Acórdão nº 51017298720218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 20-04-2022

Data de Julgamento20 Abril 2022
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo51017298720218210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001950909
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5101729-87.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias

RELATOR: Desembargador FRANCISCO JOSE MOESCH

APELANTE: TISCHLER & CIA LTDA (IMPETRANTE)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por TISCHLER & CIA LTDA. contra a sentença que denegou a ordem nos autos do mandado de segurança impetrado contra ato imputado ao SUBSECRETÁRIO DA RECEITA ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL. Condenou a impetrante ao pagamento das custas processuais e deixou de arbitrar honorários, Custas pela parte impetrante. Sem honorários, de acordo com as Súmulas 512 do STF e 105 do STJ.

Em suas razões recursais, a recorrente discorre sobre o princípio da não-cumulatividade do ICMS, previsto no art. 155, § 2ª, I, da CF. Defende ter direito ao crédito decorrente do pagamento do imposto estadual quando da aquisição de energia elétrica, já que se trata de mercadoria com entrada no estabelecimento que é utilizada na obtenção de produto com saída tributada. Afirma que as vedações constantes no art. 20, §3° da Lei Complementar 87/96 não atingem o seu direito. Sustenta que a energia elétrica configura elemento imprescindível dos produto produzidos em seu estabelecimento, já que não há possibilidade de obter o produto final sem o seu consumo no processo industrial. Cita precedente do STF. Requer o provimento do recurso, para que seja concedida a segurança e reconhecido o direito à compensação própria do ICMS a partir do trânsito em julgado, nos termos da fundamentação apresentada evento 34, APELAÇÃO1.

Foram apresentadas as contrarrazões evento 37, CONTRAZAP1.

Neste grau de jurisdição, o Ministério Público opinou pelo conhecimento e desprovimento do apelo evento 7, PARECER1.

Vieram conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Recebo o presente recurso, porquanto cabível e tempestivo, preenchendo os pressupostos de admissibilidade previstos no CPC.

TISCHLER & CIA LTDA., atua no ramo de supermercados e impetrou mandado de segurança para ver reconhecido o direito ao creditamento do ICMS pago na aquisição de energia elétrica consumida em seu estabelecimento para industrialização de produtos que comercializa a varejo, tais como pães, bolos, salgados.

Pois bem.

O princípio da não-cumulatividade, consagrado pela Constituição Federal, no art. 155, § 2º, inc. I, autoriza o estabelecimento, na qualidade de contribuinte de jure, a compensação do imposto sobre circulação de mercadorias incidente em cada operação de circulação mercadorias ou em cada operação de prestação de serviços, com o montante cobrado nas operações anteriores.

Nesse sentido é a previsão da Lei Complementar 87/96:

Art. 19. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado.

Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.

§1º Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento.

Todavia, no tocante às operações de entrada de energia elétrica, o art. 33, II, da LC 87/96 determina que o direito ao crédito de ICMS só ocorre em algumas hipóteses, a exemplo de quando for consumida no processo de industrialização, sendo que, nos demais casos, será possível o creditamento a partir de 1º de janeiro de 2033:

Art. 33. Na aplicação do art. 20 observar-se-á o seguinte:

(...)

II – somente dará direito a crédito a entrada de energia elétrica no estabelecimento:

a) quando for objeto de operação de saída de energia elétrica;

b) quando consumida no processo de industrialização;

c) quando seu consumo resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção destas sobre as saídas ou prestações totais; e

d) a partir de 1º de janeiro de 2033, nas demais hipóteses;

(...)

E a própria Lei Estadual que instituiu o ICMS em nosso Estado (Lei nº 8.820/89) remete o direito ao creditamento para a data prevista em lei complementar:

“Art. 15. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto:

I - anteriormente cobrado e destacado na primeira via do documento fiscal, nos termos do disposto em regulamento, em operações ou prestações de que tenha resultado:

(...)

c) a entrada de energia elétrica no estabelecimento:

1 - quando for objeto de operação de saída de energia elétrica;

2 - quando consumida no processo de industrialização;

3 - quando seu consumo resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção destas sobre as saídas ou prestações totais;

4 - a partir da data prevista em Lei Complementar, de que trata o inciso XII do § 2º do art. 155 da Constituição Federal, nas demais hipóteses; (Alínea acrescentada pela Lei Nº 13.099 DE 18.12.2008, DOE RS de 19.12.2008)

(...)”

No âmbito do Supremo Tribunal Federal, foi reconhecido que as operações de consumo de energia elétrica em regra não geram direito a crédito de ICMS, bem como que as alterações previstas no art. 33 da LC 87/96 não violam o princípio da não-cumulatividade:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. EMBARGOS RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. TRIBUTÁRIO. ICMS. CRÉDITO. AQUISIÇÃO DE BENS DESTINADOS AO CONSUMO OU ATIVO FIXO. PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE. BENEFÍCIO FISCAL. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. LEGISLADOR POSITIVO. VERIFICAÇÃO DA DESTINAÇÃO DOS BENS ADQUIRIDOS PELO CONTRIBUINTE. INCURSIONAMENTO NO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA Nº 279 DO STF. LEGISLADOR POSITIVO. 1. Os embargos de declaração opostos objetivando a reforma da decisão do relator, com caráter infringente, devem ser convertidos em agravo regimental, que é o recurso cabível, por força do princípio da fungibilidade. (Precedentes: Pet 4.837-ED, rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJ de 14/3/2011; Rcl 11.022-ED, rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJ de 7/4/2011; AI 547.827-ED, rel. Min. Dias Toffoli, 1ª Turma, DJ de 9/3/2011; RE 546.525-ED, rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJ de 5/4/2011). 2. A inexistência de direito a crédito de ICMS pago em razão de operações de consumo de energia elétrica, de utilização de serviços de comunicação ou de aquisição de bens destinados ao ativo fixo e de materiais de uso e consumo não viola o princípio da não cumulatividade. De igual modo, não ofendem o princípio da não cumulatividade a modificação introduzida no art. 20, § 5º, da LC 87/96, e as alterações ocorridas no art. 33 da mencionada lei. 3. O Poder Judiciário não pode atuar na condição de legislador positivo, para, com base no princípio da isonomia, desconsiderar os limites objetivos e subjetivos estabelecidos na concessão de benefício fiscal, de sorte a alcançar contribuinte não contemplado na legislação aplicável, ou criar situação mais favorável ao contribuinte, a partir da combinação – legalmente não permitida – de normas infraconstitucionais. (...) (ARE 710026 ED, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 07/04/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-075 DIVULG 22-04-2015 PUBLIC 23-04-2015)

Expostas essas premissas, é relevante observar que as atividades desenvolvidas pela apelante, atuante no ramo de supermercados, não são caracterizadas como industrialzação, conforme expressamente estabelecido no art. 5º do Decreto nº 7.212/10 (Regulamento do IPI):

"Art. 5º Não se considera industrialização:

I - o preparo de produtos alimentares, não acondicionados em embalagem de apresentação:

a) na residência do preparador ou em restaurantes, bares, sorveterias, confeitarias, padarias, quitandas e semelhantes, desde que os produtos se destinem a venda direta a consumidor;

(...);"

Com base nisso, o Superior Tribunal de Justiça, já definiu, por ocasião do julgamento do Resp nº 1.117.139/RJ (Tema 242) que “As atividades de panificação e de congelamento de produtos perecíveis por supermercado não configuram processo de industrialização de alimentos, por força das normas previstas no Regulamento do IPI (Decreto 4.544/2002), razão pela qual inexiste direito ao creditamento do ICMS pago na entrada da energia elétrica consumida no estabelecimento comercial”.

Desta forma, considerando que a atividade da impetrante não se insere no conceito de industrialização e que é legítima a limitação temporal prevista no art. 33, inciso II, alínea d, da LC 86/97, não há direito ao creditamento do ICMS recolhido na aquisição de energia elétrica consumida em seu estabelecimento, na esteira do entendimento consolidado pela Corte Superior.

O Ministério Público desta instância também se alinhou nesse sentido:

"(...) a impetrante, consoante afirmado na própria inicial, bem como de acordo com seu ato constitutivo (Evento 1, doc. 2), constitui-se em estabelecimento do ramo de supermercados, no qual, dentre os vários produtos que comercializa, advindos de diferentes searas industriais, encontram-se igualmente pães, salgados, bolos e outros alimentos feitos diretamente no âmbito de seu...

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