Acórdão nº 50962140820208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50962140820208210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001567771
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5096214-08.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Isonomia/ Equivalência Salarial

RELATOR: Desembargador ANTONIO VINICIUS AMARO DA SILVEIRA

APELANTE: SARA VIEGAS BRESSANE (AUTOR)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por SARA VIEGAS BRESSANE contra a sentença de improcedência, prolatada nos autos da ação de rito ordinário movida em desfavor do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, na qual busca o reconhecimento do desvio de função e o direito ao adicional de risco de vida.

Em suas razões, a parte autora refere que ingressou nos quadros do Tribunal de Justiça deste Estado em 19.08.2017, para o exercício das atividades de Serviçal. Entretanto, relata que quando passou a desempenhar suas atividades junto ao Cartório da Distribuição e Contadoria do Foro Partenon, em meados de 2007, houve novação objetiva no seu contrato de trabalho, pois passou a exercer as atividades de Oficial Escrevente. Insurge-se contra o entendimento do juízo de origem, no sentido de servidor celetista não faz jus ao pagamento de desvio de função de cargo exercido por servidor estatutário. Argumenta que incontroverso nos autos que efetivamente existiu o desvio de função e que a apelante na realidade fática do contrato de trabalho laborou exercendo as atividades inerentes ao cargo de Oficial Escrevente. Relata que a atividade de serviçal consiste em manter a serventia organizada, manter os processos físicos em ordem, organizar a cozinha dos cartórios, realizar o preparo de café para Magistrados e Servidores, organizar as salas de audiência, entre outras. Ao passo que a de Oficial Escrevente consiste no atendimento ao público, advogados, partes, confecção de alvarás, disponibilização de notas de expediente, envio de e-mails, telefonemas, distribuição de processos cíveis, criminais, inquéritos, termos circunstanciados, entre outras. Refere que a tanto a prova documental, quanto testemunhal, corroboram as alegações, como por exemplo, as certidões com fé pública que a apelante realizava consultando a competência, o atendimento a advogados e partes, distribuição de processos e termos circunstanciados comprovam o alegado. Discorre que não houve impugnação específica da Procuradoria do Estado no tocante à farta prova documental produzida ao longo dos anos que comprovam sem deixar qualquer dúvida que a apelante laborou exercendo as atividades de Oficial Escrevente, entretanto, sem receber as vantagens do cargo. Releva ter direito a uma indenização pelos danos morais sofridos. Requer o provimento do recurso, com vistas à reforma da sentença, com a condenação do demandado ao pagamento das diferenças salariais entre o cargo de Serviçal e Oficial Escrevente, sob pena de enriquecimento sem causa, bem como a indenização por danos morais.

Foram apresentadas contrarrazões.

O Ministério Público, em parecer da lavra do e. Procurador de Justiça, Dr. Luiz Felipe Brack, opina pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas, conheço do recurso, pois preenchidos os requisitos de admissibilidade.

Destaco que a matéria devolvida à apreciação desta Corte diz respeito à pretensão de reconhecimento de desvio de função entre o cargo de Serviçal e o de Oficial Escrevente, pelo período em que vinculada ao Estado do Rio Grande do Sul como extranumerário, bem como a indenização por danos morais alegadamente sofridos.

Consigno, de início, que atrelada está a Administração Pública ao princípio da legalidade, e qualquer pretensão só será passível de concessão quando houver expressa previsão legal.

Nestes termos, prudente lembrar a sempre citada lição de Hely Lopes Meirelles:

“A legalidade, como princípio administrativo (CF, art. 37, “caput”), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. A eficácia de toda a atividade administrativa está condicionada ao atendimento da lei. Na administração pública não há liberdade nem vontade pessoal, enquanto na administração particular é lícito fazer tudo o que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa pode fazer assim; para o administrador público deve fazer assim“ (in Direito Administrativo Brasileiro, 22ª ed., p. 82).

Quanto ao desvio de função, a autora alega, desde a petição inicial, que não obstante tenha ingressado no Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul para exercer as funções de Serviçal, em 19.08.1987, submetida ao regime jurídico da Consolidação das Leis do Trabalho, passou a desempenhar suas atividades na Vara de Execuções Criminais do Foro Central, no Foro Regional do Alto Petrópolis, na 2ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de Porto Alegre e, por fim, junto ao cartório da Distribuição e Contadoria do Foro Regional do Partenon, onde exerceu exclusivamente atividades que eram privativas de Oficial Escrevente.

Nesse passo, importa referir que a orientação firmada nos Tribunais Superiores é no sentido de que o reconhecimento de que o servidor desempenha atribuições diversas daquele cargo para o qual foi aprovado em concurso público e nomeado pela Administração Pública implica na obrigação de complementação vencimental pelo período em que desviado de suas funções1.

No mesmo norte, o Superior Tribunal de Justiça, ao editar o enunciado da Sumula nº 378, disse que Reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais decorrentes”, entendimento sufragado por esta Corte Estadual, conforme se vê, exemplificativamente: (Apelação e Reexame Necessário Nº 70056992530, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Uhlein, Julgado em 17/09/2014; Apelação Cível Nº 70059800722, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francesco Conti, Julgado em 27/08/2014; Apelação Cível Nº 70058456104, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Julgado em 25/09/2014).

Partindo de tais premissas, na hipótese de comprovação do desvio de função em cargo que exige melhor qualificação e de melhor remuneração do que a do cargo que o postulante é titular, cabível a condenação do poder público ao pagamento de diferenças vencimentais, sob pena de enriquecimento ilícito.

No caso concreto, no entanto, a autora ingressou com a demanda buscando o reconhecimento do exercício as atividades de Oficial Escrevente, em contrapartida às funções de Serviçal, a contar do ano de 2007 até a data de sua aposentadoria, em 04.12.2017 (Evento 1 – OUT6, dos autos de origem), razão pela qual pleiteia o pagamento das diferenças salariais daí decorrentes, bem como de indenização por danos morais.

Adianto que o caso dos autos comporta peculiaridade, na medida em que o falecido autor era servidor público extranumerário ...

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