Acórdão nº 50904929020208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 09-05-2022

Data de Julgamento09 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50904929020208210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002065019
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5090492-90.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Roubo (art. 157)

RELATORA: Desembargadora MARIA DE LOURDES GALVAO BRACCINI DE GONZALES

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O Ministério Público ofereceu denúncia contra MATHEUS MACHADO FERREIRA, dando-o como incurso nas sanções do artigo 157, caput, na forma do artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso:

“No dia 22 de abril de 2020, por volta das 16h20min, nas proximidades do nº 2035 da Avenida Borges de Medeiros Menino Deus, Porto Alegre, o denunciado MATHEUS MACHADO FERREIRA, mediante grave ameaça de estar armado, bem como agredir a vítima masculina, deu início ao ato de subtrair bens de valor do casal RAFAEL DAMO BINSFELD e GRAZIELA MENDES MICHELIN, não logrando êxito por circunstâncias alheias a sua vontade, quais sejam, a negativa das vítimas de que tivessem bens de valor e o fato de as mesmas terem ganhado tempo e atrair a atenção de populares, o que forçou a fuga do acusado.

Na ocasião, o acusado abordou as vítimas com a mão na cintura, a indicar que estava armado, e ordenou que as vítimas entregassem seus bens. Os ofendidos informaram que não possuíam bens e o acusado passou a ameaçar a vítima Rafael, referindo que iria lhe agredir. Não obtendo sucesso na empreitada delitiva em razão da negativa das vítimas em entregar seus bens, e pela grande movimentação do local, o acusado fugiu, sendo localizado por policiais militares momentos depois. As vítimas fizeram um reconhecimento positivo na área judiciária. O acusado é reincidente em crimes contra o patrimônio. Foi decretada a prisão preventiva”

O réu foi preso em flagrante em 22-04-2020, devidamente homologado, e a prisão foi convertida em segregação cautelar.

Em decisão proferida em 24-04-2020, o juízo processante recebeu a denúncia, ocasião em que revogou a prisão preventiva, concedendo a liberdade provisória ao acusado (Evento 03 – processo Judicial 02).

Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em 05-07-2021 (Evento 03 – Processo Judicial 04 – fl. 102), julgando procedente a ação penal para condenar o réu como incurso nas sanções do artigo 157, caput, combinado com o artigo 14, inciso II e artigo 61, inciso I, todos do Código Penal, à pena de 01 (um) ano e 05 (cinco) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e a 10 (dez) dias-multa à razão de 1/30 do salário-mínimo vigente na data do fato, concedido o direito de apelar em liberdade (Evento 03 – Processo Judicial 04).

Irresignados com a sentença, o Ministério Público e a defesa apelaram.

O MINISTÉRIO PÚBLICO, em suas razões, pleiteia o aumento da pena em ¼, em razão da multirreincidência, com consequente majoração do apenamento.

Jà a defesa, em suas razões recursais arguiu, em preliminar, a nulidade da sentença por ausência de apreciação da tese defensiva de Desistência Voluntária. No mérito, sustentou insuficiência probatória com base no princípio in dubio pro reo, requerendo sua absolvição ou, alternativamente o reconhecimento da desistência voluntária e a desclassificação do crime de roubo para o delito de furto. Subsidiariamente, postulou o afastamento da agravante de reincidência e a isenção da pena de multa. Por fim, prequestionou a matéria. (Evento 03- Processo Judicial 04).

As partes manifestaram-se pelo improvimento do apelo contrário.

Em parecer, a Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso defensivo e provimento do recurso ministerial.evento 7, PARECER1

Esta Câmara adotou o procedimento informatizado e foi observado o artigo 613, inciso I, do Código de Processo Penal.

É o relatório.

VOTO

Conheço dos recursos, pois preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

Da preliminar de nulidade da sentença por ausência de enfrentamento da tese defensiva de desistência voluntária.

Quanto à preliminar, de nulidade da sentença por não atendidos os requisitos do art. 381, inciso III, do Código de Processo Penal, esta improcede.

Argumentam os apelantes que o sentenciante não enfrentou “a tese defensiva acerca da Desistência voluntária". Entretanto, da leitura da decisão recorrida, percebe-se que restou devidamente examinada a prova da alegada desistência voluntária.

Embora a analise tenha ocorrido de forma sucinta, a decisão supriu a prova naquilo que interessa ao deslinde da controvérsia.

Ora, o magistrado, ao proferir sentença, segue o princípio da livre apreciação das provas, formando convencimento baseado na convicção obtida pelo exame do conjunto probatório, sendo suficiente que exponha, de forma clara e concisa, os fundamentos que embasaram sua decisão.

O juízo de piso, no ato sentencial, refutou a tese defensiva, ainda que implicitamente, ao afirmar, de modo inequívoco, a presença da condição de "subtração violenta". E assim o fez com base nos relatos da vítima, prestados de forma firme e coerente ao objetivo da demonstração da dinâmica do delito no sentido de ter sido abordada pelo ofensor, com a menção de estar armado e proferindo diversas ameaças quando do anúncio do roubo.

Além disso, o Magistrado sentenciante deixou expresso na sentença o reconhecimento da tentativa e enfatizou que o réu somente deixou de efetivar o roubo em razão da resistência das vítimas, conforme transcrição in verbis:

“[...]

As provas produzidas em juízo, portanto, conduzem o feito à condenação e enfraquecem a versão de negativa de autoria apresentada pelo acusado, que se encontra, assim, isolada quando confrontada com o acervo probatório.

Também são seguras as provas quanto à materialidade do delito de tentativa de roubo, em especial, quanto a elementar relacionada à grave ameaça, o que, inclusive, afasta a pretensão defensiva quanto a desclassificação para o delito de furto.

Quanto à tentativa, é importante ressaltar que a consumação do delito, na esteira do que indica a Súmula 582 do STJ (“consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada”), é atingida “no momento em que o objeto material é retirado da esfera de posse e disponibilidade do sujeito passivo, ingressando na livre disponibilidade do autor.” (In Direito Penal – Parte Especial – Tomo II – P. 302 - DE JESUS, Damásio E.)

E como o acusado não logrou subtrair qualquer bem dos ofendidos, ainda que por circunstâncias alheias à sua vontade – a resistência das vítimas - foi compelido a abandonar o delito em fase já iniciada, razão pela qual presente a causa geral de diminuição de pena do artigo 14, inciso II, do Código Penal. Grifei

[...]”.

Assim, justificando fundamentadamente o sentenciante o que o levou ao dispositivo, atendeu ao disposto no art. 5º, LV, e art. 93, IX, da Constituição Federal e no art. 381, III, do Código de Processo Penal.

Logo, não há nulidade. Não prospera a preliminar.

Mérito.

A materialidade e a autoria delitivas, bem como a tese relativamente à insuficiência probatória, foram bem analisadas pelo ilustre Juiz de Direito, Dr. Sidinei José Brzuska, ao proferir a sentença, não sendo verificada qualquer inovação em sede de apelação em relação aos pontos analisados em primeiro grau, pelo que adoto seus fundamentos para evitar inútil tautologia (Evento 03 – Processo Judicial 04):

“[...]

A materialidade do delito restou comprovada pela ocorrência policial, bem como pela prova oral coligida aos autos e demais peças do auto de prisão em flagrante. Confirmada, ainda, a autoria da tentativa do crime patrimonial restou suficientemente sendo, portanto, induvidosa.

Isso porque, a vítima, em seu depoimento, mencionou que estava praticando exercícios físicos com sua namorada no Parque Marinha do Brasil e, quando concluíram a corrida, pararam para descansar em um dos bancos localizados no interior do mencionado parque.

Enquanto descansavam, foram abordados pelo denunciado que, fazendo menção de estar armado, anunciou assalto, exigindo que as vítimas lhe entregassem seus pertences. Ao perceberem que o acusado, em verdade, não estava armado, mas apenas simulando com um celular, resistiram, não lhe entregando nada.

Diante da resistência das vítimas, o denunciado proferiu uma série de ameaças, dentre as quais, disse ao ofendido que “os guris” iriam pegá-lo. Após intimidá-lo, empreendeu fuga.

Toda a conduta delituosa do denunciado foi flagrada por um frequentador do parque, não identificado, que lá também estava praticando atividades físicas e noticiou o crime para uma guarnição que realizava patrulhamento de rotina no local.

Avisados os policiais, esses foram ouvidos em juízo, quando mencionaram que, com a descrição das características físicas e vestimentas do indivíduo, as quais foram informadas pelo popular, iniciaram a busca no parque e rapidamente localizaram e abordaram o réu.

Nesse ínterim, as vítimas também buscaram o apoio da guarnição, momento em que a encontraram já com o denunciado detido. Nessa circunstância, o denunciado foi reconhecido pessoalmente pelas vítimas poucos minutos após a prática delituosa.

O reconhecimento foi ratificado por uma das vítimas e pelos policiais militares envolvidos na ocorrência que afirmaram ser o denunciado, presente em audiência, o autor da tentativa de crime patrimonial objeto da presente demanda.

Vale registrar que a palavra da vítima tem especial importância à verificação das circunstâncias que circundam o fato, pois sofreu a ação direta do réu, inexistindo, inclusive em relação ao policial, elementos que desqualifiquem seus relatos ou demonstrem que...

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