Acórdão nº 51018407120218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Terceira Câmara Cível, 26-04-2022

Data de Julgamento26 Abril 2022
ÓrgãoVigésima Terceira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo51018407120218210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001933019
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

23ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5101840-71.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador JORGE LUIS DALL AGNOL

APELANTE: IARA RODRIGUES TORRES (AUTOR)

APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por IARA RODRIGUES TORRES da sentença que, nos autos da ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação de tutela ajuizada em desfavor de BANCO BMG S.A, julgou improcedentes os pedidos e condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em R$ 400,00, ficando suspensa a exigibilidade por litigar sob os auspícios da gratuidade de justiça (Evento 15 do processo originário).

Em suas razões, a apelante alega que a operação realizada pela instituição financeira é abusiva e excessivamente onerosa ao consumidor. Menciona que o pagamento da dívida ocorre mediante débito em folha do mínimo da fatura e que são aplicados juros abusivos de 3,36% ao mês, enquanto que a taxa para empréstimos consignados é de 1,80% ao mês. Acrescenta que o cartão de crédito nunca foi utilizado ou desbloqueado, o que reforça não ser conhecedor da modalidade escolhida, e que o valor foi depositado via TED, o que é uma característica de empréstimos consignados comuns. Afirma que não há prazo final para quitação da dívida, sendo, portanto, impagável, e que esta está em valor maior do que inicialmente disponibilizado. Defende a conversão do contrato em empréstimo consignado. Requer a condenação da instituição apelada e o redimensionamento dos ônus sucumbenciais. Menciona que os honorários advocatícios, fixados em 20% sobre o valor da causa, são ínfimos, devendo a verba ser majorada para R$ 3.000,00. Subsidiariamente, pleiteia a fixação da verba em 20% do valor atualizado da causa. Postula o provimento do recurso, para reformar a sentença, nos seguintes termos: a) convertendo o contrato para empréstimo consignado; b) utilizando os valores já pagos a título de RMC para amortizar o saldo devedor, o qual deverá ser recalculado com base no montante liberado, sendo desprezado o saldo devedor atual (valor acrescido de juros e encargos); c) devendo, se for o caso, ser determinada a repetição dobrada de valores pagos a maior, os quais devem ser corrigidos monetariamente pelo IGP-M, desde o efetivo pagamento até a repetição, e acrescidos de juros legais de 1% ao mês, a serem apurados em fase de liquidação de sentença; d) condenando a recorrida ao pagamento de honorários, que devem ser majorados, e redimensionando os ônus da sucumbência (Evento 19 do processo originário).

Ausentes contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

Cuida-se de ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação de tutela movida por IARA RODRIGUES TORRES em face de BANCO BMG S.A, em que pugna, em suma, pela conversão do contrato de cartão de crédito para empréstimo consignado.

Foi proferida sentença de improcedência dos pedidos, condenando a autora ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios em favor da parte contrária, fixados em R$ 400,00.

Pois bem.

Inicialmente, aplicável, a espécie, as normas do Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista a Súmula n. 297 do STJ: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM MARGEM CONSIGNÁVEL

Exame dos autos demonstra que, em 21 de abril de 2020, a parte autora firmou contrato de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC), sendo disponibilizado, por TED, em conta bancária, a quantia de R$ 1.489,00 (Evento 10 do processo originário - CONT1 e FATURA5).

Da análise das faturas acostadas aos autos, não há provas de que tenha efetuado compras mediante o cartão de crédito contratado.

Pelo contrato de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC) é disponibilizado determinado valor ao contratante, com previsão de pagamento mínimo de fatura pela utilização do crédito contratado, no limite de 5% sobre o valor do benefício previdenciário.

Tal contratação para operações com cartão de crédito em benefícios previdenciários está prevista no art. 1º da Resolução nº 1.305/2009 do Conselho Nacional de Previdência Social, a saber:

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL, no uso da atribuição que lhe confere o inciso V do art. 21 do Regimento Interno, aprovado pela Resolução nº 1.212, de 10 de abril de 2002, torna público que o Plenário, em sua 151ª Reunião Ordinária, realizada em 10 de março de 2009, resolveu:

Art. 1º Recomendar ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS que, relativamente aos empréstimos consignados, e respeitado o limite de margem consignável de 30% (trinta por cento) do valor do benefício, torne facultativo aos titulares dos benefícios previdenciários a constituição de Reserva de Margem Consignável – RMC de 10% (dez por cento) do valor mensal do benefício para ser utilizada exclusivamente para operações realizadas por meio de cartão de crédito.

Ainda, é necessária a expressa autorização do consumidor, por escrito ou por meio eletrônico, consoante art. 3º, III, da Instrução Normativa do INSS nº 28/2008, alterada pela Instrução Normativa do INSS nº 39/2009, que assim dispõe:

Artigo 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito concedidos por instituições financeiras, desde que (...)

III - a autorização seja dada de forma expressa, por escrito ou por meio eletrônico e em caráter irrevogável e irretratável, não sendo aceita autorização dada por telefone e nem a gravação de voz reconhecida como meio de prova de ocorrência.

No caso, tudo indica que a parte autora não foi devidamente informada acerca do contrato, apontando a existência de vício de vontade na contratação, pois sua pretensão não era a utilização do cartão para compras, mas, sim, a realização de empréstimo consignado.

O que se verifica, no caso, é que a recorrente foi induzida em erro, ao realizar o negócio pensando ter assumido empréstimo consignado e não empréstimo com margem consignável para cartão de crédito.

A instituição financeira demandada, por sua vez, não demonstrou a legalidade da contratação. Ao contrário, verifico que houve falha no dever de informação, violando o disposto no art. 52 do CDC:

Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre:

I – preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional;

II – montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros;

III – acréscimo legalmente previstos;

IV – número e periodicidade das prestações;

V – soma total a pagar, com o sem financiamento.

Ainda, o artigo 51, § 2º, do CDC dispõe que "a nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes”.

Assim, reconheço a nulidade dos descontos realizados no benefício da parte autora a título de “reserva de margem consignável – RMC”, em razão da contratação do cartão de crédito.

Isso porque o artigo 170 do Código Civil dispõe que “se o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido se houvessem previsto a nulidade”.

A respeito, o entendimento desta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO. PEDIDOS DECLARATÓRIO NEGATIVO E CONDENATÓRIO. DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). FALTA DE INFORMAÇÕES. PRÁTICA ABUSIVA. ALTERAÇÃO CONTRATUAL. DEVOLUÇÃO DE VALORES. DANO MORAL AFASTADO. Código de Defesa do Consumidor. Código de Defesa do Consumidor e a revisão judicial do contrato, quando detectado o desequilíbrio ou abusividade. Precedentes e Súmula 297 STJ. Declaração de nulidade da contratação. As provas demonstraram a abusividade contratual pela Instituição Financeira. No caso o Réu/Apelado deixou de comprovar as informações claras da contratação de cartão com comprometimento de margem consignável (RMC), ao invés de...

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