Acórdão nº 51011330620218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 02-12-2022

Data de Julgamento02 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo51011330620218210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002802780
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5101133-06.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Seguro

RELATOR: Desembargador NIWTON CARPES DA SILVA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL ajuizou ação indenizatória em face de XL SEGUROS BRASIL S.A, narrando, em síntese, que contratou com a Apelada, a partir de 2016, seguro de responsabilidade civil para cobrir eventuais danos experimentados por seus executivos em razão de reclamações relacionadas a atos de gestão, denominado D&O (“Directors and Officers”), que consiste em uma modalidade de seguro de responsabilidade civil, a qual tem por objeto a proteção do patrimônio dos altos executivos, como diretores, administradores, conselheiros e gerentes que tenham poder de tomada de decisão dentro da empresa, em face de responsabilização pessoal administrativa ou judicial dos atos relacionados à sua gestão. Mencionou que como em todos os outros anos, a contratação da apólice nº 03.10.1.001555 (“Apólice” – Evento 1, Anexo 5) foi antecedida pelo preenchimento, pelo Banrisul, de um questionário preparado pela Seguradora. (“Questionário” – Evento 1, Anexo 6), que exigia, dentre outros dados, informações sobre “demandas judiciais ou extrajudiciais” e “inquéritos administrativos.” Em 20.5.2020, o Banrisul tomou conhecimento da instauração do Processo Administrativo Sancionador nº 173612 (“PAS”) no âmbito do BACEN. De acordo com o BACEN, determinados colaboradores do Banrisul teriam deixado de adotar os procedimentos e cautelas necessárias para a prevenção de atos de lavagem de dinheiro, nos termos da legislação aplicável. Na medida em que as perdas decorrentes do PAS – incluindo custos de defesa dos colaboradores do Banrisul e eventual sanção que venha a lhes ser aplicada ao final do procedimento – são riscos cobertos pela Apólice, o Banrisul enviou à Seguradora o competente aviso de sinistro (“Aviso de Sinistro” – Evento 1, Anexo 8, em 15.6.2020. Asseverou que foi surpreendido com a negativa de cobertura, eis que, segundo a XL, inexistiria “cobertura securitária por conta do conhecimento prévio dos Segurados e a não aplicação da retroatividade da Apólice para fatos conhecidos. Postulou assim, a condenação da seguradora ré ao pagamento dos prejuízos incorridos pelo Autor e pelos Administradores Banrisul relacionados ao Processo Administrativo, o que inclui (i) os custos de defesa até o momento incorridos, no valor histórico de R$ 646.015,00 (seiscentos e quarenta e seis mil e quinze reais); (ii) outros valores a serem despendidos pelo Autor ou pelos Administradores Banrisul no curso do Processo Administrativo, relacionados a perdas cobertas pela Apólice, inclusive multas e penalidades impostas no âmbito do Processo Administrativo, tudo a ser corrigido monetariamente pela variação positiva do IPCA/IBGE, com juros remuneratórios de 1% ao mês, nos termos da cl. 19.3 da Apólice.

Sobreveio sentença que julgou improcedente a ação, condenando a parte Autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao procurador da parte Requerida, que restaram fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa.

A parte autora apelou. Em suas razões recursais reiterou os termos da exordial, asseverando, em síntese, que não houve enfrentamento dos argumentos trazidos pelo Banrisul para refutar a negativa ilegal de cobertura securitária por parte da Seguradora, impedindo que o Apelante verificasse se as suas razões foram levadas em consideração pelo juízo de origem, em observância ao princípio do contraditório. Mencionou que acostou aos autos diversas provas documentais capazes de demonstrar a procedência dos pedidos autorais. Discorreu sobre o princípio da boa-fé. Colacionou jurisprudência. Ao final requereu o provimento do recurso para fins de: a. anular a Sentença, considerando (i) o cerceamento do direito de defesa do Banrisul (CPC, art. 369); e (ii) a violação ao dever de fundamentação das decisões judiciais (CPC, art. 489, § 1º, II, III e IV); b. ou, em eventualidade, reformar a Sentença e julgar procedentes os pedidos autorais formulados na petição inicial. evento 40, APELAÇÃO1

Foram apresentadas contrarrazões evento 44, CONTRAZAP1

Os autos vieram-me conclusos em 30/09/2022.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas. Trata-se, consoante sumário relatório, de ação de cobrança de indenização de Seguro de Responsabilidade Civil de Diretores e Administradores de Pessoa Jurídica para cobrir eventuais danos experimentados por seus executivos em razão de reclamações relacionadas a atos de gestão denominado D&O, julgada improcedente na origem, por suposta infringência da norma contratual quanto alegada irregularidade ocorrida na instituição bancária.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

1) Preliminar- Do Cerceamento de Defesa -

Em suas razões recursais, a apelante defendeu, que as partes foram intimadas a especificar as provas que pretendiam produzir sem que as questões de fato e direito relevantes para a resolução do mérito fossem delimitadas pelo Juízo a quo, como impõe o CPC, art. 357, II e IV. Defendeu o recorrente que a definição das matérias de fato e de direito relevantes para o julgamento do mérito – e sobre as quais deveriam recair a atividade probatória – é medida essencial à boa organização do processo e preserva os princípios do contraditório e ampla defesa. Sustentou, ainda, que no caso dos autos, no entanto, a ausência de fixação dos pontos controvertidos da demanda revelou-se ainda mais grave porque (i) o Juízo a quo não oportunizou ao Banrisul seu direito expressamente previsto no CPC, art. 369, CPC, defendendo a ocorrência do cerceamento de defesa.

Mencionou que em diversas manifestações nos autos de origem, o Banrisul pontuou que essa contradição ínsita à tese da Seguradora havia restado incontroversa, justamente porque a Apelada não se manifestou sobre o assunto em contestação. Destacou que o Juízo a quo, por sua vez, não apontou essa questão como controvertida ao sanear o processo. Foi por conta disso que o Banrisul optou por não requerer a produção de provas a esse respeito (CPC, art. 374, III).

Entretanto a irresignação recursal veiculada na preliminar, data venia, não merece prosperar.

Destaco, inicialmente, que a ausência de despacho saneador não gera, por si só, nulidade processual, visto que se trata de provimento jurisdicional não obrigatório.

Depreende-se da análise dos autos que foi oportunizada às partes a produção de provas, não existindo, conforme adiante se vê, qualquer prejuízo aos recorrentes. Nesse viés, oportuno salientar que, sendo o juiz o destinatário da prova, cabe a ele indeferir aquelas que considera irrelevantes ou meramente procrastinatórias, forte no artigo 370, do CPC/20151, máxime quando entender que a causa, no estado em que se encontra, está pronta para julgamento.

Conforme precedente do Superior Tribunal de Justiça, referindo-se ao disposto no §2º do artigo 331, do CPC/1973, o saneamento do processo será feito desde que algum vício apresente necessidade de correção, pelo prejuízo causado a uma das partes, sendo que a ausência do despacho saneador não acarreta nulidade do processo ou cerceio de defesa capaz de comprometer a higidez processual, desde que assegurada a ampla defesa e o contraditório, sic:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL TRANCADO. RETENÇÃO. ART. 542, § 3º, DO CPC. REGRA GERAL. PRODUÇÃO DE PROVAS. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO ART. 331, § 3º DO CPC. PRECEDENTE. AUSÊNCIA DE FUMUS BONI IURIS E DE PERICULUM IN MORA. MEDIDA CAUTELAR NEGADA.

1. Medida cautelar ajuizada com o objetivo de destrancar recurso especial retido com base no art. 542, § 3º, do Código de Processo Civil, interposto contra acórdão que apreciou decisum interlocutório; no caso concreto, o magistrado de instrução considerou que as provas deveriam ser produzidas, por força do § 3º do art. 331 do Código de Processo Civil antes que fossem delimitados os pontos controvertidos.

2. A retenção dos recursos especiais, com base no art. 542, § 3º, do Código de Processo Civil, configura uma regra geral, quando a insurgência está dirigida contra debate acerca de decisão interlocutória, que é o caso concreto. Precedentes: AgRg na MC 23.800/MS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18.12.2015; AgRg na MC 17.449/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 6.12.2013; AgRg na MC 16.817/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 14.9.2010.

3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acolhe a possibilidade de aplicação do § 3º do art. 331 do Código de Processo Civil, em casos como o dos autos, pois "(...) o sistema processual atual não consagra a obrigatoriedade do despacho saneador em momento único. O saneamento do processo é feito em qualquer momento, desde que surja a necessidade de corrigir qualquer desvio prejudicial à apuração dos fatos discutidos e à aplicação das leis suscitadas. A regra do § 3º do artigo 331 do Código de Processo Civil não é obrigatória. A sua falta só produz nulidade quando demonstrado evidente prejuízo para uma das partes" (EDcl no AgRg no REsp 724.059/MG, Rel. Ministro José delgado, Primeira Turma, DJ 3.4.2006, p. 252).

(...)

(AgRg na MC 25.519/DF, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/03/2016, DJe 08/03/2016) – grifei

Ademais, foi oportunizado às partes, por duas vezes, a possibilidade de requerer a produção probatória, sendo que na primeira oportunidade o apelante requereu pela produção de prova documental suplementar e na segunda oportunidade o apelante dispensou a produção de outras provas. Ademais, o autor-recorrente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT