Acórdão nº 50891573620208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 04-11-2022

Data de Julgamento04 Novembro 2022
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50891573620208210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002736317
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5089157-36.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO

APELANTE: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

APELANTE: BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL (RÉU)

APELADO: JOSE ERNESTO DE OLIVEIRA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO e por BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL, respectivamente, contra a sentença proferida nos autos da ação de obrigação de fazer ajuizada por JOSE ERNESTO DE OLIVEIRA, com o seguinte dispositivo (Evento 106 do processo de origem):

Outrossim, com fundamento no art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil, resolvo pela procedência da Ação de Obrigação de Fazer movida por José Ernesto de Oliveira contra Banco do Estado do Rio Grande do Sul - BANRISUL e Facta Financeira S.A Crédito, Financiamento e Investimento, para o fim de determinar a limitação dos descontos, no percentual de 30% (trinta por cento) dos rendimentos líquidos do demandante, deduzidos os descontos obrigatórios, concomitante com a limitação de 70% de todos os seus descontos, tendo em vista que a contratação ultrapassou a margem consignável estabelecida em lei.

Condeno as rés, de forma solidária, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios do patrono da parte adversa, que, observados os parâmetros do art. 85, do Código de Processo Civil, fixo em R$ 1.000,00 (hum mil reais), sobre o qual deverá incidir correção monetária pelo IGP-M (FGV) a contar da publicação da presente decisão.

Da sentença foram opostos embargos de declaração, os quais foram desacolhidos (Evento 123 do processo originário).

A instituição-demandada FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, declinando suas razões (Evento 115 da origem), requer "a reforma da nobre sentença prolatada em 1º grau, para extinguir o processo sem julgamento de mérito ou declarar a improcedência dos pedidos". Para tanto, defende (i) a participação do órgão pagador, considerando o litisconsórcio necessário e, assim, a extinção do presente processo sem julgamento de mérito; (ii) a incompetência desta justiça comum para o processamento do feito, sendo a competência de uma das Varas da Fazenda Pública; (iii) a improcedência da pretensão de limitação em dos descontos em folha de pagamento em 30%; (iv) alternativamente "ao reconhecimento da inaplicabilidade de qualquer limitação em 30% relacionada ao autor, servidor público estadual, requer o acolhimento do pedido alternativo no sentido de que se reconheça o limite de descontos de 70% para todos os descontos (obrigatórios, mensalidades, empréstimos...) e de 30% exclusivamente para empréstimos bancários".

O BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL, por sua vez, declinando suas razões (Evento 131 da origem), defende a reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos da exordial. Aduz que "e o percentual descontado não ultrapassa o previsto em legislação, uma vez que em se tratando de funcionário do Estado do Rio Grande do Sul, o desconto deve ser limitado ao índice legalmente previsto no art. 15, § 2º, do Decreto Estadual n. 43.574, o qual permite consignações facultativas e obrigatórias em folha de pagamento no percentual de 70% da retribuição pecuniária mensal". Defende, ainda, que "Caso não se esse o entendimento, requer seja determinada que a limitação observe a ordem cronológica em que os contratos foram firmados". Ainda, "Outrossim, caso ainda seja necessária a redução do valor da parcela, requer seja autorizado o aumento da quantidade de parcelas, para que o contrato seja pago na forma contratada". Por fim, "requer seja utilizado como base de cálculo a renda bruta do autor, todavia, caso o entendimento seja diverso, requer seja considerada como renda líquida, a renda bruta, abatidos os descontos obrigatórios, quais sejam, importo de renda e previdência".

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 137 do processo de origem).

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC/2015.

É o relatório.

VOTO

PRELIMINAR DE PARTICIPAÇÃO DO ENTE PAGADOR E DE CONSEQUENTE INCOMPETÊNCIA. INOVAÇÃO RECURSAL.

Pelo princípio da estabilidade objetiva da demanda as partes não podem alterar o pedido nem as questões e os fatos suscitados na petição inicial e na contestação.

Acerca do princípio da estabilidade objetiva da demanda, o jurista Rui Portanova1refere o seguinte:

O princípio da consubstanciação é um desses limites que o interesse público que rege o processo impõe às partes. A liberdade das partes quanto aos fatos e aos pedidos constantes do processo sofre as limitações impostas em lei [...] tanto a consubstanciação como a adstrição do juiz ao pedido da parte se referem aos termos da ação, mas um é conseqüência do outro. A consubstanciação impede que as partes alterem a causa pedir e o pedido. Já a adstrição constrange o juiz aos limites que a imutabilidade impõe ao processo [...] Entendemos o princípio da substanciação como estabilidade objetiva da lide que opera seus efeitos tanto para o autor quanto para o réu [...] Em verdade, depois da citação as partes mantém plena disponibilidade, mas devem estar de acordo. Essa liberdade vai até o saneamento do processo. Depois desse ato, incide interesse público na estabilidade objetiva e material da demanda. Logo, em nenhuma hipótese serão permitidas alterações. [...] Quanto ao réu, o princípio geral do acesso à justiça (também chamado disponibilidade) informa a ampla defesa. Na contestação, o réu pode alegar o que entender conveniente para defender-se. Depois disso, os termos da lide estabilizam-se .

Ora, conforme o Princípio da Eventualidade, as partes têm obrigação de produzir, de uma só vez, todas as alegações e requerimentos nas fases processuais correspondentes, ainda que as razões sejam excludentes e incompatíveis umas com as outras2.

Em relação ao dever de indicar os fatos a partir dos quais move sua pretensão, leciona Fredie Didier Jr.3:

Tem, assim, o autor de, em sua petição inicial, expor todo o quadro fático necessário à obtenção do efeito jurídico perseguido, bem como demonstrar como os fatos narrados autorizam a produção desse mesmo efeito (deverá o autor demonstrar a incidência da hipótese normativa no suporte fático concreto).

Adotou, nosso CPC a chamada teoria da substancialização da causa de pedir, que impõe ao demandante o ônus de indicar, na petição inicial, qual o fato jurídico e qual a relação jurídica dele decorrente que dão suporte ao seu pedido. Não basta a indicação da relação jurídica, efeito do fato jurídico, sem que indique qual o fato jurídico que lhe deu causa – que é o que prega a teoria da individualização.

Discorrendo acerca da causa de pedir e da limitação que impõe ao feito, refere Luiz Guilherme Marinoni4:

É correto afirmar que o autor deve afirmar um fato essencial juridicamente qualificado e apresentar o seu nexo com um efeito jurídico. O autor, em outras palavras, narra o fato jurídico que constitui o direito por ele afirmado. Esse fato jurídico é o chamado fato essencial, que é todo aquele do qual decorre a consequência jurídica pretendida pela parte em juízo. Apenas o autor, por meio da causa de pedir, e o réu, por meio da alegação de defesas indiretas na contestação, podem trazer fatos essenciais a juízo a fim de delimitar o litígio que deve ser examinado pelo juiz (art. 141).

Lembre-se que compete ao réu, na contestação, antes de discutir o mérito, alegar todas as questões preliminares (art. 301 do CPC/73 – atual art. 337 do CPC/2015) ou questões prejudiciais, bem como alegar toda a matéria de defesa (art. 300 do CPC/73 – atual art. 336 do CPC/2015).

No que tange à eventualidade ou concentração da defesa, refere Fredie Didier Jr.5:

A regra da eventualidade (Eventualmaxime) ou da concentração da defesa na contestação significa que cabe ao réu formular toda sua defesa na contestação (art. 336, CPC). Toda a defesa deve ser formulada de uma só vez como medida de previsão ad eventum, sob pena de preclusão. O réu tem o ônus de alegar tudo o quanto puder, pois, caso contrário, perderá a oportunidade de fazê-lo.

Enfim, consoante os princípios processuais supramencionados, as partes não podem alterar o pedido nem as questões e fatos alegados na inicial e contestação.

Outrossim, consoante dispõe o artigo 507 do CPC, É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão.

Aliás, Decorrido o prazo, extingue-se o direito de praticar ou de emendar o ato processual, independentemente de declaração judicial (art. 223 do CPC).

A preclusão, conforme doutrina de Luiz Guilherme Marinoni6, consiste na perda, extinção ou consumação de uma faculdade processual em face do decurso do tempo (preclusão temporal), da prática de ato incompatível (preclusão lógica) e do efetivo exercício de determinada faculdade processual (preclusão consumativa). Se a parte discute essa ou aquela questão no curso do processo, a decisão a respeito faz precluir a possibilidade de a parte continuar discuti-la na mesma instância. A parte só poderá voltar a discutir questão já decidida, se, oportunamente, recorreu da decisão”.

Observe-se, ainda, a doutrina de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery7:

2. Preclusão. A preclusão indica perda da faculdade processual, pelo seu não uso dentro do prazo peremptório previsto pela lei (preclusão temporal), ou, pelo fato de já havê-la exercido (preclusão consumativa), ou, ainda, pela prática de ato incompatível com aquele que se pretenda exercitar no processo (preclusão lógica). Esta...

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