Acórdão nº 50844914420208217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 29-01-2021

Data de Julgamento29 Janeiro 2021
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo50844914420208217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20000510610
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5084491-44.2020.8.21.7000/

TIPO DE AÇÃO: Roubo majorado (art. 157, § 2º)

RELATORA: Desembargadora ISABEL DE BORBA LUCAS

AGRAVANTE: GABRIEL RIBAS RIBEIRO

AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RELATÓRIO

GABRIEL RIBAS RIBEIRO interpôs agravo em execução penal contra decisão que reconheceu o cometimento, de sua parte, de falta disciplinar de natureza grave, por fuga, determinando a regressão de seu regime carcerário para o fechado, a alteração da data base para a concessão de novos benefícios e a perda de 1/3 dos seus dias remidos e a remir.

Alegou, o agravante, em síntese, não ser caso de reconhecimento de falta grave, pois justificada a conduta, ausente dolo em sua ação, somente não tendo se reapresentado, após saída temporária, por não possuir dinheiro para a aquisição de passagem de retorno para a comarca de origem. Destacou, nesse sentido, que costumava passar os dias de saída temporária no município de Gravataí, no qual residia e para onde estava tentando transferência, conforme fazem prova os documentos acostados aos autos. Nessa situação, tentou se apresentar junto ao Foro Central de Porto Alegre, ocasião em que, contudo, teve negada vaga em uma das casas prisionais da região metropolitana em virtude da superlotação destas, motivo pelo qual, por não ter dinheiro para comprar passagem de volta à Palmeira das Missões, permaneceu em Gravataí. Salientou, ademais, que, durante todo o período durante o qual esteve na condição de foragido, exerceu atividade laboral e se manteve junto a familiares, ausente notícia de novos delitos, apenas não retornando ao cumprimento da pena, por insuficiência de recursos financeiros. Também não seria de seu conhecimento que poderia solicitar auxílio junto ao setor de Assistência Social do Município. Subsidiariamente, requereu a manutenção dos seus dias remidos, ou que a perda se dê em patamar inferior, observados os princípios da proporcionalidade, da individualização da pena e da dignidade humana. Ainda pugnou pelo afastamento da regressão do regime carcerário, medida desnecessária, considerando o período durante o qual permaneceu cautelarmente recolhido em regime mais gravoso, e pelo afastamento da alteração da data base ou a limitação de seu alcance apenas à progressão de regime, excluídos os demais benefícios da execução penal, em especial a saída temporária e o trabalho externo. Prequestionou, por fim, os pontos debatidos.

Com base nessas considerações, requereu o provimento do recurso, com o afastamento do reconhecimento da falta grave e de seus consectários legais.

Contrarrazões pelo desprovimento do recurso (doc. 4, evento 3).

Mantida a decisão (seq. 138.1 SEEU).

Em parecer, opinou o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Luiz Henrique Barbosa Lima Faria Corrêa, pelo desprovimento do agravo (doc. 15, evento 9).

Vieram conclusos.

É o relatório.

VOTO

Trata-se de agravo em execução, interposto por GABRIEL RIBAS RIBEIRO, contra decisão que reconheceu o cometimento, de sua parte, de falta disciplinar de natureza grave, por fuga, determinando a regressão de seu regime carcerário, a alteração da data base para a concessão de novos benefícios e a perda de 1/3 dos seus dias remidos e a remir.

O agravo, adianto, merece parcial provimento.

O agravante cumpre pena total de 06 (seis) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, atualmente em regime fechado, pela prática de crime de roubo majorado, com início em 03/02/2018. Em 04/01/2020, quando cumpria pena em regime semiaberto e durante o gozo de saída temporária, não retornou ao sistema prisional, passando à condição de foragido, com recaptura, conforme dados constantes do relatório da situação processual executória, somente em 25/08/2020.

No bojo do PAD nº 8927/2020, instaurado em âmbito administrativo, a fim de apurar a conduta faltosa, GABRIEL referiu ter sido orientado pela casa prisional de que poderia se apresentar na Comarca de Gravataí, por ser a cidade onde morava. Disse que foi no Fórum Central de Porto Alegre para se apresentar em Gravataí, mas que foi negado devido à superlotação na região metropolitana e por não ter encaminhamento do PEC. Informou que não tinha passagem para retornar e que não tinha serviço (fl. 07, doc. 10, evento 3).

E quando ouvido em juízo, nos moldes do §2º do artigo 118 da LEP, com o propósito de explicar e afastar o reconhecimento da falta grave, manteve a mesma versão, assim se manifestando (doc. 11, evento 3):

(...) O depoente diz que se apresentou no Fórum Central de Porto Alegre e eles não lhe aceitaram. Que se apresentou dois dias antes de ter que se apresentar aqui. PELO MP: que estava em saída temporária. Refere que disseram para ela que podia se apresentar em Porto Alegre. Que ficou trabalhando em uma lavoura. Que durante o tempo em que ficou foragido ficou trabalhando. Que estava com seus familiares. Que foi preso pela Brigada Militar em um bar. Sua prisão ocorreu no início da noite. Que não tentou por meio da Assistência Social retornar a Palmeira das Missões. PELA DEFESA: que quando se apresentou em Porto Alegre lhe orientaram retornar a Palmeira das Missões. Que não retornou em razão de não ter como adquirir passagem. Que não sabe o que é Assistência Social referida pelo Ministério Público. Que esteve trabalhando em uma lavoura de seus parentes. Que não tinha dinheiro para retornar. (...)

No entanto, a justificativa apresentada não possui qualquer possibilidade de afastar o cometimento da falta grave, pela fuga, admitida por ele próprio, pois não cabe ao apenado, ora agravante, escolher a conduta que mais lhe beneficie, divorciando-se do cumprimento de sua reprimenda, em total discordância com o dever jurídico que lhe foi imposto pela pena aplicada. De notar, aliás, que o agravante permaneceu fora do sistema prisional por mais de seis meses, período durante o qual, em momento algum, buscou regularizar sua situação. Pelo contrário, somente voltou a cumprir pena, porque detido em abordagem de rotina realizada por policiais militares, ocasião em que, ademais, conforme referiu, em juízo, encontrava-se em um bar, ocorrendo sua prisão, ressalta-se, conforme registro de ocorrência acostado aos autos, às 23h30min do dia 14/08/2020 (doc. 8, evento 3).

Por outro lado, o fato de ter permanecido em regime mais severo, desde sua recaptura, também não obsta o reconhecimento da falta grave e/ou a aplicação de seus consectários lógicos e legais, pois tal período será considerado, quando do cálculo para a concessão de novos benefícios, na execução penal.

Mesma forma, não há falar em ofensa à Carta Magna, por violação ao princípio da proporcionalidade, porquanto, se assim não se procedesse, o apenado faltoso permaneceria em situação idêntica à do que cumpre integralmente as sanções que lhe são impostas, em verdadeira violação ao princípio da individualização da pena. Com efeito, revela-se adequado e razoável sancionar aquele que incidir nas hipóteses de falta grave, elencadas no artigo 50 da LEP, porquanto o cometimento das condutas ali descritas demonstra a sua indiferença para com o cumprimento de sua reprimenda.

Assim, praticada a falta grave, afastada a justificativa do agravante, devem incidir sobre ele as consequências jurídicas de sua conduta, conforme artigo 50 da LEP.

Esse é o entendimento uníssono desta Corte e, a título de exemplificação, dentre tantos outros, colaciono os seguintes precedentes:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. RECURSO DEFENSIVO. MANUTENÇÃO DO RECONHECIMENTO DA FALTA GRAVE. FUGA. REGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL. ALTERAÇÃO DA DATA-BASE. PERDA DOS DIAS REMIDOS. - FALTA GRAVE. ART. 50, INC. II, DA LEP. Irrepreensível o reconhecimento da prática da falta grave, consistente em fuga, empreendida pelo apenado que, no gozo do benefício da saída temporária, não retornou ao presídio no dia 26.02.2019, passando à condição de foragido até a sua recaptura em 05.03.2019. Justificativa não acolhida. - REGRESSÃO DE REGIME. A partir do reconhecimento da falta grave, a regressão a regime mais severo é consequência necessária considerando o que preleciona com clareza o art. 118, inc. I, da LEP. - ALTERAÇÃO DA DATA-BASE. Ocorrendo a regressão de regime prisional, a interrupção do prazo para nova progressão é simples decorrência da interpretação sistemática da LEP, que, em seu art. 112, estabelece como requisito para a transferência a regime menos rigoroso, o cumprimento pelo apenado de ao menos 1/6 (um sexto) da pena no regime anterior. Jurisprudência pacífica do STF e do STJ. - PERDA DOS DIAS REMIDOS. A remição não constitui direito adquirido do apenado, mas mera expectativa de direito sujeita à cláusula rebus sic stantibus, passível de revogação. Constitucionalidade do art. 127 da LEP assentada pelo STF. Súmula Vinculante nº 9. Mantida a decretação de perda de 1/3 dos dias remidos. Agravo desprovido. (Agravo de Execução Penal, Nº 70083607317, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Dálvio Leite Dias Teixeira, Julgado em: 29-01-2020)

AGRAVO EM EXECUÇÃO. VIOLAÇÃO DA ZONA DE MONITORAMENTO. ROMPIMENTO DA TORNOZELEIRA ELETRÔNICA. FUGA. FALTA GRAVE. CONSECTÁRIOS. 1. BLOQUEIO DO SINAL DO DISPOSITIVO DO MONITORAMENTO ELETRÔNICO. ROMPIMENTO DA CINTA. FUGA. FALTA GRAVE. CARACTERIZAÇÃO. REGRESSÃO DE REGIME. Hipótese na qual a reclusa bloqueou o sinal do dispositivo do monitoramento eletrônico e, posteriormente, retirou a cinta da tornozeleira, sendo considerada foragida, recapturada mais de um ano e meio depois, conduta que, a par de possibilitar a revogação do benefício do monitoramento eletrônico (art. 146-D, II da LEP), configura a falta grave de fuga, porque a condenada permaneceu em plena liberdade, por um...

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