Acórdão nº 50860337920198210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarto Grupo de Câmaras Criminais, 29-04-2022

Data de Julgamento29 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Número do processo50860337920198210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarto Grupo de Câmaras Criminais

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002018896
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4º Grupo Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 5086033-79.2019.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Dano (art. 163)

RELATOR: Juiz de Direito ALEXANDRE KREUTZ

EMBARGANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

EMBARGADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de embargos infringentes opostos por JOAO MAYCON VARGAS TRILHA, em face do acórdão prolatado pela Oitava Câmara Criminal, que, por maioria, conheceu do recurso em sentido estrito como apelação e deu provimento ao recurso ao efeito de receber a denúncia oferecida pelo Ministério Público, determinando o regular prosseguimento da ação penal, vencida a Dra. Carla Fernanda de Cesero Haass, Juíza de Direito convocada, que o desprovia (evento 12, DOC2).

Pretende o embargante a prevalência do voto mais benéfico, pugnando pela reforma do acórdão impugnado, a fim de que seja mantida a rejeição da exordial acusatória (evento 18, DOC1).

O Ministério Público, em seu parecer, opinou pelo desacolhimento dos embargos infringentes (evento 31, DOC1).

É o relatório.

VOTO

Prezados Colegas.

O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

A matéria trazida à apreciação deste Grupo diz respeito à divergência dos Julgadores quanto à rejeição da exordial acusatória, que imputou ao embargante a prática do crime de dano qualificado, pela ausência de dolo específico da conduta.

Razão assiste ao embargante.

Na hipótese, a inicial acusatória imputou a JOÃO a conduta de romper e, assim, destruir a tornozeleira eletrônica nº 36025, ao efeito de violar a sua zona de inclusão/casa e fugir do sistema de monitoramento eletrônico.

Ocorre que, segundo o entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça, para a configuração do crime de dano ao patrimônio público, é imprescindível a demonstração do animus nocendi, isto é, do dolo específico de causar prejuízo ao bem público.

Sendo assim, quando a destruição, inutilização ou deterioração da coisa (tornozeleira eletrônica, cela etc.) é voltada ao fim específico de burlar a fiscalização estatal e facilitar ou propiciar a fuga do sistema prisional, como no caso em tela, não se verifica a presença do elemento subjetivo específico.

Nesse sentido, os seguintes julgados:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRIME DE DANO QUALIFICADO. ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, III, DO CÓDIGO PENAL ? CP. DESTRUIÇÃO DE TORNOZELEIRA ELETRÔNICA PARA EVASÃO. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. ANIMUS NOCENDI. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. A danificação de tornozeleira eletrônica para evasão não configura o delito do art. 163, parágrafo único, III, do CP, por ausência de animus nocendi. Precedentes.
2. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1861044/RS, Rel.
Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 28/04/2020, DJe 04/05/2020)

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. CRIME DE DANO QUALIFICADO. ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, III, DO CP. DANO QUALIFICADO PRATICADO CONTRA PATRIMÔNIO PÚBLICO. DESTRUIÇÃO DE TORNOZELEIRA ELETRÔNICA PARA EVASÃO. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. ANIMUS NOCENDI. AUSÊNCIA. PRECEDENTES. 1. Para a caracterização do crime tipificado no art. 163, parágrafo único, Ill, do Código Penal, é imprescindível o dolo específico de destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia, ou seja, a vontade do agente deve ser voltada a causar prejuízo patrimonial ao dono da coisa, pois, deve haver o animus nocendi.
2. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as razões reunidas na insurgência são incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão agravada.
3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1722060/PE, Rel.
Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 02/08/2018, DJe 13/08/2018)

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS COUS. CRIME DE DANO QUALIFICADO PRATICADO CONTRA O PATRIMÔNIO PÚBLICO. TENTATIVA DE FUGA DO ESTABELECIMENTO PRISIONAL. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO (ANIMUS NOCENDI). NÃO CONFIGURAÇÃO DO DELITO.
1 - Consoante jurisprudência desta Corte, para a configuração do crime de dano previsto no art. 163 do Código Penal, mostra-se imprescindível a presença do elemento subjetivo específico, qual seja, o animus nocendi, que consiste na vontade deliberada de causar prejuízo ao patrimônio alheio.

2 - "A destruição de patrimônio público (buraco na cela) pelo preso que busca fugir do estabelecimento no qual encontra-se encarcerado não configura o delito de dano qualificado (art. 163, parágrafo único, inciso III do CP), porque ausente o dolo específico (animus nocendi), sendo, pois, atípica a conduta" (HC n. 260.350/GO, Relª.
Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, DJe 21/5/2014).

3 - Agravo regimental desprovido.

(AgRg no HC 409.417/SC, Rel.
Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 24/10/2017, DJe 06/11/2017)

HABEAS COUS LIBERATÓRIO. CRIME DE DANO CONTRA O PATRIMÔNIO PÚBLICO (ART. 163, PAR. ÚNICO, III DO CPB). PRESO QUE EMPREENDE FUGA, DANIFICANDO OU INUTILIZANDO AS GRADES DA CELA ONDE ESTAVA CUSTODIADO. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO (ANIMUS NOCENDI).
PRECEDENTES DESTA CORTE SUPERIOR.
ABSOLVIÇÃO. PARECER DO MPF PELA CONCESSÃO DA ORDEM. ORDEM CONCEDIDA, PARA ABSOLVER O PACIENTE DO CRIME DE DANO CONTRA O PATRIMÔNIO PÚBLICO.
1. Conforme entendimento há muito fixado nesta Corte Superior, para a configuração do crime de dano, previsto no art. 163 do CPB, é necessário que a vontade seja voltada para causar prejuízo patrimonial ao dono da coisa (animus nocendi). Dessa forma, o preso que destrói ou inutiliza as grades da cela onde se encontra, com o intuito exclusivo de empreender fuga, não comete crime de dano.
2. Parecer do MPF pela concessão da ordem.
3. Ordem concedida, para absolver o paciente do crime de dano contra o patrimônio público (art. 163, par. único, III do CPB).
(HC 85.271/MS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 06/11/2008, DJe 01/12/2008)

E o posicionamento da Corte Superior é refletido no mais recente julgado deste Colendo Grupo Criminal acerca da temática:

EMBARGOS INFRINGENTES. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. DANO CONTRA O PATRIMÔNIO PÚBLICO. ROMPIMENTO DE TORNOZELEIRA ELETRÔNICA. AUSÊNCIA DE PROVA ACERCA DO DOLO. ANIMUS NOCENDI NÃO EVIDENCIADO DE FORMA CLARA NA CONDUTA. Não há como verificar o dolo específico na conduta em danificar o bem público (Animus nocendi), o que é necessário à caracterização do crime previsto no Art. 163, parágrafo único, III, do Código Penal, já que, ao que tudo indica nos autos, a intenção do acusado era impedir o controle estatal, tanto é que ele fugiu, de molde que a retirada da tornozeleira, bem do Estado que estava sob sua custódia, constituiu, no presente caso, um meio para atingir essa finalidade. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. EMBARGOS INFRINGENTES ACOLHIDOS. POR MAIORIA.(Embargos Infringentes e de Nulidade, Nº 70085269215, Quarto Grupo de Câmaras Criminais, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabianne Breton Baisch, Redator: José Conrado Kurtz de Souza, Julgado em: 26-11-2021)

Nesse cenário, não restando evidenciado o exigido animus nocendi, deve ser acolhido o voto minoritário e mantida a decisão que rejeitou a denúncia da ação penal nº 001/2.19.0107789-4 por ausência de justa causa.

Ante o exposto, voto por acolher os embargos infringentes, a fim de manter a rejeição da exordial acusatória oferecida nos autos da ação penal nº 001/2.19.0107789-4.



Documento assinado eletronicamente por ALEXANDRE KREUTZ, Relator, em 29/4/2022, às 17:45:35, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. A autenticidade do documento pode ser conferida no site https://eproc2g.tjrs.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=consulta_autenticidade_documentos, informando o código verificador 20002018896v3 e o código CRC b621ee3d.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALEXANDRE KREUTZ
Data e Hora: 29/4/2022, às 17:45:35



Documento:20002076077
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4º Grupo Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 5086033-79.2019.8.21.0001/RS

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