Acórdão nº 50948466120208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Cível, 02-03-2023
Data de Julgamento | 02 Março 2023 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50948466120208210001 |
Tipo de documento | Acórdão |
Órgão | Oitava Câmara Cível |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20003269661
8ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5094846-61.2020.8.21.0001/RS
TIPO DE AÇÃO: Fixação
RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS
RELATÓRIO
LUCAS S. P. interpõe recurso de apelação da sentença que, nos autos da ação de guarda cumulada com regulamentação de convivência e alimentos ajuizada por ELEONORA M. P. B., julgou procedentes os pedidos, definindo a guarda do filho dos litigantes em favor da autora/apelada, regulamentando a convivência paterno-filial e fixando os alimentos devidos pelo recorrente em 30% de seus rendimentos líquidos - assim entendida a renda bruta menos os descontos legais obrigatórios - e 35% do salário mínimo nacional em caso de desemprego ou atividade informal (evento 99, SENT1).
Sustenta que: (1) a convivência paterno filial está ocorrendo em todos os finais de semana, de forma que o genitor/apelante está participando ativamente da vida de seu filho, fortalecendo vínculos; (2) em decorrência disso, é de ser estabelecida a guarda compartilhada da criança, fixando-se a residência materna como base de moradia, sendo este o arranjo que melhor atende melhor aos interesses do infante; (3) quanto aos alimentos, a apelada postulou sua fixação em valor inclusive inferior ao arbitrado pelo Juízo de origem para o caso de desemprego do prestador; (4) não é razoável que o valor da obrigação alimentar em caso de desemprego e atividade informal do prestador seja superior ao devido enquanto possuir vínculo formal; (5) considerando que o recorrente possui emprego formal, mas não aufere expressiva renda, é imperiosa a redução dos alimentos à luz do binômio necessidade-possibilidade, previsto no art. 1.694, § 1º, do Código Civil. Requer o provimento do recurso para reformar a sentença atacada, a fim de (a) estipular a guarda compartilhada do filho dos litigantes, fixando a residência materna como base de moradia, bem como (b) reduzir os alimentos devidos pelo recorrente para 20% de seus rendimentos e 20% do salário mínimo nacional em caso de desemprego ou atividade informal (evento 119, APELAÇÃO1).
Houve oferta de contrarrazões (evento 129, CONTRAZAP1).
O Ministério Público opina pelo parcial provimento (evento 7, PARECER1).
É o relatório.
VOTO
Inicio pela análise do pedido de reforma relativo ao tema da guarda do filho dos litigantes, LUCAS ARTHUR, nascido em 01.06.2017 (evento 1, CERTNASC7). Como é sabido, as questões envolvendo a guarda de crianças e adolescentes são delicadas e exigem ampla análise, a fim de que prevaleça o seu melhor interesse.
Na sentença atacada, foi definida a guarda unilateral do infante em favor da genitora/apelada. Inconformado, o genitor recorre, visado a obter a guarda compartilhada.
Embora o Código Civil, em seus arts. 1.583 e 1.584, privilegie, de certo modo, a guarda compartilhada, há situações peculiares que inviabilizam, ou não recomendam, sua aplicação. Se o propósito da Constituição Federal é garantir o melhor interesse das crianças e adolescentes, na linha do disposto no art. 227, não se pode entender a guarda compartilhada como um imperativo legal, dotado de automaticidade, que deva predominar em qualquer situação.
Há que se ter em mente que o objetivo da guarda compartilhada é possibilitar a ambos os genitores, ainda que separados no plano fático, a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres concernentes ao poder familiar dos filhos comuns (art. 1.583, inc. I, do Código Civil), o que, em tese, só traz benefícios ao(s) filho(s). Contudo, para tanto, pressupõe-se a necessidade de existir um mínimo diálogo produtivo entre os genitores, a fim de que o compartilhamento da guarda não se torne a causa para outras tantas futuras disputas judiciais, concernentes aos desacertos entre os guardiães, o que, sobretudo, reflete em prejuízos à prole, que muitas vezes participa e é exposta a um recorrente atrito. Nesse sentido, inclusive, já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. FAMÍLIA. PRETENSÃO DE ADOÇÃO DA GUARDA COMPARTILHADA DOS FILHOS MENORES. ACÓRDÃO RECORRIDO QUE, COM BASE NOS ELEMENTOS E PROVAS CONSTANTES DOS AUTOS, CONCLUIU QUE A GUARDA COMPARTILHADA NÃO ATENDE O MELHOR INTERESSE DOS FILHOS. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO NA VIA DO RECURSO ESPECIAL. REEXAME DE PROVAS. VEDAÇÃO. SÚMULA Nº 7 DO STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL INVIABILIZADO EM RAZÃO DO ÓBICE SUMULAR. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
(...) 2. Esta eg. Corte Superior já decidiu que a guarda compartilhada dos filhos é o ideal a ser buscado no exercício do poder familiar, na medida em que a lei foi criada com o propósito de pai e mãe deixarem as desavenças de lado, em nome de um bem maior, qual seja, o bem-estar deles.
2.1. Contudo, a questão envolvendo a guarda de menores não pode ser resolvida somente no campo legal, devendo também ser examinada sob o viés constitucional, consubstanciado na observância do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, previsto no art. 227 da CF, que também deve ser respeitado pelo magistrado, garantindo-lhes a proteção integral, que não podem ser vistos como objeto, mas sim como sujeitos de direito.
2.2. Em situações excepcionais e, em observância ao referido princípio, a guarda compartilhada não é recomendada, devendo ser indeferida ou postergada, como nos casos em que as condutas conturbadas e o alto grau de beligerância entre os seus genitores ao longo do processo de guarda não observam o melhor interesse dos filhos.
(...) (AgInt no REsp 1808964/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/03/2020, DJe 11/03/2020) (grifei)
No caso, como bem assinalado na sentença recorrida, o estudo social produzido denota a inviabilidade de haver o compartilhamento da guarda. É consignado no laudo social que a beligerância entre os contendores inclusive acarreta a necessidade de intermediação de outros familiares no que diz respeito às combinações inerentes à convivência paterno-filial (evento 70, LAUDO1). Por essa razão, conclui a assistente social que "considerando a singularidade do contexto familiar, recomenda-se a manutenção da guarda materna e do convívio paterno em finais de semana alternados com pernoite".
Nesse contexto, deve ser mantida a guarda unilateral em favor da genitora, destacando-se que, mesmo pleiteando a guarda compartilhada, o genitor não se opõe à fixação da residência materna como base de moradia.
Passo a examinar o pedido de reforma relativo aos alimentos devidos pelo demandado/apelante, os quais decorrem do dever de sustento dos pais em relação aos filhos menores, previsto no art. 22 do ECA e art. 1.566, inc. IV, do Código Civil. Quanto ao valor, dispõe o art. 1.694, § 1º, do Código Civil, que a verba deve ser fixada na proporção das necessidades do beneficiário e dos recursos da pessoa obrigada.
Na sentença recorrida, a obrigação alimentar em prol do filho dos contendores, LUCAS ARTHUR, foi fixada em 30% dos rendimentos líquidos do...
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