Acórdão nº 50837532220218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50837532220218217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001472199
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5083753-22.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Urgência

RELATORA: Desembargadora LAURA LOUZADA JACCOTTET

AGRAVANTE: IPE-SAÚDE - INSTITUTO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO RIO GRANDE DO SUL

AGRAVADO: SANTA AUTA DE OLIVEIRA ALBERNAZ

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo IPE-SAÚDE - INSTITUTO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO RIO GRANDE DO SUL, nos autos da ação que lhe move SANTA AUTA DE OLIVEIRA ALBERNAZ, em face da decisão datada de 13/05/2021 (evento nº 11) que deferiu a tutela de urgência para determinar que a ré fornecesse, imediatamente, o custeio integral do procedimento cirúrgico requerido e seus materiais, sob pena de multa diária de R$ 1.500,00, limitado ao valor do procedimento.

Em suas razões, primeiramente aduz ser exíguo o prazo para cumprimento da tutela de urgência, eis que determinou o imediato custeio do procedimento cirúrgico. Após, defende inexistir prova da indispensabilidade e urgência, para a vida da parte autora, do fornecimento imediato do tratamento antes da sentença. Ademais, sustenta a inexistência de cobertura do procedimento requerido, asseverando que qualquer tratamento, para ser disponibilizado pelo IPE-Saúde, deve estar normativa e inequivocamente previsto, o que não acontece neste caso, conforme regras e tabelas do Ipe Saúde (Ordem de Serviço nº 007/2014), que não prevê a cobertura para esse procedimento (cirurgia + materiais). Ainda, que o plano se submete ao princípio da coparticipação do segurado. Prossegue asseverando ser inadequada a fixação de multa diária contra a Fazenda Pública, pois não atinge sua finalidade processual. Por fim, alega ser irreversível a medida, esgotando o objeto da lide. Ao final, pugna seja dado provimento, para cassar a decisão recorrida, ou, acaso assim não se entenda, que, se mantida a ordem, seja fixado prazo de cumprimento não inferior a dez dias, e dela se afastando a imposição de multa diária, pelos fundamentos já expostos.

Determinada a intimação do agravante quanto a eventual interesse recursal remanescente, diante do óbito da autora em 07/06/2021, após a realização da cirurgia às expensas do agravante (evento nº 5), o prazo transcorreu in albis.

Indeferida a liminar recursal, seguiu-se o trâmite não tendo sido apresentadas contrarrazões, oportunidade em que o Ministério Público opinou pelo conhecimento e parcial provimento recursal.

Após, voltaram os autos conclusos.

É o breve relatório.

VOTO

Conheço do recurso, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade.

Inicialmente, considerando que a negativa administrativa restou realizada após a entrada em vigor da Lei Complementar nº 15.145/2018 (inexistente prova do pedido), aplicável a novel legislação ao caso em tela.

Trata-se de ação ajuizada por SANTA AUTA DE OLIVEIRA ALBERNAZ em desfavor do IPE-SAÚDE - INSTITUTO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO RIO GRANDE DO SUL, com pedido de tutela de urgência, narrando ser portadora de aneurisma da aorta torácico-abdominal, sem menção de ruptura (CID 171.6), necessitando de intervenção cirúrgica para a colocação de Endoprótese ramificada T-Branch Cook, Endoprótese Torácica Zenith Alpha e de três Stents Revestidos Lifestream (Fenergy), conforme solicitado pelo seu médico assistente, cujo fornecimento dos materiais foi negado pelo plano de saúde demandado.

Nesse sentido, trecho do laudo médico que embasa o pedido:

Assim, deferida a tutela de urgência nos seguintes moldes:

Desse modo, considerando o bem jurídico tutelado, defiro a tutela pleiteada, a fim de determinar que a parte ré, imediatamente, custeie integralmente o procedimento cirúrgico do requerente, nos termos da solicitação médica constante dos autos, em especial dos materiais necessários à sua implementação - Endoprótese ramificada T-Branch Cook, Endoprótese Torácica Zenith Alpha e de três Stents Revestidos Lifestream (Fenergy) -, sob pena de multa diária de R$1.500,00, limitada ao valor do procedimento cirúrgico. (grifei)

Irresignada, a autarquia interpôs o presente recurso, suscitando as teses de teses de ausência de cobertura, submetendo-se o plano ao princípio da coparticipação financeira do segurado, e inadequação da multa diária.

Cumpre referir, ainda, que restou noticiado o óbito da autora nos autos da origem, após a realização do procedimento cirúrgico, em cumprimento a decisão liminar, oportunidade que o Juízo a quo determinou o prosseguimento do feito, com habilitação da sucessão, porque presente pedido declaratório de nulidade do indeferimento administrativo e indenizatório por dano moral e material (evento nº 41).

Restou habilitada a sucessão da autora no feito, conforme procurações colacionadas ao evento nº 51 dos autos da origem.

Pois bem.

Em que pese o artigo 4º da Lei Complementar nº 15.145/18, que revogou a Lei nº 12.134/04, disponha que integram o plano de saúde atendimentos médicos, hospitalares, ambulatoriais, laboratoriais, bem como atos necessários ao diagnóstico e aos tratamentos, exceto os tratamentos não previstos nas tabelas do próprio Instituto, o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte é cristalino quanto à impossibilidade do plano de saúde eleger as espécies de tratamento fornecidos ao segurado.

Nesse sentido, precedentes da Corte Superior:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA. ABUSIVIDADE. ENTENDIMENTO ADOTADO NESTA CORTE. VERBETE 83 DA SÚMULA DO STJ. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. REEXAME. SÚMULA N. 7/STJ. NÃO PROVIMENTO.

1. É abusiva a cláusula que exclui da cobertura do plano de saúde procedimento ou medicamento necessário para assegurar o tratamento de doenças previstas no referido plano. Precedentes. (...) (AgInt no AREsp 1353634/PR, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 16/05/2019, DJe 21/05/2019)

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. AUTOGESTÃO. INAPLICABILIDADE DO CDC. SÚMULA 608/STJ. NEGATIVA DE COBERTURA DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. NATUREZA ABUSIVA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

1. Com relação à inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso em voga, incide a Súmula 608 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe: "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão." Não obstante tal posicionamento, ressalta-se que permanece a obrigação dos planos de saúde de autogestão de cumprirem as obrigações legais e contratuais.

2. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento de que "o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de terapêutica indicada por profissional habilitado na busca da cura, e que é abusiva a cláusula contratual que exclui tratamento, medicamento ou procedimento imprescindível, prescrito para garantir a saúde ou a vida do beneficiário" (AgInt no AREsp 1.100.866/CE, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/11/2017, DJe de 30/11/2017) 3. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no REsp 1739747/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 16/10/2018, DJe 30/10/2018) (Grifei)

No mesmo norte, julgados deste Tribunal, alguns já sob o prisma da Lei 15.145/2018:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO PÚBLICO. SAÚDE. FORNECIMENTO DE TRATAMENTO DE IMUNOTERAPIA. AÇÃO DE REEMBOLSO DE DESPESAS. NEGATIVA DO IPERGS. IMPOSSIBILIDADE. CÂNCER DE PULMÃO METASTÁTICO, ESTÁGIO IV. MEDICAÇÃO. PEMBROLIZUMABE. IMPRESCINDIBILIDADE E URGÊNCIA DO TRATAMENTO COMPROVADAS. DESCABE AO PLANO DE SAÚDE PÚBLICO SELECIONAR O TIPO DE MEDICAÇÃO NECESSÁRIA AO TRATAMENTO DO SEGURADO. A Lei Complementar nº 15.145/2018, que dispõe sobre o Plano de Saúde do Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul (IPE-SAÚDE), prevê a cobertura de atendimentos médicos, hospitalares, ambulatoriais, assim como os atos necessários ao diagnóstico e ao tratamento da patologia de que padece o beneficiário.Em que pese a edição da Lei Complementar nº. 15.145/2018, que altera a Lei Complementar nº. 12.066/2004, disciplinando que descabe a imposição ao IPERGS de medicamentos não previstos em seus regramentos, entendo que a falta de previsão no Protocolo Oncológico 2010 e o alto custo do medicamento não devem servir de obstáculo ao fornecimento do tratamento postulado, visto que demonstrada a necessidade do uso do fármaco, bem como a condição de segurada da autarquia. [...] APELO PROVIDO EM PARTE. (Apelação Cível, Nº 70084227479, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miguel Ângelo da Silva, Julgado em: 30-07-2020) (Grifei)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. IPERGS. IPÊ-SAÚDE. RETIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. RIBOCICLIBE (KISQUALI®). TRATAMENTO ONCOLÓGICO. NEGATIVA ADMINISTRATIVA CALCADA NA AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL. CRITÉRIO DE EXCLUSÃO EXPRESSA DE COBERTURA. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL DO IPÊ-SAÚDE. REALIZAÇÃO DE PERÍCIA MÉDICA JUDICIAL. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA DEVIDOS A PROCURADOR PARTICULAR. APRECIAÇÃO EQUITATIVA DO JULGADOR. MINORAÇÃO. CABIMENTO. 1. Uma vez comprovada a cisão do IPERGS em IPÊ-SAÚDE e IPÊ-PREVIDÊNCIA, impõe-se a retificação do polo passivo da presente demanda. 2. Em que pesem as disposições da Lei Complementar nº 15.145/18, tem-se que a ausência de previsão no Protocolo Oncológico não deve servir de obstáculo ao fornecimento do tratamento médico postulado. Inclusive, válido ressaltar que, de acordo com as Recomendações em Oncologia do próprio Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul, atualizadas em dezembro de 2018 – elaboradas pelo Comitê Científico de...

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