Acórdão nº 50934789820228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Terceira Câmara Cível, 30-06-2022

Data de Julgamento30 Junho 2022
ÓrgãoDécima Terceira Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50934789820228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002239298
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

13ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5093478-98.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATOR: Desembargador ANDRE LUIZ PLANELLA VILLARINHO

AGRAVANTE: ELISABETH MACHADO E SILVA

AGRAVADO: BV FINANCEIRA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por ELISABETH MACHADO E SILVA contra decisão do Juízo da 1ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, que acolheu em parte a impugnação à fase de cumprimento de sentença apresentada por BV FINANCEIRA S.A. CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO.

Em suas razões, a agravante defende a reforma da decisão recorrida, argumentando que, em ações de busca e apreensão, ante a impossibilidade de restituição do bem, deve ser recomposto ao consumidor o valor do bem pela Tabela FIPE, sendo que eventual compensação de valores deve ser realizada em ação própria. Refere que decisão em sentido contrário implicaria reconhecer a procedência da ação cautelar indiretamente, colacionando precedentes jurisprudenciais. Nesses termos, protesta pelo provimento do recurso para reconhecer a inviabilidade na compensação de valores no feito.

Recebido o recurso no efeito devolutivo (evento 07), foram apresentadas contrarrazões pela recorrida, protestando pelo desprovimento do recurso (evento 15).

É o relatório.

VOTO

Cuida-se de agravo de instrumento interposto por ELISABETH MACHADO E SILVA contra decisão do Juízo da 1ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, que acolheu em parte a impugnação à fase de cumprimento de sentença apresentada por BV FINANCEIRA S.A. CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO.

A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos (evento 37/1g, SENT1):

[...]

O feito comporta julgamento antecipado, na forma do art. 355, inciso I, do CPC.

Inexigibilidade do título. A instituição financeira ajuizou ação de busca e apreensão do veículo PEUGEOT 106 SOLEIL, placas IH*-**00, tendo sido deferida medida liminar de busca e apreensão do automóvel, o qual restou leiloado extrajudicialmente pela instituição bancária em 07/05/2013 (Evento 19 - IMPUGNAÇÃO1, fl. 7).

Ocorre que a ação de busca e apreensão restou julgada extinta, por força da declaração de inexistência de mora verificada em ação revisional. Assim, deveria a instituição financeira proceder à devolução do veículo apreendido em seu favor, o que se tornou impossível em virtude da alienação realizada, motivo pelo qual a obrigação deve ser convertida em perdas e danos.

Nesse sentido, é o entendimento firmado pelo TJRGS:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. 1. Venda extrajudicial do bem apreendido liminarmente em ação de busca e apreensão. Posterior improcedência da demanda. Conversão da obrigação de fazer (devolução do veículo) em perdas e danos. 2. Impossibilidade de compensação de tal valor com eventual saldo devedor do contrato. RECURSO IMPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70075890491, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Judith dos Santos Mottecy, Julgado em: 29-03-2018)

No ponto, o credor instaurou fase de cumprimento de sentença, requerendo o pagamento de R$ 23.492,52, referente ao valor da tabela FIPE, já com as devidas atualizações.

Não há, portanto, que se falar em inexigibilidade do título, uma vez que a situação do caso concreto permite a conversão do feito em perdas e danos.

Quanto à utilização da tabela FIPE como parâmetro para fixação do montante a ser restituído, de acordo com os reiterados julgados do TJRGS, faz-se necessário o pagamento do valor de mercado do bem divulgado pela Tabela Fipe à época da alienação, não podendo ser entendido como pagamento da dívida o valor pelo qual o veículo foi leiloado pelo impugnante.

AGRAVO DE INSTRUMENTO E AGRAVO INTERNO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. Agravo de Instrumento. Em sendo inviável a restituição, à consumidora, do bem apreendido e vendido de forma prematura, diante da reversão da medida liminar de busca e apreensão, incumbe à instituição financeira depositar o equivalente em dinheiro, segundo os valores divulgados pela Tabela FIPE à época da alienação do veículo, devidamente corrigidos desde então. Agravo Interno. Diante do desprovimento do agravo de instrumento, resta prejudicado o exame do agravo interno. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. (Agravo de Instrumento Nº 70071510465, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mário Crespo Brum, Julgado em 30/03/2017)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DO VEÍCULO. RESTITUIÇÃO DO VALOR EQUIVALENTE AO BEM PELA TABELA FIPE MULTA PREVISTA NO ART. 3º, § 6º, DO DECRETO LEI Nº 911/69. FIXAÇÃO EM ATO POSTERIOR. DESCABIMENTO. COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS. POSSIBILIDADE. DA MULTA PREVISTA NO ART. 3º, § 6º, DO DECRETO LEI Nº 911/69. Não havendo condenação da instituição financeira ao pagamento da multa prevista no art. 3º, § 6º, do Decreto Lei nº 911/69 no título em execução, descabe a sua fixação em ato posterior. DA RESTITUIÇÃO DO VALOR EQUIVALENTE AO BEM PELA TABELA FIPE. Constatada a impossibilidade de restituição do bem ao fiduciante, diante da sua alienação extrajudicial, é viável a utilização da Tabela FIPE para apuração do valor do bem e respectivo cálculo do montante a ser restituído. DA. COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS. No caso de duas pessoas serem ao mesmo tempo credora e devedora recíprocas, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem, desde que ocorra entre dívidas líquidas, vencidas e fungíveis entre si. Inteligência dos artigos 368 e 369, ambos do Código Civil. DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. Acolhida em parte a impugnação ao cumprimento de sentença, é cabível a fixação de honorários advocatícios em favor da impugnante. Precedentes do STJ e desta Corte. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70085298735, Décima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em: 30-09-2021)

Sendo assim, deve o banco impugnante efetuar o pagamento do valor de mercado do veículo, com base no divulgado pela Tabela Fipe quando da alienação extrajudicial, ocorrida em 07/05/2013, corrigido monetariamente pelo IGP-M desde aquela data.

No caso dos autos, verifica-se que o cálculo do Evento 1 - OUT3 adotou como parâmetro o mês de abril/2012 (quando da apreensão do veículo) e não o mês de maio/2013, data da efetiva alienação extrajudicial.

Acolho, em parte, a presente impugnação, reconhecendo o excesso de execução com base na fundamentação supra.

Tratando-se de obrigações líquidas e vencidas, cujo valor devido depende tão somente de cálculo aritmético, não há óbice à compensação da totalidade das parcelas apontadas como inadimplidas, forte no que dispõe o artigo 368 do Código Civil, na medida em que caracterizada a identidade entre credor e devedor.

Dessa forma, cabível a compensação entre os créditos e débitos líquidos, reciprocamente devidos entre os litigantes, com fulcro no art. 368 do Código de Processo Civil.

3 - Dispositivo

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a presente impugnação ao cumprimento de sentença, reconhecendo excesso de execução nos moldes da fundamentação supra, devendo ser elaborado novo cálculo tomando por base o valor indicado na tabela FIPE em 07/05/2013, autorizando eventual compensação de valores, comprovada por meio de planilha contábil a ser apresentada pela instituição financeira no prazo de 5 dias após o trânsito em julgado da decisão.

Diante da sucumbência recíproca, arcarão as partes com o pagamento das custas, por metade, e honorários advocatícios ao procurador da parte adversa, fixados em 10% sobre o valor da condenação (ao impugnado) e R$ 1.000,00 (ao impugnante), observadas as diretrizes do art. 85, §8º do CPC. Resta suspensa a exigibilidade da verba sucumbencial em face da parte impugnada, posto que beneficiária da AJG.

[...]

A exequente/fiduciante se insurge unicamente em relação à determinação de compensação de créditos, reconhecida na decisão recorrida, com base no art. 368 do Código Civil.

Aludido dispositivo legal1 contém a definição da compensação: meio de pagamento pelo qual a obrigação do devedor em relação ao credor extingue-se segundo o valor de outra obrigação devida pelo mesmo credor ao mesmo devedor. Adiante, dispõe o artigo 369 do mesmo diploma legal que A compensação efetua-se entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis.

Comentando referido dispositivo, o doutrinador Hamid Charaf Bdine Júnior ensina (Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência, 2ª ed. rev. e atual, Coord. Cezar Peluso, Barueri: Manole, 2008, p. 390):

[...]

Para serem compensados, os débitos devem ser líquidos, ou seja, devem referir-se a importância determinada. Devem, ainda, estar vencidos, isto é, ser passíveis de exigência imediata. E, finalmente, devem ser fungíveis entre si. Vale dizer, os débitos devem compreender prestações que podem ser substituídas umas pelas outras (art. 85 do CC).

Em determinadas situações, porém, é possível identificar compensação entre dívidas ilíquidas. Isso se verificará por imposição judicial, quando, em um processo de conhecimento - que compreenda dívidas desprovidas de certeza e liquidez -, no qual exista reconvenção. Ao se verificar que o autor é credor do réu, tanto quanto este é credor daquele, sem que os respectivos débitos estejam liquidados, o juiz poderá...

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