Acórdão nº 50926447720218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 31-03-2022

Data de Julgamento31 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50926447720218210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001545101
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5092644-77.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Inclusão Indevida em Cadastro de Inadimplentes

RELATORA: Desembargadora ELIZIANA DA SILVEIRA PEREZ

APELANTE: MARA NUBIA DE VARGAS LACERDA (AUTOR)

APELADO: FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO PADRONIZADOS NPL II (RÉU)

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso de Apelação interposto por MARA NUBIA DE VARGAS LACERDA contra a sentença que, nos autos da Ação Indenizatória c/c Declaratória de Nulidade de Dívida com Pedido Tutela Provisória de Evidência ajuizada em face de FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NAO PADRONIZADOS NPL II , julgou improcedente o feito.

Cita-se o dispositivo da sentença (evento 29):

Isso posto consubstanciado do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE a presente ação declaratória ajuizada por MARA NUBIA DE VARGAS LACERDA contra FUNDO DE INVESTIMENTOS EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS NPL II, nos termos da fundamentação supra. Com isso, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.200,00, nos termos do art. 85, § 8º, do NCPC, sem prejuízo do benefício da assistência judiciária gratuita.

Por derradeiro, tendo em vista a nova sistemática do Código de Processo Civil e, diante da inexistência de juízo de admissibilidade, conforme dispõe o artigo 1.010, § 3º, do NCPC, em caso de interposição de recurso de apelação, proceda-se na intimação da parte apelada para que apresente contrarrazões, querendo, no prazo de 15 dias. Decorrido o prazo, subam os autos ao egrégio TJRS.

Com o trânsito em julgado, não sendo nada requerido no prazo de 5 dias, e satisfeitas eventuais custas pendentes, arquive-se com baixa.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Nas razões recursais, a parte autora, ora apelante, referiu que aforou a presente ação declaratória de nulidade de inscrição restritiva de crédito cumulada com indenizatória pois, ao consultar seus apontamentos no SCPC, observou que havia dívida registrada como devida em seu nome junto a ré FIDC NPL 2, com a qual jamais manteve relação negocial. Mencionou que a ré, em realidade, é uma empresa de fundo de investimentos, que adquire dívidas de outras empresas por meio de cessão de crédito e reinscreve o consumidor nos bancos de dados de restrição de crédito em nome próprio, no caso, não restando comprovada a relação jurídica com o credor originário Banco Agibank. Ao final, requereu o provimento do recurso.

Apresentadas as contrarrazões (evento 38).

Vieram conclusos os autos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso de Apelação.

Conforme relatado, a matéria controvertida nos autos refere-se à declaração de nulidade de débito, inscrição do nome da parte autora em órgão de proteção ao crédito.

Inicialmente, esclareço que, nos termos do artigo 290 do Código Civil, a cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este notificada, mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.

Não obstante, o colendo Superior Tribunal de Justiça, recentemente, firmou posicionamento no sentido de que a inexistência de notificação do devedor acerca da cessão de crédito não torna a dívida inexigível e não impede o novo credor de praticar os atos necessários à preservação dos direitos cedidos.In verbis:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CPC/1973. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS CONJUGADO COM CANCELAMENTO DE TÍTULOS. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. INEXISTÊNCIA. SÚMULA Nº 211/STJ. CONTRATOS BANCÁRIOS. CESSÃO DE CRÉDITO. NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR. AUSÊNCIA. DÍVIDA EXIGÍVEL. SÚMULA Nº 568/STJ. CADASTRO DE INADIMPLENTES. INSCRIÇÃO. REGULARIDADE. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ.

1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).

2. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. 3. A ausência de prequestionamento da matéria suscitada no recurso especial, a despeito da oposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial em virtude da incidência da Súmula nº 211/STJ.

4. A inexistência de notificação do devedor acerca da cessão de crédito não torna a dívida inexigível e não impede o novo credor de praticar os atos necessários à preservação dos direitos cedidos.

Precedentes.

5. Não há como rever o entendimento do tribunal de origem acerca da validade da dívida e da regularidade da inscrição nos cadastros de inadimplentes sem a análise de fatos e provas, o que é inviável no recurso especial diante da incidência da Súmula nº 7/STJ.

6. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp 1146254/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/02/2018, DJe 20/02/2018) (g.n.)

Com efeito, a notificação exigida no referido dispositivo legal possui o único objetivo de informar o devedor sobre o novo credor, razão pela qual a sua ausência não torna a dívida inexigível, sendo permitido ao novo credor se valer de todos os atos necessários à preservação dos direitos creditórios cedidos, inclusive com a inclusão do nome do devedor nos órgãos de proteção ao crédito.

Diante dessas considerações, basta saber se a cessão de crédito foi efetivada e se a dívida inscrita em nome da parte autora é válida/existente ou não.

Prosseguindo, observo que a presente relação é eminentemente de consumo, forte no artigo 3º, parágrafo 2º, do Código de Defesa do Consumidor, a saber:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (g.n.)

Já o caput do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor dispõe que, independente de culpa, o fornecedor responde pelos danos causados aos consumidores por falha na prestação de serviço.

Eis a redação da aludida norma legal:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - o modo de seu fornecimento;

II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi fornecido.

§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

§ 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. (g.n.)

E, ainda, de acordo com o artigo 927 do Código Civil, aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo, devendo-se entender por ato ilícito, nos termos do artigo 186 do mesmo diploma legal, a ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência que viola direito e causa dano a outrem, ainda que exclusivamente moral.

Com efeito, o ônus da prova acerca da comprovação da existência da dívida e da regularidade dos débitos é da parte demandada, em face da hipossuficiência do consumidor, conforme art. 6º, inciso VIII, do CDC, in verbis:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

[...]

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

No caso versado, a documentação colacionada aos autos a respeito não é suficiente para demonstrar a higidez da dívida cobrada.

Isso porque, a apelada não trouxe...

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