Acórdão nº 50981011120228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 20-06-2022
Data de Julgamento | 20 Junho 2022 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Classe processual | Habeas Corpus |
Número do processo | 50981011120228217000 |
Tipo de documento | Acórdão |
Órgão | Segunda Câmara Criminal |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20002188606
2ª Câmara Criminal
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Habeas Corpus (Câmara) Nº 5098101-11.2022.8.21.7000/RS
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5001786-31.2022.8.21.0044/RS
TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)
RELATOR: Desembargador JOSE ANTONIO CIDADE PITREZ
PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA
ADVOGADO: DAIANA DA SILVA TOLEDO (OAB RS096167)
IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA
RELATÓRIO
Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por advogada em favor de ALEX PIEROZAN PIRES, alegando que este sofre constrangimento ilegal em seu direito de ir e vir, apontando como autoridade coatora o Juízo da 2ª Vara Criminal da comarca de Encantado, tendo como fundo o cometimento, em tese, de delito de narcotráfico.
O presente habeas corpus busca a concessão de liberdade provisória ao paciente. Sustenta a defesa que este se encontra segregado desde 05MAI2022, modo injustificado, alegando "excesso de tempo já preso preventivamente".
Refere ausentes os requisitos do artigo 312, do CPP, a justificar a constrição cautelar e a manutenção desta, bem como aduz da falta de fundamentação do decreto de prisão.
Afirma que dito paciente apresenta predicados pessoais favoráveis; aduz matéria de mérito, em especial, referindo fragilidade da prova quanto ao ilícito, enfatizando que o gravame da prisão não mais lhe pode ser imposto, pontuando a condição do paciente de usuário de drogas. Assevera que a prisão fere o princípio da presunção de inocência e configura antecipação de punição, endossando a viabilidade de se responder ao feito em liberdade, eis que o delito não se reveste de violência ou grave ameaça. Cita que o fato de o paciente estar em local frequentado por usuários de drogas, não faz deste traficante.
Busca a aplicação de medidas cautelares contidas no artigo 319, do CPP, caso não lhe seja deferida a liberdade, almejada prioritariamente.
Seguiu-se apreciação da liminar, ocasião em que indeferida a mesma.
Dispensadas as informações, colheu-se, na sequência, o parecer escrito da douta Procuradoria de Justiça, no rumo do conhecimento e denegação da ordem.
É o relatório.
VOTO
Adianto que denego a ordem impetrada, por não vislumbrar o invocado constrangimento ilegal.
Assim me manifestei, quando despachei o pleito liminar:
“Vistos.
Indefiro o pedido de concessão da ordem impetrada em caráter liminar, figura de criação pretoriana e destinada a casos excepcionais, nos quais não se enquadra o presente, malgrado os ponderáveis argumentos expostos na inicial.
Com efeito, para a decretação da custódia cautelar, a lei processual exige a reunião de, pelo menos, três requisitos: dois fixos e um variável.
Os primeiros são a prova da materialidade e indícios suficientes de autoria. O outro pressuposto pode ser a tutela da ordem pública ou econômica, a conveniência da instrução criminal ou a garantia da aplicação da lei penal, demonstrando-se o perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado (receio de perigo) e a existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada (CPP, art. 312, caput e § 2º c/c art. 315, § 2º).
Ademais, deve-se verificar uma das seguintes hipóteses: a) ser o crime doloso apenado com pena privativa de liberdade superior a quatro anos; b) ser o investigado reincidente; e c) pretender-se a garantia da execução das medidas protetivas de urgência havendo violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência (CPP, art. 313).
No caso em apreço, a prova da materialidade e os indícios suficientes de autoria encontram-se evidenciados pelos elementos de convicção constantes do auto de prisão em flagrante, do auto de apreensão, do laudo pericial e das declarações dos policiais que efetivaram a prisão em flagrante do paciente.
A propósito, o Superior Tribunal de Justiça deixou assentado que "(...) quanto aos requisitos para a preventiva, para a sua decretação, não se exige prova concludente da autoria delitiva, reservada à condenação criminal, mas apenas indícios suficientes dessa (...)" (HC 379.264/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 22/03/2018, DJe 04/04/2018) que, pelo cotejo dos elementos que instruem o mandamus.
Ademais, o delito imputado ao paciente (tráfico de drogas) é doloso, com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos.
Outrossim, considerando a multiplicidade de verbos nucleares previstos no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, a configuração de dito delito prescinde da comprovação da finalidade de comercialização.
Nesse sentido:
PROCESSUAL PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. TRÁFICO INTERNACIONAL DROGAS. EXPORTAR OU REMETER DROGA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 528.
I - A competência em tráfico transnacional é da Justiça Federal, com base no artigo 109, inciso V, da Constituição Federal.
II - Nos termos do artigo 70, caput, do Código de Processo Penal, "a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução".
III - O crime de tráfico de drogas é considerado de ação múltipla ou tipo misto alternativo, em que a consumação ocorre com a incidência de qualquer dos núcleos.
IV - Em caso de exportação ou remessa de droga do Brasil para o exterior via postal, a consumação do delito ocorre no momento do envio da droga, juízo competente para processar e julgar o processo, independentemente do local da apreensão. Inaplicabilidade da Súmula 528 desta Corte Superior, na espécie.
Conflito de Competência conhecido para declarar competente o Juízo Federal da Seção Judiciária do Estado de Goiás.
(CC 146.393/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe 01/07/2016)
Em prosseguimento, tem-se que a prisão preventiva se faz necessária para fins de garantia da ordem pública, tendo em vista a gravidade concreta do delito, notadamente se considerada as circunstâncias da prisão (cumprimento de mandado de busca e apreensão expedido a partir de prévia investigação que apontou o imóvel em que o paciente foi abordado, como ponto de tráfico de drogas), a abordagem de um sedizente usuário no local, assim como a variedade e quantidade de alguns dos entorpecentes apreendidos (23 porções de maconha, com peso total de 59,80g; 26 porções de cocaína, pesando 21,30g e 05 porções de crack, com peso de 0,90g), o que evidencia a dedicação e o envolvimento do flagrado com a atividade criminosa
A propósito, colaciono o seguinte excerto de julgado do Superior Tribunal de Justiça: “a quantidade, a natureza ou a diversidade dos entorpecentes apreendidos podem servir de fundamento ao decreto de prisão preventiva” (passagem da ementa do HC 391.652/MS, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 03/08/2017, DJe 14/08/2017).
Ademais, a segregação cautelar do paciente também está justificada, em face de sua periculosidade e do risco concreto de reiterar na prática delitiva, visto que o agente, conquanto primário, cumpre medida socioeducativa pela prática recente de ato infracional análogo ao crime de estupro de vulnerável (processo nº 5002761-58.2019.8.21.0044/RS).
Com efeito, a perseverança do agente na senda delitiva, comprovada pelo registro de fato delituoso grave anterior, enseja a decretação da prisão cautelar para a garantia da ordem pública como forma de conter a reiteração, resguardando, assim, o princípio da prevenção geral e o resultado útil do processo.
Mencione-se que, embora inquéritos policiais, ações penais em andamento e atos infracionais não possam ser considerados para recrudescer a pena, nos termos do enunciado n. 444 da Súmula do STJ, consistem em elementos indicadores da propensão do acusado ao cometimento de novos delitos, caso permaneça em liberdade
Nessa direção, o entendimento do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que "a periculosidade do agente pode ser aferida por intermédio de diversos elementos concretos, tal como o registro de inquéritos policiais e ações penais em andamento que, embora não possam ser fonte desfavorável da constatação de maus antecedentes, podem servir de respaldo da necessidade da imposição de custódia preventiva” (HC n. 126.501/MT, Relator Min. MARCO AURÉLIO, Relator p/...
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