Acórdão nº 50814339620218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 15-06-2022

Data de Julgamento15 Junho 2022
ÓrgãoVigésima Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50814339620218217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002178820
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5081433-96.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda

RELATOR: Desembargador GLENIO JOSE WASSERSTEIN HEKMAN

AGRAVANTE: JOSIANA DE OLIVEIRA MORAIS KRAMER

AGRAVADO: FELISBINO LISBOA BOEIRA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por JOSIANA DE OLIVEIRA MORAIS KRAMER em face da decisão que afastou a alegação de impossibilidade jurídica do pedido, nos autos da ação de obrigação de fazer com pedido liminar, que FELISBINO LISBOA BOEIRA move em seu desfavor.

Está assim redigida a decisão agravada:

1 - Da impossibilidade jurídica do pedido

A Lei de Registros Públicos, dispõe no nº 29 do inciso I do art. 167 ser possível o registro da compra e venda, tanto da pura como da condicional.

A compra e venda condicional, neste artigo, é aquele negócio jurídico imobiliário cujos efeitos estão subordinados a uma condição, tal seja, a um evento futuro e incerto (art. 121 do Código Civil), que pode ser tanto uma condição suspensiva como uma condição resolutiva.

Na condição ou cláusula suspensiva (art. 125 do Código Civil) o negócio jurídico está submetido a um evento futuro e incerto que, não ocorrendo, não gera a aquisição do direito. Nessa situação o negócio jurídico existe, mas sua eficácia estará suspensa até que ocorra o evento futuro que o condiciona.

Relativamente ao contrato de compra e venda, significa que essa venda só produzirá seus efeitos depois de implementada a condição suspensiva estabelecida. O que se tem aqui é mera expectativa de direito e não direito adquirido.

Na condição ou cláusula resolutiva (art. 127 do Código Civil) o negócio jurídico vigorará plenamente desde sua constituição, mas, verificando-se a condição o direito se extingue. “A compra e venda sob condição resolutiva significa que o negócio vigora desde o início, podendo ser registrada a transmissão da propriedade, bem como o imóvel pode inclusive ser vendido para terceiros. Contudo, se o evento futuro ocorrer, os registros das alienações serão cancelados, restaurando-se a situação anterior, em nome do primitivo vendedor”.

No presente caso verifica-se que a venda se perfectibilizaria com o falecimento de Maria Luiza.

Assim, afasto a preliminar arguida.

2 - Defiro AJG à demandada.

3 - No mais, intimem-se as partes para que, no prazo impostergável de 15 dias, esclareçam as provas que pretendem produzir, inclusive renovando eventuais pedidos anteriormente deduzidos, sob pena de preclusão da faculdade probatória, com correlato encerramento da fase instrutória e julgamento da lide no estado em que se encontra.

Com efeito, caso pretendam produzir prova testemunhal, deverão - em idêntico prazo - acostar o rol de testemunhas, declinando corretamente o endereço e telefone, bem como informar expressamente sobre a necessidade de intimação, sob pena de terem de apresentá-las em juízo independentemente de intimação.

Dils.

Após a decisão ser proferida, a parte interpôs embargos de declaração, os quais foram julgados da seguinte forma:

Desacolho os embargos, porquanto não verifico a existência de omissão ou contradição da decisão atacada.

Ademais, a irresignação deverá ser enfrentada em via adequada.

Intime-se.

Em razões argumenta que seu pedido liminar se refere a nulidade do pedido, expresso no artigo 426 do CPC, visto a impossibilidade jurídica do mesmo. Aduz que a nulidade do fato se dá em face de não poder ser realizado negócio jurídico envolvendo herança de pessoa viva. Colaciona jurisprudência desta Corte neste sentido. Discorre sobre a previsão do artigo 485, inciso IV, do CPC, indicando que o presente feito deve ser extinto. Disserta sobre a necessidade de concessão de efeito suspensivo. Requer que o presente recurso seja recebido com efeito suspensivo, vindo a dar provimento, determinando o reconhecimento da impossibilidade jurídica do pedido formulado na ação de obrigação de fazer, visto que o mesmo é manifestamente nulo.

O recurso foi recebido sem atribuição de efeito suspensivo, nos termos da decisão do Evento 5.

A parte agravada ofertou contrarrazões, momento em que pugnou pelo desprovimento do recurso.

Vieram-me os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Com a entrada em vigor do CPC/15, restaram limitadas as hipóteses para interposição e conhecimento do recurso de agravo de instrumento, conforme rol taxativo do art. 1.015 do mesmo dispositivo legal, in verbis:

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

I - tutelas provisórias;

II - mérito do processo;

III - rejeição da alegação de convenção de arbitragem;

IV - incidente de desconsideração da personalidade jurídica;

V - rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pedido de sua revogação;

VI - exibição ou posse de documento ou coisa;

VII - exclusão de litisconsorte;

VIII - rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio;

IX - admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros;

X - concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à execução;

XI - redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1º;

XII - (VETADO);

XIII - outros casos expressamente referidos em lei.

Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário.

Na doutrina, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero1 explicam a técnica de enumeração taxativa das hipóteses de cabimento do agravo de instrumento, nestes termos:

No Código Buzaid, o agravo era gênero no qual ingressavam duas espécies: o agravo retido e o agravo de instrumento. Toda e qualquer decisão interlocutória era passível de agravo suscetível de interposição imediata por alguma dessas duas formas. O novo Código alterou esses dois dados ligados à conformação do agravo: o agravo retido desaparece do sistema (as questões resolvidas por decisões interlocutórias não suscetíveis de agravo de instrumento só poderão ser atacadas nas razões de apelação, art. 1.009, § 1.º, CPC) e o agravo de instrumento passa a ter cabimento apenas contra as decisões interlocutórias expressamente arroladas pelo legislador (art. 1.015, CPC). Com a postergação da impugnação das questões decididas no curso do processo para as razões de apelação ou para as suas contrarrazões e com a previsão de rol taxativo das hipóteses de cabimento do agravo de instrumento, o legislador procurou a um só tempo prestigiar a estruturação do procedimento comum a partir da oralidade (que exige, na maior medida possível, irrecorribilidade em separado das decisões interlocutórias), preservar os poderes de condução do processo do juiz de primeiro grau e simplificar o desenvolvimento do procedimento comum.

O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.696.396/MT, de relatoria da Min. Nancy Andrighi, realizado sob o rito dos Recursos Repetitivos, fixou tese sobre a mitigação da taxatividade do Agravo de Instrumento (Tema 988): o rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação.

O REsp supracitado restou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. NATUREZA JURÍDICA DO ROL DO ART. 1.015 DO CPC/2015. IMPUGNAÇÃO IMEDIATA DE DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS NÃO PREVISTAS NOS INCISOS DO REFERIDO DISPOSITIVO LEGAL. POSSIBILIDADE. TAXATIVIDADE MITIGADA. EXCEPCIONALIDADE DA IMPUGNAÇÃO FORA DAS HIPÓTESES PREVISTAS EM LEI. REQUISITOS.

1- O propósito do presente recurso especial, processado e julgado sob o rito dos recursos repetitivos, é definir a natureza jurídica do rol do art. 1.015 do CPC/15 e verificar a possibilidade de sua interpretação extensiva, analógica ou exemplificativa, a fim de admitir a interposição de agravo de instrumento contra decisão interlocutória que verse sobre hipóteses não expressamente previstas nos incisos do referido dispositivo legal.

2- Ao restringir a recorribilidade das decisões interlocutórias proferidas na fase de conhecimento do procedimento comum e dos procedimentos especiais, exceção feita ao inventário, pretendeu o legislador salvaguardar apenas as "situações que, realmente, não podem aguardar rediscussão futura em eventual recurso de apelação".

3- A enunciação, em rol pretensamente exaustivo, das hipóteses em que o agravo de instrumento seria cabível revela-se, na esteira da majoritária doutrina e jurisprudência, insuficiente e em desconformidade com as normas fundamentais do processo civil, na medida em que sobrevivem questões urgentes fora da lista do art. 1.015 do CPC e que tornam inviável a interpretação de que o referido rol seria absolutamente taxativo e que deveria ser lido de modo restritivo.

4- A tese de que o rol do art. 1.015 do CPC seria taxativo, mas admitiria interpretações extensivas ou analógicas, mostra-se igualmente ineficaz para a conferir ao referido dispositivo uma interpretação em sintonia com as normas fundamentais do processo civil, seja porque ainda remanescerão hipóteses em que não será possível extrair o cabimento do agravo das situações enunciadas no rol, seja porque o uso da interpretação extensiva ou da analogia pode desnaturar a essência de institutos jurídicos ontologicamente distintos.

5- A tese de que o rol do art. 1.015 do CPC seria meramente exemplificativo, por sua vez, resultaria na repristinação do regime recursal das interlocutórias que vigorava no CPC/73 e que fora conscientemente modificado pelo legislador do novo CPC, de modo que estaria...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT