Acórdão nº 50927453520228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 08-06-2022

Data de Julgamento08 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo50927453520228217000
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002179628
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5092745-35.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro de vulnerável CP art. 217-A

RELATORA: Desembargadora MARIA DE LOURDES GALVAO BRACCINI DE GONZALES

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus impetrado por advogados constituídos, em favor de ALEX EVANDRO PEREIRA CANES, apontando como autoridade coatora o Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Cachoeirinha.

Relatam ter sido o paciente preso preventivamente em 27.04.2022, todavia, é primário, de bons antecedentes, funcionário do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e com residência fixa.

Aludem excesso de prazo para o encerramento do inquérito policial, porquanto ultrapassados os 10 dias previstos no art. 10 do CPP, bem como aduzem que a não apresentação do suplicante na audiência de custódia, gera a nulidade da prisão.

Sustentam a ausência dos requisitos contidos no art. 312 do CPP.

Requerem a concessão liminar de ordem, e sua confirmação, no mérito.

A liminar foi indeferida.

O Ministério Público ofertou parecer pela denegação da ordem.

É o relatório.

VOTO

Cuida-se de habeas corpus impetrado por advogados constituídos, em favor de ALEX EVANDRO PEREIRA CANES, preso preventivamente em 27.04.2022, pela suposta prática do delito de estupro de vulnerável.

Inicialmente, verifica-se estar a decisão que decretou a prisão preventiva do paciente, pela suposta prática do delito de estupro de vulnerável, devidamente fundamentada, na forma do art. 93, IX, da CF, consoante sua transcrição:

Vistos.

Trata-se de representação formulada pela Autoridade Policial para decretação da prisão preventiva de ALEX EVANDRO PEREIRA CANES, pelo suposto cometimento do crime de estupro de vulnerável (evento 1, OUT5).

Conforme narrado pela Autoridade Policial, a genitora da vítima compareceu na Delegacia de Polícia, relatando que MARIA EDUARDA, atualmente com 13 anos de idade, fora abusada sexualmente pelo padrasto, ora suspeito. De acordo com o relato prestado pela vítima à genitora, o investigado fazia a adolescente assistir vídeos pornográficos, passava a mão pelo corpo dela (nádegas e seios) e introduzia o dedo na vagina da vítima, tudo quando a genitora não estava em casa. Ainda, o suspeito teria ameaçado a vítima para que não contasse sobre os abusos, inclusive segurando-a pelo pescoço e deixando sinais visíveis. Acrescentou a genitora da ofendida que, após a filha lhe contar sobre os abusos, ela entrou em contato com o investigado, oportunidade em que ALEX EVANDRO "lhe pediu desculpas, disse que não poderia passar essa vergonha para seu filho e que iria se matar", assim admitindo, portanto, a veracidade dos fatos relatados por MARIA EDUARDA.

Com base nos aludidos elementos de prova, argumentou a Autoridade Policial que a prisão preventiva do investigado se faria necessária como forma de proteção da ordem pública e como meio de preservar a vítima e o outro filho do suspeito, forte no art. 312 do CPP.

Remetidos os autos ao Ministério Público, o órgão acusatório apresentou parecer opinando pelo acolhimento da representação da Autoridade Policial (evento 8, PARECER1).

É o breve relato.

Decido.

Nos termos do art. 312 do CPP, é cabível a prisão preventiva desde que (a) haja prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria e, também, (b) esteja presente, ao menos, um dos três requisitos elecandos pelo supracitado dispositivo, quais sejam, (b.1) necessidade de garantia da ordem pública ou econômica, (b.2) necessidade de preservação da instrução criminal e (b.3) necessidade de se assegurar a aplicação da lei penal.

De outra banda, deve-se também apontar que a prisão preventiva, mesmo que presentes os requisitos acima elencados, só poderá ser decretada: (a) nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 04 anos; (b) ou se tiver havido prévia condenação por outro crime doloso (desde que ainda possível o reconhecimento de reincidência – art. 64 do CP); (c) ou se o crime envolver violência doméstica ou familiar contraa mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa portadora de deficiência.

Ademais, a prisão preventiva não poderá ser decretada se puder, sem prejuízo quanto à efetividade do comando, ser substituída por outro medida de natureza cautelar (art. 282, §6, do CPP) ou, ainda, se estiverem presentes alguma das hipóteses de exclusão da ilicitude previstas pelo art. 23 do CP (art. 314 do CPP).

No caso em tela, a infração penal cogitada (estupro de vulnerável) é punida com pena superior a 04 anos de reclusão.

Por outro lado, no presente caso, a prova da ocorrência da infração penal cogitada e os indícios de autoria advém da investigação em curso promovida pela Autoridade Policial, em especial no que condiz: ao depoimento prestado pela genitora da vítima (evento 1, DEPOIM_TESTEMUNHA3) e ao áudio juntado ao evento 1, ÁUDIO7, em que o investigado não nega a prática criminosa.

Ainda, da análise dos requisitos previstos no art. 312 do CPP, verifica-se que, no caso, visualiza-se a necessidade de preservação da ordem pública, da higidez da instrução criminal. Vejamos.

Ao que consta, a vítima teria sido abusada pelo suspeito, seu padrastro, em mais de uma oportunidade, nas ocasiões em que sua genitora, companheira do investigado, não se encontrava em casa. Além da gravidade inerente do crime pelo qual está sendo investigado, o suspeito teria ameaçado a vítima e a agredido fisicamente, apertando seu pescoço até deixar marcas visíveis - tudo para que não contasse sobre os abusos. Em decorrência, de acordo com o depoimento de EDNA, MARIA EDUARDA estaria apresentando comportamento agressivo - sequela psicológica característica da pessoa vítima de abuxo sexual.

Não restou suficientemente esclarecido se o investigado ainda reside na residência da vítima. Contudo, denota-se que EDNA possui outro filho com o suspeito, também menor de idade.

Esse contexto, portanto, em que demonstrada a periculosidade do suspeito (que abusava e agredia a vítima em sua própria resistência) e o contato do investigado com outra criança, evidencia a necessidade de resguardar a sociedade em face do risco de reiteração delitiva, decretando-se a segregação cautelar do denunciado para garantia da ordem pública.

Ademais, mostra-se presente a necessidade de higidez da instrução criminal, uma vez que o suspeito vinha ameançando a vítima para que não contasse sobre os fatos - o que poderia prejudicar, com efeito, a colheita da prova e, mais gravemente, a integridade física e psíquica da vítima.

Deve-se apontar que, além de não se poder falar na ocorrência de alguma das hipóteses de exclusão da ilicitude previstas pelo art. 23 do CP, tampouco se visualiza a possibilidade de se substituir, sem prejuízo quanto à efetividade do comando, a prisão preventiva pela aplicação de outra medida de natureza cautelar (art. 319 do CPP).

Ao menos por ora, com efeito, não foram colhidos elementos suficientes quanto ao comportamento do investigado para indicar que eventuais proibição de frequência a determinados lugares ou de manutenção de contato com as vítimas seriam suficientes para se resguardar a sociedade contra o risco de reiteração delitiva. Na mesma linha, nada garante, ademais, que a segregação domiliciar ou o simples comparecimento em Juízo seriam suficientes para evitar que o investigado deixe de cometer novos atos abusivos similares aos que vinha praticando com a própria enteada.

Destaca-se, por fim, que a segregação provisória não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência, mas apenas acautela a paz social e principalmente a recidiva.

DIANTE DO EXPOSTO, com fundamento no art. 312 do CPP , DECRETO a PRISÃO PREVENTIVA DE ALEX EVANDRO PEREIRA CANES, para garantia da ordem pública, higidez da instrução criminal e aplicação da lei penal.

Expeça-se mandado de prisão.

Comunique-se a Autoridade Policial.

Intimem-se, inclusive o Ministério Público.

D.L.

O paciente foi preso preventivamente em 27.04.2022 (evento 41, autos n.º 5004376-49.2022.8.21.0086), e, não obstante o prazo de 10 dias para o encerramento do inquérito policial, previsto no art. 10 do CPP, não se verifica o alegado excesso de prazo, porque este pode ser prorrogado, conforme, inclusive, entendimento do Superior Tribunal de Justiça (in AgRg na CauInomCrim 36/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, CORTE ESPECIAL, julgado em 18/11/2020, DJe 04/12/2020).

Por outro lado, não há falar em ilegalidade da prisão ante a não apresentação do suplicante na audiência de custódia, porque, conforme entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal, a sua falta constitui mera irregularidade, não afastando a prisão preventiva, uma vez atendidos os requisitos do art. 312 do CPP, in verbis:

Processual penal. Agravo regimental em habeas corpus. Tráfico de drogas. Associação para o tráfico de drogas. Corrupção ativa. Prisão preventiva. Reiteração delitiva. Gravidade concreta. Prisão domiciliar. Ausência de ilegalidade flagrante ou abuso de poder. Invasão de domicílio. Supressão de instâncias. Ausência de audiência de custódia. Presença...

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