Acórdão nº 50867546020218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 24-11-2022

Data de Julgamento24 Novembro 2022
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50867546020218210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002984458
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5086754-60.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATOR: Desembargador JOAO MORENO POMAR

APELANTE: MARIO MACHADO DOS SANTOS JUNIOR (AUTOR)

APELADO: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

MARIO MACHADO DOS SANTOS JÚNIOR (AUTOR) apela da sentença proferida nos autos da ação revisional que move em face de BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (RÉU), assim lavrada:

Vistos.
MARIO MACHADO DOS SANTOS JUNIOR propôs ação revisional de contrato bancário contra BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A..

A parte autora da ação revisional afirmou ter celebrado contrato de empréstimo n° 479733947 com a instituição financeira ré.
Alegou que no decorrer do contrato houve excesso na cobrança de juros remuneratórios, capitalização, comissão de permanência e venda casada de seguro, pelo que requereu a procedência da ação para revisá-lo, a descaracterização da mora e a repetição de indébito em dobro.
Foi deferida a gratuidade judiciária pelo TJRS.

Citado, o réu contestou.
Preliminarmente, alegou inépcia da inicial e impugnou a concessão da gratuidade judiciária. Sustentou, no mérito, que o contrato foi livremente pactuado pela parte autora, inexistindo qualquer abusividade nas cláusulas ajustadas. Requereu a improcedência da ação.
Sobreveio réplica.

Relatei.
Decido.

A matéria comporta julgamento imediato consoante artigo 355, I do CPC, pois desnecessária a produção de outras provas.
A preliminar de inépcia da inicial não merece procedência, uma vez que a petição inicial obedece aos requisitos contidos no art. 330, §§2º e 3º do CPC, pois, da leitura da petição inicial, entendo que a parte autora indicou as obrigações contratuais a controverter, bem como, apontou corretamente o valor que entende incontroverso.

Prejudicada a impugnação da gratuidade judiciária, tendo em vista o deferimento do benefício pelo TJRS.

Limito-me ao exame da legalidade das cláusulas contratuais expressamente impugnadas pela parte autor, em conformidade com o tema 36 do STJ.

A par do que foi sumulado pelo Colendo STJ (súmula 297), o CDC é aplicável às instituições financeiras.
Não obstante, consoante ao Tema 24 daquela Corte e a súmula 596 do STF, as disposições do Dec. nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional.

JUROS REMUNERATÓRIOS
A revogação do art. 192, § 3º, da CF/88 pela EC nº 40, de 20 de maio de 2003 esgotou a discussão quanto à limitação dos juros remuneratórios à taxa de 12% ao ano, o que restou consolidado com o tema 25 do STJ, que expressamente estabelece que a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.

Outrossim, o simples fato de os juros remuneratórios contratados serem superiores à taxa média de mercado, por si só, não configura abusividade.
(Jurisprudência em Teses - STJ, item 8).
Acrescente-se que a média é um valor indicativo de uma maior concentração de distribuição num intervalo medido.
Não é adequado, para a hipótese, admiti-la como um valor absoluto e, sim, entender aceitáveis as taxas praticadas no intervalo próximo àquele índice apontado pelo BC como referência.
No caso em análise, de acordo com consulta no site do Banco Central do Brasil1, verificou-se que os percentuais praticados a título de juros remuneratórios pela instituição bancária, ora ré, ficaram acima da taxa média estabelecida pelo Bacen na série 25466, mas dentro do limite de 30%, não sendo carcaterizada a abusividade.

CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS:
No que tange ao tópico da capitalização, oportuno reproduzir os seguintes temas do ESTJ:

Tema 26: São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02.
Tema 246: É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31/03/2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.

Tema 247: A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara.
A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.

Considerando que o contrato apresentado foi firmado após a edição da Medida Provisória n° 2.170-36/2001, e que a taxa mensal e a anual de juros contratada indicam a ocorrência de capitalização mensal, tenho como possível a capitalização mensal dos juros.

COMISSÃO DE PERMANÊNCIA
Consoante orientação jurisprudencial, a comissão de permanência se destina à recomposição do inadimplemento e tem por base repor juros remuneratórios, atualizar o valor e compensar a mora contratual.

Eis os temas e súmulas do ESTJ que tratam sobre o assunto:

Tema 52 (STJ) / Súmula 472 (STJ): A cobrança de comissão de permanência - cujo valor não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato - exclui a exigibilidade dos juros remuneratórios, moratórios e da multa contratual.
Súmula 30 (STJ): A comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis.

Súmula 294 (STJ): Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do contrato.

Súmula 296 (STJ): Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado.

É lícita, portanto, a cobrança da comissão de permanência pactuada, desde que não cumulada com juros remuneratórios, multa, juros de mora e correção monetária no período de inadimplência, devendo ser calculada pela taxa média de mercado e limitados à taxa do contrato.
Assim, a parte autora não demonstrou nos autos que tenha havido a incidência de cobrança de comissão de permanência, nada havendo, então, o que revisar neste ponto.

VENDA CASADA DE SEGURO
Não há nos autos qualquer elemento probatório que indique que o autor tenha sido coagido à contratação de seguro como condição para a efetivação do contrato em análise.

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÕES REVISIONAL E DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL DO BANCO FIDUCIÁRIO NOS AUTOS DA AÇÃO REVISIONAL. [...] VENDA CASADA. Não demonstrada minimamente a venda casada do financiamento com o seguro. [...] Não se nega a abusividade da venda casada nas relações consumeristas. Tal norma vem contida no artigo 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor. Todavia, no presente caso, não logrou a parte autora demonstrar minimamente a ocorrência da venda casada do objeto principal do contrato de financiamento com o seguro. (Apelação Cível Nº 70065462871, Décima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Elisabete Correa Hoeveler, Julgado em 23/07/2015)

Dessa forma, não merece prosperar a pretensão da parte autora no ponto.

DA DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA
Relativamente à questão da mora, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de sua descaracterização apenas no caso de cobrança de encargos ilegais no período da normalidade contratual, hipótese não ocorrida nos autos.

Neste sentido é a orientação do STJ :

ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA
[...]
b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual.
[...] (RECURSO ESPECIAL Nº 1.061.530 – RS). (Suprimi).

DA COMPENSAÇÃO DOS VALORES E REPETIÇÃO DO INDÉBITO
Os pagamentos realizados pela parte autora não decorreram de erro, bem assim, não se trata de cobrança ilegal.
Assim, como nada vicia o contrato, não cabe a repetição do indébito.
Não configurada a hipótese à revisão, descabem todos os provimentos nesta amparados.
pelo que descabe, outrossim, o pedido indenizatório.
Pelo exposto, julgo improcedente a ação para manter as estipulações pactuadas no contrato ora analisado.
Condeno a autora, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$ 1.000,00 para o procurador da requerida. Entretanto, suspendo a exigibilidade dos encargos de sucumbência em virtude da concessão da AJG.
Transitada em julgado e nada requerido, arquive-se com baixa.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Nas razões sustenta que na época em que firmado o contrato citado, ou seja, no dia 10.02.2021, o BACEN estipulava taxa média de juros remuneratórios a serem aplicados, na percentagem de 18,83% a.a, contudo, a instituição financeira aplicou ao aludido negócio jurídico 36,86% a.a pontos percentuais, estando evidenciada a existência de abusividades contratuais; que no contrato em debate, não há expressa previsão de capitalização dos juros a serem aplicados; que não há especificação se a capitalização de juros é feita de forma anual, mensal ou, ainda, diária. Postula pelo provimento do recurso.

A parte apelada, intimada, não apresentou contrarrazões (Evento 38).

Vieram-me conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas!

O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece conhecimento. Assim, analiso-o.

JUROS REMUNERATÓRIOS. TAXA. LIMITAÇÃO.

As teses de limitação da taxa de juros ao limite de 12% ao ano foram superadas pelo ditame vinculante do colendo Supremo Tribunal Federal:

Súmula Vinculante nº 07/08 - A norma do parágrafo 3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a...

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