Acórdão nº 50953496620228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Cível, 23-11-2022

Data de Julgamento23 Novembro 2022
ÓrgãoQuarta Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50953496620228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002432660
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5095349-66.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Poluição

RELATOR: Desembargador VOLTAIRE DE LIMA MORAES

AGRAVANTE: SARAH MARIA BORGES UGGERI

AGRAVANTE: SALETE DE FATIMA BORGES LORENZINI

AGRAVANTE: MARCOS ANTONIO SANGOI

AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RELATÓRIO

1- Trata-se de agravo de instrumento interposto por SALETE DE FÁTIMA BORGES LORENZINI e OUTRAS, na ação civil pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, em face da decisão proferida pela Dra. ANA PAULA DA SILVA TOLFO, da Comarca de Santiago, nos seguintes termos:

Vistos etc.

1.-Vieram os autos conclusos após a réplica, passo ao saneamento.

2.- Não é caso de reconhecimento da prescrição.

A questão restou sedimentada pelo STF com a edição do Tema 999, do seguinte teor:

É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental.

O reconhecimento se deve à natureza do direito que não atinge unicamente a esfera individual, mas a coletividade.

Também assim o entendimento do TJRGS:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA (TAC). EXECUÇÃO NÃO EMBARGADA. POSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INOCORRÊNCIA. NULIDADE DO TAC NÃO CONFIGURADA. DESCUMPRIMENTO DE PRAZO PARA ATENDER AS CONDIÇÕES ESTABELECIDAS. APLICAÇÃO DE MULTA. POSSIBILIDADE. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO MANTIDA. 1. A proteção ao meio ambiente consagra-se como direito difuso e indisponível razão pela qual a pretensão para haver indenização decorrente de danos ambientais é imprescritível. 2. A validade e eficácia do título executivo extrajudicial podem ser objeto de posterior ação de conhecimento, quando na execução não forem opostos embargos do devedor. 3. É entendimento pacificado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça que o inquérito civil instaurado pelo Ministério Público tem cunho informativo e serve de base para o pedido inicial da ação civil pública. Portanto, não se submete aos princípios do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, inc. LV, da CF). 4. Não há qualquer nulidade no título, em razão da ausência de assistência de advogado no momento da assinatura, como quer fazer crer o recorrente. 5. As obrigações impostas ao executado, no Termo de Ajustamento de Conduta, tinham por fim a recuperação florestal de área de preservação permanente, com plantio de 255 mudas de árvores nativas em prazo estipulado. Obrigação cumprida três anos após o prazo estabelecido. 6. Não implementado integralmente o plantio de mudas previsto no projeto de recuperação da área degradada, no prazo avençado no Termo, resta descumprido o TAC, devendo ser aplicada àquele que não realizou as obrigações assumidas uma sanção pecuniária pelo descumprimento. 7. O §6º, do artigo 5º, da Lei nº 7.347/85 prevê a cominação de multa, a fim de assegurar o cumprimento das obrigações assumidas em termo de ajustamento de conduta. APELO DESPROVIDO.(Apelação Cível, Nº 70079209664, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Lúcia de Fátima Cerveira, Julgado em: 28-11-2018)

Assim, desacolho a prefacial de prescrição.

3.- Quanto ao mais, a discussão cinge-se a efetiva ocorrência de dano, extensão e danos daí decorrentes.

A documentação juntada pelo Ministério Público é início de prova suficiente dos danos ocorridos e do nexo causal indicado.

Assim, o ônus de demonstrar a não ocorrência na forma como indicada no inquérito civil é da parte requerida.

4.- Intimem-se na forma do §1º do art. 357 do NCPC, mesmo prazo em que deverão as partes indicar as provas que ainda pretendam produzir, inclusive juntando rol de testemunha em caso de pretenderem a produção de prova oral.

Diligências legais.

2- Em razões recursais, sustentam as agravantes, em síntese, que deve ser modificada a decisão recorrida, pois ela não foi devidamente fundamentada, ferindo o disposto no artigo 11 c/c o art. 489 parágrafo 3º, inciso III, do CPC. Discorrem acerca da impossibilidade da inversão do ônus da prova, no caso, notadamente levando em consideração que essa inversão transfere encargo impossível às demandadas, já que o auto de infração ambiental foi lavrado há sete anos. Salientam que o ônus da prova é do agravado. Postulam a concessão do efeito suspensivo e, no mérito, o seu provimento.

O recurso foi recebido no efeito devolutivo (Evento nº 07).

Intimado, o agravados deixou transcorrer in albis o prazo (Eventos nºs. 9,10 e 11).

Com o parecer da Digna Procuradora de Justiça, Dra. Vera Lúcia Gonçalves Quevedo, manifestando-se pela rejeição da preliminar de nulidade da decisão e, no mérito, pelo desprovimento do recurso, vieram-me os autos para julgamento.

VOTO

Cuida-se de agravo de instrumento interposto por SALETE DE FÁTIMA BORGES LORENZINI e OUTROS, em face da decisão proferida pela Dra. ANA PAULA DA SILVA TOLFO que, nos autos da ação civil pública, entendeu que o ônus de demonstrar a não ocorrência dos danos na forma como indicada no inquérito civil é da parte-requerida.

Inicialmente passo ao exame da preliminar de nulidade da decisão recorrida e o faço para afastá-la.

Quando do recebimento do agravo de instrumento assim me manifestei, in verbis:

Inicialmente, cabe salientar que não vislumbro qualquer mácula na decisão agravada que possa acarretar a sua nulidade, notadamente levando em consideração que o julgador a quo expôs os elementos formadores de sua convicção para determinar a inversão do ônus da prova, mesmo que de forma sucinta, atendendo assim, as exigências constitucionais e legais quanto à necessidade de fundamentação das decisões (art. 93, inciso IX, da CF/88 e no art. 489, inciso II, do CPC/15).

Logo, embora concisa, a decisão recorrida não carece de fundamentação.

Assim, não há falar em nulidade da decisão recorrida, pois o julgador a quo expôs os elementos formadores de sua convicção, fundamentando sua decisão com base no direito vigente, atendendo, assim, às exigências constitucionais e legais quanto à necessidade de fundamentação das decisões (art. 93, IX, da CF/88 e artigos 489, I a III e 11, ambos do CPC).

No caso, conforme se pode verificar dos autos, especialmente do inquérito civil, o Ministério Público ajuizou ação civil pública contra os ora agravantes em razão de supressão de vegetação nativa típica campestre do bioma mata atlântica, sem a devida autorização ou licenciamento, requerendo a inversão do do ônus da prova.

Para Hugo Nigro Mazzilli, Inquérito Cívil é: 1 A rigor, o inquérito civil não é processo administrativo e sim procedimento; nele não há uma acusação nem nele se aplicam sanções: nele não se decidem nem impõem limitações, restrições ou perda de direitos (embora dele decorram alguns efeitos jurídicos indiretos, e, excepcionalmente, até mesmo uma consequência jurídica direta para terceiros, que é óbice à decadência, como veremos no cap. 9). No inquérito civil não se decidem interesses; não se aplicam penalidades ou sanções, não se extinguem nem se criam novos direitos. Apenas serve, sob forma inquisitiva, para colher elementos ou informações, basicamente com o fim de formar-se a convicção do órgão do Ministério Público para eventual propositura de ação civil pública ou coletiva.

No caso, do quanto se extrai do conceito acima, o inquérito civil tem como objetivo colher elementos de prova ou informações que deem suporte ao Ministério Público para o ajuizamento de uma ação civil pública.

Com efeito, a ação civil pública foi ajuizada com base no Inquérito Civil nº 01223.00040/2014, onde foram colhidas informações e muitas provas (laudo, termo de vistoria, relatório técnico, auto de infração, certidões, declarações) que foram produzidas por agentes públicos e que, por isso, possuem pressução de veracidade.

Nesse sentido, por pertinente, destaco trecho do Recurso Especial nº 1.761.131-SP, da Relatoria do Ministro Herman Benjamin, in verbis: Consoante o art. 405 do CPC/2015, laudo, termo de vistoria, relatório técnico, auto de infração, certidão, declaração e outros e outros atos gerados por agentes de qualquer órgão do Estado possuem presunção (relativa) de legalidade, legitimidade e veracidade, por se enquadrarem no conceito geral de documento público. Tal qualidade jurídica inverte o ônus da prova, sem impedir, por óbvio, a mais ampla sindicância judicial. Por outro lado, documento público não pode ser desconstituído por prova inconclusiva, dúbia, hesitante ou vaga. São dotados de natureza pública documentos elaborados no âmbito do Inquérito Civil e investigações preliminares conduzidas pelo Parquet.

Nessa linha de raciocínio cabe destacar a doutrina de Hugo Nigro Mazzilli2: O valor do inquérito civil como adminiculo probatório em juízo decorre de ser uma investigação pública e de caráter oficial. Quando regularmente instaurado, o que nele se colher ou se apurar tem validade e eficácia em juízo, como é o caso dos documentos, das perícias e das inquirições. Ainda que o inquérito civil sirva essencialmente para preparar a decisão do próprio Ministério Público de propor ou não ação civil...

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