Acórdão nº 50875123920218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50875123920218210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001489518
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5087512-39.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: IRPF/Imposto de Renda de Pessoa Física

RELATOR: Desembargador JOAO BARCELOS DE SOUZA JUNIOR

APELANTE: VOLNEI NOE SCARPARO (AUTOR)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso de apelação interposto por VOLNEI NOE SCARPARO, porquanto inconformado com a sentença que julgou improcedente a ação ordinária ajuizada em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. O dispositivo sentencial está assim lançado (evento 39):

DISPOSITIVO

Em face do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a presente ação, forte no art. 487, inc. I, do CPC.

Diante do resultado do julgamento, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, em conformidade com o art. 85, § 3º, I, e § 4º, inc. III, do CPC. O valor será atualizado monetariamente pelo IPCA-E a contar da data do ajuizamento da ação (Súmula no 14 STJ), e acrescidos de juros de mora pelo índice da caderneta de poupança, a partir do trânsito em julgado da presente decisão.

P.R.I.

Interposto recurso de apelação, intime-se o recorrido para contrarrazões. Com a juntada, remetam-se os autos ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, em atendimento ao art. 1010, §3º, do CPC.

Diligências legais.

Em razões recursais, a parte apelante defende que é portador de moléstia que enseja a isenção do imposto de renda sobre seus proventos de aposentadoria. Discorre que possui isquemia cerebral, marcapasso e demais cirurgias invasivas que atestam a gravidade da cardiopatia que lhe acomete. Cita precedentes. Assevera que os portadores de moléstia grave elencada na lei federal n° 7.713/1988 não precisam mais fazer prova dos sintomas ou da recidiva da doença para fazer jus à isenção do imposto de renda. Pugna pelo provimento do recurso, para que seja reformada a sentença e julgada procedente a ação (evento 55).

Ofertadas contrarrazões (evento 63).

O Ministério Público, neste grau de jurisdição, opinou pelo conhecimento e desprovimento do apelo.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Em breve contextualização da demanda, Volnei Noe Scarparo ajuizou ação ordinária em face do Estado do Rio Grande do Sul, buscando o reconhecimento da isenção do pagamento de imposto de renda sobre os proventos de sua aposentadoria, em razão de ser portador de cardiopatia grave, bem como postulou a devolução dos valores recolhidos indevidamente, desde o pedido administrativo. Postulou, liminarmente, a suspensão dos descontos.

A medida liminar foi indeferida pelo Julgador de Primeiro Grau (evento 9 do processo originário), contudo, deferida por este Órgão Fracionário, por ocasião do julgamento do agravo de instrumento nº 5158568-87.2021.8.21.7000/RS, em 29/09/2021, de minha Relatoria, cujo acórdão restou assim ementado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO TRIBUTÁRIO. IRPF. ISENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE OS PROVENTOS DE APOSENTADORIA. CARDIOPATIA GRAVE. CABIMENTO.

1. NO CASO, O ATESTADO MÉDICO ACOSTADO AOS AUTOS INDICA QUE O PACIENTE É PORTADOR DAS CARDIOPATIAS: CID 10 I48 - FLUTTER E FIBRILAÇÃO ATRIAL; CID 10 I 49.5 - SÍNDROME DE NÓ SINUSAL; PRESENÇA DE MARCAPASSO CARDÍACO; CID 10 G45.9 - ISQUEMIA CEREBRAL TRANSITÓRIA NÃO ESPECIFICADA. EM QUE PESE O AUTOR TENHA ACOSTADO ATESTADO MÉDICO AOS AUTOS QUE NÃO MENCIONA QUE A SUA MAZELA LIMITA PROGRESSIVAMENTE A CAPACIDADE FUNCIONAL DO CORAÇÃO, LEVANDO À DIMINUIÇÃO DA CAPACIDADE FÍSICA E LABORATIVA, TAL CONCLUSÃO É DECORRÊNCIA LÓGICA DA CARDIOPATIA QUE LHE ACOMETE, SOBRETUDO PORQUE POSSUI IMPLANTE DE MARCAPASSO, CUJA FUNÇÃO DO DISPOSITIVO É JUSTAMENTE MONITORAR O RITMO CARDÍACO E ESTIMULAR O CORAÇÃO, EVITANDO QUE OS BATIMENTOS FIQUEM ABAIXO DO CONSIDERADO IDEAL.

2. PORTANTO, ESTANDO COMPROVADO QUE O REQUERENTE É ACOMETIDO DE CARDIOPATIA GRAVE, CONFIGURADA ESTÁ A HIPÓTESE DE ISENÇÃO AO PAGAMENTO DO IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE (IRRF), NOS TERMOS DO ART. 6º, INCISO XIV, DA LEI Nº 7.713/88.

3. PRESENTES OS REQUISITOS ELENCADOS NO ART. 300, CAPUT, DO CPC, A ENSEJAREM A CONCESSÃO DA TUTELA PLEITEADA. DECISÃO DE ORIGEM REFORMADA.

AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.

O Estado apresentou contestação, e o Ministério Público de Primeiro Grau opinou pela procedência da ação.

Após, em 09/11/2021, foi exarada a sentença de improcedência, ora hostilizada.

Fins de evitar desnecessária tautologia, reporto-me aos fundamentos utilizados no julgamento do agravo de instrumento nº 5158568-87.2021.8.21.7000/RS para conceder a antecipação da tutela recursal e que ora utilizo como razões de decidir, porquanto entendo que a situação fática restou inalterada no caso:

"(...)

Compulsando os autos, observo que o demandante juntou atestado médico aos autos de origem (evento 1, out6), datado de 29/09/2020, que contém as seguintes informações:

Verifica-se que o médico descreveu que o paciente é portador das cardiopatias: CID 10 I48 - flutter e fibrilação atrial; CID 10 I 49.5 - síndrome de nó sinusal; presença de marcapasso cardíaco; CID 10 G45.9 - isquemia cerebral transitória não especificada.

Quanto à existência ou não do direito à isenção ao pagamento do imposto, ressalto que o Superior Tribunal de Justiça, com base no princípio do livre convencimento do Juiz publicou o enunciado da Súmula nº 598, que assim determina:

É desnecessária a apresentação de laudo médico oficial para o reconhecimento judicial da isenção do imposto de renda, desde que o magistrado entenda suficientemente demonstrada a doença grave por outros meios de prova.

Portanto, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, é suficiente a comprovação da doença com base nas provas constantes dos autos, tal como ocorre no caso.

Conforme ressaltei quando do recebimento do recurso, em que pese o autor tenha acostado atestado médico aos autos que não menciona que a sua mazela limita progressivamente a capacidade funcional do coração, levando à diminuição da capacidade física e laborativa, tal conclusão é decorrência lógica da cardiopatia que lhe acomete, sobretudo porque possui implante de marcapasso, cuja função do dispositivo é justamente monitorar o ritmo cardíaco e estimular o coração, evitando que os batimentos fiquem abaixo do considerado ideal.

Desta forma, a situação da parte autora enquadra-se no previsto no art. 6º, XIV, da lei nº 7.713/1988, a saber:

Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas:

[...]

XIV – os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma; (Redação dada pela Lei nº 11.052, de 2004) (Vide Lei nº 13.105, de 2015) (Vigência)

[grifei]

Neste momento cabe dizer que consta no Manual de Perícia Oficial em Saúde do Servidor Público Federal, 3ª edição - 2017, o seguinte conceito de cardiopatia grave:1

A2) CARDIOPATIA GRAVE

Conceitua-se como cardiopatia grave, no âmbito médico-pericial, toda enfermidade que, em caráter permanente, reduz a capacidade funcional do coração a ponto de acarretar alto risco de morte prematura ou impedir o indivíduo de exercer definitivamente suas atividades, não obstante tratamento médico e/ou cirúrgico em curso.

O conceito de cardiopatia grave engloba doenças agudas e crônicas, que em sua evolução limitam progressivamente a capacidade funcional do coração, levando à diminuição da capacidade física e laborativa, a despeito do tratamento instituído.

[grifei]

Segundo artigo publicado pela II Diretriz Brasileira de Cardiopatia Grave, a existência de cardiopatia isquemia, infarto agudo do miocárdio, limitação para grandes atividades físicas e cardiopatia crônica são indícios de cardiopatia grave. Nas referidas diretrizes consta a seguinte conceituação:2

O conceito de cardiopatia grave engloba tanto doenças cardíacas crônicas, como agudas. São consideradas cardiopatias graves:

a) cardiopatias agudas, habitualmente rápidas em sua evolução, que se tornam crônicas, caracterizadas por perda da capacidade física e funcional do coração;

b) as cardiopatias crônicas, quando limitam, progressivamente, a capacidade física e funcional do coração (ultrapassando os limites de eficiência dos mecanismos de compensação), não obstante o tratamento clínico e/ou cirúrgico adequado;

c) cardiopatias crônicas ou agudas que apresentam dependência total de suporte inotrópico farmacológico (como dobutamina, dopamina) ou mecânico (tipo Biopump, balão intra-aórtico);

d) cardiopatia terminal: forma de cardiopatia grave em que a expectativa de vida se encontra extremamente reduzida, geralmente não responsiva à terapia farmacológica máxima ou ao suporte hemodinâmico externo. Esses pacientes não são candidatos à terapia cirúrgica, para correção do distúrbio de base (valvopatia, cardiopatia isquêmica, cardiopatia congênita...) ou transplante cardíaco, devido à severidade do quadro clínico ou comorbidades associadas (hipertensão arterial pulmonar, disfunção renal severa, neoplasia avançada).

A limitação da capacidade física e funcional é definida, habitualmente, pela presença de uma ou mais das seguintes síndromes: insuficiência cardíaca, insuficiência coronariana,...

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