Acórdão nº 50900865320228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo50900865320228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002301159
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5090086-53.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Roubo majorado (art. 157, § 2º)

RELATORA: Desembargadora FABIANNE BRETON BAISCH

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO interpôs o presente AGRAVO EM EXECUÇÃO por inconformar-se com decisão proferida pela MMª. Juíza de Direito do 1º Juizado da 1ª VEC da Comarca de Porto Alegre/RS que, após conceder ao apenado ANDRÉI KAUÃ DORNELLES SEBAJES a progressão ao regime semiaberto, deferiu-lhe saída especial e, diante da notória não remoção de apenados ao regime carcerário respectivo, incluiu-o no sistema de monitoramento eletrônico, nas condições de prisão domiciliar (Evento 3 - AGRAVO1 - págs. 03/06).

Sustentou o agravante, em síntese, que o apenado possui elevado saldo de pena a cumprir, não estando próximo do livramento condicional ou da progressão para o regime aberto, destacando que os crimes pelos quais cumpre pena são graves - roubos majorados, porte ilegal de arma de fogo - além de furto, ostentando a condição de reincidente, os roubos majorados, inclusive, passando a ser considerados como hediondos. Não foram tomadas medidas administrativas que viabilizassem a remoção ao regime carcerário correspondente. A concessão de tais benefícios deve observar os princípios da legalidade, igualdade, e da individualização da pena. Requereu o provimento do recurso para que seja reformada a decisão atacada, determinando o recolhimento do apenado à casa prisional do regime semiaberto (Evento 3 - AGRAVO1 - págs. 08/14).

A defesa contra-arrazoou o agravo, pugnando pela manutenção da decisão vergastada (Evento 3 - AGRAVO1 - págs. 16/22).

O decisum foi mantido pela magistrada singular (Evento 3 - AGRAVO1 - pág. 23), subindo os autos a esta Corte.

Aqui, a ilustre Procuradora de Justiça, Drª. Maria Cristina Cardoso Moreira de Oliveira, manifestou-se pelo provimento do recurso (Evento 10).

Vieram conclusos.

É o relatório.

VOTO

Pelo que se depreende dos autos, o apenado restou condenado à pena de 23 anos, 2 meses e 15 dias de reclusão, e multa, tendo iniciado o cumprimento da reprimenda em 05.12.2017, possuindo ainda saldo de pena de cerca de 17 anos e 10 meses a cumprir (representando 77% do total da reprimenda), segundo dados constantes do relatório da situação processual executória atualizado, disponível no Sistema SEEU.

Em 06.04.2022, a magistrada da VEC deferiu ao apenado a progressão de regime ao semiaberto (a decisora destacando que o fazia de forma antecipada), bem como concedeu saída temporária e, diante da notória não remoção de apenados ao regime respectivo, determinou a inclusão em sistema de monitoramento eletrônico, nas condições da prisão domiciliar (Evento 3 - AGRAVO1 - págs. 03/06), o Ministério Público não se conformando com esta última disposição.

O recolhimento do preso em seu domicílio é situação que vem prevista na LEP em hipóteses absolutamente excepcionais e taxativas.

Dispõe o art. 117 daquele diploma que “somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de: I – condenado maior de setenta anos; II – condenado acometido de doença grave; III – condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; IV – condenada gestante.”

Por outro lado, quanto ao monitoramento eletrônico, a redação do art. 146-B da LEP, acrescentado pela Lei nº 12.258/10, prevê que “o juiz poderá definir a fiscalização por meio da monitoração eletrônica quando: I – (vetado); II – autorizar a saída temporária no regime semiaberto; III (vetado); IV – determinar a prisão domiciliar; V – (vetado).”

De forma que a prisão domiciliar não é prevista para os presos do regime semiaberto, sendo que a única hipótese de monitoramento eletrônico para os presos do regime semiaberto é nos casos de saída temporária.

Essas as disposições legais pertinentes.

Ocorre que, diante do abandono do sistema carcerário pelo Estado e as precárias condições das casas prisionais, absolutamente insalubres e superlotadas, subjugando os reclusos a uma condição indigna e deplorável, transformando a execução da pena, não raro, em uma execução cruel, os magistrados passaram a ver no cumprimento domiciliar a solução para tais percalços.

Inicialmente tímida, a medida, com o passar do tempo e o agravamento do caos no sistema carcerário, tornou-se de ampla adoção pelos juízes de 1º Grau, chegando-se ao ponto de conceder-se a prisão domiciliar a indivíduos de altíssima periculosidade, condenados por crimes graves, como latrocínio, estupro e tráfico de drogas, entre outros, muitas vezes sem que tivessem experimentado um único dia de prisão.

Diante da crueldade do cenário e porque o tratamento dado aos presos, sem dúvida alguma, feria indelevelmente o princípio da dignidade da pessoa humana, a concessão da prisão domiciliar foi corroborada pelo E. STJ, mas apenas quando ausente local compatível com as normas legais para o cumprimento da pena ou, quando existente, por ausência de vagas.

Contudo, impossível negar que, se, de um lado, estava-se paliativamente resolvendo o problema da superlotação dos presídios; de outro lado, a sensação de impunidade, aliada a outros fatores de ordem social, levou a índices alarmantes do aumento da criminalidade, como vem amplamente sendo noticiado nos meios de comunicação, sendo de conhecimento de todos.

Debatiam-se, a defesa, na busca da preservação dos direitos daqueles que sofreram condenação criminal e que, como tal, passaram à tutela do Estado; e o Ministério Público, na pretensão da efetiva execução da pena imposta e salvaguarda da sociedade ordeira.

Inúmeros, aliás, os recursos que passaram a aportar nesta Corte discutindo a questão, sendo que sempre me posicionei pela taxatividade do art. 117 da LEP, negando prisão domiciliar fora daquelas hipóteses legais.

Todavia, curvando-me ao entendimento cristalizado na Súmula Vinculante nº 56 do E. STF, tive de rever minha posição sobre o tema, passando a admitir a prisão domiciliar em determinados casos que não aqueles proclamados no art. 117 da LEP, sempre tendo em vista a peculiar situação de insegurança pública que vive atualmente o Estado do Rio Grande do Sul, com índices criminais assustadores como têm divulgado os meios de comunicação local com repercussão em todo o território nacional.

É que a questão foi levada ao âmbito do E. STF que, por meio do julgamento do RE nº 641.320/RS, confirmando a prisão domiciliar como instrumento de política criminal, disciplinou, contudo, sua utilização, que, até aqui, não possuía critérios bem definidos, dado que, diante da finalidade a que passou a servir – correção da omissão Estatal na manutenção das casas prisionais –, não mais se enquadrava nas situações restritivas do art. 117 da LEP, refugindo, em muito, da ideia inicial do legislador de beneficiar somente os presos com idade avançada, acometidos de doença grave ou gestantes e presas com filhos menores ou deficientes físicos ou mentais.

Sedimentando seu entendimento, o Pretório Excelso publicou a Súmula vinculante nº 56, dispondo: “A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS.”

De modo que não é mais...

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