Acórdão nº 50866458020208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Segunda Câmara Cível, 16-02-2023

Data de Julgamento16 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50866458020208210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Segunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003187370
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

12ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5086645-80.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Transporte de coisas

RELATOR: Desembargador OYAMA ASSIS BRASIL DE MORAES

APELANTE: BRASKEM S/A (RÉU)

APELADO: TRANSPESUL TRANSPORTES ESPECIAIS LTDA - ME (AUTOR)

RELATÓRIO

BRASKEM S/A interpõe Recurso de Apelação em face da sentença que julgou procedente os pedidos formulados na ação indenizatória ajuizada por TRANSPESUL TRANSPORTES ESPECIAIS LTDA - ME.

Transcrevo o relatório e o dispositivo da sentença recorrida de lavra da Dra. Tatiana Elizabeth Michel Scalabrin DI Lorenzo, para melhor análise dos fatos:

TRANSPESUL TRANSPORTES ESPECIAIS LTDA, qualificada na inicial, ajuizou a presente AÇÃO ORDINÁRIA contra BRASKEM S.A. Disse que a Lei 10.290/2001 instituiu o Vale-Pedágio, atribuindo ao embarcador o dever de antecipar ao transportador o valor do pedágio. Gizou que é vedado incluir a quantia no valor do frete. Aduziu que a parte ré jamais adiantou os valores dos pedágios dos trechos dos fretes que a autora realizou em seu favor. Suscitou, na forma prevista na legislação específica, a condenação da parte ré a indenizar à parte autora o valor correspondente a duas vezes o montante dos fretes. Requereu a procedência da demanda. Pediu AJG. Juntou documentos. Foi deferida a AJG. Citada, a ré contestou, inicialmente, impugnando o valor da causa, assim como arguindo preliminar de ilegitimidade ativa. No mérito, gizou que a própria autora dispensava a antecipação do pedágio, visto que inseria a importância no valor do frete. Aduziu que existe prova expressa da negativa de adiantamento por parte da autora. Suscitou a aplicação da Teoria do Venire Contra Factum Proprium. Sustentou que não há prova do efetivo pagamento dos pedágios pela parte autora. Asseverou que a Lei do Vale-Pedágio é inconstitucional. Postulou o acolhimento da prefacial. Requereu a improcedência da demanda. Juntou documentos. Houve réplica. Instadas sobre a produção de provas, manifestaram-se as partes, pedindo prova oral. Foram rechaçadas as preliminares e acolhida a impugnação ao valor da causa. Foi indeferida a prova oral. Vieram os autos conclusos para sentença. É o breve relatório. Segue fundamentação.

(...)

DIANTE DO EXPOSTO, julgo PROCEDENTE a demanda, resolvendo o feito com julgamento de mérito, forte no art. 487, I, do CPC, para condenar a parte ré ao pagamento de indenização em quantia equivalente ao montante de duas vezes o valor dos fretes realizados em seu favor pela parte autora, qual seja, R$ 2.985.579,76, tudo corrigido pelo IGPM a contar da data de cada frete e acrescido de juros de mora de 1% ao mês contados da citação, forte no artigo 405, do CC. Condeno a ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários ao patrono da autora, que arbitro em 15% sobre o valor da condenação, forte no art. 85, § 2º, do CPC.

Irresignada, veicula a parte ré recurso de apelação (evento 59, APELAÇÃO1), alegando que foram feitas negociações, ocasião em que a autora afirmou que os pedágios estavam incluídos no preço do frete.

Refere a ausência de prova quanto ao pagamento do pedágio por parte da apelada.

Aponta incompatibilidade da multa do art. 8º da Lei de Vale-Pedágio com o sistema processual brasileiro.

Afirma que a empresa apelada não se enquadra como transportadora autônoma, sendo inaplicável a Lei nº. 14.206/2021.

Postula o provimento do apelo.

Apresentadas contrarrazões (evento 66, CONTRAZAP1), vieram os autos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas.

Preenchidos os requisitos de admissibilidade dispostos no art. 1010, do CPC, recebo o recurso de apelação.

Antecipo que encaminho o voto para reformar a sentença.

A matéria em discussão diz com ressarcimento de vale-pedágio em favor do transportador, pelo embarcador, de forma antecipada e destacada do frete, sendo regida pelas disposições contidas nas Leis 10.209/2001 e 14.229/2021.

Por primeiro, afasto a alegação de que a apelada não possui os requisitos para ser equiparada à condição de transportador, uma vez que não atua de forma autônoma, pois, nos termos do art. 2º,§2º, da Lei 10.209/01, atualizada pela Lei 14.206/2021, não é condição obrigatória ser transportador autônomo para a incidência da norma:

Art. 3o A partir de 25 de outubro de 2002, o embarcador passará a antecipar o Vale-Pedágio obrigatório ao transportador, em modelo próprio, independentemente do valor do frete, ressalvado o disposto no § 5o deste artigo.

§ 2º O Vale-Pedágio obrigatório deverá ser disponibilizado ao transportador contratado para o serviço de transporte pelo embarcador ou equiparado, no valor necessário à livre circulação entre a sua origem e o destino, e a comprovação da antecipação a que se refere o caput deste artigo deverá ser consignada no DT-e. (Redação dada pela Lei nº 14.206, de 2021)

De igual maneira não merece prosperar a alegação de inconstitucionalidade do artigo 8º da Lei n. 10.209/01, que tem a seguinte dicção:

Art. 8º Sem prejuízo do que estabelece o art. 5º, nas hipóteses de infração ao disposto nesta Lei, o embarcador será obrigado a indenizar o transportador em quantia equivalente a duas vezes o valor do frete.

Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, por intermédio do seu Tribunal Pleno, no julgamento da ADI n. 6.031, reconheceu a constitucionalidade do aludido dispositivo legal, assentando, portanto, a necessidade de aplicação da respectiva sanção, na quantia correspondente a duas vezes o valor do frete.

Confira-se a ementa atribuída ao precedente da Suprema Corte:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REQUERIMENTO DE MEDIDA CAUTELAR. ART. 8º DA LEI N. 10.209/2001. PAGAMENTO ANTECIPADO DE VALE-PEDÁGIO NA CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE CARGAS. INDENIZAÇÃO AO TRANSPORTADOR, EM CASO DE DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO PELO CONTRATANTE, EM VALOR VINCULADO AO FRETE CONTRATADO. ALEGADA OFENSA AO ART. 1º E AO INC. LIV DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. LIMITES DE INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE COMO PARÂMETRO CONSTITUCIONAL DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE ABUSO LEGISLATIVO. PRECEDENTES. INDENIZAÇÃO LEGAL QUE NÃO SE DEMONSTRA DESARRAZOADA. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE. 1. Proposta de conversão de julgamento de medida cautelar em julgamento definitivo de mérito: não complexidade da questão de direito e instrução dos autos. Precedentes. 2. Legitimidade ativa ad causam da Confederação Nacional das Indústrias – CNI: existência de pertinência temática entre os objetivos institucionais e o conteúdo material do texto normativo impugnado. Precedentes. 3. A atividade legislativa sujeita-se à estrita observância de diretriz fundamental pela qual, havendo suporte teórico no princípio da proporcionalidade, vedam-se os excessos normativos e as prescrições irrazoáveis do Poder Público. Precedentes. 4. Indenização, no caso de descumprimento pelo embarcador de antecipação do vale-pedágio ao transportador, em quantia equivalente a duas vezes o valor do frete, que não se revela arbitrária ou irrazoável. 5. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente para declarar constitucional o art. 8º da Lei n. 10.209/2001. (ADI 6031, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 27/03/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-090 DIVULG 15-04-2020 PUBLIC 16-04-2020)

A propósito, colaciono os seguintes julgados deste Colegiado:

APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE. TRANSPORTE DE COISAS. AÇÃO CONDENATÓRIA. COBRANÇA DA PENALIDADE PREVISTA NO ART. 8º DA LEI N.º 10.209/2001, REFERENTE AO NÃO-ADIANTAMENTO, AO TRANSPORTADOR, PELO EMBARCADOR, DOS VALORES RELATIVOS AO VALE-PEDÁGIO. PRAZO PRESCRICIONAL. 1. Submete-se ao prazo prescricional decenal, previsto no art. 205 do Código Civil, a pretensão de recebimento do valor a que alude o art. 8º da Lei n.º 10.209/2001, referente à penalidade pela não-observância, pela embarcadora ré, do dever de adiantamento dos vales-pedágio, à transportadora demandante. Afastada a incidência do prazo anual, dado pelo art. 18 da Lei 11.442/07. 2. Não tendo a ré observado o dever de adiantamento do Vale-Pedágio, previsto nos arts. e da Lei n.º 10.209/2001, conforme demonstrado nos autos, deve ser provido o apelo, no tocante à aplicação da multa prevista no art. 8º da Lei n.º 10.209/2001, cuja incidência se dá, de forma automática, em decorrência do descumprimento das regras previstas na lei em questão, por parte do embarcador, conforme precedentes desta Corte. APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação Cível, Nº 50000396720218210016, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Julgado em: 12-08-2021)

APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE. VALE-PEDÁGIO. NÃO FORNECIMENTO. AÇÃO DE COBRANÇA. VALE PEDÁGIO NÃO ADIMPLIDO. INCIDÊNCIA DA MULTA PREVISTA NO ART. 8º DA MESMA LEI N. 10.209/2001. DISPOSITIVO LEGAL DECLARADO CONSTITUCIONAL PELA ADI 6.031. Comprovada a contratação e a subcontratação do transporte e o não fornecimento do vale pedágio ao demandante. Responsabilidade solidária entre o embarcador e o subcontratante, ante a equiparação entre eles prevista em lei para fins de responsabilização. Modificando entendimento anterior, cabível a aplicação da multa nos exatos termos do art. 8º, da Lei 10.209/2001, no valor do dobro do frete, tendo em vista a declaração de constitucionalidade do referido artigo, pelo STF, na ADI 6.031, julgada em março/2020. APELO PROVIDO. (Apelação Cível, Nº 50021895520208210016, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Luiz Pozza, Julgado em: 24-06-2021)

No tocante ao pagamento antecipado do vale-pedágio por parte do embarcador não há dúvida de sua obrigatoriedade em face do contido na...

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