiva de arquivamento do feito, é caso de afastamento do reconhecimento da falta grave.

Desta forma, deve ser afastado o reconhecimento da falta grave apurada no bojo do PAD nº 017/2020, bem como de seus consectários legais.

Já no tocante ao PAD nº 036/2020, em que apurada suposta fuga, assim constou do termo de ocorrência (fl. 205, doc. 5, evento 3):

(...) na data de 03/06/20 os agentes Rodrigo Tolfo e Cassio da Silva realizaram fiscalização na residência do apenado Ednei, sendo que o mesmo não se encontrava,na data de 15/06/20 se deslocaram novamente a residência, onde o mesmo também não se encontrava, desta forma foi revogada pela Juíza da VEC o benefício da prisão domiciliar. Em 18/06/20, após a revogação da Prisão Domiciliar os agentes se deslocaram a residência do apenado, porém o mesmo não se encontrava. Na data de 05/07/20 o mesmo foi recolhido ao Presídio.

O agravante, que cumpria pena em prisão domiciliar excepcional, após se submeter a procedimento cirúrgico e necessitar de cuidados especiais, no pós-operatório (seq. 106 e 142 execução nº 0008542-62.2014.8.21.0064), não foi localizado no endereço informado, nos dias 03/06/2020 e 15/06/2020, quando de fiscalizações realizadas por agentes penitenciários (fls. 207 e 210, doc. 5, evento 3). E noticiados os fatos ao juízo da execução, a prisão domiciliar foi revogada, já em 15/06/2020 (fl. 210, doc. 5, evento 3), passando E.D.S.S. à condição de foragido, novamente não sendo encontrado em seu endereço, no dia 18/06/2020, e somente vindo a ser recapturado em 05/07/2020 (fls. 211/212, doc. 5, evento 3).

Inquirido em sede administrativa, no bojo do PAD nº 026/2020, E.D.S.S. fez uso do seu direito ao silêncio. Já em juízo, ouvido nos moldes do §2º do artigo 118 da LEP, com o propósito de explicar e...

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