Acórdão nº 50856557320228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 09-05-2022

Data de Julgamento09 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo50856557320228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002125430
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5085655-73.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Estelionato (art. 171)

RELATORA: Desembargadora VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Eminentes Colegas.

Trata-se de ordem de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrada por NATHALIA TEIXEIRA DE OLIVEIRA GALVÃO, advogada, em favor de RAMON DA SILVA SANTOS, sob a alegação de este estar sofrendo constrangimento ilegal por ato da Juíza da 2ª Vara Criminal do Foro de Erechim/RS, nos autos do processo tombado sob o nº 5012191-59.2021.8.21.0013.

A impetrante narrou, inicialmente, que o paciente foi preso preventivamente em 13.03.2022, pela suposta prática do crime de estelionato.

Sustentou que não estão presentes os requisitos e pressupostos da segregação cautelar, bem como que a decisão que decretou a prisão preventiva do paciente está despida de fundamentação idônea, pois baseada unicamente "na gravidade abstrata do delito".

Alegou que o paciente "não praticou crime algum, do contrário, e como ficará provado, o réu é inocente e também vítima, pois foi contratado para prestar serviços autônomos, retirando envelopes apenas dois em endereços determinados, com anuência e entrega espontânea dos envelopes pelos “clientes” do seu contratante".

Apontou haver falta de contemporaneidade na segregação cautelar, porque "O fato investigado ocorreu a mais de 1 ano e seis 6 meses, e durante todo o período o mesmo sempre esteve a disposição da justiça, sem oferecer risco à ordem econômica, não há razões para imposição da medida mais gravosa, não há indícios de que hoje, após passados 1 ano e oito meses do fato acusatório, que a liberdade do Paciente ponha em risco a instrução criminal nos autos".

Asseverou, ainda, que o paciente é primário, tem bons antecedentes, possui residência fixa e trabalha de forma autônoma com sua mãe, de modo que preenche os requisitos para responder ao processo em liberdade.

Por fim, requereu o deferimento da liminar para o fim de revogar a prisão preventiva do paciente. No mérito, pugnou a concessão da ordem em definitivo.

O parecer do Ministério Público, de lavra do ilustre Procurador de Justiça, Dr. Maria Alice Buttini, foi emitido pela denegação da ordem de habeas corpus.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas, o paciente foi preso preventivamente pela suposta prática dos delito de estelionato.

Os fundamentos da segregação cautelar foram analisados quando do indeferimento da liminar e a eles me reporto para evitar repetição:

"(...)

Segundo se observa dos autos originários, em especial do Relatório Final elaborado pela Polícia Civil (evento 4, REL_FINAL_IPL1), foi instaurado inquérito policial para apurar a prática de cerca de 20 crimes de estelionato, ocorridos entre 08.09.2020 e 11.09.2020, consubstanciados na modalidade "golpe do cartão clonado", cujo modus operandi dos criminosos consistia no seguinte:

"(...)

Em todos os casos, o criminoso entra em contato com a vítima, na grande maioria das vezes por telefone fixo, se identificando como funcionário de banco e informando que o cartão magnético da vítima foi clonado.

Para cessar o problema, solicitam que a vítima confirme algumas informações e repasse dado do cartão e senha. Acreditando se tratar de uma ligação verdadeira, fornece os dados solicitados.

Em alguns casos, desconfiando da ligação, a vítima argumenta que irá contatar sua agência bancária, o que é aceito pelo estelionatário. Ocorre que sem verificar se a ligação foi encerrada, insere de imediato o número de telefone de sua agência e passar a conversar com o suposto bancário. Todavia, continua falando com a mesma pessoa.

Após fornecer todos os dados necessários, o criminoso solicita que a vítima escreva uma carta autorizando o envio do cartão magnético para a perícia e para auxiliar a polícia Civil ou Polícia Federal. Feito isso, deve colocar o cartão e a carta em um envelope para que um funcionário autorizado, com identificação do banco, passe na residência da vitima para captar o envelope.

Após a entrega, conversam com familiares ou se dirigem até suas agências bancárias e percebem que foram vítima de um golpe.

Dos casos aqui analisados, quase a totalidade das vítimas são pessoas idosas.

(...)".

A autoridade policial, durante as investigações, verificou que, de posse dos cartões das vítimas, os criminosos passavam a realizar saques, depósitos, transferências e empréstimos, sendo solicitadas imagens de câmeras de segurança do locais onde realizadas as transações.

Também foi requerida e autorizada judicialmente e quebra do sigilo bancário dos ofendidos, chegando-se, assim, à identificação dos criminosos.

Após outras diligências, a autoridade policial, em 03.12.2021, representou pela prisão preventiva e pelo cumprimento de mandado de busca e apreensão em residências, bem como pela quebra do sigilo de dados bancários e bloqueio de valores em contas correntes do paciente RAMON e de outros investigados (evento 1, REPRESENTACAO_BUSCA1).

Precedido de manifestação ministerial favorável (evento 5, PARECER1), o juízo de origem, acolhendo parcialmente a representação policial, decretou a prisão preventiva de RAMON e determinou a expedição de mandados de busca e apreensão. Vejamos (evento 13, DESPADEC1):

"(...)

Para a decretação da prisão preventiva faz-se necessário que esteja comprovada a existência do crime, que existam indícios de autoria e, além disso, que esteja presente alguma das hipóteses previstas no artigo 312 do Código de Processo Penal, observadas as hipóteses do artigo 313 do mesmo diploma legal.

O crime em questão tem pena máxima cominada superior a quatro anos de reclusão. A materialidade e os indícios de autoria estão suficientemente demonstrados, pelos depoimentos colhidos pela autoridade policial, em especial o do investigado Andrei que exerceu a função de motorista de Ramon, e das vítimas, sendo que duas delas reconheceram o representado Ramon como suposto funcionário do banco, além da documentação bancária e imagens de câmeras de monitoramento e segurança carreadas aos autos. Satisfeitos, portanto, os requisitos do art. 313 do CPP (fumus commissi delicti).

Quanto às exigências do artigo 312 (periculum libertatis), entendo que a segregação cautelar do investigado Ramon faz-se necessária para a garantia da ordem pública.

Verifica-se da certidão de antecedentes criminais que o representado já fora condenado por delitos de mesma natureza cometidos antes e depois dos fatos objeto do presente inquérito, tendo inclusive sido preso em flagrante, o que leva a crer que, caso continue solto, continuará na caminhada delitiva, já que faz do crime seu modo de vida.

Ainda que se tratem de delitos cometidos no ano de 2020, casos como esse, em que diversas vítimas idosas perderam economias quiçá da vida inteira, exigem uma resposta firme do Estado, para fazer cessar o agir criminoso e restabelecer a ordem pública. Do contrário, sentir-se-á o representado imune à ação da Justiça e incentivado, pelo sentimento de impunidade, a continuar a prática dessa espécie de conduta.

Ademais, não vislumbro adequação das outras medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP, ao presente caso. Com efeito, não há de se acreditar que alguma diminuição da esfera à liberdade e garantia do indivíduo, que não a prisão, seja suficiente para frear os impulsos criminosos do investigado.

Assim, a prisão de Ramon é necessária para garantia da ordem pública, além do que, pelo exposto, se revelam insuficientes as medidas cautelares estabelecidas no artigo 319 do CPP.

Por outro lado, com relação aos demais representados, inobstante existam indícios da participação nos delitos acima mencionados, não se encontram presentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva.

Embora exista prova de que os investigados Francisca, Alan, Edgar, Marco Aurélio e Ana Carolina tenham recebido valores oriundo das contas bancárias das vítimas, seja através de transferência eletrônica (TEV), caso dos últimos, seja através de máquinas de cartão da empresa Pagseguro cadastradas em seus nomes – Francisca, Alan e Edgar, não há como ser descartada a hipótese de se tratarem de “laranjas”, considerando a circunstância de residirem no mesmo município de Caieiras/SP, e em municípios próximos, o que demanda o prosseguimento das investigações e a coleta de novas provas, não ficando descartada a possibilidade de reanálise do pedido.

Sendo assim, considerando todas essas circunstâncias, tenho como presentes fundados motivos ao deferimento das diligências postuladas pela autoridade policial, eis que imprescindíveis à conclusão da investigação, inclusive com relação à quebra do sigilo bancário e bloqueio dos valores eventualmente encontrados em contas e investimentos dos representados, a fim de possibilitar o ressarcimento às vítimas.

PELO EXPOSTO, acolho parcialmente a representação da autoridade policial para:

1) decretar a prisão preventiva de RAMON DA SILVA SANTOS, para garantia da ordem pública, com base nos art. 311 e 312 do CPP.

Expeça-se mandado de prisão, com prazo de validade até 10/09/2032, em caráter restrito, como requerido.

2) Deferir a expedição de mandados de busca e apreensão de valores e produtos que aparentem ter sido adquiridos com valores ilícitos; aparelhos celulares, SIM card (chips) e cartões de memória; o veículo GM/Corsa placas CXS1729, de propriedade de Francisca Ferreira dos Santos Luz; e, outros objetos de origem ilícita, com fulcro no art. 240 do CPP, a serem cumpridos nas residências de:

a) RAMON DA SILVA SANTOS, localizada na Rua Perdiz, nº 146, casa 02, Bairro Laranjeiras, Caieiras-SP e Rua Ernani Osmar Blaas, nº 212, Bloco 212,...

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