Acórdão nº 50819835720228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 13-07-2022

Data de Julgamento13 Julho 2022
ÓrgãoVigésima Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50819835720228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002417356
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5081983-57.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Pagamento

RELATOR: Desembargador DILSO DOMINGOS PEREIRA

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por ELDE FENGLER, em face da decisão proferida nos autos da ação monitória ajuizada por COMERCIAL PONTO DO MARCENEIRO SM LTDA, cujo teor enuncia:

Vistos em saneamento: Cumpre analisar as preliminares arguidas pelas partes, como leciona o art. 357 do CPC. I ¿ Ilegitimidade Passiva Argui a embargante, em preliminar, que não possui vínculo comercial com a embargada, bem como que a cártula objeto desta ação é originária de contratação de móveis sob medida para um escritório, com a empresa Flores e Ribeiro Ind. de Móveis Ltda. Compulsando os autos, verifico que não assiste razão a embargante, eis que o cheque é ordem de pagamento à vista, constitui título executivo e obriga o seu emitente pela provisão de fundos na instituição sacada. Não enseja discussão de causa debendi e por insuficiência de fundos ou contra-ordem de pagamento quem responde é o seu emitente não importando se destinado ao pagamento de obrigação de terceiro. Com efeito, a legitimidade para responder pela ação monitória é do emitente do título de crédito, ainda que destinado ao pagamento de obrigação de terceiro. Assim, afasto a preliminar de ilegitimidade passiva, arguida pelo embargante. II - Da Denunciação à lide Alega a demandada, em sede de preliminar, a denunciação à lide da empresa Flores e Ribeiro Ind. de Móveis Ltda, sob o argumento de que o valor de R$3.500,00 é oriundo de negócio jurídico firmado entre o autor/embargado e a denunciada, razão pela qual entende que a entidade deveria integrar o polo passivo da demanda. Compulsando os autos, entendo que não assiste razão a requerida, pois, uma vez que, o art. 125, inciso II, do CPC, assegura o direito da denunciação da lide quando houver a obrigação de indenizar, esta, só será admissível quando existente a obrigação legal ou contratual de indenizar em ação regressiva, não sendo possível a denunciação como forma de transferir a responsabilidade a terceiros. Outrossim, tendo em vista que o cheque se caracteriza como título de crédito que goza de autonomia, abstração e literalidade, sendo representativo de obrigação autônoma, independente, líquido e certo, este, é um título de crédito que desvincula-se de sua causa subjacente ao circular, visando proteger o terceiro de boa-fé, bem como fomentar a realização de novos negócios jurídicos. Assim, cada credor do cheque exerce um direito originário, autônomo, próprio e independente dos demais signatários do título, o qual não pode ser restringido pelas relações existentes entre os anteriores possuidores e o devedor do mesmo. Nesse sentido, art. 25 da Lei do cheque (Lei n° 7357): Quem for demandado por obrigação resultante de cheque não pode opor ao portador exceções fundadas em relações pessoais com o emitente, ou com os portadores anteriores, salvo se o portador o adquiriu conscientemente em detrimento do devedor. Da mesma forma, prevê a Lei Uniforme de Genebra, em seu art. 17: As pessoas acionadas em virtude de uma letra não podem opor ao portador exceções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador ou com os portadores anteriores, a menos que portador ao adquirir a letra tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor. Também, a Lei Cambial (D 2.044, 31.12.08), no art. 51: Na ação cambial, somente é admissível defesa fundada no direito pessoal do réu contra o autor, em defeito de forma do título e na falta de requisito necessário ao exercício da ação. Nesse sentido, o posicionamento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ao qual me filio: (...) Pelo exposto, afasto a preliminar de carência da ação arguida pela embargante. IV ¿ Da Intempestividade dos Embargos Relata o embargado acerca da intempestividade da oposição dos embargos monitórios, sob o argumento que a procuradora da embargante/reconvinte tomou o processo em carga em 20/08/2020, devendo o prazo fluir a partir da referida data, encerrando em 11/09/2020. Compulsando os autos, verifico que não assiste razão o embargado, levando em conta que mesmo o prazo de defesa quinzenal, iniciando em 20/08/2020, findaria em 11/09/2020, sem contar o prazo de suspensão dos processos físicos. Assim, considerando que os embargos foram protocolados em 11/09/2020, não há no que se falar em intempestividade da defesa. Destarte, afasto a preliminar da Intempestividade dos Embargos arguida pelo embargado. Ainda, esclareçam as partes, com clareza e objetividade, as provas que efetivamente pretendem produzir, informando sobre sua utilidade, necessidade e conveniência, sem prejuízo de eventual julgamento antecipado. Pretendendo a produção de prova oral, atentas ao dever de colaboração, manifestem-se de forma expressa quanto à necessidade de coleta de depoimento pessoal da parte adversa, bem como arrolem testemunhas, que possam elucidar os fatos controvertidos, sob pena de perda da prova, ficando cientes de que a audiência se realizará, preferencialmente, de forma virtual, como autoriza o Ofício Circular nº 035/2020 da CGJ c/c Resolução nº 011/2020-P, em plataformas digitais disponibilizadas pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Em não havendo concordância com a realização da audiência online, deverá a parte manifestar-se expressamente justificando a sua posição. Outrossim, o silêncio será interpretado como concordância da realização do ato online. Caso pretendam a produção de prova pericial, deverão indicar, objetivamente, o que pretendem demonstrar e qual a especialidade técnica do profissional a ser nomeado pelo juízo.

Em suas razões, sustenta que a decisão merece quando a) afastou a preliminar de ilegitimidade passiva da empresa Flores e Ribeiro Ind. de Móveis Ltda; b) indeferiu a denunciação a lide; c) afastou a preliminar de carência da ação. Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva, sustenta que, mediante Jéssica Marques, contratou os serviços da empresa Flores e Ribeiro, dando como pagamento o cheque. Observa que nunca teve relação direta com tal empresa.Acrescenta que a Flores e Ribeiro repassou o cheque a terceiros e não realizou o serviço contratado, por isso sustou o título. Quanto à denunciação da lide, entende que a decisão merece reforma, pois não manteve relação com a empresa Flores e Ribeiro, mas com a arquiteta Jessica Marques. E, no tocante à preliminar de carência de ação, assevera ser possível discutir a "causa debendi" quando o cheque se encontra prescrito. Requer a concessão de efeito suspensivo e, ao final, o provimento do agravo, para acolher a preliminar de ilegitimidade passiva e de carência de ação ou, subsidiariamente, deferir a denunciação da Lide à empresa Flores e Ribeiro e à arquiteta Jessica Marques.

Ao agravo, não foi atribuído efeito suspensivo.

Com as contrarrazões, os autos vieram conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Conheço do agravo apenas quanto ao tópico da decisão que indeferiu o pedido de denunciação da lide.

Quanto aos demais pontos, afastamento das preliminares de ilegitimidade passiva e de "carência de ação", a matéria,não é passível de ser atacada por agravo de instrumento, pois não se enquadra em qualquer das hipóteses arroladas pelo art. 1.015 do CPC, “in verbis”:

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

I - tutelas provisórias;

II - mérito do processo;

III - rejeição da alegação de convenção de arbitragem;

IV - incidente de desconsideração da personalidade jurídica;

V - rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pedido de sua revogação;

VI - exibição ou posse de documento ou coisa;

VII - exclusão de litisconsorte;

VIII - rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio;

IX - admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros;

X - concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à execução;

XI - redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1o;

XII - (VETADO);

XIII - outros casos expressamente referidos em lei.

Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário.

Não se desconhece, é bem verdade que, ao apreciar o Resp 1.696.396-MT e o Resp 1.704.520-MT, o STJ passou a entender que o rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada.

Contudo, a orientação traçada nesses paradigmas sob nenhum aspecto impõe o regresso ao sistema do antigo código, que permitia o manejo do agravo irrestritamente. A orientação do STJ é bem clara. Poderá se conhecer do agravo, ainda que a matéria não conste entre as arroladas no art. 1.015 do CPC, se houver inquestionável prejuízo para a parte, situação que não permite que se aguarde a análise da vexata quaestio na apelação.

Veja-se, a respeito, a tese firmada pelo STJ ao analisar o Resp 1.704.520-MT :

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. NATUREZA JURÍDICA DO ROL DO ART. 1.015 DO CPC/2015. IMPUGNAÇÃO IMEDIATA DE DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS NÃO PREVISTAS NOS INCISOS DO REFERIDO DISPOSITIVO LEGAL. POSSIBILIDADE. TAXATIVIDADE MITIGADA. EXCEPCIONALIDADE DA IMPUGNAÇÃO FORA DAS HIPÓTESES PREVISTAS EM LEI. REQUISITOS.

1- O propósito do presente recurso especial, processado e...

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