Acórdão nº 50967282420218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Número do processo50967282420218210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002241836
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação/Remessa Necessária Nº 5096728-24.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: ICMS/Importação

RELATOR: Desembargador MIGUEL ANGELO DA SILVA

APELANTE: GENTOS TECNOLOGIA EM SEMENTES DE PASTOS EIRELI (IMPETRANTE)

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (INTERESSADO)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

De saída, reporto-me ao relatório do parecer ministerial lançado nesta instância, que assim sumariou a espécie, "in verbis":

"Trata-se de Recursos de Apelação interpostos por GENTOS TECNOLOGIA EM SEMENTES DE PASTOS EIRELI e pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, nos autos do mandado de segurança ora impetrado pelo primeiro apelante contra ato consubstanciado ao Subsecretário da Receita Estadual.

Em suas razões, o Estado tece argumentos a fim de justificar a denegação da ordem; pugnando, assim, pelo provimento do apelo.

Inconformado, a impetrante apela. Desse modo, pede seja concedida a ordem, para garantir o direito da mesma à compensação dos valores indevidamente pagos a título de ICMS sobre as importações de sementes do Mercosul, anteriores ao ajuizamento deste mandamus, respeitada a prescrição quinquenal, na forma do postulado na petição inicial.

Ambas as partes ofereceram contrarrazões."

A d. Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e desprovimento de ambos os recursos (Evento 07).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Reexame necessário.

A sujeição da sentença ao duplo grau de jurisdição obrigatório encontra previsão no art. 14, § 1º, da Lei nº 12.016/09, “in litteris”:

Art. 14. Da sentença, denegando ou concedendo o mandado, cabe apelação.
§ 1º Concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição.

Portanto, conheço da remessa necessária.

Apelações.

Conheço de ambos os recursos interpostos, pois presentes seus pressupostos de admissibilidade.

Cuida-se de mandado de segurança impetrado por GENTOS TECNOLOGIA EM SEMENTES DE PASTOS EIRELI, contra ato do SUBSECRETÁRIO DA RECEITA ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL, em cuja inicial aquela postula seja concedida a ordem, para "garantir à Impetrante o direito líquido e certo de usufruir de isenção de ICMS nas operações de importação de sementes (das espécies para as quais conta com credenciamento junto ao Registro Nacional de Sementes e Mudas - RENASEM) oriundas de empresas situadas em países do Mercosul, nos termos previstos no artigo 9º, inciso VIII, alínea “e”, do RICMS/RS, aplicável ao caso por força do disposto no artigo 7º, do Tratado de Assunção.". Ainda, pugna por que seja declarado "o direito da impetrante à compensação dos valores indevidamente recolhidos em decorrência da cobrança de ICMS na importação de sementes, pagos nos últimos 05 (cinco) anos, e, ainda, no curso do presente processo, com débitos próprios, vencidos ou vincendos, referentes a qualquer tributo administrado pela Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul, com correção monetária plena pela taxa SELIC, ou subsidiariamente, com a aplicação dos mesmos índices de correção e juros aplicados pela Fazenda Pública, sem as limitações do artigo 170- A do CTN, afastando-se a aplicação de restrições deste tipo existentes em qualquer outra norma;" (sic).

Insurgem-se a impetrante e o Estado do Rio Grande do Sul contra a sentença que, entendendo demonstrado em parte o direito líquido e certo invocado na inicial, concedeu parcialmente a segurança, "para reconhecer o direito da impetrante de realizar as importações de sementes (das espécies credenciadas junto ao Registro Nacional de Sementes e Mudas - RENASEM) de países integrantes do Mercosul sob o abrigo da isenção do ICMS, nos moldes do artigo 9º, inciso VIII, alínea "e", do RICMS, permitindo, ainda, a restituição do montante recolhido indevidamente, a contar da data da impetração deste writ. Os valores deverão ser corrigidos monetariamente pela taxa SELIC, nos termos da Lei nº 13.379, de 19.01.2010, que alterou o art. 69 da Lei nº 6.537/73." (sic).

Pois bem.

Quanto ao ponto fulcral da questão trazida ao crivo desta instância revisora, relativo à incidência (ou não) do ICMS nas importações de sementes de países integrantes do Mercosul, estimo não comportar reparos a d. sentença invectivada, cujos fundamentos adoto e transcrevo adiante, a fim de evitar desnecessária tautologia, “in litteris”:

"Trata-se de mandado de segurança em que a impetrante pretende o reconhecimento do direito líquido e certo de importar sementes de arroz de empresas situadas nos países do Mercosul ao abrigo da isenção, conforme previsto no art. 9º, inciso VIII, alínea "e" do RICMS/RS para as vendas internas.

Analisando o caso em tela, verifica-se que, em situação similar neste Juizado, foi deferida a liminar e concedida a segurança no processo nº 9049501-72.2018.8.21.0001, cuja decisão transitou em julgado, obtendo a impetrante direito à importação de sementes ao abrigo da isenção do ICMS.

Transcrevo a ementa do acórdão do TJRS para melhor exemplificar:

APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. ISENÇÃO. IMPORTAÇÃO DE SEMENTES DE ARROZ DE EMPRESAS SITUADAS NOS PAÍSES INTEGRANTES DO MERCOSUL. POSSIBLIDADE. EXTENSÃO DE BENEFÍCIO FISCAL. TRATADO DE ASSUNÇÃO. SÚMULA 575 DO STF E SÚMULA 20 DO STJ. O artigo 7º do Tratado de Assunção, ratificado pelo Congresso Nacional através do Decreto nº 350/91, prevê que em matéria tributária, os produtos originários do território de um Estado parte gozarão, nos demais, do mesmo tratamento aplicável ao produto nacional. O art. 98 do Código Tributário Nacional, por sua vez, dispõe que os tratados/convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha. Possui a impetrante direito líquido e certo de importar sementes de arroz de empresas situadas nos países integrantes do Mercosul ao abrigo da isenção do ICMS prevista no artigo 9º, inciso VIII, alínea “e”, do RICMS. APELO DESPROVIDO. SENTENÇA CONFIRMADA EM REMESSA NECESSÁRIA. UNÂNIME.(Apelação e Reexame Necessário, Nº 70080186786, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco José Moesch, Julgado em: 25-04-2019).

Conforme artigo 7º do Tratado de Assunção (Decreto nº 350/91), do qual o Brasil é signatário, deve ser assegurado às mercadorias adquiridas de países membros do Mercosul o mesmo tratamento tributário dado aos produtos nacionais.

Transcrevo:

Em matéria de impostos, taxas e outros gravames internos, os produtos originários do território de um Estado Parte gozarão, nos outros Estados Partes, do mesmo tratamento que se aplique ao produto nacional.

Releva notar que a viabilidade eficacial das normas dos tratados constitui diretriz do nosso sistema jurídico, consoante art. 5º da Constituição Federal:

§2º. Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte." Portanto, o Tratado de Assunção deve ser respeitado, a fim de viabilizar a livre circulação de bens e serviços entre os países integrantes.

Sobre o tema cito a doutrina de José Eduardo Soares De Melo, no livro Importação e Exportação no Direito Tributário:

Não se trata de norma programática, mas de norma que possui eficácia como todo preceito constitucional, não significando simples conselho, diretriz, exortação ou programa cometido ao legislador. Portanto, tendo a aludida integração se tornado uma realidade jurídica (Tratado do Mercosul), hão que ser respeitados seus comandos normativos, na medida em que sejam harmonizados com os demais preceitos constitucionais.

O entendimento esposado por Hugo De Brito Machado acerca do art. 98 do CTN, no sentido de que os tratados internacionais prevalecem sobre a legislação interna, corrobora os fundamentos até então expostos. Cito:

O Código Tributário Nacional estabelece que os tratados e convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna e serão observados pela que lhes sobrevenha (art. 98). Há, evidentemente, impropriedade terminológica na disposição legal. (...) O que ela pretende dizer é que os tratados e convenções internacionais prevalecem sobre a legislação interna, seja anterior ou mesmo posterior.

(...) Constituem os tratados internacionais valioso instrumento para a disciplina das relações tributárias com implicações no âmbito internacional. A propósito de renda, por exemplo, o Brasil já celebrou diversos tratados visando a evitar a evasão de tributo e a bitributação internacional. Também no que se refere ao imposto de importação tem o Brasil participado de alguns tratados internacionais, como o da ALALC e do GATT.

Tal interpretação deu origem às Súmulas 575 do STF e 20 do STJ:

Súmula n. 575 do STF - À mercadoria importada de país signatário do GATT, ou membro da ALALC, estende-se a isenção do imposto de circulação de mercadorias concedida a similar nacional.

Súmula n. 20 do STJ - A MERCADORIA IMPORTADA DE PAIS SIGNATARIO DO GATT É ISENTA DO ICM, QUANDO CONTEMPLADO COM ESSE FAVOR O SIMILAR NACIONAL.

No mesmo sentido, foi o parecer do Ministério Público (Evento 24), vejamos:

O artigo 7º do Tratado de Assunção, ratificado pelo Congresso Nacional através do Decreto nº 350/91, prevê que em matéria tributária, os produtos originários do território de um Estado parte gozarão, nos demais, do mesmo tratamento aplicável ao produto nacional:

Em matéria de impostos, taxas e outros gravames internos, os produtos originários do território de um Estado Parte gozarão, nos outros Estados Partes, do mesmo tratamento que se aplique ao produto nacional.

O art. 98 do Código Tributário Nacional, por sua vez,...

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